APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001375-60.2009.4.03.6124
RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS
APELADO: ANISIA SONODA, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE RUBINEIA, RIO PARANÁ ENERGIA S.A
Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A, LAURA FANUCCHI - SP374979-A
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogado do(a) APELADO: AZILDE KEIKO UNE - SP62650-A
Advogado do(a) APELADO: MILTON RICARDO BATISTA DE CARVALHO - SP139546-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001375-60.2009.4.03.6124 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS APELADO: ANISIA SONODA, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE RUBINEIA, RIO PARANÁ ENERGIA S.A Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A, LAURA FANUCCHI - SP374979-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelações e remessa necessária, em ação civil pública, com pedido de liminar, ajuizada pelo Ministério Público Federal contra Anisia Sonoda, Companhia Energética de São Paulo (CESP), sucedida pela Rio Paraná Energia S.A., município de Rubineia, Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) e União Federal objetivando (...) a) Seja condenada a União Federal pela omissão na fiscalização do contrato de concessão firmado com a concessionária-ré, acarretando na imediata ruptura da avença por inobservância das imposições legais e constitucionais (preservação do meio ambiente); b) Seja compelida a União Federal a proceder apuração de eventuais responsabilidades dos gestores públicos, especialmente do fiscal/gestor do contrato administrativo, em razão da não fiscalização da execução do contrato; c) Seja condenada a União Federal a, em conjunto com os demais réus, recompor integralmente os danos ambientais perpetrados nas APPs, consistente na adoção de todas as medidas necessárias para tal recomposição; e d) Seja arbitrada multa pecuniária, levando-se em conta o período em que a ré União Federal foi omissa na fiscalização do contrato, devendo ser criteriosamente arbitrado por este r. Juízo e revertido ao fundo previsto na Lei 7.347/85 (...); Com relação à rancheira (...) a) Seja(m) condenado(s) (...) nos termos do artigo 3° e seguintes da Lei n° 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) à obrigação de fazer consistente na completa recuperação da área de preservação permanente efetivamente prejudicada (florestamento), mediante a retirada das edificações e impermeabilizações existentes no local e adoção de práticas de adequação ambiental, utilizando-se técnicas de plantio e de manutenção da área e produtos não lesivos ao meio ambiente, mediante a supervisão do órgão ambiental, que deverá aprovar a forma de recuperação; e b) Seja(m) condenado(s) (...) à obrigação de coibir toda e qualquer atividade que possa causar lesão à área de preservação permanente objeto da ação civil pública ou nela promover ou permitir que se promovam atividades danosas, ainda que parcialmente. (...) Seja condenado o Município de Rubineia e a empresa CESP, solidariamente, à obrigação de fazer consistente na completa recuperação da área de preservação permanente efetivamente prejudicada; (...) Seja condenado o IBAMA na obrigação de fazer consistente na fiscalização e acompanhamento técnico ambiental até completa recuperação da área de preservação permanente; e e) Seja condenado o IBAMA e a Municipalidade, na obrigação de fazer consistente no exercício de seu poder de Polícia Ambiental, para realizarem fiscalização diuturna, ostensiva e ininterrupta em toda a APP, no sentido de: e.1.) realizarem a delimitação física da APP; e.2.) evitar novas construções ou edificações; e.3.) interromper toda e qualquer atividade em andamento que estiver em desacordo com a legislação ambiental protetora da APP, realizando para tanto, interdições, aplicação de multa, embargos e demolições; e.4.) realizar vistoria mensal em toda a APP, para o cumprimento das obrigações acima mencionadas, fiscalizando as delimitações físicas realizadas, remetendo mensalmente a este juízo relatório de tais vistorias, sob pena de multa a ser estipulada por Vossa Excelência em caso de eventual descumprimento; e.5.) que AFIXEM, mantenham e conservem as placas alertando sobre os limites da APP, informando ainda que se trata de bem insuscetível de ocupação/utilização; (...) Com relação a todos os réus requer: a) Sejam condenados os réus no pagamento de indenização quantificada em perícia ou por arbitramento deste Juízo Federal, correspondente aos danos ambientais que, no curso do processo, mostrarem-se técnica e absolutamente irrecuperáveis nas áreas de preservação permanente irregularmente utilizadas pelos réus, acrescidas de juros e correção monetária, a ser recolhida ao Fundo a que se refere o artigo 13 da Lei ri. 7.347/85 (Ação Civil Pública); b) Seja imposta multa diária não inferior a R$ 3.000,00 (três mil reais), com fundamento no artigo 461, § 4º, do Código de Processo Civil, para a hipótese de descumprimento das obrigações impostas nos itens acima; e c) Seja reconhecida e declarada a rescisão do contrato de concessão entre a concessionária de energia e o infrator por quebra de cláusula contratual - (preservação do meio ambiente). Alega, em breve síntese, que a legislação ambiental fixa, no entorno de reservatórios artificiais de águas, Área de Preservação Permanente – APP de 30 (trinta) metros em áreas urbanas consolidadas ou de 100 (cem) metros em áreas rurais, sendo esse o caso da área em torno da UHE de Ilha Solteira. Sustenta que, (...) a permanência das edificações e a utilização antrópica do local impede o restabelecimento da vegetação na APP ao redor do Reservatório, podendo trazer novos danos ambientais decorrentes do lançamento de efluentes (esgotos) e da utilização do lago da usina sem o competente licenciamento ambiental. Quanto à rancheira, aduz que, (...) instado a reparar o dano causado ao meio ambiente, o proprietário apresentou Projeto de Recuperação Ambiental (documento encartado no Expediente SOTC anexo à inicial), que, no entanto, foi rejeitado pela perita do MPF - engenheira florestal concursada - por não contemplar a retirada das intervenções humanas levadas à cabo na APP (construções, benfeitorias, impermeabilizações, introdução de plantas exógenas etc.). Afirma que (...) a concessionária não adotou as medidas que estavam ao seu alcance para preservar e recuperar as áreas de proteção permanente situadas no redor do reservatório de Ilha Solteira, (...) embora estivesse (...), por força do disposto no art. 23 da Lei 8:171/91, (...) obrigada a promover recuperação do dano ao meio ambiente ocorrido na área de abrangência de sua respectiva bacia hidrográfica. Aduz que, embora a União tenha outorgado (...) à Companhia Energética-Ré, mediante Contrato de Concessão para geração de energia elétrica destinada a serviço público, a exploração do potencial de energia hidráulica do já mencionado reservatório artificial (...) não fiscalizou a concessionária quanto ao estrito cumprimento do ajuste contratual, tornando-se, em razão de sua omissão, responsável pela prática dos danos que se sucederam e que poderiam ter sido evitados com a simples supervisão da União acerca do cumprimento integral das obrigações avençadas com a concessionária. Quanto à responsabilidade do IBAMA, sustenta que (...), não obstante a farta legislação federal e estadual salientando o relevante papel do IBAMA no monitoramento das atividades capazes de degradar o meio ambiente, a autarquia ambiental omitiu-se no cumprimento destas atribuições, permitindo que o rancheiro atuasse de forma irregular em área de preservação permanente. Aponta a responsabilidade do Município de Rubineia que (...) ao invés de se valer do poder de polícia de que dispõe para proteger o ambiente e coibir a ocupação irregular das áreas de proteção permanente situadas no entorno do Reservatório de Ilha Solteira, resolveu inovar o ordenamento jurídico, criando normas legais para burlar a legislação ambiental federal. Por fim, aponta que (...) a responsabilidade por danos ambientais será sempre objetiva, (...) independentemente da existência de culpa (...), bastando (...) que se estabeleça o nexo causal entre a conduta (comissiva ou omissiva) e o dano. Foi atribuído à causa o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). O pedido de liminar foi parcialmente deferido (ID 280728878, págs. 20/22). Foi deferido o requerimento de ingresso da União e do IBAMA no polo ativo da demanda (ID 280728879, págs. 19 e 25). Considerando o vasto número de ações civis públicas sobre o mesmo tema, adotou-se um processo piloto para a realização dos atos de instrução (ACP 0001653-95.2008.4.03.6124), no qual foi proferida decisão de parcial saneamento, requerendo as partes, genericamente, a produção de qualquer prova admitida em direito. Determinada a suspensão do feito até o julgamento definitivo da ADI 4.937/DF. Considerando que a determinação de processamento conjunto já teria atingido a sua razão de ser, o Juízo de origem determinou que cada ação civil pública deveria ter seu trâmite individualizado (ID 280729125). Proferida decisão de saneamento, (...) a) DETERMINO o regular prosseguimento deste feito e o desvinculo de qualquer sujeição processual ou instrutória a outro feito chamado “processo-piloto”; b) REJEITO a alegação de conexão e o pedido de reunião, para julgamento conjunto, de todas as ações civis públicas relativas à APP da UHE de Ilha Solteira; c) INDEFIRO o pedido de reconsideração relativo à legitimidade da CESP e da RIO PARANÁ S/A; d) REJEITO a preliminar de ilegitimidade dos proprietários do imóvel; e) REJEITO a preliminar de perda superveniente do interesse processual; f) REJEITO a alegação de prescrição; g) DETERMINO, em conformidade aos parâmetros de constitucionalidade declarados pelo STF, que para fins de prova pericial a Área de Preservação Permanente – APP no entorno da UHE de Ilha Solteira seja aferida a partir do parâmetro fixado pelo Novo Código Florestal, artigo 62; h) DETERMINO a inversão do ônus probatório, atribuindo-o aos proprietários do imóvel quanto à prova de que as edificações apontadas na inicial estão na APP da UHE de Ilha Solteira; i) DETERMINO a realização de prova pericial, cujo ônus financeiro de adiantar a integralidade dos valores deve ser arcado pelo(s) proprietário(s) do imóvel; j) NOMEIO como perito o Dr. Artur Pantoja Marques, professor da UNESP – Ilha Solteira, que realizará a perícia (...) (ID 280729125). Foi acostado aos autos laudo pericial pelo Engenheiro Civil Artur Pantoja Marques (ID 280729177). O Ministério Público Federal apresentou manifestação requerendo a realização de nova perícia judicial, para que seja realizada de acordo com os parâmetros estabelecidos pela Lei 4.771/1965, ou seja, 100 (cem) metros a partir do nível máximo normal, afastando-se a incidência do art. 62 da Lei 12.651/2012 (ID 280729181). O IBAMA apresentou manifestação, indicando que os seus quesitos não foram respondidos, o que impede a exata avaliação da extensão da área de preservação permanente à luz dos parâmetros defendidos pela autarquia ambiental (ID 280729190). As concessionárias manifestaram concordância com a conclusão do laudo pericial (ID 280729184 e ID 280729185). O r. Juízo a quo julgou improcedente os pedidos, deixando de fixar honorários advocatícios, tendo em vista o disposto no art. 18 da Lei 7.347/1985, e condenando a União Federal ao ressarcimento dos honorários periciais adiantados, consoante tese fixada pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.253.844/SC (Tema 510). Sentença submetida ao reexame necessário, nos termos do art. 19 da Lei 4.717/1965 (ID 280729217). Apelou o Ministério Público Federal, objetivando (...) a) acolhimento da preliminar formulada nos termos do art. 1.009, § 1º, do CPC, reformando-se a r. decisão interlocutória saneadora do feito para a aplicação da Lei 4.771/65, artigo 2º, alínea “b”, e Resolução CONAMA nº 302/2002 como marco normativo para instrução do feito, a fim de que a APP seja delimitada em 100 metros, medida a partir do nível máximo normal, afastando-se a incidência do art. 62 da Lei 12.651/2012; b) consequentemente, a anulação do laudo pericial juntado aos autos e da r. sentença recorrida, determinando-se a realização de nova perícia nos termos da legislação que fundamentou os pedidos iniciais; c) subsidiariamente, a reforma da r. sentença para que os pedidos sejam julgados totalmente procedentes , sendo determinada a realização de nova perícia na fase de cumprimento de sentença para determinar a extensão dos danos a serem reparados (ID 280729220). Apelou a União, pleiteando (...) que a r. sentença seja reformada para que seja afastado o capítulo que a condenou a ressarcir as despesas correspondentes à perícia requerida pelo réu, como prevê o art. 18 da Lei nº 7.347/85. Subsidiariamente, em caso de não ser acolhida a pretensão recursal principal, requer que a apelação seja provida em menor extensão, para que a condenação seja rateada entre os litisconsortes ativos, nos termos do art. 87 do Cód. de Processo Civil (ID 280729221). Apelou, por fim, o IBAMA, requerendo a (...) a) Declaração de nulidade da sentença e o consequente retorno dos autos à 1ª instância para que os quesitos formulados pela Autarquia possam ser respondidos pelo Sr. perito judicial; b) Seja acolhida a preliminar formulada nos termos do art. 1.009, § 1º, do Código de Processo Civil, reformando-se a r. decisão interlocutória saneadora do feito; e, c) Consequentemente, retifique-se também a r. sentença de mérito, fazendo constar as balizas apresentadas pelo IBAMA acerca do art. 62 do Novo Código Florestal, nos termos acima delineados; d) Por fim, em caso de constatação de intervenções ilegais em APP, considerada esta conforme a interpretação do art. 62 da Lei 12.651/12 acima exposta pelo IBAMA, requer-se a condenação dos réus à sua remoção e à recuperação da área, nos termos definidos pela petição inicial (ID 280729223). Com contrarrazões, subiram os autos a este e. Tribunal. O Ministério Público Federal opinou (...) pelo desprovimento dos apelos do IBAMA e do Ministério Público Federal e pelo provimento parcial do recurso da União (...) afastando-se o seu pedido subsidiário (281600248). É o relatório.
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogado do(a) APELADO: AZILDE KEIKO UNE - SP62650-A
Advogado do(a) APELADO: MILTON RICARDO BATISTA DE CARVALHO - SP139546-A
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0001375-60.2009.4.03.6124 RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, UNIÃO FEDERAL, INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS APELADO: ANISIA SONODA, CESP COMPANHIA ENERGETICA DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE RUBINEIA, RIO PARANÁ ENERGIA S.A Advogados do(a) APELADO: ALEXANDRE ABBY - SP303656-A, LAURA FANUCCHI - SP374979-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O De início, não se vislumbra o alegado cerceamento de defesa. Afirma o IBAMA que os quesitos por ele formulados deixaram de ser respondidos pelo perito designado, sendo indeferidos pelo Juízo de origem tão somente no momento da prolação da sentença. No caso vertente, por meio de decisão de saneamento, o r. Juízo de origem determinou (...), em conformidade aos parâmetros de constitucionalidade declarados pelo STF, que para fins de prova pericial a Área de Preservação Permanente – APP no entorno da UHE de Ilha Solteira seja aferida a partir do parâmetro fixado pelo Novo Código Florestal, artigo 62. Desse modo, seguindo as diretrizes estabelecidas pelo Juízo, o perito judicial formulou o seu laudo levando em consideração o estabelecido no art. 62 do novo Código Florestal, que trata da delimitação da extensão da área de preservação permanente nos reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público, deixando de responder aos quesitos formulados pela autarquia ambiental que estavam em desacordo com as referidas balizas. Ora, como se sabe, o destinatário da prova é o juiz, que tem capacidade para avaliar, dentro do quadro probatório existente, quais diligências serão úteis ao bom desenvolvimento do processo, e quais serão meramente protelatórias ou impertinentes, nos termos dos arts. 370 e 371 do Código de Processo Civil. Não é outro o entendimento adotado por esta c. Corte: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO ENTORNO DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA. PRELIMINARES REJEITADAS. SENTENÇA MANTIDA. REEXAME NECESSÁRIO IMPROVIDO. APELAÇÕES IMPROVIDAS. (...) VI - A perícia realizada nos autos conclui pela inexistência de ocupação de APP nos termos definidos pelo art. 62 da Lei 12.651/2012. Destaca-se que não há nulidade na perícia, uma vez que esta foi realizada nos parâmetros definidos pelo juízo a quo, enquanto os quesitos não respondidos pretendiam a averiguação de tese já descartada em decisão saneadora. A decisão não foi impugnada tempestivamente pelas apelantes e, sobretudo, foi objeto de ratificação pela sentença e está em consonância com o entendimento adotado por esta Corte e pelo STF. (...) IX - Rejeitadas as matérias preliminares. Reexame Necessário, Apelações do MPF e do IBAMA e da União improvidos. (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 0001645-21.2008.4.03.6124, Rel. Des. Fed. NOEMI DE OLIVEIRA, j. 16/10/2024, DJEN DATA: 22/10/2024) (destaque nosso) Desse modo, diante da irrelevância dos quesitos para a resolução do litígio, o simples fato de não terem sido formalmente rejeitados pelo juízo não impede sua desconsideração pelo perito do juízo. No mais, a questão quanto à delimitação de qual seria a área confunde-se com o mérito e com ele deverá ser analisada a seguir. A questão central cinge-se a saber: i) se a área ocupada se enquadra ou não como área de preservação permanente (APP), e, ainda, ii) se ocorreram danos ambientais. A ação civil pública constitui importante instrumento processual que visa apurar e coibir os danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, por infração da ordem econômica e da economia popular, assim como à ordem urbanística, conforme prevê a Lei 7.347/1985. Por sua vez, a Constituição da República garantiu, em seu art. 225, o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, qualificando-o como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, exigindo, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade, na forma do § 1°, IV, do referido dispositivo. As Áreas de Preservação Permanente (APP) consistem em espaços territoriais especialmente protegidos pelo ordenamento jurídico brasileiro, cuja cobertura vegetal deve ser necessariamente mantida, para garantir a proteção do solo, dos recursos hídricos, a estabilidade do relevo, de forma a evitar o assoreamento e assegurar a proteção das espécies animais e vegetais. A Lei 4.771/1965, antigo Código Florestal, descreveu objetivamente as Áreas de Preservação Permanente, estabelecendo em seu art. 2º a proteção especial desses espaços, cuja criação decorre da própria lei, mas deixando de delimitar a sua abrangência. Nessa linha, concebeu como de preservação permanente a área situada ao redor dos reservatórios hídricos artificiais, a teor da alínea b, assim redigida: Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: (...) b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais; Foi editada então a Medida Provisória 2.166-67, de 24/08/2001, que, ao incluir o § 6º do art. 4º no antigo Código Florestal, delegou ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) a definição dos parâmetros, bem como o regime de uso das APPs no entorno de reservatórios artificiais. Nesse diapasão, visando suprir essa lacuna legislativa, o CONAMA estabeleceu as definições e limites das Áreas de Preservação Permanente de reservatórios artificiais e o regime de uso do entorno, da seguinte forma: Art. 3º. Constitui Área de Preservação Permanente a área com largura mínima, em projeção horizontal, no entorno dos reservatórios artificiais, medida a partir do nível máximo normal de: I - trinta metros para os reservatórios artificiais situados em áreas urbanas consolidadas e cem metros para áreas rurais; (…) § 1º Os limites da Área de Preservação Permanente, previstos no inciso I, poderão ser ampliados ou reduzidos, observando-se o patamar mínimo de trinta metros, conforme estabelecido no licenciamento ambiental e no plano de recursos hídricos da bacia onde o reservatório se insere, se houver. Contudo, com o advento do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), houve a revogação do anterior conceito de área de preservação permanente, passando a prever o art. 62, in verbis: Art. 62. Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum. Inicialmente, prevalecia o entendimento de que o novo Código Florestal não poderia retroagir a fim de reduzir a proteção de ecossistemas frágeis, a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da "incumbência" do Estado de garantir a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais. Com efeito, levando em consideração os princípios do tempus regit actum e da vedação ao retrocesso ambiental, o Superior Tribunal de Justiça entende que o novo Código não pode retroagir para afetar fatos ocorridos anteriormente: ADMINISTRATIVO E AMBIENTAL. AGRAVO INTERNO. CÔMPUTO DA ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO CÁLCULO DA ÁREA DE RESERVA LEGAL. COMPENSAÇÃO DE ÁREA. APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO FLORESTAL. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA VEDAÇÃO AO RETROCESSO AMBIENTAL. TEMPUS REGIT ACTUM. CLÁUSULA DE RESERVA DE PLENÁRIO. NÃO VIOLAÇÃO. 1. A matéria pertinente ao art. 6º, caput, §1º, da LINDB, apontado como violado, foi objeto de enfrentamento no acórdão proferido pelo Tribunal a quo, de modo que o apelo nobre preenche o requisito do prequestionamento. 2. "A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que, em se tratando de matéria ambiental, deve-se analisar a questão sob o ângulo mais restritivo, em respeito ao meio ambiente, por ser de interesse público e de toda a coletividade, e observando, in casu, o princípio tempus regit actum." (AgInt no AREsp n. 1.145.207/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 13/8/2021). 3. Assim, resta impossibilitada a aplicação retroativa do art. 15 da Lei n. 12.651/2012, uma vez que o padrão de proteção ambiental estabelecido pela nova lei é inferior àquele já existente, de modo que, em estrita observância aos princípios de proibição do retrocesso na preservação ambiental e do tempus regis actum, a instituição da área de reserva legal, no caso dos autos, deve se amparar na legislação vigente ao tempo da infração ambiental. (...) 6. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt no REsp 1.700.760/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 9/11/2022, DJe de 14/11/2022) Contudo, no julgamento da ADC 42 e das ADIs 4.901, 4.902, 4.903 e 4.937, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 62 do novo Código Florestal, reconhecendo a incidência da norma às circunstâncias pretéritas. Mostra-se oportuna, assim, a transcrição do seguinte excerto do aludido julgado: O estabelecimento de dimensões diferenciadas da APP em relação a reservatórios registrados ou contratados no período anterior à MP nº 2166-67/2001 se enquadra na liberdade do legislador para adaptar a necessidade de proteção ambiental às particularidades de cada situação, em atenção ao poder que lhe confere a Constituição para alterar ou suprimir espaços territoriais especialmente protegidos (art. 225, § 1º, III). Trata-se da fixação de uma referência cronológica básica que serve de parâmetro para estabilizar expectativas quanto ao cumprimento das obrigações ambientais exigíveis em consonância com o tempo de implantação do empreendimento. Ex positis, declaro a constitucionalidade dos artigos 5º, caput e §§ 1º e 2º, e 62 do novo Código Florestal, julgando, no ponto, improcedente a ADI nº 4.903 e procedente a ADC nº 42. Entende o Pretório Excelso que (...) o raciocínio adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, fundado nos princípios do tempus regit actum e da vedação de retrocesso ambiental, acarreta burla às decisões proferidas pelo Plenário desta Corte na ADC 42/DF e nas ADIs 4.901/DF, 4.902/DF, 4.903/DF e 4.937/DF (...), esvaziando a eficácia da referida norma (STF, Rcl 44.645 AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 26/05/2021). Acerca do dispositivo em destaque, colho os ensinamentos da obra de Édis Milaré e Paulo Afonso Leme Machado, segundo a qual, (...) em sendo imposta a obrigação de se implantar Áreas de Preservação Permanente, aumentando o custo do empreendimento, a busca pelo equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão se dá com a revisão da tarifa de energia. Ocorre que o aumento na tarifa é repassado ao consumidor, que é quem de fato, suporta tal encargo. Portanto, o art. 62 do atual Código Florestal resolve esses impasses, na medida em que estabelece que ‘a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum.’ Tal regra vai ao encontro dos interesses ambientais, sociais e econômicos. De fato, preserva o meio ambiente na medida em que estabelece a conservação do entorno de reservatório artificiais; pacifica os conflitos sociais, pois tais áreas já são comumente consideradas artificiais (...) e (...) ‘de segurança’ para os reservatórios artificiais, significando pouco ocupação residencial nas mesmas; e evita a ruptura da estabilidade dos contratos administrativos de concessão pública, mantendo o valor das tarifas originariamente previstas” (...) (Novo Código Florestal: comentários à Lei 12.651, de 25 de maio de 2012, à Lei 12.727, de 17 de outubro de 2012 e ao Decreto 7.830, de 17 de outubro de 2012. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 451-452) Houve assim um realinhamento da jurisprudência deste Tribunal, a fim de adotar o novel entendimento consagrado pela Corte Maior, conforme se denota da transcrição da seguinte ementa de julgado do c. Órgão Especial: PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA AFASTADA. MÉRITO. JULGAMENTO ANTECIPADO. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. UHE ÁGUA VERMELHA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO NOVO CÓDIGO FLORESTAL. ARTIGO 62. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. ADI 4.903 E ADC 42. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO. RESCISÓRIA PROCEDENTE. (...) 5. Quanto ao mérito, na ADI 4.903/DF, assim como na ADC 42, restou consignada a constitucionalidade do artigo 62 do Novo Código Florestal. Não é demais ressaltar que o Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, debruçando-se não só sobre o tema, mas especificamente sobre a UHE Água Vermelha, nos autos da Reclamação Rcl 38.764/SP distribuída à Relatoria do Min. Edson Fachin, decidiu que esta Corte Federal, nos autos da Apelação Cível nº 0002737-88.2008.4.03.6106/SP (caso análogo ao presente), desrespeitou a autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficácia do julgado na ADI 4.903/DF e na ADC nº 42/DF. 6. Assim, resta indene de dúvida que o artigo 62 do Novo Código Florestal tem aplicação pretérita já que o dispositivo, cuja constitucionalidade foi declarada, em sua literalidade, define novos parâmetros às áreas de preservação permanente “Para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à MP nº 2.166-67 de 2001”, o que e o caso da UHE Água Vermelha. 7. Realizado este apanhado, há de ser reconhecida a violação à norma jurídica, especificamente o artigo 62 do Novo Código Florestal, pelo acórdão rescindendo, de modo que a decisão combatida comporta rescisão. 8. Com efeito, embora o acórdão rescindendo tenha fixado como área de preservação permanente a extensão de 100 metros no entorno da UHE Água Vermelha, aplicado o artigo 62 do Novo Código Florestal ao contrato de concessão em espécie, firmado em 1999, a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum da UHE de Água Vermelha coincide no valor de 383,3 m, o que culmina em uma área de preservação permanente nula ou igual a zero. 9. Em decorrência, havendo norma legal declarada constitucional e aplicável ao caso vertente, afasta-se a pretensa aplicação, pela defesa, da Resolução CONAMA 302/2004, inexistindo, via de consequência, dano ambiental a ser reconhecido. 10. Agravo interno prejudicado, preliminar arguida afastada. No mérito, julgada procedente a ação rescisória. (TRF3, 2ª Seção, AR 5020192-48.2017.4.03.0000, Rel. Des. Fed. ANTONIO CEDENHO, j. 06/05/2021, DJEN DATA: 10/05/2021) (destaque nosso) De acordo com o supracitado art. 62, a extensão da área de preservação permanente adotada vale para os reservatórios artificiais de água destinados à geração de energia ou abastecimento público, que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória 2.166-67, de 24/08/2001. No caso concreto, embora não conste dos autos a data exata da concessão da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira, nota-se que o Decreto 67.066, de 17/08/1970, outorgou à empresa Centrais Elétricas de São Paulo S.A. licença para o aproveitamento progressivo da energia hidráulica da localidade. Posteriormente, o Ministério de Minas e Energia editou a Portaria 289, de 11 de novembro de 2004, prorrogando a concessão por 20 (vinte) anos, com efeitos retroativos a 08/07/1995. Portanto, comprovando-se que a concessão da UHE de Ilha Solteira à CESP é anterior a 24 de agosto de 2001, incide a extensão da área de preservação permanente estipulada pelo art. 62 da Lei 12.651/2012. Estabelecida a área de preservação permanente como sendo a descrita no art. 62 da Lei 12.651/2012, deve-se apurar a existência, ou não, dos danos alegados pelo Parquet federal. Em razão de a questão trazida à liça tratar de matéria eminentemente técnica, analiso as ilações a que se chegou o perito do Juízo, o Engenheiro Civil Artur Pantoja Marques, cujo laudo (ID 280729177) assim concluiu: O reservatório da UHE de Ilha Solteira apresenta como níveis de armazenamento (acima do nível do mar) as cotas, NMO - Nível Máximo Operativo Normal igual a 328,00 metros e CMM – Cota Máxima Maximorum igual a 329,00 metros. A cota de desapropriação apresenta valores entre 330,00 metros e 335,00 metros. A APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, considerando o Art. 62 do Código Florestal em vigor (Lei 12.651/2012) apresenta, sua área definida entre esses dois níveis NMO e a CMM, ou seja, na faixa entre 328,00 metros e 329,00 metros, portanto, dentro da faixa de desapropriação. (...) Após a implantação dos pontos delimitadores da APP, realizou-se vistoria nos limites e não foram encontradas intervenções humanas que impeçam a regeneração natural no local auto da infração. (destaque nosso) Para a delimitação desses valores nos locais considerados, foram realizadas vistorias, com aplicação de técnicas e ferramentas compatíveis com o padrão de qualidade exigido, por meio de equipamentos topográficos (estação total), geodésicos (receptores GNSS) e aerofotogramétricos (RPA Drone). Reconhecida a inexistência de intervenção antrópica na área de preservação permanente descrita nos moldes do art. 62 da Lei 12.651/2012, restam prejudicados os demais pleitos de remoção das construções, recuperação da área, bem como de indenização pelos danos irrecuperáveis. Por fim, pleiteia a União Federal o afastamento de sua condenação ao ressarcimento dos honorários periciais, ou, subsidiariamente, que a condenação seja rateada entre os litisconsortes ativos. Aplica-se ao presente caso o art. 18 da Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública), que dispõe que (...) nas ações de que trata esta lei, não haverá adiantamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nem condenação da associação autora, salvo comprovada má-fé, em honorários de advogado, custas e despesas processuais (...) o que impede o requerimento de rateio do montante fixado entre os autores da demanda. In casu, inexiste prova de que o autor agiu com desígnio de atuar com má-fé, pelo que de rigor a incidência da regra isentiva prevista na Carta Maior, não devendo, ipso facto, ser condenado ao pagamento da aludida verba de sucumbência. Ademais, a condenação da União Federal ao pagamento dos honorários periciais, conforme fixada pela sentença, está em consonância com a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 510, in verbis: Não é possível se exigir do Ministério Público o adiantamento de honorários periciais em ações civis públicas. Ocorre que a referida isenção conferida ao Ministério Público em relação ao adiantamento dos honorários periciais não pode obrigar que o perito exerça seu ofício gratuitamente, tampouco transferir ao réu o encargo de financiar ações contra ele movidas. Dessa forma, considera-se aplicável, por analogia, a Súmula n. 232 desta Corte Superior ('A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito'), a determinar que a Fazenda Pública ao qual se acha vinculado o Parquet arque com tais despesas. (destaque nosso) Corroborando o até aqui expendido, trago à colação os seguintes precedentes das Turmas integrantes da Segunda Seção desta c. Corte, in verbis: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. DANO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE NO ENTORNO DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA. PRELIMINARES REJEITADAS. SENTENÇA MANTIDA. REEXAME NECESSÁRIO IMPROVIDO. APELAÇÕES IMPROVIDAS. I - A determinação contida no art. 55, § 3º do CPC deve ser interpretada à luz dos princípios que norteiam o processo civil e de todas as demais normas que compõem o referido códex. A existência de cerca de 500 ações civis públicas, tramitando em diferentes varas federais, tratando de imóveis em diversos municípios, construídos em condições múltiplas, com vários réus e advogados distintos indicam a inconveniência de uma reunião total das ações. Ainda assim, o juízo a quo envidou esforços para reunir as ações que se encontravam em condições similares. Não suficiente, os julgamentos realizados pelas cortes superiores com efeito erga omnes, com repercussão geral ou pelo ritos dos recursos repetitivos, tem sido suficientes para padronizar os entendimentos e garantir a isonomia entre as partes. (STJ, AgInt nos EDcl no CC n. 167.981/PR). II -O Novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), cuja vigência teve início no curso da ação, define Área de Preservação Permanente (APP) em seu art. 3º, II, Lei 12.651/2012. Para efeitos da presente ação destaca-se o teor do art. 62 do Novo Código Florestal, segundo o qual, para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum. III - As profundas mudanças legais empreendidas pelo Novo Código Florestal provocaram o ajuizamento das ADI’s 4.937/DF, 4.902/DF, 4.903/DF e da ADC 42/DF, julgadas pelo STF que, em linhas gerais e com poucas adaptações, confirmou a constitucionalidade do Novo Código Florestal. Destaca-se que a constitucionalidade do art. 62 da Lei 12.651/2012, objeto da maior controvérsia na presente ação, foi reconhecida por unanimidade pela Corte Suprema o que provocou, em um momento posterior, inclusive a necessidade de adaptação de julgados desta Sexta Turma que adotavam entendimento que restringia a aplicação do dispositivo. Por esta razão, não há como prevalecer o entendimento adotado pelo MPF de que a aplicação do artigo em questão ofenderia o teor do art. 5º, XXXVI da CEF e art. 6º, caput, §§ 1º e 3º da LINDB. IV - Também por este motivo, não restam dúvidas de que a APP no entorno do Reservatório da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira enquadra-se na hipótese do art. 62 da Lei 12.651/2012, que não faz menção às áreas consolidadas referidas em seus artigos anteriores ou à natureza das atividades nelas desenvolvidas. Ao limitar a extensão da APP no entorno dos reservatórios de água artificiais destinados à geração de energia, a lei acaba por regularizar a situação dos imóveis que se encontravam na área definida pelas Resoluções Conama, mas fora das novas dimensões definidas pela Lei 12.651/2012. V - A esse respeito, cumpre mencionar que o Tribunal Regional Federal da 1ª Região editou súmulas padronizando a interpretação do novo ordenamento ambiental, entre as quais se destaca a Súmula 56, segundo a qual o art. 62 do Novo Código Florestal é aplicável aos reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou ao abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória 2.166/1967, de 24/08/2001, tão somente para evitar demolições, sem, no entanto, ter o condão de possibilitar novas edificações, ainda que seja além da cota máxima maximorum. VI - A perícia realizada nos autos conclui pela inexistência de ocupação de APP nos termos definidos pelo art. 62 da Lei 12.651/2012. Destaca-se que não há nulidade na perícia, uma vez que esta foi realizada nos parâmetros definidos pelo juízo a quo, enquanto os quesitos não respondidos pretendiam a averiguação de tese já descartada em decisão saneadora. A decisão não foi impugnada tempestivamente pelas apelantes e, sobretudo, foi objeto de ratificação pela sentença e está em consonância com o entendimento adotado por esta Corte e pelo STF. VII - Precedentes desta Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3, 0001553-09.2009.4.03.6124, DES. FED. JOHONSOM DI SALVO, Publicado Acórdão em 15/06/2022; TRF3, APELAÇÃO CÍVEL, ApCiv 0001898-09.2008.4.03.6124, Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, 6ª Turma, Intimação via sistema DATA: 16/08/2023; TRF3,0001476-97.2009.4.03.6124, DES. FED. MAIRAN MAIA, 6ª Turma, Publicado Acórdão em 23/01/2023). VIII - No tocante às alegações da União, ao defender que não há fundamentos para sua condenação em arcar com os honorários periciais, sua insurgência contraria a literalidade da tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Tema Repetitivo nº 510. Neste sentido já decidiu este Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3, ApelRemNec 0000820-09.2010.4.03.6124, Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, 6ª Turma, DJEN DATA: 20/04/2023) IX - Rejeitadas as matérias preliminares. Reexame Necessário, Apelações do MPF e do IBAMA e da União improvidos. (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 0001645-21.2008.4.03.6124, Rel. Des. Fed. NOEMI MARTINS DE OLIVEIRA, j. 16/10/2024, DJEN DATA: 22/10/2024) AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE DO RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA. ART. 62 DO CÓDIGO FLORESTAL. INEXISTÊNCIA DE INTERVENÇÃO NA APP. PERÍCIA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. HONORÁRIOS PERICIAIS ADIANTADOS PELO RÉU. RESSARCIMENTO DEVIDO PELA UNIÃO. - Apelações do Ministério Público Federal, União Federal e do IBAMA contra sentença que julgou improcedente ação civil pública proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL contra PAULO ROMANO e outros, a CESP - COMPANHIA ENERGÉTICA DE SÃO PAULO, RIO PARANÁ S/A e o MUNICÍPIO DE SANTA FÉ DO SUL. - O decisum deve ser submetido ao reexame necessário, à semelhança do que se verifica no manejo da ação popular, aplicada por analogia a Lei nº 4.717/65, em razão da interpretação sistemática e teleológica do microssistema de tutela dos interesses coletivos e difusos. - Preliminarmente, os recursos de apelação interpostos pelo MPF e o IBAMA pretendem a reforma da decisão saneadora, no que se refere ao item “g”, que determinou: “em conformidade aos parâmetros de constitucionalidade declarados pelo STF, que para fins de prova pericial a Área de Preservação Permanente – APP no entorno da UHE de Ilha Solteira seja aferida a partir do parâmetro fixado pelo art. 62 do Novo Código Florestal;” e, consequentemente, a nulidade do laudo pericial e da sentença. Defendem que a legislação aplicável ao caso deveria ser a vigente à época dos fatos (Lei nº 4.771/65 (antigo Código Florestal) e a Resolução do CONAMA nº 302/02). Entretanto, a definição da extensão da área de preservação permanente diz respeito ao próprio mérito, de modo que será analisada conjuntamente. - Os proprietários do imóvel objeto da lide foram autuados por terem realizado intervenções não autorizadas, consistentes em construções impeditivas da regeneração natural da vegetação e lançamento de efluentes à margem do lago artificial formado pela usina hidrelétrica de Ilha Solteira. À época dos fatos, estavam em vigor a Lei nº 4.771/65 (antigo Código Florestal), bem como a Resolução do CONAMA nº 302/02, das quais se extraía que a área de preservação permanente nessa situação era de cem metros para as áreas rurais, contados do nível máximo normal. Assim, a demanda – ajuizada em 2008 – pretendeu a recuperação dessa área, bem como a responsabilização solidária do município e das concessionárias por essa obrigação. - No curso do processo, em 2012, com a promulgação do novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), a matéria passou a contar com nova disciplina. Os reservatórios artificiais de água, registrados ou que tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente a 2001, passaram a ter área de preservação permanente fixada pela distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máximamaximorum (área normalmente inundável). - Houve intenso debate sobre a constitucionalidade de diversos dispositivos da nova legislação ambiental, inclusive do aludido artigo 62, o que redundou na paralisação desta e centenas de outras ações idênticas que então tramitavam. O Supremo Tribunal Federal no julgamento conjunto da ADC 42/DF e das ADI 4901/DF, ADI 4902/DF, ADI 4903/DF e ADI 4937/DF, relativamente à questão em debate firmou sua constitucionalidade. - Descabe qualquer controvérsia sobre a constitucionalidade dessa regra, como, de fato, não foi suscitada pelos recorrentes. Não obstante, a discussão continuou, porém com base no entendimento do Superior Tribunal de Justiça aplicação dos princípios tempus regit actum e vedação ao retrocesso ambiental (AgInt no AREsp 1145207/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 09/08/2021, DJe 13/08/2021), conforme sustentou o MPF em seu apelo. Mais recentemente, no entanto, em reclamações contra decisões deste tribunal que adotaram o entendimento do STJ, a Corte Suprema reafirmou a aplicabilidade do artigo 62 do Código Florestal. Cite-se, a propósito, a de nº 38.764/SP, relatada pelo Min. Edson Fachin. - Insustentável, à luz do entendimento do Supremo Tribunal Federal, deixar de aplicar a regra do artigo 62 do Código Florestal por força dos princípios tempus regit actum e vedação ao retrocesso ambiental, considerado que é incontroverso no caso dos autos que a construção da hidrelétrica de Ilha Solteira é anterior a 2001. Irretorquível, em decorrência, a decisão saneadora ao fixar esse parâmetro para o exame pericial, cuja conclusão é de que, observada a cota maxima maximorum, não se verificou intervenção na área de preservação permanente. - Impertinente, in casu, a pretensão do IBAMA de que seja reformada a sentença para que sejam observadas as balizas interpretativas do artigo 62 do Código Florestal que defende, no sentido de se aplica às intervenções consolidadas, vale dizer, preexistentes a 22 de julho 2008 (artigo 3º do Código Florestal) ou, subsidiariamente, a data de entrada em vigor da Lei nº 12.651/12, não para futuras intervenções. A situação analisada nos autos diz respeito especificamente à alegação de desrespeito à área de preservação ambiental em 2008, conforme descrito na autuação elaborada à época. Descabe, portanto, cogitar sobre situações eventuais e futuras, nos termos em que defende a autarquia, porquanto não são objeto do feito. - Não procede o pedido da União Federal para seja desobrigada do ressarcimento dos honorários periciais adiantados pelos réus, nos termos do entendimento do STJ consolidado no Tema 510. Tampouco o pleito subsidiário para que a condenação seja rateada entre os litisconsortes ativos, porquanto o artigo 18 da Lei nº 7347/85 aplica-se também ao IBAMA. - Apelações e reexame necessário desprovidos. (TRF3, 4ª Turma, ApelRemNec 0001724-97.2008.4.03.6124, Rel. Des. Fed. ANDRE NABARRETE, j. 08/10/2024, DJEN DATA: 17/10/2024) PROCESSO CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DIREITO AMBIENTAL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESERVATÓRIO ARTIFICIAL DE ÁGUA DESTINADO À GERAÇÃO DE ENERGIA. CONCESSÃO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA MP 2.166-67/2001. OBSERVÂNCIA DA REGRA DE TRANSIÇÃO PREVISTA NO ARTIGO 62 DA LEI 12.651/2012 (CÓDIGO FLORESTAL ATUAL). NECESSIDADE. PRECEDENTE FIRMADO PELO STF NO JULGAMENTO DA ADC 42/DF E DAS ADIs 4.901/DF, 4.902/DF, 4.903/DF e 4.937/DF. INEXISTÊNCIA DE INTERVENÇÃO ANTRÓPICA NA FAIXA DA APP. LAUDO TÉCNICO. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. HONORÁRIOS PERICIAIS. REEMBOLSO PELA UNIÃO FEDERAL. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES DO MPF, DA UNIÃO FEDERAL E DO IBAMA DESPROVIDA. SENTENÇA MANTIDA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. 1 - Ao se examinar detidamente o laudo pericial, verifica-se que ele foi confeccionado com base no critério de cálculo da faixa da APP estabelecido no artigo 62 do Novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012) (ID 281002116), em estrito cumprimento aos termos da decisão saneadora prolatada pelo Juízo 'a quo' (ID 281002090). 2 - Alguns quesitos efetuados pelo IBAMA (ID 281002094), no entanto, ignoraram essa premissa, buscando obter o pronunciamento do vistor oficial sobre assuntos que não guardam relação com o objetivo da perícia. Em outros, insistiu-se na utilização de forma de cálculo da faixa da APP que foi expressa e fundamentadamente afastada pela decisão do Juízo 'a quo'. 3 - Diante da impertinência de tais questionamentos em relação ao propósito do laudo pericial - que não é o de desenvolver discussões jurídicas -, não há violação ao direito de defesa a ser pronunciada nesta fase processual. Precedente. 4 - Não se pode olvidar que o destinatário da prova é o juiz, que, por sua vez, sentiu-se suficientemente esclarecido sobre o tema. Não é direito subjetivo da parte, a pretexto de supostos esclarecimentos, a formulação de indagações outras, tão só porque a conclusão pericial lhe foi desfavorável. 5 - No mais, a impugnação da decisão saneadora e, consequentemente, a arguição de nulidade do laudo pericial, tão somente por ter determinado a observância do critério previsto no artigo 62 do Novo Código Florestal, confunde-se com o mérito. 6 - A controvérsia diz respeito à responsabilização por danos ambientais em Área de Preservação Permanente. 7 - O artigo 225 da Constituição Federal de 1988 reconheceu, como direito fundamental, a manutenção de um meio ambiente ecologicamente equilibrado, pois este constitui condição imprescindível para uma existência digna, já que viabiliza a fruição de uma vida mais saudável, mediante a proteção dos espaços, bem como dos recursos naturais e biológicos necessários à perpetuação da convivência humana. Dada a relevância dos bens ambientais para as presentes e as futuras gerações, foram incumbidos de sua proteção e preservação não só o Poder Público, mas também toda a coletividade. 8 - A fim de atingir esse propósito, entre outras providências, conferiu-se ao Estado a possibilidade de delimitar espaços territoriais que devam ser especialmente protegidos, de modo a impedir que sua utilização indevida comprometa a integridade do ecossistema, nos termos do artigo 225, §1º, III, da Carta Magna. Não é outra a razão pela qual o legislador regulamentou a criação e o regime jurídico das chamadas Áreas de Preservação Permanente - APPs. Esses espaços encontram-se atualmente disciplinados pelo Novo Código Florestal - NCF (Lei n. 12.651 de 25/06/2012). 9 - Os territórios nos arredores dos reservatórios artificiais de água foram reconhecidos como áreas de preservação permanente em razão da norma prevista no artigo 2, alínea 'b', do antigo Código Florestal (Lei n. 4.771/65). 10 - O preceito normativo supramencionado, conquanto tenha assegurado especial proteção estatal em torno desses empreendimentos, não estipulou qualquer critério para delimitação da abrangência da APP. 11 - A fim de suprir a referida omissão e no exercício de sua competência para formular diretrizes para a implementação da Política Nacional de Meio Ambiente, o CONAMA editou a Resolução n. 04/1985, que estabelecia inicialmente o critério para definição da abrangência desses territórios. 12 - Entretanto, questionava-se a validade da referida Resolução, sobretudo, considerando que a Lei n. 4.771/65 não delegava ao Poder Executivo o poder de regulamentar a forma de cálculo da faixa da APP. 13 - Justamente para encerrar a discussão em torno desse tema, preenchendo a alegada lacuna legislativa, foi editada a Medida Provisória n. 2.166-67, que incluiu o parágrafo 6º no artigo 4º do antigo Código Florestal (Lei n. 4.771/65). A referida Medida Provisória foi sendo reeditada inúmeras vezes até sua perenidade ser assegurada na ordem jurídica pela promulgação da Emenda Constitucional n. 32, de 11 de setembro de 2001, a qual estabeleceu em seu artigo 2º que "as medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional". 14 - Com esteio nesta delegação legislativa, o Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA confeccionou a Resolução n. 302, em 20 de março de 2002, regulamentando o artigo 2º, alínea 'b', da Lei n. 4.771/65, a fim de estabelecer novo critério de cálculo da faixa da APP no entorno de reservatórios artificiais de água. 15 - Com a entrada em vigor do Novo Código Florestal - NCF (Lei n. 12.651/2012), buscou-se compatibilizar a tutela do direito fundamental a um ambiente ecologicamente equilibrado com a necessidade de resolução dos conflitos de interesses que permeiam a disputa pela terra no país, inclusive mediante a positivação de medidas que visavam possibilitar eventual regularização fundiária de edificações que, embora construídas indevidamente, em regiões que gozavam de especial tutela estatal, já possuíam seu uso consolidado pelo decurso do tempo. 16 - É com esse espírito que veio a lume o artigo 62 do NCF, que inovou ao estabelecer critério objetivo de delimitação da Área de Preservação Permanente no entorno dos reservatórios artificiais de águas destinados à geração de energia ou ao abastecimento público, cujos contratos de concessão ou autorização foram assinados antes da vigência da Medida Provisória n. 2.166-67. 17 - Substitui-se, portanto, a prévia determinação legal de limites rígidos para a faixa da APP, em prol de um critério técnico variável de acordo com as características particulares do empreendimento. 18 - A aplicação da referida regra de transição foi objeto de intensa controvérsia jurisprudencial, sobretudo no que tange à rediscussão da validade do dimensionamento das Áreas de Preservação Permanente feitas segundo os parâmetros fixados na Resolução n. 302/2002. Neste sentido, impugnava-se a supressão dos limites mínimos para delimitação da APP, tendo em vista o impacto que isso poderia representar para o equilíbrio dos ecossistemas. 19 - Diante desse contexto, o C. Superior Tribunal de Justiça manteve sua orientação de prestigiar a observância dos princípios tempus regit actum e da vedação ao retrocesso ambiental ao analisar recursos que objetivavam o redimensionamento das faixas de APP segundo a Lei n. 12.651/2012. Precedente. 20 - Entretanto, ao julgar a ADC n. 42 e as ADIs n. 4901, 4902, 4903 e 4937, a Suprema Corte concluiu pela constitucionalidade da regra de transição prevista no artigo 62 do Novo Código Florestal. 21 - Reconhecida a constitucionalidade do referido preceito legal, em sede de controle concentrado, inviável desconsiderar sua incidência no caso concreto sob a justificativa de observância dos princípios tempus regit actum e da vedação ao retrocesso ambiental. Precedentes. 22 - Este Egrégio Tribunal, por sua vez, também começou a realinhar sua jurisprudência para reconhecer a incidência imediata do artigo 62 do Novo Código Florestal nos processos em curso. Neste sentido, é paradigmático o precedente firmado pela 2ª Seção na Ação Rescisória n. 5020192-48.2017.4.03.0000, sob a relatoria do Des. Fed. Antonio Carlos Cedenho. Precedentes. 23 – Segundo os autores, o suposto dano ambiental seria causado pela construção da edificação pertencente aos corréus MARIA APARECIDA, MIGUEL e ANA ROSA, dentro da Área de Preservação Permanente no entorno da UHE de Ilha Solteira. 24 - O referido empreendimento teve sua concessão deferida à CESP por meio do Decreto n. 67.066, de 17/08/1970, consoante informações constantes no Parecer do IBAMA acostado aos autos (ID 281001967 - p. 2). Posteriormente, o Ministério de Minas e Energia editou a Portaria n. 289, de 11 de novembro de 2004, prorrogando a concessão por 20 (vinte) anos, com efeitos retroativos a 08/07/1995. 25 - É incontroverso, portanto, que a concessão da UHE de Ilha Solteira ocorreu antes de 24 de agosto de 2001, razão pela qual a faixa da APP no seu entorno deve ser calculada nos termos do artigo 62 do Novo Código Florestal (Lei n. 12.651/2012), conforme estabelecido na decisão saneadora. 26 - Neste sentido, foi realizada perícia judicial no período de 08/06/2022 a 28/10/2022, com o auxílio de equipamentos topográficos, geodésicos e aerofotogramétricos, por Engenheiro e Professor Doutor da UNESP (ID 281002116), na qual se consignou que "o reservatório da UHE de Ilha Solteira apresenta como níveis de armazenamento (acima do nível do mar) as cotas, NMO - Nível Máximo Operativo Normal igual a 328,00 metros e CMM - Cota Máxima Maximorum igual a 329,00 metros. A cota de desapropriação apresenta valores entre 330,00 metros e 335,00 metros. A APP do reservatório da UHE de Ilha Solteira, considerando o Art. 62 do Código Florestal em vigor (Lei 12.651/2012) apresenta, sua área definida entre esses dois níveis NMO e a CMM, ou seja, na faixa entre 328,00 metros e 329,00 metros, portanto, dentro da faixa de desapropriação". 27 - Feitas as devidas averiguações e estabelecida a delimitação da APP, o experto do Juízo concluiu que "não foram encontradas intervenções humanas que impeçam a regeneração natural no local". 28 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010. 29 - Por conseguinte, à míngua da demonstração de intervenção antrópica dentro da faixa da APP que obste a regeneração natural da vegetação, inviável reconhecer a responsabilidade dos réus pela reparação de dano ambiental no caso vertente, devendo ser mantida a sentença de 1º grau neste aspecto. Precedentes. 30 - No que tange aos honorários periciais, igualmente não merece reparos o r. decisum, já que os valores que foram antecipados a este título devem ser reembolsados pela União Federal, por aplicação analógica da Súmula 232 do C. STJ: "A Fazenda Pública, quando parte no processo, fica sujeita à exigência do depósito prévio dos honorários do perito ". Precedentes. 31 - Remessa necessária e apelações interpostas pelo MPF, pela União Federal e pelo IBAMA desprovidas. Sentença mantida. Ação julgada improcedente. (TRF3, 3ª Turma, ApelRemNec 0001768-82.2009.4.03.6124, Rel. Des. Fed. CARLOS DELGADO, j. 26/08/2024, DJEN DATA: 28/08/2024) Em face do exposto, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa e nego provimento à remessa necessária e às apelações do Ministério Público Federal, do IBAMA e da União Federal, devendo ser mantida a r. sentença recorrida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos. É como voto.
Advogado do(a) APELADO: ADRIANA ASTUTO PEREIRA - SP389401-A
Advogado do(a) APELADO: AZILDE KEIKO UNE - SP62650-A
Advogado do(a) APELADO: MILTON RICARDO BATISTA DE CARVALHO - SP139546-A
E M E N T A
DIREITO AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP). RESERVATÓRIO DA USINA HIDRELÉTRICA DE ILHA SOLTEIRA. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRELIMINAR REJEITADA. ART. 62 DA LEI 12.651/2012 (NOVO CÓDIGO FLORESTAL). CONSTITUCIONALIDADE. ADC 42/DF E DAS ADIS 4.901/DF, 4.902/DF, 4.903/DF E 4.937/DF. INCIDÊNCIA DA NORMA ÀS CIRCUNSTÂNCIAS PRETÉRITAS. CONTRATO DE CONCESSÃO ANTERIOR À MEDIDA PROVISÓRIA 2.166-67, DE 24/08/2001. LAUDO PERICIAL. INEXISTÊNCIA DE INTERVENÇÃO ANTRÓPICA. HONORÁRIOS PERICIAIS. RESSARCIMENTO DEVIDO PELA UNIÃO. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES DESPROVIDAS. AÇÃO IMPROCEDENTE.
1. Não se vislumbra o alegado cerceamento de defesa, no sentido de que os quesitos formulados pelo IBAMA deixaram de ser respondidos pelo perito designado, sendo indeferidos pelo Juízo de origem tão somente no momento da prolação da sentença.
2. Seguindo as diretrizes estabelecidas pelo Juízo, o perito judicial formulou o seu laudo levando em consideração o estabelecido no art. 62 do novo Código Florestal, que trata da delimitação da extensão da área de preservação permanente nos reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público, deixando de responder aos quesitos formulados pela autarquia ambiental que estavam em desacordo com as referidas balizas.
3. Diante da irrelevância dos quesitos para a resolução do litígio, o simples fato de não terem sido formalmente rejeitados pelo juízo não impede sua desconsideração pelo perito do juízo.
4. As Áreas de Preservação Permanente (APP) consistem em espaços territoriais especialmente protegidos pelo ordenamento jurídico brasileiro, cuja cobertura vegetal deve ser necessariamente mantida, para garantir a proteção do solo, dos recursos hídricos, a estabilidade do relevo, de forma a evitar o assoreamento e assegurar a proteção das espécies animais e vegetais.
5. A Lei 4.771/1965, antigo Código Florestal, descreveu objetivamente as Áreas de Preservação Permanente, estabelecendo em seu art. 2º a proteção especial desses espaços, cuja criação decorre da própria lei, mas deixando de delimitar a sua abrangência.
6. Foi editada então a Medida Provisória 2.166-67, de 24/08/2001, que, ao incluir o § 6º do art. 4º no antigo Código Florestal, delegou ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) a definição dos parâmetros, bem como o regime de uso das APPs no entorno de reservatórios artificiais.
7. Visando suprir essa lacuna legislativa, o CONAMA estabeleceu, por meio da Resolução 302/2002, as definições e limites das Áreas de Preservação Permanente de reservatórios artificiais e o regime de uso do entorno.
8. Contudo, com o advento do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), houve a revogação do anterior conceito de área de preservação permanente, passando a prever o art. 62 que (...) para os reservatórios artificiais de água destinados a geração de energia ou abastecimento público que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória nº 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, a faixa da Área de Preservação Permanente será a distância entre o nível máximo operativo normal e a cota máxima maximorum.
9. Inicialmente, prevalecia o entendimento de que o novo Código Florestal não poderia retroagir a fim de reduzir a proteção de ecossistemas frágeis, a ponto de transgredir o limite constitucional intocável e intransponível da "incumbência" do Estado de garantir a preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais.
10. Contudo, no julgamento da ADC 42 e das ADIs 4.901, 4.902, 4.903 e 4.937, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 62 do novo Código Florestal, reconhecendo a incidência da norma às circunstâncias pretéritas.
11. Houve assim um realinhamento da jurisprudência deste Tribunal, a fim de adotar o novel entendimento consagrado pela Corte Maior.
12. De acordo com o supracitado art. 62, a extensão da área de preservação permanente adotada vale para os reservatórios artificiais de água destinados à geração de energia ou abastecimento público, que foram registrados ou tiveram seus contratos de concessão ou autorização assinados anteriormente à Medida Provisória 2.166-67, de 24/08/2001.
13. No caso concreto, embora não conste dos autos a data exata da concessão da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira, nota-se que o Decreto 67.066, de 17/08/1970, outorgou à empresa Centrais Elétricas de São Paulo S.A. licença para o aproveitamento progressivo da energia hidráulica da localidade.
14. Posteriormente, o Ministério de Minas e Energia editou a Portaria 289, de 11 de novembro de 2004, prorrogando a concessão por 20 (vinte) anos, com efeitos retroativos a 08/07/1995.
15. Portanto, comprovando-se que a concessão da UHE de Ilha Solteira à CESP é anterior a 24 de agosto de 2001, incide a extensão da área de preservação permanente estipulada pelo art. 62 da Lei 12.651/2012.
16. Estabelecida a área de preservação permanente como sendo a descrita no art. 62 da Lei 12.651/2012, deve-se apurar a existência, ou não, dos danos alegados pelo Parquet federal, concluindo o perito do Juízo que (...) não foram encontradas intervenções humanas que impeçam a regeneração natural no local auto da infração.
17. Reconhecida a inexistência de intervenção antrópica na área de preservação permanente descrita nos moldes do art. 62 da Lei 12.651/2012, restam prejudicados os demais pleitos de remoção das construções, recuperação da área, bem como de indenização pelos danos irrecuperáveis.
18. In casu, inexiste prova de que o autor agiu com desígnio de atuar com má-fé, pelo que de rigor a incidência da regra isentiva prevista na Carta Maior, não devendo, ipso facto, ser condenado ao pagamento da aludida verba de sucumbência.
19. Ademais, a condenação da União Federal ao pagamento dos honorários periciais, conforme fixada pela sentença, está em consonância com a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema Repetitivo 510.
20. Preliminar rejeitada. Remessa necessária e apelações desprovidas.