Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
2ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO DE MEDIDA CAUTELAR CÍVEL (1271) Nº 5002008-33.2024.4.03.9301

RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR SP

RECORRENTE: BRUNO APARECIDO BANDELLI VIEIRA

Advogado do(a) RECORRENTE: MARIANA COSTA - GO50426-A

RECORRIDO: BANCO DO BRASIL SA, UNIÃO FEDERAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

Advogado do(a) RECORRIDO: PAULO ROBERTO JOAQUIM DOS REIS - SP23134-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO DE MEDIDA CAUTELAR CÍVEL (1271) Nº 5002008-33.2024.4.03.9301

RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR SP

RECORRENTE: BRUNO APARECIDO BANDELLI VIEIRA

Advogado do(a) RECORRENTE: MARIANA COSTA - GO50426-A

RECORRIDO: BANCO DO BRASIL SA, UNIÃO FEDERAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

Advogado do(a) RECORRIDO: PAULO ROBERTO JOAQUIM DOS REIS - SP23134-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

Dispensado o relatório nos termos do art. 46 da Lei 9.099/1995.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO DE MEDIDA CAUTELAR CÍVEL (1271) Nº 5002008-33.2024.4.03.9301

RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR SP

RECORRENTE: BRUNO APARECIDO BANDELLI VIEIRA

Advogado do(a) RECORRENTE: MARIANA COSTA - GO50426-A

RECORRIDO: BANCO DO BRASIL SA, UNIÃO FEDERAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO

Advogado do(a) RECORRIDO: PAULO ROBERTO JOAQUIM DOS REIS - SP23134-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

O recurso não pode ser conhecido. Destaco os motivos já expostos na ementa deste voto, em fundamentação sucinta autorizada pelo artigo 46 da Lei 9.099/1995, aos quais me reporto e que se consideram transcritos e integrantes desta fundamentação.

DISPOSITIVO

Recurso não conhecido.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

1. Recurso interposto em face de decisão de primeiro grau que indeferiu o pedido de concessão de tutela provisória para suspender o pagamento das prestações de contrato de financiamento estudantil – FIES. Recurso incabível e não conhecido.

2. A liminar foi indeferida. O Banco do Brasil S/A apresentou contrarrazões.

3. O recurso não é cabível porque interposto de decisão interlocutória, e não de sentença definitiva.

Os artigos 4º e 5º da Lei nº 10.259/2001, dispõem, respectivamente, que “O Juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação” e que “Exceto nos casos do art. 4º, somente será admitido recurso de sentença definitiva”. Da literalidade do texto legal surge a norma de que cabe recurso apenas da decisão que defere medida cautelar no curso do processo, e não da que a indefere.

Mas não é apenas a literalidade do texto legal que autoriza essa interpretação, mas também a aplicação dos critérios da simplicidade, economia processual e celeridade, que direcionam a interpretação da Lei nº 10.259/2001, por força do artigo 2º da Lei nº 9.099/1995 (“O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que possível, a conciliação ou a transação”), e devem ser observados pelos Juizados Especiais Civis da Justiça Federal, nos termos do artigo 1º daquela lei (“São instituídos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais da Justiça Federal, aos quais se aplica, no que não conflitar com esta Lei, o disposto na Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995”).

A menos que a Lei nº 10.259/2001 houvesse previsto, expressamente, o cabimento de recurso também em face da decisão que indefere o pedido de concessão de medida cautelar (e não somente, como o fez, da que a defere), tal conclusão não pode ser extraída por construção jurisprudencial ou interpretação extensiva, porque vai de encontro aos critérios legais da simplicidade, economia processual e celeridade.

Admitir que a decisão que indefere o pedido de concessão de medida cautelar também é passível de impugnação por recurso, por interpretação extensiva, sobre violar a literalidade do texto legal, implica também agressão aos critérios legais da simplicidade, economia processual e celeridade.

Isso porque uma mesma decisão, que, por exemplo, defere em parte a tutela provisória, seria passível de impugnação tanto pelo autor como também pelo réu, gerando mais dois processos no âmbito do Juizado Especial Federal, além da lide principal.

Em outras palavras, no dia seguinte ao ajuizamento da demanda, se deferida apenas em parte a concessão da medida cautelar, a mesma lide pode dar causa ao ajuizamento de dois recursos, tanto pelo autor como pelo réu, gerando três processos solução essa que, a menos que houvesse sido admitida expressamente pelo legislador, afronta os critérios da simplicidade, economia processual e celeridade, donde não poder ser admitida.

A Lei n. 9.099/95 está voltada à promoção de celeridade no processamento e julgamento de causas cíveis de complexidade menor. Daí ter consagrado a regra da irrecorribilidade das decisões interlocutórias, salvo na única hipótese expressamente prevista no artigo 5º da Lei nº 10.259/2001, em caso de concessão de medida cautelar. Não cabe a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil para ampliar o cabimento de recurso em face da decisão que indefere a medida cautelar.

Não há afronta aos princípios constitucionais da ampla defesa (art. 5º, LV da Constituição do Brasil) e do amplo acesso ao Poder Judiciário (art. 5º, XXXV, da Constituição do Brasil), uma vez que a decisão interlocutória que indefere a medida cautelar será substituída pela sentença, passível de impugnação quando da interposição de recurso inominado.

De resto, a parte já teve garantido o acesso ao Poder Judiciário, quanto ao pedido de tutela provisória, perante o Juizado Especial Federal de origem. A Constituição do Brasil não garante o duplo grau de jurisdição relativamente à tutela provisória, especialmente no sistema dos Juizados Especiais o que, conforme fundamentação que segue, é compatível com os critérios legais previstos no artigo 2º da Lei 9.099/1995 e encontra fundamento de validade na própria Constituição, que prevê a atuação simplificada dos Juizados, mediante procedimentos oral e sumaríssimo, no artigo 98, inciso I, a afastar qualquer interpretação acerca da existência de um direito fundamental ao duplo grau de jurisdição relativamente à tutela provisória.

Cumpre salientar que a redação do texto do artigo 5º da Lei nº 10.259/2001, no que autoriza a interposição de recursos nos casos em que o juiz deferir medidas cautelares no curso do processo, para evitar dano de difícil reparação, não pode ser classificada como um erro de redação por parte do legislador, que teria dito no texto menos do que se pretendia, ao não se mencionar expressamente o cabimento do recurso também no caso de indeferimento de medida cautelar.

O legislador teve a oportunidade de “corrigir” esse suposto erro, na Lei nº 12.153/2009, que dispõe sobre os Juizados Especiais da Fazenda Pública no âmbito dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, e, no entanto, manteve nos seus artigos 3º e 4º redação idêntica à dos artigos 4º e 5º da Lei nº 10.259/2001: “Art. 3º O juiz poderá, de ofício ou a requerimento das partes, deferir quaisquer providências cautelares e antecipatórias no curso do processo, para evitar dano de difícil ou de incerta reparação. Art. 4º  Exceto nos casos do art. 3º, somente será admitido recurso contra a sentença”.

Do texto legal é possível concluir o cabimento do recurso, tratando-se de decisão interlocutória, apenas em face da decisão que concede a medida cautelar, destina-se a conferir à Fazenda Pública maior segurança jurídica.

Se de um lado a lei autoriza que a Fazenda Pública possa ser ré, no Juizado Especial, abrindo-se mão de certa segurança jurídica, especialmente tendo presente o grande volume de demandas de massa que nele tramitam, de outro lado institui certo grau de proteção à segurança jurídica, sem comprometer a simplicidade, economia processual e celeridade, ao prever recurso apenas da decisão interlocutória que concede medida cautelar.

Trata-se de providência destinada a equilibrar a segurança jurídica, permitindo que apenas a Fazenda Pública, considerado o número limitado de procuradores que a representam em juízo, em milhões de causas em curso nos Juizados Especiais no País, conte com algum grau maior de proteção, ante eventuais decisões proferidas com base em cognição sumária e superficial, dentro de um procedimento que já é, ele mesmo, presidido pelos critérios da simplicidade, economia processual e celeridade.

Assim, não se pode aplicar a interpretação extensiva, para ampliar, por meio de construção judicial, as duas únicas hipóteses de cabimento de recursos no âmbito dos Juizados: em face da decisão que concede medida cautelar e da sentença.

Fora dessas hipóteses, apenas em caso de expressa previsão legal é de ser admitido o recurso, porque conclusão contrária afronta os critérios legais da simplicidade, economia processual e celeridade. Quanto mais recursos e mais processos e incidentes processuais, menos simplicidade, economia processual e celeridade serão obtidas.

Deve ser restritiva a interpretação sobre as regras de cabimento de recursos no Juizado Especial Federal. Nesse sistema, os recursos somente cabem nas hipóteses taxativamente previstas, a fim de prestigiar os referidos critérios legais previstos no artigo 2º da Lei 9.099/1995, sob pena de se transformar o Juizado Especial Federal em sistema burocrático e com os mesmos vícios da Justiça tradicional.

Nesse sentido cito a exortação feita pela Excelentíssima Ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça, quando ocupava o cargo de Corregedora Nacional de Justiça: “O primeiro passo é a releitura do artigo 2º, da Lei 9.099/95, e, releitura, porque temos hoje um histórico de experiência recolhida ao longo de 20 anos de vigência da Lei, daquilo que produz resultados e das práticas que não produzem os efeitos desejados observada a realidade diferenciada de cada lugar de funcionamento dos Juizados Especiais. Os critérios que devem orientar o processo que tramita nos Juizados são: oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. Lembro do assombro de muitos de nós juízes ao ler pela primeira vez esse artigo, iniciando por abolir a palavra consagrada em todos os códigos "princípios" substituindo-a por ‘critérios’. Tudo era diferente, tudo tinha um propósito: distanciar ao máximo a Justiça Especial que estava sendo instalada no país das reconhecidas dificuldades e mazelas dos processos que tramitam pela Justiça tradicional. Todavia, naquela época não tínhamos a noção do funcionamento da nova e grandiosa experiência de instalar uma ‘nova justiça’ no país” (“Temos condições de redescobrir os juizados especiais e acionar sua potencialidade”, Conjur, 27/2/2015).

Na mesma direção é o voto proferido pelo Excelentíssimo Ministro do Superior Tribunal de Justiça João Otávio de Noronha, nos autos do AgRg no MS 21.883/DF, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/05/2017, DJe 18/08/2017: “os juizados especiais federais ou estaduais têm regramento processual próprio, de modo que não são aplicáveis as regras contidas no Código de Processo Civil”.

A Resolução CJF 347/2015, ao estabelecer que “Art. 2º Compete às turmas recursais dos juizados especiais federais processar e julgar:  I – em matéria cível, os recursos interpostos de sentenças ou de decisões que apreciam pedidos de medidas liminares, cautelares ou antecipatória dos efeitos da tutela”, disciplina apenas a competência para processar e julgar o recurso. Não estabelece que o recurso é cabível nem que deve ter seu mérito conhecido. Estabelece só a competência da Turma Recursal para processar e julgar o recurso. À Turma Recursal compete dizer que o recurso não é cabível em determinada hipótese. Não se está a recusar a competência para processar e julgar o recurso. O recurso está sendo processado e julgado pela Turma. Ainda que para assentar seu descabimento.

Outras situações iguais existem há anos no mesmo sentido. Por exemplo, o mesmo ato normativo estabelece a competência da Turma para processar e julgar mandados de segurança (artigo 2º, IV). Mas a Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais mantém a interpretação de que não cabe mandado de segurança nas Turmas Recursais. Mas à Turma Recursal compete dizer que o mandado de segurança não é cabível. No verbete da Súmula nº 20 da Turma Regional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais da 3ª Região foi resumida a interpretação das respectivas Turmas Recursais de que “Não cabe mandado de segurança no âmbito dos juizados especiais federais. Das decisões que põem fim ao processo, não cobertas pela coisa julgada, cabe recurso inominado”.

Ou seja, as Turmas Recursais têm competência para processar e julgar mandados de segurança, nas situações descritas o artigo 2º, IV, do Resolução 347/2015 - ainda que para afirmar seu descabimento, na mesma linha do tema 77/STF: “Não cabe mandado de segurança das decisões interlocutórias exaradas em processos submetidos ao rito da Lei 9.099/1995”. O mesmo ocorre com o recurso interposto em face de decisão que indefere tutela provisória: as Turmas Recursais têm competência para processar e julgar esse recurso, ainda que para afirmar seu descabimento.

Ainda que assim não fosse, mesmo que se considerasse cabível o recurso, falta plausibilidade jurídica à fundamentação porque:

i) a decisão recorrida não é nula. Ela contém fundamentação suficiente: não há dispositivo legal ou contratual que autorize a suspensão do contrato, em análise realizada em fase de cognição sumária, que é rápida e superficial neste momento processual. De resto, estamos em sede de Juizado Especial, em que a fundamentação deve ser sucinta;

ii) para conceder a tutela provisória seria indispensável declarar a inconstitucionalidade de vários dispositivos da Lei 14.375/2022, o que não se admite em grau de cognição sumária, que permite julgamento rápido e superficial no início da lide, em face do princípio da presunção de constitucionalidade das leis. Nenhuma das normas impugnadas teve sua eficácia suspensa pelo Supremo Tribunal Federal e sua compatibilidade com a Constituição do Brasil é presumida, de modo que se tem normas existentes, válidas e eficazes, que não podem ser afastadas em uma penada pelo juiz, no início da lide, o que representaria uma verdadeira afronta ao Poder Legislativo e à separação de funções estatais; e

iii) a declaração de inconstitucionalidade dos dispositivos impugnados não implicaria a criação de uma norma diferente para favorecer o recorrente, não prevista pelo Poder Legislativo, e sim à exclusão total das normas inconstitucionais da ordem jurídica e a ausência de qualquer desconto ou abatimento do saldo devedor. No controle difuso de constitucionalidade, realizado de modo incidental, em que a compatibilidade do texto da lei ordinária com a Constituição é apreciada como questão prejudicial ao julgamento do mérito, o juiz não dispõe de competência para atuar como legislador positivo, alterar o texto legal e criar outro texto, diferente do estabelecido pelo Poder Legislativo, sob pena de usurpar a função legislativa. Cabe apenas ao juiz atuar como “legislador negativo” e afastar a aplicação da norma no controle incidental de constitucionalidade, o que implicaria a não concessão de qualquer desconto. E a eventual inconstitucionalidade por omissão do legislador em contemplar a situação do contrato do autor não pode ser suprida pelo juiz de primeira instância. A Constituição do Brasil não atribui aos juízes de primeiro grau competência para julgar ação de inconstitucionalidade por omissão, de competência privativa do Supremo Tribunal Federal (artigo 103, § 2º, da Constituição do Brasil).

4. Ante o exposto, por ser manifestamente incabível o recurso, conforme interpretação reiterada desta 2ª Turma Recursal, não conheço do recurso.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo decidiu, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
CLECIO BRASCHI
JUIZ FEDERAL