APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000469-93.2024.4.03.6112
RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN
APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
APELADO: ROSIMEIRE FERREIRA LIMA SALES, MURILLO DE SOUZA SALES
Advogados do(a) APELADO: ERICK MORANO DOS SANTOS - SP240353-A, SAURIA SALOMAO SANTOS - SP403547-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000469-93.2024.4.03.6112 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: ROSIMEIRE FERREIRA LIMA SALES, MURILLO DE SOUZA SALES Advogados do(a) APELADO: ERICK MORANO DOS SANTOS - SP240353-A, SAURIA SALOMAO SANTOS - SP403547-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Trata-se de ação ajuizada por Rosimeire Ferreira Lima Sales e Murillo de Souza Sales em face da Caixa Econômica Federal - CEF, na qual pleiteiam a declaração de nulidade da execução extrajudicial do contrato de financiamento habitacional nº 844442179467-5, “restabelecendo a reabertura do contrato firmado entre as partes”. Aduzem ter a propriedade do imóvel alienado fiduciariamente sido consolidada em nome da credora sem que eles fossem intimados pessoalmente para purgar a mora, bem como das datas dos leilões públicos designados. Requerem, também, a antecipação da tutela para: “1.a) que SEJA DETERMINADO A IMEDIATA SUSPENSÃO da inscrição do imóvel a leilão, caso já tenha ocorrido, que suspenda o leilão do imóvel e qualquer ato expropriatório tomado pela parte Requerida, do imóvel situado à Rua Cinco, n. 21, Residencial Veneza, CEP 1964- 5000, na cidade de Nantes/SP, assim como que sejam os Requerentes mantidos na posse do imóvel em comento até ulterior decisão proferida na presente demanda, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais) em caso de descumprimento da ordem judicial; 1.b) Sucessivamente ao item "1.a" supra, que SEJA DETERMINADO A IMEDIATA SUSPENSÃO da inscrição do imóvel a leilão, caso já tenha ocorrido, que suspenda o leilão do imóvel e qualquer ato expropriatório tomado pela parte Requerida, pelo menos até a realização da audiência de conciliação prevista no art. 334, do NCPC, oportunidade em que os Requerentes buscarão transigir com a requerida e retomar o pagamento das prestações do contrato firmado, evitando assim a perda do único bem imóvel que possuem e possíveis ações expropriatórias futuras por parte da instituição financeira; 1.c) determinar que seja enviado ofício ao Leiloeiro a fim de que efetue a inclusão da informação da existência da presente demanda em todos os sítios eletrônicos que divulguem a venda do imóvel em comento através de leilões extrajudiciais a terceiros; 1.d) determinar que seja enviado ofício ao Cartório de Registro de Imóveis de Rancharia/SP, a fim de averbar o registro da existência da presente demanda na matrícula do imóvel (Matrícula n° 18.230) , evitando prejuízos a eventuais terceiros arrematantes.” A tutela de urgência foi indeferida (ID 308377632) e os benefícios da assistência judiciária gratuita, deferidos. Foi interposto agravo de instrumento contra a decisão que indeferiu o pedido de antecipação de tutela, autuado neste Tribunal sob o nº 5006782-73.2024.4.03.0000, ao qual foi negado efeito suspensivo, tendo sido, ao final, improvido. A parte autora efetuou depósito judicial no valor de R$ 13.000,00 (treze mil reais) (ID 308377659 e 308377665). O pedido foi julgado procedente, consoante dispositivo que segue: “Posto isto, JULGO PROCEDENTE o pedido para fins de reconhecer a nulidade do procedimento de consolidação da propriedade do imóvel que consta nos autos, por desrespeito ao rito previsto na Lei 9.514/97. Extingo o presente feito, com resolução do mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil. Imponho à parte ré o dever de arcar com as custas decorrentes e pagar honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da causa, nos termos do §2º do artigo 85 do Código de Processo Civil. Tendo em vista as características da ação, antecipo os efeitos da sentença para fins de manter a posse do imóvel em nome dos autores, até novo procedimento de consolidação da propriedade.” Inconformada, apelou a CEF, pugnando pela reforma da sentença e a total improcedência do pedido. Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000469-93.2024.4.03.6112 RELATOR: Gab. 41 - DES. FED. HERBERT DE BRUYN APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: ROSIMEIRE FERREIRA LIMA SALES, MURILLO DE SOUZA SALES Advogados do(a) APELADO: ERICK MORANO DOS SANTOS - SP240353-A, SAURIA SALOMAO SANTOS - SP403547-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Senhor Desembargador Federal Herbert de Bruyn (Relator): Na modalidade contratual de financiamento com garantia por alienação fiduciária no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, o devedor/fiduciante transfere a propriedade do imóvel à Caixa Econômica Federal (credora/fiduciária) até que se implemente a condição resolutiva, que é o pagamento total da dívida. Liquidado o financiamento, o devedor retoma a propriedade plena do imóvel, ao passo que, havendo inadimplemento, a CEF, desde que obedecidos os procedimentos previstos na lei, pode requerer ao Cartório a consolidação da propriedade do imóvel em seu nome, passando a exercer a propriedade plena do bem. Os procedimentos de consolidação e posterior alienação do imóvel estão expressamente previstos na Lei nº 9.514/97, in verbis: “Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel. (...) Art. 23. Constitui-se a propriedade fiduciária de coisa imóvel mediante registro, no competente Registro de Imóveis, do contrato que lhe serve de título. Parágrafo único. Com a constituição da propriedade fiduciária, dá-se o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel. (...) Art. 26. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, o fiduciante, ou seu representante legal ou procurador regularmente constituído, será intimado, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do competente Registro de Imóveis, a satisfazer, no prazo de quinze dias, a prestação vencida e as que se vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel, além das despesas de cobrança e de intimação. § 2º O contrato definirá o prazo de carência após o qual será expedida a intimação. § 3º A intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento. (...) § 7º Decorrido o prazo de que trata o § 1º sem a purgação da mora, o oficial do competente Registro de Imóveis, certificando esse fato, promoverá a averbação, na matrícula do imóvel, da consolidação da propriedade em nome do fiduciário, à vista da prova do pagamento por este, do imposto de transmissão inter vivos e, se for o caso, do laudêmio.” (...) Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da data do registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel. § 1º Se, no primeiro público leilão, o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI do art. 24, será realizado o segundo leilão, nos quinze dias seguintes. § 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais." Registre-se que, para a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira ser considerada válida, deve-se observar o procedimento especificado na referida norma, em especial a previsão contida no artigo 26, §§ 1º e 3º, que estabelece devam os mutuários ser notificados pessoalmente para purgar a mora no prazo de quinze dias. A respeito da purgação da mora, prevê a Lei nº 9.514/97, ainda, em seu art. 39, a aplicação dos arts. 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66, às operações de financiamento imobiliário. Segundo o art. 34 do referido Decreto-Lei, é lícito purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, desde que, no valor, estejam compreendidos, além das parcelas vencidas do contrato de mútuo, os prêmios de seguro, multa contratual e todos os custos advindos da consolidação da propriedade, in verbis: "Art. 34. É lícito ao devedor, a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, purgar o débito, totalizado de acôrdo com o artigo 33, e acrescido ainda dos seguintes encargos: I - se a purgação se efetuar conforme o parágrafo primeiro do artigo 31, o débito será acrescido das penalidades previstas no contrato de hipoteca, até 10% (dez por cento) do valor do mesmo débito, e da remuneração do agente fiduciário; II - daí em diante, o débito, para os efeitos de purgação, abrangerá ainda os juros de mora e a correção monetária incidente até o momento da purgação." Aludido entendimento restou acolhido pelo Superior Tribunal de Justiça em relação aos contratos de alienação fiduciária de bem imóvel firmados sob a égide da Lei nº 9.514/97, desde que cumpridas todas as exigências previstas no art. 34 do Decreto-Lei nº 70/66: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CONSIGNATÓRIA CUMULADA COM ANULATÓRIA DE ATO DE CONSOLIDAÇÃO DE PROPRIEDADE. LEI Nº 9.514/1997. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. LEILÃO EXTRAJUDICIAL. DEVEDOR FIDUCIANTE. NOTIFICAÇÃO PESSOAL. NECESSIDADE. CREDOR FIDUCIÁRIO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. PURGAÇÃO DA MORA. POSSIBILIDADE. DECRETO-LEI Nº 70/1966. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. A teor do que dispõe o artigo 39 da Lei nº 9.514/1997, aplicam-se as disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/1966 às operações de financiamento imobiliário em geral a que se refere a Lei nº 9.514/1997. 3. No âmbito do Decreto-Lei nº 70/1966, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça há muito se encontra consolidada no sentido da necessidade de intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial, entendimento que se aplica aos contratos regidos pela Lei nº 9.514/1997. 4. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de ser possível a purga da mora em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel (Lei nº 9.514/1997) quando já consolidada a propriedade em nome do credor fiduciário. A purgação da mora é cabível até a assinatura do auto de arrematação, desde que cumpridas todas as exigências previstas no art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966. 5. Rever as conclusões do acórdão recorrido de que a intimação pessoal do devedor acerca da data da realização do leilão extrajudicial não foi comprovada e que houve a purgação da mora antes do auto de arrematação demandaria o reexame de matéria fática e a interpretação de cláusula contratual, procedimentos vedados pelas Súmulas nºs 5 e 7/STJ. 6. Agravo interno não provido. (Terceira Turma, AgInt no AREsp 1286812/SP, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 10/12/2018, DJe 14/12/2018, grifos nossos). Na mesma trilha, o entendimento desta Primeira Turma: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. INTERESSE EM PURGAR A MORA. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE IRREGULARIDADES. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL. I. O pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional. II. A possibilidade de purgar a mora não pode servir de fundamento para que o devedor, conscientemente, postergue o adimplemento da dívida, de maneira que exorbite à razoabilidade. III. Para purgar os efeitos da mora e evitar as medidas constritivas do financiamento, tais como a realização do leilão e a consolidação da propriedade, é necessário que a agravante proceda ao depósito dos valores relativos às parcelas vencidas e vincendas do financiamento, com encargos legais e contratuais, arcando o devedor com as despesas decorrentes, até a data limite para purgação da mora, a qual pode se dar mesmo depois da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, ou seja, até a realização do último leilão, data da arrematação, na forma do art. 34, do DL 70/66, desde que cumpridas todas as suas exigências, dispositivo aplicável por analogia, conforme autorizado no inc. II, do art. 39 da Lei 9.514. IV. Agravo de instrumento a que se dá parcial provimento." (AI 5002307-79.2021.4.03.0000, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, julgado em 28/05/2021, DJEN de 01/06/2021). Não obstante, observa-se que a Lei nº 13.465/2017 restringiu a aplicação das disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66, “exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”, não mais se aplicando aos contratos regidos pelo Sistema Financeiro Imobiliário, o qual estabelece a garantia fiduciária, e não a hipotecária. Igualmente, os procedimentos de cobrança, purgação da mora e consolidação da propriedade fiduciária relativos às operações de financiamento habitacional, inclusive as operações do Programa Minha Casa, Minha Vida, com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), passaram a obedecer a nova disciplina legal, a partir da vigência da Lei nº 13.465, em 12/07/2017, que inseriu o artigo 26-A e o § 2º-B ao artigo 27 da Lei nº 9.514/97, in verbis: "Art. 26-A. Os procedimentos de cobrança, purgação de mora e consolidação da propriedade fiduciária relativos às operações de financiamento habitacional, inclusive as operações do Programa Minha Casa, Minha Vida, instituído pela Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), sujeitam-se às normas especiais estabelecidas neste artigo. § 1º A consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário será averbada no registro de imóveis trinta dias após a expiração do prazo para purgação da mora de que trata o § 1o do art. 26 desta Lei. § 2º Até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária, é assegurado ao devedor fiduciante pagar as parcelas da dívida vencidas e as despesas de que trata o inciso II do § 3o do art. 27, hipótese em que convalescerá o contrato de alienação fiduciária. Art. 27. Uma vez consolidada a propriedade em seu nome, o fiduciário, no prazo de trinta dias, contados da datado registro de que trata o § 7º do artigo anterior, promoverá público leilão para a alienação do imóvel. § 1º Se no primeiro leilão público o maior lance oferecido for inferior ao valor do imóvel, estipulado na forma do inciso VI e do parágrafo único do art. 24 desta Lei, será realizado o segundo leilão nos quinze dias seguintes. § 2º No segundo leilão, será aceito o maior lance oferecido, desde que igual ou superior ao valor da dívida, das despesas, dos prêmios de seguro, dos encargos legais, inclusive tributos, e das contribuições condominiais. § 2º-A. Para os fins do disposto nos §§ 1º e 2º deste artigo, as datas, horários e locais dos leilões serão comunicados ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico. § 2º-B. Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário e até a data da realização do segundo leilão, é assegurado ao devedor fiduciante o direito de preferência para adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, somado aos encargos e despesas de que trata o § 2º deste artigo, aos valores correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes ao procedimento de cobrança e leilão, incumbindo, também, ao devedor fiduciante o pagamento dos encargos tributários e despesas exigíveis para a nova aquisição do imóvel, de que trata este parágrafo, inclusive custas e emolumentos." Quanto a essa disciplina, esta Primeira Turma vinha adotando o entendimento de que, com as alterações trazidas pela Lei n. 13.465, de 11/7/2017, à Lei n. 9.514/97, somente nos casos em que a consolidação da propriedade em nome do agente fiduciário ocorreu antes da inovação legislativa poderia o devedor purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, por força do artigo 34 do Decreto-Lei nº 70/66 aplicável aos contratos celebrados sob as regras da Lei nº 9.514/97 por força do artigo 39 deste diploma legal. Nas hipóteses em que a propriedade se consolidasse em nome do agente fiduciário após a publicação da Lei nº 13.465/2017, descabia a possibilidade de purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação, mas, apenas, o direito de preferência para a aquisição do mesmo imóvel mediante o pagamento de preço correspondente ao valor da dívida somado aos encargos previstos no § 2º-B do artigo 27 da Lei nº 9.514/97. Contudo, aderindo à fundamentação lançada no julgamento do Agravo de Instrumento n. 5014383-67.2023.4.03.0000, de relatoria do Desembargador Federal Nelton dos Santos, adoto a posição de que a inovação legislativa não se aplica aos contratos anteriormente firmados, in verbis: “Ocorre que, sob o prisma CONSTITUCIONAL, há fundadas razões para sustentar a tese contrária, entendimento que ora passo a justificar. Com efeito, o artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal estabelece que “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. In casu, o contrato configura ato jurídico perfeito, porquanto aperfeiçoado na vigência da Lei n. 9.514/1997 e antes da entrada em vigor da Lei n. 13.465/2017, o que se deu em 12 de julho de 2017. Ora, o direito de purgar a mora é de natureza substancial ou material, possuindo justamente tal natureza as regras que o consagram. Uma vez purgada a mora, desaparece o débito e mantém-se o vínculo contratual. Fosse uma norma relativa ao procedimento, ou seja, atinente às regras do rito tendente à consolidação da propriedade ou à alienação do imóvel, aí, sim, teria procedência o entendimento que dá pela aplicabilidade da lei nova, na perspectiva, por todos conhecida, de que as regras de processo aplicam-se imediatamente, alcançando os feitos em curso. Frise-se, porém, que não é essa a hipótese de que se cuida, pois a purgação da mora produz efeitos na relação jurídica de direito material. Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que, por respeito à segurança jurídica, a lei nova não alcança os contratos celebrados anteriormente. Veja-se: (...) Tornando ao caso dos autos, não se pode tomar como ato jurídico perfeito a consolidação da propriedade, isoladamente, em detrimento do contrato. A consolidação da propriedade é apenas um dos efeitos que podem resultar do contrato. A proteção da segurança jurídica é maior, abrange o ato negocial por inteiro. Deveras, ao firmarem um contrato, as partes fazem-no à luz do direito então vigente, analisando todas as possibilidades e avaliando os pontos favoráveis e desfavoráveis. Dentre eles se situa, claramente, o direito à purgação da mora como forma de manter o vínculo contratual. Assim, se, quando da celebração do contrato, o ordenamento vigente assegurava ao devedor fiduciante o direito de purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, não é possível ou mesmo razoável que, posteriormente, uma lei nova incida e reduza-lhe o tempo para o exercício daquele direito; e assim o é porque, em cenário jurídico diverso – e, no caso, também adverso –, talvez a parte ora agravada nem mesmo firmasse o contrato. Acrescente-se que, a prevalecer o entendimento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, corre-se o risco de, em alguns casos, suprimir-se por completo o direito à purgação da mora. Sim, pois segundo aquela C. 3ª Turma, se a consolidação da propriedade ocorrer já na vigência da lei nova, restará ao devedor fiduciário apenas a possibilidade de exercer o direito de preferência, ou seja, pode ocorrer que o prazo para a purgação da mora, que se estenderia até a data da assinatura do auto de arrematação, esgote-se antes mesmo da consolidação – por força do § 1º do artigo 26 da Lei n. 9.514/1997 – e, talvez, até mesmo antes da entrada em vigor da nova lei, em claro e indevido caráter retroativo. Para evitar-se a irretroatividade da lei, a única solução aceitável dentro do espectro constitucional, data venia, é a de aplicar-se a lei vigente ao tempo da celebração do contrato, de sorte que, se tal fato deu-se antes da entrada em vigor da Lei n. 13.465/2017, o devedor fiduciário tem direito a purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação; e se tal direito foi-lhe negado, há de ser-lhe assegurado pelo Poder Judiciário.” É preciso determinar, previamente, quais as regras legais que vinculam as partes contratantes e que servirão para a interpretação das cláusulas do contrato. De fato, as relações jurídicas decorrentes desses contratos, livremente pactuadas e observada a autonomia da vontade das partes, devem ser compreendidas à luz da segurança jurídica, de maneira a conferir estabilidade aos direitos de todos os envolvidos, presumindo-se o conhecimento das partes quanto às regras às quais se vincularam. Assim, em atenção ao princípio da segurança jurídica e em respeito ao ato jurídico perfeito, entendo que não é o registro da consolidação da propriedade na matrícula do imóvel o marco temporal para a aplicação das novas regras implantadas pela Lei nº 13.465/17 mas, sim, a data em que firmado o contrato de alienação fiduciária. Por fim, saliente-se que, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário 627.106, “É constitucional, pois foi devidamente recepcionado pela Constituição Federal de 1988, o procedimento de execução extrajudicial, previsto no Decreto-lei nº 70/66" (Tema 249). Ademais, resta pacificada na jurisprudência a constitucionalidade do procedimento da alienação fiduciária de coisa imóvel estabelecido na Lei nº 9.514/97. Nesse sentido, destaco os seguintes julgados desta Primeira Turma: "DIREITO CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO (SFH). ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. LEI 9.514/97. CONSTITUCIONALIDADE. RETIDÃO DO PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL. PURGAÇÃO DA MORA. DIREITO DE PREFERÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. ABUSO DE DIREITO. APELO NÃO PROVIDO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é pacífica sobre a constitucionalidade do procedimento adotado pela Caixa Econômica Federal na forma do Decreto-Lei n.º 70/66, não ferindo qualquer direito ou garantia fundamental do devedor, uma vez que além de prever uma fase de controle judicial antes da perda da posse do imóvel pelo devedor, não impede que eventual ilegalidade perpetrada no curso do procedimento da venda do imóvel seja reprimida pelos meios processuais próprios. 2. O procedimento previsto pela Lei nº 9.514/97 não se reveste de qualquer nódoa de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, como pretende a parte recorrente, conforme entendimento consolidado por esta Eg. Corte. 3. O vencimento antecipado da dívida e a consequente consolidação da propriedade em nome da instituição financeira, nos termos do acordado na cláusula trigésima do contrato de financiamento, nada mais são que consectários da impontualidade e inadimplência no pagamento das prestações. 4. A alienação fiduciária compreende espécie de propriedade resolúvel, em que, inadimplida a obrigação a que se refere, consolida-se em favor do credor fiduciário. Para que a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira mutuante ocorra de maneira válida, é imperioso que esta observe um procedimento cuidadosamente especificado pela normativa aplicável. Com efeito, conforme se depreende do art. 26, §§ 1º e 3º, da Lei nº 9.514/97, os mutuários devem ser notificados para purgarem a mora no prazo de quinze dias, o que ocorreu na espécie. 5. No tocante ao leilão do imóvel promovido após a consolidação da propriedade, a Lei nº 9.514/97, do mesmo modo, é clara ao dispor acerca da necessidade de comunicação ao devedor mediante correspondência dirigida aos endereços constantes do contrato, inclusive ao endereço eletrônico. 6. É certo que a inclusão do § 2º-A, que determina a notificação do devedor acerca das datas, horários e locais dos leilões, no art. 27 da Lei nº 9.514/97, somente se deu por ocasião da edição da Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017. 7. O entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que "nos contratos de alienação fiduciária regidos pela Lei nº 9.514/97, ainda que realizada a regular notificação do devedor para a purgação da mora, é indispensável a sua renovação por ocasião da alienação em hasta extrajudicial" (in AREsp nº 1.032.835-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, publicado no DJ 22.03.2017). 8. No caso dos autos, inexiste prova firme e segura de que o procedimento de execução extrajudicial do imóvel levado a efeito pela Caixa Econômica Federal contém vícios formais. 9. Ausentes quaisquer outros elementos que possam efetivamente elidir a validade da referida notificação, bem como, a legalidade do procedimento extrajudicial, a manutenção da consolidação da propriedade em favor da EMGEA é medida que se impõe. 10. O Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de admitir a purgação da mora em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, mesmo que já consolidada a propriedade do imóvel dado em garantia ao credor fiduciário, desde que ocorra até a assinatura do auto de arrematação. 11. Contudo, na hipótese, a presente ação foi ajuizada em 17 de agosto de 2018, quase um ano e meio após a arrematação do imóvel pela EMGEA, registrada na matrícula do imóvel em 05 de abril de 2017, e alguns meses antes da venda do imóvel à terceiro de boa-fé, formalizada em 16 de novembro de 2018, conforme demonstra a Proposta de Compra e Venda acostada aos autos. 12. Não se vislumbra mais a possibilidade de retomada do contrato, para a purgação da mora pelas apelantes nos termos da Lei nº 9.514/97, sob pena de configuração de abuso de direito por parte do mutuário. 13. Recurso de apelação a que se nega provimento." (ApCiv 5020686-09.2018.4.03.6100, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy, julgado em 01/12/2020, e - DJF3 Judicial 1 de 10/12/2020, grifos nossos) "CONSTITUCIONAL E CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CONSTITUCIONALIDADE DA EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL PREVISTA PELA LEI N. 9.514/97. INADIMPLEMENTO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE EM NOME DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. Com base no art. 370 do Código de Processo Civil, deve prevalecer a prudente discrição do magistrado no exame da necessidade ou não da realização de provas, de acordo com as peculiaridades do caso concreto. 2. No caso, basta a mera interpretação das cláusulas do contrato firmado entre as partes para se apurar eventuais ilegalidades, de modo que a prova pericial mostra-se de todo inútil ao deslinde da causa. 3. A alienação fiduciária representa espécie de propriedade resolúvel, de modo que, conforme disposto pela própria Lei n. 9.514/97, inadimplida a obrigação pelo fiduciante a propriedade se consolida em mãos do credor fiduciário. 4. Afasta-se de plano a inconstitucionalidade da execução extrajudicial prevista pela Lei n. 9.514/97, a semelhança do que ocorre com a execução extrajudicial de que trata o Decreto-lei n. 70/66 de há muito declarada constitucional pelo STF. 5. Os contratos de financiamento foram firmados nos moldes do artigo 38 da Lei n. 9.514/97, com alienação fiduciária em garantia, cujo regime de satisfação da obrigação (artigos 26 e seguintes) diverge dos mútuos firmados com garantia hipotecária. 6. A impontualidade na obrigação do pagamento das prestações pelo mutuário acarreta o vencimento antecipado da dívida e a imediata consolidação da propriedade em nome da instituição financeira. 7. Providenciada pela instituição financeira a intimação da parte devedora para purgar a mora acompanhada de planilha de projeção detalhada do débito e, posteriormente, para exercer seu direito de preferência previsto na legislação de regência, denota-se que foram observadas as regras do procedimento executório. 8. O procedimento de execução do mútuo com alienação fiduciária em garantia não ofende os princípios fundamentais do contraditório ou ampla defesa, porquanto não impede que devedor fiduciante submeta à apreciação do Poder Judiciário eventuais descumprimentos de cláusulas contratuais ou abusos ou ilegalidades praticadas pelo credor. 9. Muito embora o STJ venha admitindo a aplicabilidade da Lei Consumerista aos contratos regidos pelo SFI, e que se trate de contrato de adesão, sua utilização não é indiscriminada, ainda mais que não restou demonstrada abusividade nas cláusulas adotadas no contrato de mútuo em tela, que viessem a contrariar a legislação de regência. 10. Apelação não provida." (ApCiv 5026408-58.2017.4.03.6100, Rel. Des. Federal Helio Nogueira, julgado em 03/04/2020, e - DJF3 Judicial 1 de 14/04/2020) Caso dos autos. Em 04/11/2019, os autores celebraram com a CEF o contrato nº 8444421794675, para “aquisição de terreno e construção de imóvel, mútuo e alienação fiduciária em garantia – carta de crédito individual FGTS/Programa Minha Casa Minha Vida – CCFGTS/PMCMV – SFH, com utilização do FGTS do(s) devedor(es)”, tendo por objeto um terreno constituído pelo lote 6, da quadra “F”, no Residencial Veneza, em Nantes/SP, no qual foi edificada uma casa residencial, averbada na matrícula do imóvel em 29/04/2020 (ID 308375821 e 308377844). O valor total financiado pela CEF foi de R$ 113.685,82 (cento e treze mil, seiscentos e oitenta e cinco reais e oitenta e dois centavos), pelo prazo de 360 (trezentos e sessenta) meses, com a primeira prestação no valor de R$ 885,40 (oitocentos e oitenta e cinco reais e quarenta centavos), a partir de 04/12/2019. Em 19/11/2019, a alienação fiduciária foi averbada na matrícula do imóvel (ID 308377838). Em 13/11/2023, averbou-se a consolidação da propriedade em favor da Caixa Econômica Federal, conforme segue abaixo: "AV.4/18.230, em 13 de novembro de 2023 - Prenotação 90.638 de 09/03/2023. CONSOLIDAÇÃO DE PROPRIEDADE - Pelo procedimento de consolidação de propriedade fiduciária, instruído com requerimento firmado em Florianópolis, SC, aos 04/09/2023, pela credora da alienação fiduciária Caixa Econômica Federal, já qualificada, assinado eletronicamente pelo procurador Milton Fontana, inscrito no CPF nº 575.672.049-91, acompanhado com a respectiva guia de ITBI, procedo à presente averbação para constar que, realizado o procedimento previsto nos artigos 26 e 26-A, da Lei Federal nº 9.514/1997, em face dos devedores fiduciantes MURILLO DE SOUZA SALES e sua mulher ROSIMEIRE FERREIRA LIMA SALES, já qualificados, os quais foram regularmente notificados, transcorrido o prazo sem que houvesse purgação da mora, fica CONSOLIDADA A PROPRIEDADE do imóvel objeto desta matrícula na pessoa da credora CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, inscrita no CNPJ sob o nº 00.360.305/0001-04, com sede no Setor Bancário Sul, Quadra 4, lotes 3/4, em Brasília, DF. A Caixa Econômica Federal, já qualificada, foi representada por seu procurador Milton Fontana, brasileiro, casado, economiário, inscrito no CPF nº 575.672.049-91, com endereço profissional na Rua Nossa Senhora de Lourdes, nº 111, 4º andar, Agronômica, em Florianópolis, SC, nos termos da procuração pública lavrada no 2º Tabelião de Notas e Protesto de Brasília, DF, no livro 3572-P. fls. 148/149, aos 01/08/2023. e do substabelecimento de procuração, lavrado no 2º Tabelião de Notas e Protesto de Brasília, DF, no livro 3574-P, fis. 10/11, aos 03/08/2023. O ITBI foi recolhido conforme guia de recolhimento que instruiu o referido procedimento e o valor base utilizado para o recolhimento foi de R$150.000,00. A Declaração sobre Operações Imobiliárias será emitida por esta Serventia no prazo legal. O procedimento de consolidação, autuado sob o nº 11/2023, fica arquivado nesta Serventia. Oficiala Interina, 70 Erica Aparecida Crão Soares. Selo Digital: 120089331000000010167223" Na hipótese em apreço, o contrato de alienação fiduciária foi firmado posteriormente à vigência da Lei nº 13.465/2017. Portanto, não existe mais possibilidade de purga da mora após a averbação da consolidação da propriedade, restando assegurado, à parte autora, somente o exercício do direito de preferência, consoante dispõe o art. 27, parágrafo 2º-B da Lei nº 9.514/97. Não há controvérsia acerca da inadimplência dos mutuários. Em sua petição inicial, eles afirmam que deixaram de pagar as parcelas do financiamento imobiliário “por conta de problemas financeiros e de saúde” (ID 308375806, p. 2). Consoante certidões emitidas pelo Oficial Registrador do Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídica de Rancharia/SP, os autores foram intimados nos termos do art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, para efetuar o pagamento do débito em atraso, além das despesas de intimação, no prazo de 15 (quinze) dias, o qual decorreu sem a purgação da mora (ID 308377845 e 308377846). Assim, não verifico a alegada irregularidade a tornar inválida a consolidação da propriedade imobiliária efetivada pela instituição financeira credora, averbada na matrícula do imóvel objeto desta lide, documento que goza de fé pública e não foi infirmado pelos documentos e alegações trazidas pelos proponentes. Nota-se, além disso, que, em 06/03/2024, a CEF encaminhou notificações extrajudiciais aos autores, dirigidas ao endereço do contrato, comunicando-os sobre a consolidação da propriedade, a designação das datas do 1º e do 2º leilões públicos (13/05/2024 e 22/05/2024, respectivamente) e ainda, quanto ao prazo para desocupação do imóvel. O mesmo documento salvaguardou, inclusive, o seu direito de preferência para a aquisição do bem, por preço correspondente ao valor da dívida, somado aos encargos e despesas incidentes sobre o imóvel, no valor total de R$ 143.227,52 (cento e quarenta e três mil, duzentos e vinte e sete reais e cinquenta e dois centavos) (ID 308377644 e 308377645). Conquanto não tenha sido apresentado o comprovante de recebimento das aludidas notificações, verifica-se terem os autores obtido plena ciência da realização das hastas, tanto que, em petição protocolizada em 09/03/2024 – mais de dois meses antes da data designada para a realização dos leilões – , reiteraram o pleito de concessão de tutela de urgência, alegando que receberam “um e-mail de um grupo de assessoria jurídica, se disponibilizando a ajudar na recuperação do imóvel, dando ciência à requerente que o leilão está agendado para 13/05/2024” (ID 308375830 e 308377640). Segundo a orientação pacificada no Superior Tribunal de Justiça, não se decreta a nulidade do leilão, por ausência de intimação pessoal, se ficar demonstrada a ciência inequívoca do devedor: "AGRAVO INTERNO. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. LEILÃO EXTRAJUDICIAL.CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURAÇÃO. REEXAME DE PROVAS. PURGA DA MORA. VALOR INSUFICIENTE. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. CIÊNCIA INEQUÍVOCA. PRECEDENTES. 1. Não cabe, em recurso especial, reexaminar matéria fático-probatória (Súmula 7/STJ). 2. A Jurisprudência do STJ é firme no sentido de que não se decreta a nulidade do leilão, por ausência de intimação pessoal, se ficar demonstrada a ciência inequívoca do agravante. 3. Agravo interno a que se nega provimento." (AgInt no AgInt no AREsp 1463916/SP, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. em 03/12/2019, DJe 09/12/2019) Esse é o entendimento que tem prevalecido no âmbito das Turmas que compõem a Primeira Seção deste Tribunal: "APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ANULATÓRIA DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. PRELIMINAR. SENTENÇA EXTRA PETITA. INOCORRÊNCIA. REGULARIDADE DA NOTIFICAÇÃO PARA PURGAÇÃO DA MORA. CERTIDÃO DO OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE. AUSÊNCIA DE INTIMAÇÃO DOS LEILÕES. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DOS DEVEDORES. AJUIZAMENTO ANTERIOR À DATA DA HASTA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. VALIDADE DO LEILÃO E DA ARREMATAÇÃO. RECURSO PROVIDO. 1. Pretende a apelante a anulação ou a reforma da sentença que declarou a nulidade do leilão extrajudicial do imóvel objeto do contrato celebrado entre as partes, ante a ausência de prova da intimação dos mutuários daquele ato. 2. O juiz não está vinculado aos fundamentos jurídicos invocados na petição inicial, cabendo-lhe analisar os fatos e pedidos deduzidos no caso concreto e aplicar-lhes a solução pertinente à luz do ordenamento jurídico. Precedentes do STJ. 3. A alienação fiduciária de imóvel constitui espécie de propriedade resolúvel, que se consolida em favor do credor fiduciário se inadimplida a obrigação por ela garantida. O procedimento de execução previsto pela Lei n. 9.514/1997 não se reveste de ilegalidade ou inconstitucionalidade, contudo, para que a consolidação da propriedade ocorra de forma válida, a credora deve observar o procedimento especificado pela referida lei. 4. Com efeito, nos termos do art. 26, §§ 1º e 3º, da Lei 9.514/1997, o devedor deve ser previamente notificado para purgar a mora no prazo de quinze dias, o que se verificou na espécie. 5. A certidão lavrada pelo Oficial de Registro de Imóveis goza de fé pública, e, portanto, de presunção de veracidade, somente podendo ser ilidida mediante prova inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu no caso. Precedente desta Corte. 6. Quanto ao leilão promovido após a consolidação da propriedade do imóvel, antes mesmo da inclusão do § 2º-A, que determina a notificação do devedor acerca das datas, horários e locais dos leilões, no art. 27 da Lei 9.514/1997, pela Lei 13.465/2017, o entendimento do STJ já era firmado no sentido de que "nos contratos de alienação fiduciária regidos pela Lei nº 9.514/97, ainda que realizada a regular notificação do devedor para a purgação da mora, é indispensável a sua renovação por ocasião da alienação em hasta extrajudicial" (in AREsp n. 1.032.835-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, DJ 22.03.2017). 7. Embora não haja prova da intimação pessoal nos autos, é certo que os autores ajuizaram a presente ação antes da data designada para a realização da primeira hasta, evidenciando sua ciência inequívoca das datas marcadas. 8. Ao conhecer do edital do leilão, os devedores tiveram acesso a todas as informações necessárias ao exercício do seu direito à purgação da mora. Nesse caso, não se verifica qualquer prejuízo às garantias do contraditório e da ampla defesa. Precedentes. 9. Portanto, deve ser reformada a sentença que anulou o leilão, vez que a ausência de intimação na espécie não acarretou prejuízo aos mutuários. Nesse caso, são plenamente válidas a hasta e a arrematação por terceiros, cujo excedente, aliás, foi devolvido aos devedores nos termos do art. 27, § 4º, da Lei n. 9.514/1997. 10. Apelação provida." (TRF3, Primeira Turma, AC 0011406-07.2015.4.03.6100, Relator Desembargador Federal Wilson Zauhy, j. 10/3/2022, DJEN 17/3/2022)” “AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE. LEILÃO EXTRAJUDICIAL. SUSPENSÃO. INDEFERIMENTO DO PEDIDO LIMINAR. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS. RECURSO DESPROVIDO. 1. Da análise dos documentos trazidos aos autos originários, denota-se que os fundamentos externados na decisão que deu origem ao presente recurso, revestem-se de plausibilidade jurídica, quais sejam: (i) a concessão da tutela está sujeita à existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo; (ii) a inexistência de prejuízo pela falta de intimação acerca do leilão nos termos da Lei nº 9.514/97,considerando que a requerente teve ciência da sua realização e houve tempo hábil ao exercício de seu eventual direito de purgação da mora ou de preferência;(iii) a questão demanda, ao menos a instauração do contraditório, possibilitando ao julgador um maior conhecimento dos fatos. 2. Agravo de instrumento desprovido. (TRF3, Segunda Turma, AI 5007894-48.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal Cotrim Guimarães, j. 13/7/2022, DJEN 18/7/2022) Enfim, a exigência de intimação do devedor para os leilões tem por objetivo propiciar a admitida purga da mora até a arrematação ou, na atual redação da lei, para o exercício do direito de preferência. Nesse contexto, verifica-se que os proponentes tiveram acesso, em tempo hábil, a todas as informações necessárias para exercer o seu direito de preferência, ou, de outra parte, poderiam imediatamente ter tomado alguma providência para salvaguardar seus interesses, o que não ocorreu na espécie. Portanto, não há que se falar em nulidade, também, quanto aos leilões designados. Averbe-se que, ao tratar da dívida vencida e não paga, o art. 26 da Lei n. 9.514/97 estabelece as formalidades pelas quais se dá a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, dentre as quais não se inclui a obrigatoriedade de apresentação de planilha discriminativa de débitos. Nessa esteira, os seguintes precedentes desta Turma Julgadora: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. LEI Nº 9.514/1997. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. PURGAÇÃO DA MORA. ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. AGRAVO PROVIDO. - No contrato de financiamento com garantia por alienação fiduciária, o devedor/fiduciante transfere a propriedade do imóvel à Caixa Econômica Federal (credora/fiduciária) até que se implemente a condição resolutiva que é o pagamento total da dívida. Liquidado o financiamento, o devedor retoma a propriedade plena do imóvel, ao passo que, havendo inadimplemento dos termos contratuais, a Caixa Econômica Federal, obedecidos os procedimentos previstos na lei, tem o direito de requerer ao Cartório a consolidação da propriedade do imóvel em seu nome, passando a exercer a propriedade plena do bem. - O procedimento previsto pela Lei nº 9.514/97 não se reveste de qualquer nódoa de ilegalidade. - Quanto à purgação da mora, a Lei nº 9.514/97 prevê em seu artigo 39 a aplicação dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66 às operações de crédito disciplinadas por aquele diploma legal. Assim, como o artigo 34 do referido Decreto prevê que é lícita a purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação, há a possibilidade da purgação, nos termos em que previsto pelo Decreto-Lei, desde que compreenda, além das parcelas vencidas do contrato de mútuo, os prêmios de seguro, multa contratual e todos os custos advindos da consolidação da propriedade. - A questão da purgação da mora, contudo, passou a obedecer nova disciplina com o advento da Lei nº 13.465 publicada em 12.07.2017 e que inseriu o § 2º-B ao artigo 27 da Lei nº 9.514/97. A partir da inovação legislativa não mais se discute o direito à purgação da mora, mas, diversamente, o direito de preferência de aquisição do mesmo imóvel pelo preço correspondente ao valor da dívida, além dos “encargos e despesas de que trata o § 2o deste artigo, aos valores correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes ao procedimento de cobrança e leilão, incumbindo, também, ao devedor fiduciante o pagamento dos encargos tributários e despesas exigíveis para a nova aquisição do imóvel, de que trata este parágrafo, inclusive custas e emolumentos”. - Traçado este quadro, duas situações se distinguem. Em primeiro, nos casos em que a consolidação da propriedade em nome do agente fiduciário ocorreu antes da inovação legislativa promovida pela Lei nº 13.465/2017, entendo que pode o mutuário purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, por força do artigo 34 do Decreto-Lei nº 70/66 aplicável aos contratos celebrados sob as regras da Lei nº 9.514/97 por força do artigo 39 deste diploma legal. - Nesta situação é lícito ao mutuário purgar a mora e dar continuidade ao contrato, compreendendo-se na purgação o pagamento das parcelas vencidas do contrato de mútuo, inclusive dos prêmios de seguro, da multa contratual e de todos os custos advindos da consolidação da propriedade. - Diversamente, quando a propriedade foi consolidada em nome do agente fiduciário após a publicação da Lei nº 13.465/2017 não mais se discute a possibilidade de purgar a mora, mas, diferentemente, o direito de preferência para a aquisição do mesmo imóvel mediante o pagamento de preço correspondente ao valor da dívida somado aos encargos previstos no § 2º-B do artigo 27 da Lei nº 9.514/97. Não se trata, em verdade, de retomada do contrato originário, mas de nova aquisição – novo contrato, com direito de preferência ao mutuário anterior que poderá exercê-lo caso efetue o pagamento do montante exigido pelo dispositivo legal. - No caso em análise, a consolidação da propriedade em nome da agravada foi averbada na matrícula do imóvel em 18.04.2016, portanto, antes da alteração legislativa promovida pela Lei nº 13.465/2017. Sendo assim, entendo ser lícito ao mutuário purgar a mora mediante o pagamento das parcelas vencidas, prêmios de seguro, multa contratual e dos custos relativos à consolidação da propriedade, com a consequente retomada do contrato. - Quanto à alegação de que a notificação para purgação do débito não foi acompanhada de planilha demonstrativa da dívida, tal documento não é obrigatório a acompanhar a notificação, como se verifica no artigo 26, § 1º da Lei nº 9.514/97. - Ainda, eventual realização de leilão em prazo superior àquele previsto pelo artigo 27 da Lei nº 9.514/97 (trinta dias) não implica a nulidade do procedimento de execução extrajudicial. - Quanto ao pedido para que a agravada não inscreva o nome do agravante em órgãos de proteção ao crédito, observo que o Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a simples discussão do débito não é suficiente para impedir a inclusão do nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito. - Considerando o acolhimento do pedido de pagamento das parcelas vencidas nos valores exigidos pela agravada com o objetivo de purgar a mora, entendo que igualmente deve ser acolhido o pedido de não inclusão do nome do agravante em cadastros de restrição de crédito, tais como o SPC, o SERASA, o CADIN e outros congêneres. - Agravo de instrumento provido." (AI 5006080-74.2017.4.03.0000, Rel. Des. Federal Wilson Zauhy, j. em 28/03/2019, e - DJF3 Judicial 1 de 02/04/2019, grifos nossos) "PROCESSO CIVIL. AGRAVO LEGAL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. NÃO PROVIMENTO. 1. O Colendo Supremo Tribunal Federal já reconheceu a compatibilidade da execução extrajudicial fundada no Decreto-lei nº 70/66 com a Constituição Federal, não se podendo falar em inconstitucionalidade ou não recepção pela nova ordem constitucional. Não se vislumbra, igualmente, qualquer incompatibilidade da consolidação prevista na Lei nº 9.514/97 com a Constituição Federal. 2. Desnecessária a instrução da notificação com o demonstrativo do débito: 'Se a purgação da mora se dá perante o agente fiduciário, que já dispõe de toda a documentação necessária à formação do título executivo e que poderá ser consultada pelo devedor nesse momento, não vejo motivo para exigir a instrução da notificação do devedor com os demonstrativos do débito, sobretudo porque esse requisito não está previsto na legislação específica aplicável à matéria' (EREsp 793033). 3. O descumprimento do prazo de trinta dias entre a consolidação da propriedade e a realização do leilão é mera irregularidade (art. 27 da Lei 9.514/97), não implicando em nulidade do procedimento. Na verdade a demora só prejudica o agente financeiro, que demorará mais para livrar-se do prejuízo. O mutuário acaba sendo beneficiado, na medida em que dispõe de tempo maior para obter recursos para regularização do débito e para permanecer ocupando o imóvel. 4. Agravo legal improvido." (AC 00000787620124036103, Rel. Des. Federal Luiz Stefanini, j. em 16/06/2015, e-DJF3 de 03/07/2015, grifos nossos) Ressalto que a jurisprudência deste Tribunal tem entendido que a perda de renda familiar, dentre outras condições pessoais adversas, não configura fato imprevisível, ex vi dos arts. 317 e 478, do Código Civil, que autorize o afastamento das obrigações assumidas contratualmente pelos mutuários, nem tampouco impede o exercício dos direitos previstos na Lei nº 9.514/97. Dificuldade financeira, embora indesejável, é fato natural da vida e não extraordinário, integrando o risco de qualquer contrato, mormente os financiamentos longos, como ocorre na hipótese vertente. Nessa esteira: “APELAÇÃO. AÇÃO DE REVISÃO CONTRATUAL. FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. DIVÓRCIO. ASSUNÇÃO DE DÍVIDA POR APENAS UM DOS PACTUANTES. ANUÊNCIA DA CEF. NECESSIDADE. LIMITE DE COMPROMETIMENTO DA RENDA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Segundo o disposto no art. 29 da Lei 9.514/97 a transferência dos direitos e obrigações contratuais está condicionada à aquiescência do agente financeiro. 2. A retirada de um pactuante demanda o expresso consentimento da CEF, afinal o contrato celebrado tem força vinculante entre os seus participantes. 3. Conforme previsão na cláusula 15, "b", a cessão ou transferência a terceiros, no todo ou em parte, dos seus direitos e obrigações, sem autorização da CEF, pode causar o vencimento antecipado da dívida. 4. A partilha de bens, produzida em separação ou divórcio, não tem o condão de produzir a novação subjetiva do financiamento imobiliário, não podendo onerar a CEF, principalmente por não ter a instituição financeira participado do respectivo processo. Isto porque os efeitos da sentença homologatória de separação judicial alcançam somente as partes integrantes da lide. Precedentes. 5. Por seu turno, a jurisprudência tem entendido que desemprego, divórcio, separação, redução de renda, entre outras condições pessoais adversas que interferem na saúde financeira do devedor, não dão ensejo à revisão contratual com base na teoria da imprevisão, pois são fatos naturais da vida e, não, extraordinários, integrando o risco de qualquer contrato, especialmente financiamentos longos, como na hipótese dos autos (360 meses). 6. Vale ressaltar que as prestações não estão contratualmente submetidas a um limite máximo de comprometimento da renda, como pretende a apelante. 7. Apelação desprovida.” (Segunda Turma, ApCiv 5000976-12.2019.4.03.6118, Rel. Des. Federal Cotrim Guimarães, j. em 25/02/2021, DJEN de 04/03/2021, grifos nossos) Colhem-se, ainda, os seguintes julgados deste Tribunal no mesmo sentido: Primeira Turma, ApCiv 5000859-54.2019.4.03.6107, Rel. Des. Federal Herbert de Bruyn, j. em 16/11/2023, DJEN de 21/11/2023; Primeira Turma, ApCiv 5004530-79.2020.4.03.6130, Rel. Juiz Federal Convocado Renato Becho, j. em 13/04/2023, DJEN de 18/04/2023; Primeira Turma, RemNecCiv 5009578-12.2020.4.03.6100, Rel. Des. Federal Carlos Muta, j. em 03/08/2023, DJEN de 08/08/2023; Segunda Turma, ApCiv 5005284-18.2019.4.03.6110, Rel. Des. Federal Carlos Francisco, j. em 20/10/2022, DJEN de 25/10/2022. Diversamente do que sustentam os autores, a CEF não se submete ao dever de negociar. Nos termos do art. 313, do Código Civil, o credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida. Devem ser observadas as cláusulas do contrato formalizado livremente pelas partes, em conformidade com o principio da obrigatoriedade dos contratos (pacta sunt servanda), sob pena de se aceitar, por via oblíqua, os termos de uma repactuação proposta pela parte autora, ao arrepio da Lei nº 9.514/97 e do próprio contrato, o que não se pode admitir. A propósito, assim vêm decidindo as Turmas integrantes da Primeira Seção: “APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSUAL CIVIL. INTERESSE DE AGIR CARACTERIZADO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO DAS DATAS DOS LEILÕES. NULIDADE. DIREITO DE PREFERÊNCIA. - Não há que se falar em carência de ação em razão da arrematação do imóvel, uma vez que o que se discute nos presentes autos é exatamente a regularidade do procedimento de execução extrajudicial levado a cabo pela CEF, que culminou na arrematação do mesmo. Assim, eventuais nulidades no procedimento podem e devem ser analisadas no âmbito judicial. - São constitucionais e válidos os contratos firmados conforme a Lei nº 9.514/1997, pois se assentam em padrões admissíveis pelo ordenamento brasileiro e pela liberdade de negociar, notadamente com equilíbrio nas prerrogativas e deveres das partes, com publicidade de atos e possibilidade de defesa de interesses, inexistindo violação a primados jurídicos (inclusive de defesa do consumidor). - Quanto ao procedimento no caso de inadimplência por parte do devedor-fiduciante, o art. 26 e seguintes da Lei nº 9.514/1997 dispõem sobre formalidades que asseguram informação do estágio contratual. Esse procedimento é motivado pela necessária eficácia de políticas públicas que vão ao encontro da proteção do direito fundamental à moradia e do Estado de Direito, e não exclui casos específicos da apreciação pelo Poder Judiciário. Precedentes do E.STJ e deste C.TRF da 3ª Região. - Dificuldades financeiras não são motivos jurídicos para justificar o inadimplemento de obrigações livremente assumidas pelo devedor-fiduciante, porque a alteração do contrato exige voluntária e bilateral acordo de vontade. Também não há legislação viabilizando inadimplência por esse motivo, do mesmo modo que essa circunstância unilateral não altera o equilíbrio do que foi pactuado entre as partes. - A parte autora foi intimada para purgar a mora, porém deixou transcorrer in albis o prazo para liquidar sua dívida atrasada. Frise-se que a certidão de notificação feita pelo Oficial de Registro de Imóveis possui fé pública e, portanto, goza de presunção de veracidade, somente podendo ser ilidida mediante prova inequívoca em sentido contrário, o que não ocorreu no presente caso. - Apesar de haver comprovado a intimação para purgação da mora, a CEF não juntou aos autos qualquer documento apto a demonstrar a notificação do devedor fiduciante a respeito das datas dos leilões extrajudiciais. A ausência da mencionada notificação impede o exercício do direito de preferência assegurado pelo art. 27, §2º-B, da Lei nº 9.514/1997. - Constatada irregularidade consistente na ausência de notificação prevista no art. 27, §2º-A, da Lei nº 9.514/1997 e, ainda, considerando o depósito do valor informado pela CEF, correta a r. sentença ao determinar a anulação da alienação do imóvel, reconhecendo o direito de preferência da parte autora na aquisição do mesmo. - O arrematante, ao adquirir imóvel ofertado em leilão extrajudicial, tem ciência dos riscos envolvidos em tal atividade, sendo que eventual pedido de reparação em face da CEF deve ser discutido em ação própria. - Apelação não provida.” (Segunda Turma, ApCiv 5001501-28.2018.4.03.6118, Relator Des. Federal Carlos Francisco, j. em 20/07/2022, DJEN de 25/07/2022, grifos nossos) "EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM APELAÇÃO. SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO - SFI. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO PREVISTO PELA LEI 9.514/97. PURGAÇÃO DA MORA ANTES DA ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL. IMPOSSIBILIDADE APÓS A LEI 13.465/17. EXERCÍCIO DE PREFERÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE APÓS O REGISTRO DA ARREMATAÇÃO. ARREMATAÇÃO POR PREÇO VIL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PERDAS E DANOS. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO ACOLHIDOS. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. I - As razões pelas quais se considera regular a consolidação da propriedade pelo rito da Lei 9.514/97 são semelhantes àquelas que fundamentam a regularidade da execução extrajudicial pelo Decreto-lei 70/66. Ademais, o artigo 39, I da Lei 9.514/97 faz expressa referência aos artigos 29 a 41 do Decreto-lei 70/66. No âmbito do SFH e do SFI, as discussões em torno da execução extrajudicial pelos referidos diplomas legais se confundem em larga medida. II - O procedimento próprio previsto pelo Decreto-lei 70/66 garante ao devedor a defesa de seus interesses ao prever a notificação para a purgação da mora (artigo 31, § 1º), não sendo incomum, mesmo nessa fase, que o credor proceda à renegociação das dívidas de seus mutuários, ainda que não tenha o dever de assim proceder. No mesmo sentido é o artigo 26, caput e §§ 1º, 2º e 3º da Lei 9.514/97. III - Não é negado ao devedor o direito de postular perante o Poder Judiciário a revisão do contrato e a consignação em pagamento antes do inadimplemento, ou, mesmo com a execução em curso, o direito de apontar irregularidades na observância do procedimento em questão que tenham inviabilizado a sua oportunidade de purgar a mora. IV - A matéria é objeto de ampla e pacífica jurisprudência nesta Corte, em consonância com o entendimento ainda dominante no Supremo Tribunal Federal, segundo o qual o Decreto-lei nº. 70/66 foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988. V - No tocante ao regramento do Decreto-lei 70/66, é corriqueira a alegação de irregularidade na execução em virtude da escolha unilateral do agente fiduciário pela mutuante, a qual, todavia, não se baseia em previsão legal ou contratual. A exigência de notificação pessoal se restringe ao momento de purgação da mora, não se aplicando às demais fases do procedimento. Mesmo nesta hipótese, quando o devedor se encontrar em lugar incerto ou não sabido, é possível a notificação por edital, nos termos do artigo 31, § 2º do Decreto-lei 70/66 e artigo 26, § 4º da Lei 9.514/97. VI - E de se salientar que o pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional. VII - Em suma, não prosperam as alegações de inconstitucionalidade da execução extrajudicial e de descumprimento do procedimento previsto pelo Decreto-lei 70/66 e pela Lei 9.514/97. VIII - No tocante ao direito de purgar a mora posteriormente à consolidação da propriedade fiduciária em nome do credor, o STJ tem entendimento de que, mediante previsão do art. 39 da Lei 9.514/97, é aplicável o art. 34 do Decreto-Lei 70/66, de modo de que é possível a purgação até a realização do último leilão, data da arrematação. IX - Com a edição da Lei 13.465/2017, o art. 39, II, da Lei 9.514/97 restou alterado, de modo que as disposições dos art. 29 a 41 do Decreto-lei 70/66 passaram a ser aplicáveis “exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”. Diante da alteração legal, esta Primeira Turma adota o entendimento de que o novo dispositivo aplica-se tão somente aos contratos que tiveram a consolidação da propriedade fiduciária já sob a égide desta lei. X - Caso em que restam comprovadas a intimação pessoal do autor para a purgação da mora em 07/12/2016, bem como a notificação acerca da data de realizações dos leilões, não havendo qualquer irregularidade formal no procedimento levado a cabo pelas corrés. A consolidação da propriedade aconteceu em 07/03/2017, antes do início da Lei 13.465/2017, razão pela qual seria possível a purgação da mora antes da arrematação do imóvel. Em que pese os esforços da parte Autora em demonstrar sua intenção e capacidade de regularizar a dívida por meio de depósitos judiciais, no entanto, ao se considerar os valores depositados em contraste com o montante da dívida, verifica-se que aqueles não foram suficientes para a purgação da mora ou para a regularização da dívida nos termos da legislação vigente. XI - A inadimplência do devedor que passa por dificuldades financeiras, quando não há qualquer pedido que possa implicar na revisão da dívida, não é fundamento suficiente para obstar o vencimento antecipado da dívida ou a consolidação da propriedade fiduciária, razão pela qual o prosseguimento da execução prevista na Lei 9.514/97 representa exercício regular de direito pelo credor, que não está obrigado a renegociar a dívida. XII - Sobreveio nos autos notícia de venda direta a terceiros pelo montante de R$ 397.700,00 em 17/12/2019, valor superior ao montante pelo qual o imóvel foi avaliado por ocasião da assinatura do contrato R$ 270.000,00. A parte Autora, no entanto, apresentou laudos de avaliação alegando que o imóvel, em realidade, seria avaliado em cerca de R$ 1.100.000,00, informação que guarda com coerência com os documentos apresentados para comprovar a realização de benfeitorias no imóvel, bem como o pedido formulado na inicial para a produção de perícia técnica com o intuito de mensurar o real valor do imóvel, medida ignorada pelo juízo de origem que configura evidente cerceamento de defesa. Intimada, a EMGEA não se manifestou, apesar dos diversos de pedidos de prorrogação de prazo formulados para tal finalidade, deferidos em vão por este relator. XIII - A Lei 9.514/97 não prevê a hipótese de fracasso do leilão ou de posterior venda direta em função da arrematação por preço vil. A jurisprudência pátria, no entanto, vem assentando que, além dos requisitos já previstos, o lance vencedor não poderá representar montante inferior à 50% da avaliação do imóvel, sob pena de se anular a execução, notadamente quando evidente ao senso comum a configuração do preço vil. Este entendimento representa aplicação subsidiária e analógica da norma contida no art. 692 do CPC/73, sendo de rigor destacar a positivação expressa da regra dos cinquenta por cento no art. 891, caput e parágrafo único do novo CPC, ressalvada a hipótese em que houve fixação diversa de preço mínimo pelo juiz. XIV - A arrematação do imóvel por valor irrisório configura prática abusiva, quer aconteça no âmbito dos leilões disciplinados pela Lei 9.514/97, que aconteça por venda direta a terceiros. Se a venda do imóvel se deu por valor inferior à metade do valor do imóvel, a execução poderá ser anulada, ou o credor condenado a prestar contas das operações, com o potencial de ter de pagar ao devedor o valor que excede seu crédito até metade do valor da avaliação do imóvel. Condenação nesse sentido não prejudica a compensação de despesas referentes ao período posterior à arrematação e anterior à imissão na posse. XV - Nestas condições, há fortes indícios de que a venda do imóvel se deu por preço vil, fato esse que deve ser levado em consideração para o julgamento da apelação nos termos do art. 933 do CPC. Considerando que a parte Autora despendeu grandes esforços processuais, mas em momento algum conseguiu comprovar sua capacidade material de purgar a mora ou exercer o direito de preferência, considerando ainda o interesse dos terceiros envolvidos, não há justificativa plausível para a anulação do procedimentos. Tais circunstâncias, no entanto, não afastam o dever da parte Ré em prestar as devidas contas dos valores praticados na execução, além de arcar com as eventuais perdas e danos, considerando a diferença entre 50% do valor do imóvel e a dívida consolidada por ocasião de sua venda direta, supondo que a dívida não seja superior àquele montante. XVI - Na esteira da decisão proferida por esta Primeira Turma nos autos do processo 5000063-10.2018.4.03.6136, é de rigor afastar a condenação da parte Autora ao pagamento de multa e indenização por litigância de má-fé. XVII - Embargos de declaração acolhidos para suprir as omissões apontadas e dar parcial provimento à apelação para condenar a EMGEA a prestar contas da execução extrajudicial da dívida, além de afastar as condenações por litigância de má fé. Considerando a sucumbência recíproca, reduzida a condenação da parte Autora ao pagamento de honorários advocatícios para 10% do valor da causa, além de condenar a EMGEA ao pagamento de honorários advocatícios no montante de 10% do valor da condenação, assim considerado o proveito econômico obtido pela parte Autora." (Primeira Turma, ApCiv 0000109-21.2017.4.03.6136, Rel. Des. Federal Valdeci dos Santos, j. em 10/03/2022, DJEN de 15/03/2022, grifos nossos) Por fim, o pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração, pelo devedor, de que foi frustrada a sua intenção de quitar a dívida ou de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional, o que não se verifica, in casu, porquanto os autores não comprovam a purgação total da mora, mas, apenas, o depósito parcial da dívida em atraso (ID 308377659 e 308377665). A mera manifestação de intenção de quitar a dívida, desacompanhada do depósito do valor respectivo, não ampara a suspensão do procedimento de execução extrajudicial. Nesse sentido, a orientação assentada na jurisprudência desta Corte: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. LEI 9.514/97. SUSPENSÃO DO PROCEDIMENTO DE EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. ALEGAÇÃO DE VÍCIOS. NÃO DEMONSTRADA A INTENÇÃO DE PURGAR A MORA. AGRAVO DESPROVIDO. I. Para purgar os efeitos da mora e evitar as medidas constritivas do financiamento, tais como a realização do leilão, consolidação da propriedade e inscrição de nome em cadastro de inadimplentes, é necessário que a agravante proceda ao depósito dos valores relativos às parcelas vencidas do financiamento, com encargos legais e contratuais, arcando o devedor com as despesas decorrentes, até a data limite para purgação da mora, a qual pode se dar mesmo depois da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, ou seja, até a realização do último leilão, data da arrematação, na forma do art. 34, do DL 70/66, desde que cumpridas todas as suas exigências, dispositivo aplicável por analogia, conforme autorizado no inc. II, do art. 39 da Lei 9.514. II. O pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração pelo devedor de que foi frustrada a sua intenção de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional. No entanto, a agravante não logrou êxito em provar as alegadas irregularidades ou que a situação ora instaurada sofreria qualquer alteração com a notificação das datas de leilão. Desta feita, não se vislumbra prejuízos que poderiam advir da suposta ilegalidade cometida, haja vista que a parte não demonstrou iniciativa quanto ao pagamento da dívida. III. Agravo de instrumento a que se nega provimento." (Primeira Turma, AI 5000744-55.2018.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Valdeci dos Santos, j. em 13/06/2018, e - DJF3 Judicial 1 de 15/06/2018, grifos nossos) "CONSTITUCIONAL E CIVIL. AGRAVO LEGAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. SISTEMA FINANCEIRO IMOBILIÁRIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. INADIMPLEMENTO. CONSOLIDAÇÃO EM FAVOR DO CREDOR. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA. RECURSO IMPROVIDO. 1. Imóvel financiado no âmbito do SFI - Sistema de Financiamento Imobiliário, mediante constituição de alienação fiduciária de coisa imóvel, na forma da Lei nº 9.514/1997. 2. A propriedade do imóvel consolidou-se em favor da fiduciária Caixa Econômica Federal, na forma regulada pelo artigo 26, § 1º, da Lei n. 9.514/1997. Consolidado o registro, não é possível que se impeça a agravada de exercer o direito de dispor do bem, que é consequência direta do direito de propriedade que lhe advém do registro. 3. A garantia do devido processo legal, consagrada no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal de 1988, não deve ser entendida como exigência de processo judicial. Por outro lado, o devedor fiduciante não fica impedido de levar a questão ao conhecimento do Judiciário, ainda que já concretizada a consolidação da propriedade em mãos do credor fiduciário, caso em que eventual procedência do alegado resolver-se-ia em perdas e danos. 4. Tal entendimento não exclui a possibilidade de medida judicial que obste a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, desde que haja indicação precisa, acompanhada de suporte probatório, do descumprimento de cláusulas contratuais, ou mesmo mediante contra-cautela, com o depósito à disposição do Juízo do valor exigido, o que não ocorre no caso dos autos. 5. O agravante não demonstrou que houve o descumprimento das formalidades previstas e tampouco trouxe aos autos prova de que não houve intimação para pagamento, com discriminação do débito. 6. A providência da notificação pessoal, prevista no artigo 26 e §§ da Lei 9.514/1997 tem a finalidade de possibilitar ao devedor a purgação da mora. E o devedor, ao menos com a propositura da ação originária, demonstra inequívoco conhecimento do débito, não se podendo dizer que a finalidade de tais diligências não foi atingida, não caracterizando qualquer prejuízo à parte, fato que elide a decretação de qualquer eventual nulidade, nos termos do artigo 250, parágrafo único, do Código de Processo Civil. 7. Tendo a ciência inequívoca do procedimento extrajudicial, e não negando a mora, caberia ao devedor purgá-la, ou ao menos depositar, em juízo, o valor do débito. Não é o que ocorre no caso dos autos, em que o agravante pretende, não o pagamento do débito, mas apenas a retomada do pagamento das prestações vincendas, o que não se reveste de plausibilidade jurídica. Precedentes. 8. Agravo legal não provido." (Primeira Turma, AI 0027375-29.2015.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Hélio Nogueira, j. em 30/05/2017, e-DJF3 Judicial 1 de 07/06/2017, grifos nossos) "SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. LEI 9.514/97. POSSIBILIDADE DE PURGAÇÃO DA MORA ATÉ A DATA DE LAVRATURA DO AUTO DE ARREMATAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DEPÓSITO. I - A impontualidade na obrigação do pagamento das prestações acarreta o vencimento antecipado da dívida e a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira, legitimando-se a medida nos termos da Lei n. 9.514/97, que não fere direitos do mutuário. Precedentes da Corte. II - Possibilidade do devedor purgar a mora em 15 (quinze) dias após a intimação prevista no art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/1997, ou a qualquer momento, até a assinatura do auto de arrematação, como dispõe o artigo 34 do Decreto-Lei nº 70/66. Precedentes do STJ. III - Mera manifestação de intenções de purgação da mora que não é elemento hábil a suspender os efeitos do ato de consolidação da propriedade. Precedentes. IV - Recurso desprovido." (Segunda Turma, AI 0001881-94.2017.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Peixoto Júnior, j. em 26/09/2017, e-DJF3 Judicial 1 de 05/10/2017, grifos nossos) "AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. DECRETO-LEI 70/66. CONTRATO DE MÚTUO HABITACIONAL REGIDO PELO SFH. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. IMÓVEL GRAVADO COM DIREITO REAL. LEGITIMIDADE. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1 - A execução de contrato de hipoteca em mútuo habitacional regido pelo Sistema Financeiro da Habitação encontra amparo no Decreto-lei 70/66, o qual foi recepcionado pela Constituição Federal de 88, conforme já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal (RE 223.075-1/DF) 2 - Tratando-se de imóvel gravado com direito real, o fiduciante assume o risco de eventual consolidação da propriedade em favor do credor e fiduciário Caixa Econômica Federal, razão pela qual manifesta sua concordância quanto às conseqüências decorrentes de inadimplência quando da celebração do contrato 3 - Não tendo os ora agravantes trazido aos autos comprovação de depósito em Juízo no valor integral do crédito controverso, afasta-se a possibilidade de suspensão da execução em tela 4 - Recurso a que se nega provimento." (Primeira Turma, AI 0000485-58.2012.4.03.0000, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, j. em 03/12/2013, e-DJF3 Judicial 1 de 09/01/2014, grifos nossos) Dessa forma, a sentença deve ser reformada, julgando-se improcedente o pedido inicial. A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da causa, em favor da ré, observando-se, ainda, o art. 98, §3º, do CPC, por serem os autores beneficiários da justiça gratuita. É o meu voto. Herbert de Bruyn Desembargador Federal Relator
E M E N T A
SFH. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. INADIMPLEMENTO. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. LEI Nº 9.514/97 E DECRETO-LEI Nº 70/66. CONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 13.465/17. MARCO TEMPORAL. DATA DE ASSINATURA DO CONTRATO. PROCEDIMENTOS. OBSERVÂNCIA. APELAÇÃO PROVIDA.
1. Na modalidade contratual de financiamento com garantia por alienação fiduciária no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, o devedor/fiduciante transfere a propriedade do imóvel à Caixa Econômica Federal (credora/fiduciária) até que se implemente a condição resolutiva, que é o pagamento total da dívida.
2. Liquidado o financiamento, o devedor retoma a propriedade plena do imóvel, ao passo que, havendo inadimplemento, a CEF, desde que obedecidos os procedimentos previstos na lei, pode requerer ao Cartório a consolidação da propriedade do imóvel em seu nome, passando a exercer a propriedade plena do bem.
3. Para a consolidação da propriedade em nome da instituição financeira ser considerada válida, deve-se observar o procedimento especificado na referida norma, em especial a previsão contida no artigo 26, §§ 1º e 3º, que estabelece devam os mutuários ser notificados pessoalmente para purgar a mora no prazo de quinze dias.
4. Consoante o art. 34 do Decreto-Lei nº 70/66, aplicável ao caso por força do art. 39 da Lei nº 9.514/97, é lícito purgar a mora até a assinatura do auto de arrematação, desde que, no valor, estejam compreendidos, além das parcelas vencidas do contrato de mútuo, os prêmios de seguro, multa contratual e todos os custos advindos da consolidação da propriedade.
5. A Lei nº 13.465/2017 restringiu a aplicação das disposições dos artigos 29 a 41 do Decreto-Lei nº 70/66, “exclusivamente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”, não mais se aplicando aos contratos regidos pelo Sistema Financeiro Imobiliário, o qual estabelece a garantia fiduciária, e não a hipotecária, e assegura ao devedor fiduciante o direito de preferência para adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, nos termos do §2º-B do art. 27 da Lei nº 9.514/97.
6. Em atenção ao princípio da segurança jurídica e em respeito ao ato jurídico perfeito, não é o registro da consolidação da propriedade na matrícula do imóvel o marco temporal para a aplicação das novas regras implantadas pela Lei nº 13.465, vigente a partir de 12/07/2017, mas, sim, a data em que firmado o contrato de alienação fiduciária.
7. Encontra-se pacificada na jurisprudência a constitucionalidade do procedimento de execução extrajudicial, previsto no Decreto-lei nº 70/66, bem como do procedimento da alienação fiduciária de coisa imóvel estabelecido na Lei nº 9.514/97.
8. Tendo sido o contrato de alienação fiduciária firmado em 04/11/2019, não existe mais possibilidade de purga da mora após a averbação da consolidação da propriedade, restando assegurado, à parte autora, somente o exercício do direito de preferência, consoante dispõe o art. 27, parágrafo 2º-B da Lei nº 9.514/97.
9. Não se verifica a alegada irregularidade a tornar inválida a consolidação da propriedade imobiliária efetivada pela instituição financeira credora, averbada na matrícula do imóvel objeto desta lide.
10. A plena ciência dos autores quanto à designação das datas do 1º e do 2º leilões públicos comprova que estes tiveram acesso, em tempo hábil, a todas as informações necessárias para exercer o seu direito de preferência, ou, de outra parte, poderiam imediatamente ter tomado alguma providência para salvaguardar seus interesses, o que não ocorreu na espécie.
11. O art. 26 da Lei n. 9.514/97 estabelece as formalidades pelas quais se dá a consolidação da propriedade em nome do fiduciário, dentre as quais não se inclui a obrigatoriedade de apresentação de planilha discriminativa de débitos.
12. A perda de renda familiar, dentre outras condições pessoais adversas, não configura fato imprevisível, ex vi dos arts. 317 e 478, do Código Civil, que autorize o afastamento das obrigações assumidas contratualmente pelos mutuários, nem tampouco impede o exercício dos direitos previstos na Lei nº 9.514/97.
13. O credor não é obrigado a receber prestação diversa da que lhe é devida, nos termos do art. 313 do Código Civil.
14. Devem ser observadas as cláusulas do contrato formalizado livremente pelas partes, em conformidade com o princípio da obrigatoriedade dos contratos (pacta sunt servanda), sob pena de se aceitar, por via oblíqua, os termos de uma repactuação proposta pela parte, ao arrepio da Lei nº 9.514/97 e do próprio contrato, o que não se pode admitir.
15. O pedido de suspensão ou anulação de atos relativos ao procedimento de execução extrajudicial com base em irregularidades procedimentais deve ser acompanhado da demonstração, pelo devedor, de que foi frustrada a sua intenção de quitar a dívida ou de purgar a mora, a qual permitiria o prosseguimento regular da relação obrigacional, o que não se verifica, in casu, porquanto os autores não comprovam a purgação total da mora, mas, apenas, o depósito parcial da dívida em atraso.
16. A mera manifestação de intenção de quitar a dívida, desacompanhada do depósito do valor respectivo, não ampara a suspensão do procedimento de execução extrajudicial.
17. Apelação provida.