Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004516-76.2020.4.03.6104

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. DAVID DANTAS

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Advogados do(a) APELANTE: DIOGO UEBELE LEVY FARTO - SP259092-A, FABIO MAGALHAES LESSA - SP259112-A, MARIANA RUIZ BALDI - SP410904-A

APELADO: ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, UNIÃO FEDERAL

Advogados do(a) APELADO: DIOGO UEBELE LEVY FARTO - SP259092-A, FABIO MAGALHAES LESSA - SP259112-A, MARIANA RUIZ BALDI - SP410904-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004516-76.2020.4.03.6104

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. DAVID DANTAS

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Advogados do(a) APELANTE: DIOGO UEBELE LEVY FARTO - SP259092-A, FABIO MAGALHAES LESSA - SP259112-A, MARIANA RUIZ BALDI - SP410904-A

APELADO: ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, UNIÃO FEDERAL

Advogados do(a) APELADO: DIOGO UEBELE LEVY FARTO - SP259092-A, FABIO MAGALHAES LESSA - SP259112-A, MARIANA RUIZ BALDI - SP410904-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:

Trata-se de embargos de declaração opostos pela ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA. em face do acórdão que negou provimento ao seu agravo interno.

Sustenta a embargante, em síntese, que o julgado padece de vícios que devem ser sanados. Repete pela terceira vez os mesmos argumentos expostos nas razões dos recursos já analisados. Sustenta a nulidade da r. sentença, nos termos dos arts. 11, 489, § 1º, inc. IV e 1.022, parágrafo único, inc. II, todos do Código de Processo Civil, haja vista a apresentação de fundamentação genérica para afastar a tese relativa à necessária exclusão das benfeitorias, tais quais o aterro realizado anteriormente ao Decreto-lei nº 9.760/46, da base de cálculo da taxa de ocupação. No mérito, postula a reforma parcial da r. sentença, com vistas justamente a viabilizar a definitiva exclusão das benfeitorias e acessões realizadas no imóvel sub judice do valor de avaliação do imóvel e, por consequência, da base de cálculo da taxa de ocupação, com fundamento no disposto pelo art. 1º do Decreto-lei nº 2.398/87, com redação dada após o advento da Lei nº 13.240/2015.

Utiliza o recurso para fins de prequestionamento.

Intimada, a parte contrária não apresentou resposta.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004516-76.2020.4.03.6104

RELATOR: Gab. 01 - DES. FED. DAVID DANTAS

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA

Advogados do(a) APELANTE: DIOGO UEBELE LEVY FARTO - SP259092-A, FABIO MAGALHAES LESSA - SP259112-A, MARIANA RUIZ BALDI - SP410904-A

APELADO: ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA, UNIÃO FEDERAL

Advogados do(a) APELADO: DIOGO UEBELE LEVY FARTO - SP259092-A, FABIO MAGALHAES LESSA - SP259112-A, MARIANA RUIZ BALDI - SP410904-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL DAVID DANTAS:

Primeiramente, faz-se necessário considerar que os incisos I e II, do artigo 1022 do Código de Processo Civil dispõem sobre a oposição de embargos de declaração se, na sentença ou no acórdão, houver obscuridade, contradição ou omissão. Destarte, impõe-se a rejeição do recurso em face da ausência de quaisquer das circunstâncias mencionadas.

Razão não lhe assiste.

A decisão recorrida foi cristalina. Vejamos:

 

"...

Não merece acolhida a alegação de nulidade aventada pela defesa da autora ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., haja vista a ausência de qualquer vício formal na r. sentença vergastada.

A despeito da argumentação expendida em suas razões recursais, não se verifica a prolação de édito genérico, mas apenas o inconformismo da parte autora, ora apelante, diante do entendimento esboçado pelo d. Juízo singular no sentido de que a obra de aterro realizada no imóvel sub judice, por possuidores antecedentes, não poderia ser considerada benfeitoria, mas apenas acessão artificial.

Frise-se que a questão atinente à eventual exclusão das benfeitorias observadas no imóvel da base de cálculo da taxa de ocupação, de fato, encontra previsão legal expressa no art. 1º do Decreto-lei nº 2.398/1987, in verbis:

 

"Art. 1º A taxa de ocupação de terrenos da União será de 2% (dois por cento) do valor do domínio pleno do terreno, excluídas as benfeitorias, anualmente atualizado pela Secretaria do Patrimônio da União." (Redação dada pela Lei nº 13.240, de 2015)

 

Anote-se que o regramento legal em questão também encontra plena ressonância na Instrução Normativa – SPU nº 4/2018, a qual estabelece os procedimentos administrativos para a inscrição de ocupação em terrenos e imóveis da União, define procedimentos para a outorga, transferência, revogação e cancelamento, e estabelece a definição de efetivo aproveitamento. 

Coaduno do entendimento exarado pelo d. Juízo singular no sentido de que referido regramento não poderá ser aplicado à obra de aterro efetuada no imóvel sub judice, visto que segundo a legislação em regência (art. 2º do Decreto-lei nº 3.438/41), “são terrenos acrescidos da marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento nos terrenos de marinha”.

Logo, a caracterização do imóvel da marinha já pressupõe prévio aterro natural ou artificial, medida indispensável para a efetiva utilização do terreno, caracterizado pela natureza de manguezal alagadiço, de modo que a obra vindicada pela parte autora não pode ser entendida como benfeitoria.

Além disso, faz-se necessário observar que a efetiva incidência da taxa de ocupação pressupõe prévio aterro do terreno, com vistas a garantir sua utilidade e viabilidade de exploração econômica, não podendo, portanto, ser considerada benfeitoria, instituto adstrito às hipóteses de conservação, melhoria e embelezamento das coisas.

Realizadas tais considerações, observo que a controvérsia submetida à apreciação desta E. Corte cinge-se a adequação do valor exigido a título de taxa de ocupação pela UNIÃO FEDERAL em detrimento da parte autora, relativamente ao ano de 2020, haja vista a aplicação de aumento superior ao limite legal de 10,54%, previsto no art. 1º da Lei nº 13.347/16, bem como a possibilidade de exclusão de supostas benfeitorias referentes ao aterro da área do terreno da base de cálculo.

Alega a UNIÃO FEDERAL a regularidade da cobrança, argumentando para tanto que a majoração aplicada à taxa de ocupação devida pela parte autora não se submete à limitação de 10,54%, estabelecida pela legislação em regência, posto que decorrente da mera correção de inconsistências cadastrais que ensejaram a atualização do valor exigido e, por consequência, legitimaram a cobrança retroativa.

Pois bem.

O C. Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento em sede de Recurso Repetitivo – Tema 451 – que a majoração da taxa de ocupação, realizada mediante a atualização do valor do domínio pleno do imóvel, constitui simples recomposição do patrimônio,  sendo, portanto, dispensável a abertura  de processo administrativo que oportunize a intimação pessoal de interessados.

Nesse sentido, confira-se:

  

"ADMINISTRATIVO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. TERRENO DA MARINHA. TAXA DE OCUPAÇÃO. ATUALIZAÇÃO. ART. 28 DA LEI N. 9.784/99. CONTRADITÓRIO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. ART. 1º DO DECRETO N. 2.398/87. SIMPLES RECOMPOSIÇÃO PATRIMONIAL.

1. Trata-se de recurso especial interposto por particular, com fulcro nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, contra acórdão prolatado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região em que se entendeu legal o processo administrativo adotado pela Administração Pública para fins de atualização da taxa de ocupação dos terrenos de marinha.

2. Nas razões do especial, sustenta o recorrente ter havido violação aos arts. 3º, 26, 27 e 28 da Lei n. 9.784/99, 1º do Decreto n. 2.398/87 e 67 e 101 do Decreto-lei n. 9.760/46, ao argumento principal de que a majoração da taxa de ocupação de terreno da marinha, que se efetivou mediante a atualização do valor do imóvel, depende da participação do administrado, com prévia notificação individual da parte sobre a reavaliação do seu imóvel.

3. Na forma que dispõe o art. 1º do Decreto n. 2.398/87, compete ao Serviço do Patrimônio da União - SPU a atualização anual da taxa de ocupação dos terrenos de marinha.

4. A norma contida no art. 28 da Lei n. 9.784/99 cede lugar à aplicação do art. 1º do Decreto n. 2.398/87.

5. Em primeiro lugar, porque o Decreto n. 2.398/87 é diploma normativo específico, incidindo, no caso, os arts. 2º, § 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil e 69 da Lei n. 9.784/99.

6. Em segundo lugar, porque não se trata de imposição de deveres ou ônus ao administrado, mas de atualização anual da taxa de ocupação dos terrenos de marinha à luz do art. 28 da Lei n. 9.784/99 - e da jurisprudência desta Corte Superior -, a classificação de certo imóvel como terreno de marinha, esta sim depende de prévio procedimento administrativo, com contraditório e ampla defesa, porque aí há, em verdade, a imposição do dever.

7. Ao contrário, a atualização das taxas de ocupação - que se dá com a atualização do valor venal do imóvel - não se configura como imposição ou mesmo agravamento de um dever, mas sim recomposição de patrimônio, devida na forma da lei. Daí porque inaplicável o ditame do dispositivo mencionado.

8. Não fosse isso suficiente, cumpre destacar que é possível a incidência, na espécie, embora com adaptações, daquilo que vem sendo decidido pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da atualização da planta de imóveis para fins de cobrança de IPTU.

9. Nestes casos, é necessária a edição de lei (princípio da legalidade), mas não é necessário que o Poder Público abra procedimento administrativo prévio para justificar os comandos legais que venham a ser publicados.

10. A Súmula n. 160 desta Corte Superior diz que "[é] defeso, ao Município, atualizar o IPTU, mediante decreto, em percentual superior ao índice oficial de correção monetária".

11. Veja-se, no entanto, que a vedação imposta pelo verbete sumular diz respeito apenas ao meio utilizado para a atualização - qual seja, o decreto -, por conta do princípio da legalidade tributária, nada tendo a ver com uma impossibilidade genérica de atualização anual da base de cálculo do imposto através de revisitação da planta de valores venais ou com a necessidade de que, antes de editada a norma adequada para revisão da base de cálculo, seja aberto contraditório e ampla defesa a todos os interessados.

12. Similarmente, no caso das taxas de ocupação dos terrenos de marinha, é despiciendo procedimento administrativo prévio com participação dos administrados interessados, bastando que a Administração Pública siga as normas do Decreto n. 2.398/87 no que tange à matéria.

13. Após a divulgação da nova planta de valores venais e da atualização dela advinda, aí sim os administrados podem recorrer administrativa e judicialmente dos pontos que consideram ilegais ou abusivos.

14. Não há, portanto, que se falar em necessidade de contraditório para a incidência do art. 1º do Decreto n. 2.398/87.

15. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/08."

(STJ, Primeira Seção, REsp nº 1150579/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, J. 10/08/2011, DJe 17/08/2011)

 

Da mesma forma, há de se observar que a Corte Superior possui entendimento pacificado no sentido de ser imprescindível a intimação prévia dos interessados, nas hipóteses de alteração do valor de mercado do domínio pleno do imóvel, que implique em alteração da base de cálculo, tendo em vista a necessária observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, nos termos do art. 28 da Lei nº 9.784/99, in verbis:

 

"ADMINISTRATIVO. BENS PÚBLICOS. TERRENO DE MARINHA. TAXA DE OCUPAÇÃO. ALTERAÇÃO DO VALOR DE MERCADO DO DOMÍNIO PLENO DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE. CONTRADITÓRIO PRÉVIO. NECESSIDADE. 

1. Segundo o entendimento do STJ, a atualização do domínio pleno do imóvel, para a cobrança da taxa de ocupação, é autorizada pelos arts. 1º do Decreto-Lei n. 2.398/87 e 101 do Decreto-Lei n. 9.760/46, mediante reavaliação do valor de mercado do imóvel, com a ressalva de que, havendo a alteração da base de cálculo, há a necessidade de intimação prévia dos interessados, o que é dispensável tão somente nos casos de mera atualização monetária (EREsp 1.241.464/SC).

2. Nesse contexto, provido o recurso especial da União, a fim de reconhecer a legalidade do ato administrativo que, observando a inflação e a valorização imobiliária, atualiza o valor do domínio pleno (base de cálculo) e, em consequência, a taxa de ocupação, mister se faz o retorno dos autos ao Tribunal de origem para que aprecie a questão à luz da jurisprudência desta Corte de Justiça.

3. Hipótese em que a Corte a quo reconheceu a legalidade da atualização da taxa de ocupação tão somente até o limite do montante da correção monetária verificada no período, razão pela qual entendeu que "nada acrescenta à solução da controvérsia o fato de não existir notificação pessoal do ocupante acerca da majoração", deixando de se manifestar concretamente sobre tema.

4. Existindo na exordial alegação de ofensa ao disposto no art. 28 da Lei n. 9.784/99 e pedido expresso de nulidade do procedimento que culminou com a majoração do valor do imóvel, por ausência do devido contraditório e da ampla defensa, a manifestação do Tribunal de origem sobre o tema mostra-se imprescindível, justificando, assim, o retorno dos autos a instância a quo.

5. Agravo interno desprovido."

(STJ, Primeira Turma, AgInt nos EDcl no REsp nº 1163027/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, J. 27/06/2017, DJe 23/08/2017)

  

"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TERRENOS DE MARINHA. TAXA DE OCUPAÇÃO. ALTERAÇÃO DO VALOR DE MERCADO DO DOMÍNIO PLENO DO IMÓVEL. NECESSIDADE DE INTIMAÇÃO DOS INTERESSADOS PARA TOMAREM CONHECIMENTO DA NOVA BASE DE CÁLCULO DA TAXA DE OCUPAÇÃO. ARTIGOS 3º, INCISOS II E III, E 28 DA LEI N. 9.784/1999.

1. Trata-se de embargos de divergência opostos contra acórdão da Segunda Turma, nos quais se aduz haver divergência com o entendimento da Primeira Seção, no que se refere à necessidade de intimação do interessado para se proceder à alteração dos valores da taxa de ocupação de terreno da marinha, quando alterado o valor venal do imóvel.

2. Conforme entendimento externado pela Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.150.579/SC, realizado na sistemática do art.

543-C do CPC, é desnecessária a intimação prévia dos interessados, quanto à majoração da taxa de ocupação decorrente da atualização monetária do valor venal do imóvel. Porém, esse entendimento deve ser restrito à hipótese de simples correção monetária.

3. A reavaliação do valor de mercado do imóvel qualificado como terreno de marinha, embora esteja contida na primeira parte do art. 1º do DL n. 2.398/1987 ("calculada sobre o valor do domínio pleno do terreno") e até seja uma obrigação legal (v.g.: artigos 3º-A, inciso V, 12, 24 da Lei n. 9.636/1988), não pode implicar na imediata exigência de novo valor de taxa de ocupação, sem o prévio conhecimento daqueles que irão suportar esse ônus.

4. É que, tratando-se da alteração da base de cálculo inicialmente estipulada em procedimento administrativo, sua alteração não se pode dar à revelia daqueles que suportarão o ônus financeiro da taxa de ocupação. Esse é o fim das normas estipuladas no art. 3º, incisos II e III, e no art. 28 da Lei n. 9.784/1999.

5. Embargos de divergência não providos."

(STJ, Primeira Seção, EREsp nº 1241464/SC, Rel. Min. BENEDITO Gonçalves, J. 23/10/2013, DJe 04/11/2013)

 

Todavia, na hipótese em apreço, diversamente da argumentação expendida pela UNIÃO FEDERAL, não houve mera correção de inconsistências cadastrais, mas sim alteração do logradouro da testada do terreno e consequentemente majoração da base de cálculo da taxa de ocupação, tudo sem a prévia notificação do possuidor.

Por consequência, a Secretaria de Patrimônio da União – SPU procedeu à revisão do valor do domínio pleno e, portanto, a alteração da base de cálculo da taxa de ocupação sem a necessária instauração do devido processo administrativo que viabilizasse a participação dos interessados e o regular exercício do direito constitucional ao contraditório.

Vê-se, pois, que a majoração da base de cálculo da taxa de ocupação do terreno sub judice, sem notificação prévia dos interessados, constitui vício insanável que justifica a procedência da ação anulatória ajuizada pela ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA., com vistas a desconstituir a cobrança das diferenças das taxas de ocupação (relativamente ao ano de 2020), incidentes sobre o imóvel sito à Rua Bóris Kauffmann, 218 – Chico de Paula – Santos/SP (RIP nº 7071.0019763-00), com o que resta prejudicada a apreciação dos demais argumentos veiculados pela UNIÃO FEDERAL em suas razões recursais.

Melhor sorte não assiste à defesa da parte autora ao suscitar a necessária exclusão das benfeitorias da base de cálculo da taxa de ocupação, com fundamento do art. 1º do Decreto-lei nº 2.398/87, in verbis:

 

"Art. 1º A taxa de ocupação de terrenos da União será de 2% (dois por cento) do valor do domínio pleno do terreno, excluídas as benfeitorias, anualmente atualizado pela Secretaria do Patrimônio da União." (Redação dada pela Lei nº 13.240, de 2015)

 

Isso porque, conforme já mencionado no presente decisum, a obra de aterro do imóvel sub judice, ora indicada pela parte autora como benfeitoria, em verdade, caracteriza mera acessão artificial, indispensável para a utilidade e exploração econômica da área, haja vista sua natureza de manguezal alagadiço da Zona Portuária de Santos/SP, obra realizada por possuidores que antecederam a requerente, possivelmente em momento anterior à edição do Decreto-lei nº 9.760/46, considerando-se para tanto que o Laudo Pericial colacionado aos autos e tomado como prova emprestada pelo d. Juízo singular não permite precisar com exatidão a data de realização do aterramento.

Logo, conforme consta na r. sentença recorrida, “por sua própria definição legal, o acrescido de marinha já pressupõe o aterro natural ou artificial do imóvel, de maneira que, por corolário lógico, a obra não pode ser entendida como benfeitoria”, tanto que está incluído no valor venal do terreno fornecido pela Prefeitura de Santos/SP, para fins de cobrança do IPTU.

 

..."

 

Não procede, portanto, os argumentos expostos nas razões recursais.

Sob o pretexto de obscuridade do julgado, pretende, a recorrente, atribuir caráter infringente aos presentes embargos declaratórios.

No entanto, o efeito modificativo almejado somente será alcançado perante as Superiores Instâncias, se cabível na espécie.

Nesse sentido, a jurisprudência a seguir transcrita:

 

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - EFEITO INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE - ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA.

I - É incompatível com a finalidade dos embargos de declaração, em princípio, a intenção de proceder ao rejulgamento da causa.

II - Ao beneficiário da assistência judiciária vencido pode ser imposta a condenação nos ônus da sucumbência. Apenas a exigibilidade do pagamento é que fica suspensa, por cinco anos, nos termos do artigo 12 da Lei n.º 1.060/50.

III - Embargos rejeitados."(EDRESP 231137/RS; Embargos de Declaração no Recurso Especial 1999/0084266-9; rel. Min. Castro Filho, v.u., j. 04.03.04, DJU 22.03.04, p. 292).

 

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. CARÁTER INFRINGENTE. INADMISSIBILIDADE.

I - Os embargos de declaração, em regra, devem acarretar tão-somente um esclarecimento acerca do acórdão embargado. Noutro trajeto, caracterizado o pecadilho (omissão, obscuridade ou contradição), podem, excepcionalmente, ensejar efeito modificativo.

II - Inexistente a omissão e a contradição alegada em relação ao acórdão embargado, rejeitam-se os embargos declaratórios que, implicitamente, buscam tão-somente rediscutir a matéria de mérito.

III - Embargos rejeitados."(EDRESP 482015/MS; Embargos de Declaração no Recurso Especial 2002/0149784-8; rel. Min. FELIX FISCHER, v.u., j. 26.08.03, DJU 06.10.03, p. 303).

 

"PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS. CARÁTER INFRINGENTE. VÍCIO INEXISTENTE. FUNGIBILIDADE RECURSAL. INADMISSIBILIDADE. EMBARGOS REJEITADOS.

I - A modificação de acórdão embargado, com efeito infringente do julgado, pressupõe o acolhimento do recurso em face de um dos vícios que ensejam a sua interposição, o que não ocorre na espécie.

II - Não se admite o princípio da fungibilidade recursal se presente erro inescusável ou inexistente dúvida objetiva na doutrina e na jurisprudência a respeito do cabimento do recurso na espécie."(EDAGA 489753/RS; Embargos de Declaração no Agravo Regimental 2002/0159398-0; rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, v.u., j. 03.06.03, DJU 23.06.03, p. 386).

 

Além disso, verifica-se que alega a finalidade de prequestionamento da matéria, mas, ainda assim, também deve ser observado o disposto no artigo 1.022 do CPC, o que, "in casu", não ocorreu. Nessa esteira, destaco:

 

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL - CONTRIBUIÇÃO PARA O SEBRAE - MATÉRIA DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL - ALEGADA VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535 DO CPC - OMISSÃO, OBSCURIDADE OU CONTRADIÇÃO - INOCORRÊNCIA - CARÁTER INFRINGENTE - IMPOSSIBILIDADE.

- Nítido é o caráter modificativo que a embargante, inconformada, busca com a oposição destes embargos declaratórios, uma vez que pretende ver reexaminada e decidida a controvérsia de acordo com sua tese.

- Não há contradição no v. julgado embargado ao entender pela inexistência de violação ao artigo 535 do Código de Processo Civil e não conhecer a questão de fundo em razão da matéria ter sido decidida com base em fundamentos eminentemente constitucionais pela Corte de origem.

- "Não viola o artigo 535 do CPC, nem importa negativa de prestação jurisdicional, o acórdão que, mesmo sem ter examinado individualmente cada um dos argumentos trazidos pelo vencido, adotou, entretanto, fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia posta" (REsp 529.441/RS, DJ de 06/10/2003, Rel. Min. Teori Albino Zavascki).

- Ausente qualquer omissão, contradição ou obscuridade na decisão atacada, não é possível conferir efeitos infringentes ao julgado por meio dos embargos de declaração.

- Ao Superior Tribunal de Justiça, pela competência que lhe fora outorgada pela Constituição Federal, cumpre uniformizar a aplicação da legislação federal infraconstitucional, sendo-lhe defeso apreciar pretensa violação a princípios albergados na Constituição Federal e a outros dispositivos da Lei Maior. Na mesma linha, confira-se EDREsp 247.230/RJ, Rel. Min. Peçanha Martins, in DJ de 18.11.2002.

- embargos de declaração rejeitados."

(STJ, 2ª Turma, Proc. nº 200300354543, Rel. Franciulli Netto, DJ 08.03.2004, p. 216).

 

"PROCESSO CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - REEXAME DE PROVA - INEXISTÊNCIA DE OBSCURIDADE OU OMISSÃO - CARÁTER INFRINGENTE - IMPOSSIBILIDADE - PREQUESTIONAMENTO.

I - Não é possível, em sede de embargos de declaração, o reexame de prova, por revestir-se de nítido caráter infringente, mormente quando o acórdão embargado se mostrou claro e taxativo no exame das provas documentais oferecidas.

II - O acórdão embargado limitou-se a avaliar o conjunto probatório, e não esta ou aquela prova de maneira isolada, de molde a se concluir que não há sustentação na irresignação apresentada.

III - Mesmo que possível o prequestionamento com fundamento na Súmula 98 do Superior Tribunal de Justiça os embargos declaratórios opostos com esta finalidade, devem observar os pressupostos previstos no artigo 535, do Código de Processo Civil

IV - Embargos rejeitados".

(TRF3, Proc. nº 95030838258, 5ª Turma, Rel. Juíza Suzana Camargo, DJU: 10.02.2004, p. 350).

 

Ressalto, ainda,  que o magistrado não está obrigado a pronunciar-se expressamente sobre todas as alegações da parte. Imprescindível, sim, que no contexto do caso concreto decline motivadamente os argumentos embasadores de sua decisão. No presente caso, foram analisadas todas as alegações constantes do recurso capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada no decisum recorrido. 

Ademais,  é desnecessária a referência expressa aos dispositivos legais tidos por violados, para fins de prequestionamento, porquanto o exame da questão, à luz dos temas invocados, é mais do que suficiente para viabilizar o acesso às instâncias superiores. Aliás, é possível afirmar que o disposto no artigo 1.025 do Código de Processo Civil reforça o entendimento ora esposado.

Observo, por fim,  que a embargante laborou com clara atitude protelatória e em manifesto abuso do direito de recorrer, tendo em vista que nos presentes embargos reitera o que já foi exaustivamente  alegado nos recursos anteriores interpostos, quais sejam, apelação e agravo interno.

Diante de tal atitude, é de rigor a aplicação da multa prevista no artigo 1026, § 2º, do CPC/2015, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

 

"RECURSO DE AGRAVO - RECURSO EXTRAORDINÁRIO CORRETAMENTE DENEGADO NA ORIGEM - FGTS - CORREÇÃO MONETÁRIA - MATÉRIA INFRACONSTITUCIONAL - HIPÓTESE DE OFENSA REFLEXA - INADMISSIBILIDADE DO APELO EXTREMO - AGRAVO IMPROVIDO. (...) EXERCÍCIO ABUSIVO DO DIREITO DE RECORRER E A LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.

- O abuso do direito de recorrer - por qualificar-se como prática incompatível com o postulado ético-jurídico da lealdade processual - constitui ato de litigância maliciosa repelido pelo ordenamento positivo, especialmente nos casos em que a parte interpuser recurso manifestamente inadmissível ou infundado, ou, ainda, quando dele se utilizar com intuito evidentemente protelatório, hipóteses em que se legitimará a imposição de.

- A multa a que se refere o art. 557, § 2º, do CPC possui inquestionável função inibitória, eis que visa a impedir, nas hipóteses referidas nesse preceito legal, o abuso processual e o exercício irresponsável do direito de recorrer, neutralizando, dessa maneira, a atuação censurável do improbus litigator.

(STF, AI-AgR - Ag.Reg. no Agravo de Instrumento, Processo: 245004 UF: SC, Relator(a) Min Celso de Mello, DJ 26-11-1999, PP-00102).

SEGUNDOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - INOCORRÊNCIA DE CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU OMISSÃO - PRETENSÃO RECURSAL QUE VISA, NA REALIDADE, A UM NOVO JULGAMENTO DA CAUSA - CARÁTER INFRINGENTE - INADMISSIBILIDADE -EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - REJEITADOS.

- Os embargos de declaração - desde que ausentes os seus requisitos de admissibilidade - não podem ser utilizados com a finalidade de sustentar eventual incorreção do acórdão impugnado ou de propiciar um novo exame da própria questão de fundo, em ordem a viabilizar, em sede processual absolutamente inadequada, a desconstituição de ato decisório regularmente proferido. Precedentes. MULTA E ABUSO DO DIREITO DE RECORRER. - O abuso do direito de recorrer - por qualificar-se como prática incompatível com o postulado ético-jurídico da lealdade processual constitui ato de litigância maliciosa repelido pelo ordenamento positivo, especialmente nos casos em que a parte interpuser recurso com intuito evidentemente protelatório, hipótese em que se legitimará a imposição de multa. A multa a que se refere o art. 538, parágrafo único, do CPC possui inquestionável função inibitória, eis que visa a impedir o abuso processual e a obstar o exercício irresponsável do direito de recorrer, neutralizando, dessa maneira, a atuação censurável do "improbus litigator". Precedentes.

(AI 249186 AgR-ED-ED, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 14/09/2004, DJ 05-11-2004 PP-00037 EMENT VOL-02171-02 PP-00269).

 

Posto isso, REJEITO OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO e, com fundamento no artigo 1.026, parágrafo 2º, do CPC/2015, condeno o embargante a pagar multa de 2% (dois por cento) sobre o valor atribuído à causa, devidamente corrigido.

É o voto.



Autos: APELAÇÃO CÍVEL - 5004516-76.2020.4.03.6104
Requerente: UNIÃO FEDERAL e outros
Requerido: ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA e outros

 

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. TAXA DE OCUPAÇÃO DE TERRENO DA UNIÃO. AUSÊNCIA DOS VÍCIOS DO ART. 1.022 DO CPC. PRETENSÃO INFRINGENTE. CARÁTER PROTELATÓRIO. MULTA APLICADA. RECURSO REJEITADO.

I. CASO EM EXAME

Embargos de declaração opostos por ANTOMAR EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS LTDA. contra acórdão que rejeitou pedido de exclusão de aterro artificial da base de cálculo da taxa de ocupação de terreno da União e reconheceu a nulidade da majoração dessa taxa por ausência de prévia notificação dos interessados. O embargante alega omissão, contradição e obscuridade no julgado.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

A questão em discussão consiste em verificar se o acórdão embargado padece de obscuridade, contradição ou omissão, nos termos do art. 1.022 do CPC, e se os embargos declaratórios foram opostos com caráter meramente protelatório.

III. RAZÕES DE DECIDIR

O acórdão embargado está devidamente fundamentado, analisando todas as alegações capazes de infirmar sua conclusão, inexistindo os vícios previstos no art. 1.022 do CPC.

A embargante busca rediscutir o mérito da decisão sob o pretexto de obscuridade, com a intenção de obter efeito infringente, o que não se coaduna com a finalidade dos embargos de declaração.

A referência expressa a dispositivos legais não é requisito essencial para fins de prequestionamento, sendo suficiente o exame da matéria à luz dos temas invocados.

 

IV. DISPOSITIVO E TESE

Embargos de declaração rejeitados. Multa de 2% sobre o valor da causa aplicada.

Tese de julgamento:

Embargos de declaração não se prestam à rediscussão do mérito da decisão recorrida, salvo para sanar omissão, contradição, obscuridade ou erro material.

A ausência de referência expressa a dispositivos legais não impede o prequestionamento, desde que a matéria tenha sido devidamente analisada.

A oposição de embargos declaratórios com caráter manifestamente protelatório autoriza a aplicação da multa prevista no art. 1.026, § 2º, do CPC.


Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 1.022 e 1.026, § 2º.

Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1150579/SC, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. 10.08.2011, DJe 17.08.2011; STJ, AgInt nos EDcl no REsp nº 1163027/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, j. 27.06.2017, DJe 23.08.2017; STJ, EREsp nº 1241464/SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 23.10.2013, DJe 04.11.2013.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
DAVID DANTAS
DESEMBARGADOR FEDERAL