
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004525-45.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: UNIÃO FEDERAL
APELADO: MAJD AL SAMMAN
Advogado do(a) APELADO: CAROLINA DE OLIVEIRA - SP413389-A
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004525-45.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: MAJD AL SAMMAN Advogado do(a) APELADO: CAROLINA DE OLIVEIRA - SP413389-A R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ordinária, intentada por MAJD AL SAMMAN em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a concessão de provimento jurisdicional que determine à ré a concessão de pedido de naturalização ordinária, afastando-se a exigência de prévia realização de avaliação presencial em Língua Portuguesa. A r. sentença julgou procedente o pedido, para determinar que a ré conceda a naturalização brasileira ordinária ao autor, recebendo o certificado do curso de Português anexado aos autos como comprobatório da proficiência na língua portuguesa, e desde que preenchidos os demais requisitos necessários na via administrativa. Nas razões de apelação, a União sustenta que o autor não preencheu os requisitos para a concessão da naturalização ordinária. Requer a reforma da r. sentença com a improcedência do pedido. Houve apresentação de contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004525-45.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: UNIÃO FEDERAL APELADO: MAJD AL SAMMAN Advogado do(a) APELADO: CAROLINA DE OLIVEIRA - SP413389-A V O T O Por primeiro, saliento que a técnica de julgamento per relationem, ora empregada, ao atender ao disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal, confere maior celeridade ao julgamento e reduz o formalismo excessivo ao prezar pela objetividade, simplicidade e eficiência, não se confundindo com ausência ou deficiência de fundamentação da decisão judicial. A esse respeito, colaciono a jurisprudência do E. STF e desta Corte: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA DE TODOS OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. MOTIVAÇÃO PER RALATIONEM. POSSIBILIDADE. INOBSERVÂNCIA DO ART. 316 DO CPP. PLEITO DE PRISÃO DOMICILIAR EM DECORRÊNCIA DA COVID-19. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. 1. Na linha da orientação jurisprudencial desta Suprema Corte, “o Agravante tem o dever de impugnar, de forma específica, todos os fundamentos da decisão agravada, sob pena de não provimento do agravo regimental” (HC 133.685-AgR/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, 2ª Turma, DJe 10.6.2016). 2. O uso da fundamentação per relationem não se confunde com ausência ou deficiência de fundamentação da decisão judicial, sendo admitida pela jurisprudência desta Suprema Corte (RHC 130.542-AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, 1ª Turma, DJe 25.10.2016; HC 130.860-AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, 1ª Turma, DJe 26.10.2017).” (…) (HC 182773 AgR, Relator(a): ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 15/12/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-294 DIVULG 16-12-2020 PUBLIC 17-12-2020) “(...) MOTIVAÇÃO PER RELATIONEM. LEGITIMIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DESSA TÉCNICA DE MOTIVAÇÃO. (...) Esta Corte já firmou o entendimento de que a técnica de motivação por referência ou por remissão é compatível com o que dispõe o art. 93, IX, da Constituição Federal. Não configura negativa de prestação jurisdicional ou inexistência de motivação a decisão que adota, como razões de decidir, os fundamentos do parecer lançado pelo Ministério Público, ainda que em fase anterior ao recebimento da denúncia.” (AI 738982 AgR, Relator Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, julgado em 29/05/2012) “PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. RESPONSABILIDADE DO SÓCIO. ARTIGO 135 DO CTN. SÓCIO OCULTO. NÃO COMPROVAÇÃO. AÇÃO PROCEDENTE. JULGAMENTO PER RELATIONEM. POSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O provimento recorrido encontra-se devidamente fundamentado, tendo dado à lide a solução mais consentânea possível, à vista dos elementos contidos nos autos, sendo certo, ainda, que o recurso apresentado pela apelante não trouxe nada de novo que pudesse infirmar o quanto decidido, motivo pelo qual a sentença recorrida deve ser mantida por seus próprios fundamentos. 2. Com efeito, restou firmado no julgado que, em pese a existência de indícios de que aos administradores da empresa executada no feito subjacente figuram como "laranjas", não há efetiva comprovação de que o real administrador (ou sócio oculto) da empresa é o embargante. A dilação probatória havida nestes autos, inclusive com a oitiva de testemunhas, não logrou demonstrar tal fato, conforme bem destacado na sentença vergastada. 3. Registre-se, por oportuno, que a adoção, pelo presente julgado, dos fundamentos externados na sentença recorrida - técnica de julgamento "per relationem" -, encontra amparo em remansosa jurisprudência das Cortes Superiores, mesmo porque não configura ofensa ao artigo 93, IX, da CF/88, que preceitua que "todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade (...)". Precedentes do E. STF e do C. STJ. 4. Quanto ao recurso apresentado pelo embargante, o mesmo comporta parcial provimento, para majorar a verba honorária, arbitrada pela sentença em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor esse considerado irrisório face ao valor da causa - R$ 6.515.227,26, em dezembro/2009. Na espécie, em que pese não se tratar de ação de grande complexidade, fato é que houve dilação probatória, inclusive com a oitiva de testemunhas (embora sem a participação do patrono do embargante), expedição de cartas precatórias, além de diversos outros atos, mostrando-se de rigor a observância das disposições do artigo 20, §§ 3º, alíneas "a", "b" e "c" e 4º, do CPC/73, aplicável à espécie. 5. À vista das disposições legais, majoro os honorários advocatícios para R$ 20.000,00 (vinte mil reais), valor esse suficiente à remuneração condigna do patrono do embargante. 6. Apelação da União Federal improvida. Recurso do embargante provido, em parte. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0000359-73.2010.4.03.6112, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 26/04/2021, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 05/05/2021) Prossigo. Acerca dos pontos específicos de irresignação, a sentença ora recorrida dispôs que: “(...) Postulou o autor a concessão de provimento jurisdicional que determine à ré que aceite o certificado de avaliação presencial do curso de português, realizado após o prazo para juntada do referido documento no processo administrativo, e conceda a naturalização. Dispõem os artigos 4º, 5º, caput e 12, II, “a” da Constituição Federal de 1988: “Art. 4° A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: (...) II - prevalência dos direitos humanos; Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (...) Art. 12. São brasileiros: (...) II – Naturalizados: a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral.” A Lei de Imigração nº 13.445/2017 estabelece nos artigos 64 e 65: “Art 64. A naturalização pode ser: I - ordinária; II - extraordinária; III - especial; ou IV - provisória. Art .65 -Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes condições: I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira; II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos; III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.” Por sua vez, dispõe o Decreto n° 9.199/2017 que regulamentou a Lei de Imigração, nos arts. 222 e 234: “Art. 222. A avaliação da capacidade do naturalizando de se comunicar em língua portuguesa será regulamentada por ato do Ministro de Estado da Justiça e Segurança Pública. (...) Art. 234. O pedido de naturalização ordinária se efetivará por meio da: I - apresentação da Carteira de Registro Nacional Migratório do naturalizando; II - comprovação de residência no território nacional pelo prazo mínimo requerido; III - demonstração do naturalizando de que se comunica em língua portuguesa, consideradas as suas condições; IV - apresentação de certidões de antecedentes criminais expedidas pelos Estados onde tenha residido nos últimos quatro anos e, se for o caso, de certidão de reabilitação; e V - apresentação de atestado de antecedentes criminais expedido pelo país de origem.” E, finalmente, estatui a Portaria Interministerial nº 623/2020 em seu art.5º: “Art. 5º Para a instrução do procedimento previsto no inciso I do art. 1º, é indicativo da capacidade de se comunicar em língua portuguesa, consideradas as condições do requerente, a apresentação de um dos seguintes documentos: I - certificado de: (...) d) conclusão, com aproveitamento satisfatório, de curso de língua portuguesa direcionado a imigrantes realizado em instituição de educação superior credenciada pelo Ministério da Educação. § 4º O curso referido na alínea “d” do inciso I poderá ser realizado na modalidade a distância, desde que o aluno, previamente identificado, seja submetido a pelo menos uma avaliação presencial no estabelecimento responsável ou, no caso de discente domiciliado em local diverso da sede, em instituição de educação superior a ele conveniado e também credenciada pelo Ministério da Educação.” Melhor analisando os autos, verifiquei que a negativa fornecida pela Coordenadoria de Processos Migratórios, em 12/09/2022, se fundamentou na falta de apresentação de documento necessário, qual seja, certificado de curso à distância com a informação de avaliação presencial. O autor se insurge requerendo que o certificado apresentado após o indeferimento administrativo, em curso nos moldes exigidos pela normativa do MEC, seja aceito e, assim, concluído seu pedido de naturalização. Nesse ponto, entendo que a exigência imposta pela referida Portaria Ministerial apenas não ultrapassou aquilo previsto na Lei nº 13.445/2017, apenas adicionando condição que se enquadra ao preconizado na lei. Ocorre que, neste momento, a parte possui todos os requisitos exigidos para a obtenção da sua naturalização diante da juntada do certificado de ID. 276773436 – págs. 69/74, ainda que extemporaneamente. Não se ignora que o Judiciário não pode emitir um juízo de mérito sobre os atos da Administração, ou seja, sobre a conveniência, oportunidade, eficiência ou justiça do ato. No caso, todavia, não se trata de discricionariedade no acolhimento do pedido administrativo: cumpridos os requisitos, a parte postulante terá direito à naturalização. Com a devida vênia, exigir novo requerimento administrativo para a concessão da naturalização, submetendo o autor novamente aos prazos estabelecidos em lei para a apresentação da mesma documentação já constante nos autos parece, aos olhos deste Juízo, contrário aos princípios da finalidade e da eficiência, norteadores da Administração Pública. Ante o exposto, concedo a tutela e JULGO PROCEDENTE A AÇÃO, extinguindo o processo com resolução de mérito com fundamento no artigo 487, I, do CPC, para que a ré conceda a naturalização brasileira ordinária ao autor, recebendo o certificado do curso de Português anexado aos autos como comprobatório da proficiência na língua portuguesa, e desde que preenchidos os demais requisitos necessários na via administrativa.” (ID 308236489) Extrai-se, do decisum, que todos os pontos alegados nesta sede foram devidamente apreciados pelo juízo a quo. Outrossim, a solução adotada resta coerente com os elementos fático-probatórios constantes dos autos. A r. sentença deve ser mantida. Por estes fundamentos, nego provimento à apelação. É o meu voto.
E M E N T A
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. NATURALIZAÇÃO ORDINÁRIA. EXIGÊNCIA DE AVALIAÇÃO PRESENCIAL EM LÍNGUA PORTUGUESA. CERTIFICADO APRESENTADO. REQUISITOS CUMPRIDOS. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
Ação ordinária proposta por cidadão estrangeiro contra a União Federal, objetivando a concessão de naturalização ordinária, afastando-se a exigência de avaliação presencial em língua portuguesa. Sentença julgou procedente o pedido, reconhecendo como válida a comprovação de proficiência mediante certificado de curso de português apresentado.
II. Questão em discussão
2. A questão em discussão consiste em saber se é válida a exigência de avaliação presencial em língua portuguesa como condição para concessão de naturalização ordinária, bem como se a apresentação extemporânea do certificado de curso de português preenche os requisitos legais e regulamentares.
III. Razões de decidir
3. De início, saliento que a técnica de julgamento per relationem, ora empregada, ao atender ao disposto no art. 93, IX, da Constituição Federal, confere maior celeridade ao julgamento e reduz o formalismo excessivo ao prezar pela objetividade, simplicidade e eficiência, não se confundindo com ausência ou deficiência de fundamentação da decisão judicial.
4. Se extrai do decisum que todos os pontos alegados nesta sede foram devidamente apreciados pelo juízo a quo. Outrossim, a solução adotada resta coerente com os elementos fático-probatórios constantes dos autos.
5. É de dizer: a exigência de avaliação presencial prevista na Portaria Interministerial nº 623/2020 encontra amparo na Lei nº 13.445/2017 e visa assegurar a comunicação em língua portuguesa, considerada condição para a naturalização ordinária.
6. No caso concreto, foi apresentada certificação válida, ainda que após a decisão administrativa, comprovando o atendimento às condições legais e regulamentares para a concessão da naturalização.
7. O Judiciário não pode substituir-se à Administração no juízo de conveniência, mas a obtenção dos requisitos previstos pela lei e regulamento confere ao requerente o direito à naturalização. Exigir novo requerimento administrativo viola os princípios da eficiência e da finalidade da Administração Pública.
IV. Dispositivo e tese
8. Recurso desprovido.
Tese de julgamento:
"1. A apresentação de certificado válido, ainda que extemporâneo, que comprove avaliação presencial em curso de língua portuguesa nos moldes regulamentares, atende ao requisito de proficiência para naturalização ordinária. 2. Cumpridos os requisitos legais e regulamentares, a naturalização deve ser concedida sem necessidade de novo processo administrativo."
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, arts. 4º, II, 5º e 12, II, "a"; Lei nº 13.445/2017, arts. 64 e 65; Portaria Interministerial nº 623/2020, art. 5º, §4º.