Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0008677-23.2011.4.03.6108

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. ADRIANA PILEGGI

APELANTE: INSTITUTO DAS APOSTOLAS DO SAGRADO CORACAO DE JESUS

Advogados do(a) APELANTE: FRANCISCO BROMATI NETO - SP297205-A, PAULO HENRIQUE DE SOUZA FREITAS - SP102546-A

APELADO: QUIELZE APOLINARIO MIRANDA

Advogado do(a) APELADO: ALEX APARECIDO RAMOS FERNANDEZ - SP154881-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0008677-23.2011.4.03.6108

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. ADRIANA PILEGGI

APELANTE: INSTITUTO DAS APOSTOLAS DO SAGRADO CORACAO DE JESUS

Advogados do(a) APELANTE: FRANCISCO BROMATI NETO - SP297205-A, MAGALI RIBEIRO COLLEGA - SP118408-A

APELADO: QUIELZE APOLINARIO MIRANDA

Advogado do(a) APELADO: ALEX APARECIDO RAMOS FERNANDEZ - SP154881-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de remessa oficial e apelação em face da sentença (ID 20638996, fls. 260/274 que julgou procedente o pedido, para assegurar à impetrante que, em substituição à sua presença em sala de aula entre às 18h00 das sextas-feiras e às 18h00 dos sábados, possa apresentar trabalho escrito ou outra atividade de pesquisa acadêmica, com os efeitos da segurança a partir de 23/08/2011, data do requerimento da impetrante.

Com contrarrazões (ID 206038998 – fls. 12/41), vieram os autos a este Eg. Tribunal.

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso (ID 206038998 – fls. 53/59)

O v. acórdão (ID 206038998-fls. 72/78) deu provimento à remessa oficial, nesses termos:

MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. ALUNO ADVENTISTA DO 7° DIA. ABONO DAS FALTAS. PROVAS SUBSTITUTIVAS. HORÁRIOS DIVERSOS. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DA LIBERDADE RELIGIOSA. NÃO OCORRÊNCIA.TRATAMENTO ISONÔMICO.

1. Não há violação da liberdade religiosa por meio de aplicação de regras, pela instituição de ensino, quanto à grade curricular, horários, período letivo, programas das disciplinas e formas de avaliação. Tratamento isonômico dado aos alunos.

2. A Lei n. 9.394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) exige a frequência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância (artigo 47).

3. Precedente desta Corte.

4. Remessa oficial e recurso de apelação providos. 

TRF3; 0008677-23.20221.4.03.6108; Relator Desembargador Federal MARCIO MORAES; Terceira Turma; j. 23/08/2012; DJe 31/08/2012)

Após a interposição de recursos especial e extraordinário pela parte impetrante, ora apelada, a C. Vice-Presidência desta Eg. Corte encaminhou estes autos para eventual juízo de retratação, em decorrência do julgamento pelo E. Supremo Tribunal Federal do RE nº 611.874/DF, Tema nº 386 da Repercussão Geral.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0008677-23.2011.4.03.6108

RELATOR: Gab. 09 - DES. FED. ADRIANA PILEGGI

APELANTE: INSTITUTO DAS APOSTOLAS DO SAGRADO CORACAO DE JESUS

Advogados do(a) APELANTE: FRANCISCO BROMATI NETO - SP297205-A, MAGALI RIBEIRO COLLEGA - SP118408-A

APELADO: QUIELZE APOLINARIO MIRANDA

Advogado do(a) APELADO: ALEX APARECIDO RAMOS FERNANDEZ - SP154881-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

Retornam os autos da Vice-Presidência para verificar a pertinência de juízo de retratação, nos termos e para os fins estabelecidos pelo art. 1.040, II do Código de Processo Civil.

A questão debatida nos presentes autos fora objeto de julgamento proferido em sede de repercussão geral pelo E. Supremo Tribunal Federal no RE nº 611.874, em 26/11/2020, com a seguinte tese firmada (Tema nº 386): “Nos termos do artigo 5º, VIII, da Constituição Federal é possível a realização de etapas de concurso público em datas e horários distintos dos previstos em edital, por candidato que invoca escusa de consciência por motivo de crença religiosa, desde que presentes a razoabilidade da alteração, a preservação da igualdade entre todos os candidatos e que não acarrete ônus desproporcional à Administração Pública, que deverá decidir de maneira fundamentada.”, cuja ementa transcreve-se:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENDIDA AUTORIZAÇÃO PARA REALIZAÇÃO DE ETAPA DE CONCURSO PÚBLICO EM HORÁRIO DIVERSO DAQUELE DETERMINADO PELA COMISSÃO ORGANIZADORA DO CERTAME POR FORÇA DE CRENÇA RELIGIOSA. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS EM CONFLITO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. MÉRITO. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE IGUALDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. A tessitura constitucional deve se afastar da ideia de que a laicidade estatal, compreendida como sua não-confessionalidade, implica abstenção diante de questões religiosas. Afinal, constranger a pessoa de modo a levá-la à renúncia de sua fé representa desrespeito à diversidade de ideias e à própria diversidade espiritual.

2. No debate acerca da adequação de atividades administrativas a horários alternativos em respeito a convicções religiosas, deve o Estado implementar prestações positivas que assegurem a plena vivência da liberdade religiosa, que não são apenas compatíveis, como também recomendadas pela Constituição da República, a teor do inciso VII do art. 5º, CRFB, que assegura a “prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva”, bem como do art. 210, §1º, CRFB, o qual dispõe que o “ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental.

3. A separação entre Igreja e Estado não pode implicar o isolamento daqueles que guardam uma religião à sua esfera privada. O princípio da laicidade não se confunde com laicismo. O Estado deve proteger a diversidade, em sua mais ampla dimensão, dentre as quais incluo a liberdade religiosa e o direito de culto. O limite ao exercício de tal direito está no próprio texto constitucional, nos termos do inciso VI do art. 5º.

4. A fixação, por motivos de crença religiosa do candidato em concurso público, de data e/ou horário alternativos para realização de etapas do certame deve ser permitida, dentro de limites de adaptação razoável, após manifestação prévia e fundamentada de objeção de consciência por motivos religiosos. Trata-se de prática a ser adotada pelo Estado, na medida em que representa concretização do exercício da liberdade religiosa sem prejuízo de outros direitos fundamentais.

5. Recurso extraordinário não provido, fixando-se a seguinte tese: “Nos termos do art. 5º, VIII, da CF, é possível a realização de etapas de concurso público em datas e horários distintos dos previstos em edital por candidato que invoca a escusa de consciência por motivo de crença religiosa, desde que presente a razoabilidade da alteração, a preservação da igualdade entre todos os candidatos e que não acarrete ônus desproporcional à Administração pública, que deverá decidir de maneira fundamentada."

(RE 611.874/DF, Relator Min. DIAS TOFFOLI, Relator do acórdão Min. EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 26/11/2020, DJe 12/04/2021)

No caso concreto, o mandado de segurança foi impetrado para obter provimento jurisdicional que determine à autoridade impetrada que permita à impetrante, aluna do curso de Relações Internacionais da Universidade do Sagrado Coração (USC-Bauru/SP) ausentar-se dos compromissos acadêmicos, das 18h00 das sextas-feiras às 18h00 do sábado, por motivo de convicção religiosa.

Em sede recursal, nesta Eg. Corte, a sentença que concedeu a segurança foi reformada, nos termos do acórdão assim ementado:

MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. ALUNO ADVENTISTA DO 7º DIA. ABONO DAS FALTAS. PROVAS SUBSTITUTIVAS. HORÁRIOS DIVERSOS. IMPOSSIBILIDADE. VIOLAÇÃO DA LIBERDADE RELIGIOSA. NÃO OCORRÊNCIA. TRATAMENTO ISONÔMICO.

1. Não há violação da liberdade religiosa por meio de aplicação de regras, pela instituição de ensino, quanto à grade curricular, horários, período letivo, programas das disciplinas e formas de avaliação. Tratamento isonômico dado aos alunos.

2. A Lei n. 9.394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) exige a frequência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância (artigo 47).

3. Precedente desta Corte.

4. Remessa oficial e recurso de apelação providos.

(TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, ApReeNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 337604 - 0008677-23.2011.4.03.6108, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL MÁRCIO MORAES, julgado em 23/08/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/08/2012 )

Destarte, verifico não haver contrariedade a ser sanada, posto que o acórdão recorrido trata de abono de faltas em instituição de ensino universitário, ao passo que o acórdão paradigma do E. STF se refere à possibilidade de realização de etapas de concurso público, em datas e horários distintos dos previstos no edital.

Ante o exposto, em juízo negativo de retratação, mantenho o acórdão recorrido, que deu provimento à remessa oficial e à apelação.

É como voto.

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA OFICIAL. ENSINO SUPERIOR. ABONO DAS FALTAS. CONVICÇÃO RELIGIOSA. ADVENTISTA DO SÉTIMO DIA. TEMA 386 STF. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NEGATIVO.

I. CASO EM EXAME

1. Devolução dos autos esta Eg. Terceira Turma, por determinação da Vice-Presidência desta Eg. Corte, para verificar-se a pertinência de juízo de retratação, nos termos estabelecidos no art. 1.040, II do Código de Processo Civil.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2. A questão em discussão consiste em saber se a instituição de ensino superior é obrigada a abonar faltas e disponibilizar horários diferenciados para atividades acadêmicas em razão de convicção religiosa do aluno, à luz do Tema 386 do E. STF.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3. O E. STF, no julgamento do RE nº 611.874/DF (Tema 386), fixou a possibilidade de realização de etapas de concurso público em datas distintas por candidatos que invoquem escusa de consciência por crença religiosa, desde que presente a razoabilidade da alteração, preservada a igualdade e sem ônus desproporcional à Administração.

4. Contudo, a controvérsia tratada nos presentes autos refere-se ao abono de faltas em instituição de ensino superior, tema não abrangido pelo referido precedente.

5. Inexistência de contrariedade entre o acórdão recorrido e a tese firmada pelo STF, devendo ser mantida a decisão que que deu provimento à remessa oficial e ao recurso de apelação.

IV. DISPOSITIVO E TESE

6. Juízo de retratação negativo.

Tese de julgamento: “O precedente do Tema 386/STF não se aplica a casos que envolvam abono de faltas em instituição de ensino superior em razão de convicção religiosa”.


Dispositivo relevante citado: CF/1988, art. 5º, VIII; CPC, art. 1.040, inc. II; LDB, art. 47.

Jurisprudência relevante citada: STF, RE nº 611.874, Rel. Min. Dias Toffoli, Relator do acórdão Min. Edson Fachin, Plenário, j. 26.11.2020; TRF3, ApReeNec nº 0008677-23.2011.4.03.6108, Rel. Des. Fed. Márcio Moraes, j. 23.08.2012.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, em juízo de retratação negativo, deu provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
ADRIANA PILEGGI
DESEMBARGADORA FEDERAL