Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003116-61.2015.4.03.6113

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: JULIA FERREIRA SILVA MACHADO, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE FRANCA, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: DARCY DE SOUZA LAGO JUNIOR - SP118618-A
Advogados do(a) APELANTE: ANA LELIS DE OLIVEIRA GARBIM - SP166963-A, FABIOLA ELIDIA GOMES - SP226939-A, GISELIA SILVA OLIVEIRA - SP273538-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE FRANCA, JULIA FERREIRA SILVA MACHADO

Advogado do(a) APELADO: DARCY DE SOUZA LAGO JUNIOR - SP118618-A
Advogados do(a) APELADO: ANA LELIS DE OLIVEIRA GARBIM - SP166963-A, FABIOLA ELIDIA GOMES - SP226939-A, GISELIA SILVA OLIVEIRA - SP273538-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003116-61.2015.4.03.6113

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: JULIA FERREIRA SILVA MACHADO, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE FRANCA, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: DARCY DE SOUZA LAGO JUNIOR - SP118618-A
Advogados do(a) APELANTE: ANA LELIS DE OLIVEIRA GARBIM - SP166963-A, FABIOLA ELIDIA GOMES - SP226939-A, GISELIA SILVA OLIVEIRA - SP273538-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE FRANCA, JULIA FERREIRA SILVA MACHADO

Advogado do(a) APELADO: DARCY DE SOUZA LAGO JUNIOR - SP118618-A
Advogados do(a) APELADO: ANA LELIS DE OLIVEIRA GARBIM - SP166963-A, FABIOLA ELIDIA GOMES - SP226939-A, GISELIA SILVA OLIVEIRA - SP273538-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de devolução de autos à turma julgadora para juízo de retratação, nos termos do §3º do artigo 1040 do Código de Processo Civil, ao fundamento de que o acórdão não se amolda à orientação do Recurso Extraordinário nº 1.366.243/SC (Tema 1234 - Id. 308452849).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0003116-61.2015.4.03.6113

RELATOR: Gab. 11 - DES. FED. ANDRÉ NABARRETE

APELANTE: JULIA FERREIRA SILVA MACHADO, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE FRANCA, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) APELANTE: DARCY DE SOUZA LAGO JUNIOR - SP118618-A
Advogados do(a) APELANTE: ANA LELIS DE OLIVEIRA GARBIM - SP166963-A, FABIOLA ELIDIA GOMES - SP226939-A, GISELIA SILVA OLIVEIRA - SP273538-A

APELADO: UNIÃO FEDERAL, ESTADO DE SAO PAULO, MUNICIPIO DE FRANCA, JULIA FERREIRA SILVA MACHADO

Advogado do(a) APELADO: DARCY DE SOUZA LAGO JUNIOR - SP118618-A
Advogados do(a) APELADO: ANA LELIS DE OLIVEIRA GARBIM - SP166963-A, FABIOLA ELIDIA GOMES - SP226939-A, GISELIA SILVA OLIVEIRA - SP273538-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 jcc

 

 

 

 

V O T O

 

 Ação de rito ordinário ajuizada contra a União, o Estado de São Paulo e o Município de Franca para obter o fornecimento do medicamento Hemp Oil (RSHO). 

 

O juiz da causa julgou procedente o pedido e fixou a verba honorária em 10% sobre o valor da demanda (Id. 90407763 - fls. 05/10 e Id. 90407764). Interpostas apelações, esta Turma rejeitou a preliminar de ilegitimidade passiva, deu provimento ao recurso da parte autora, negou provimento aos apelos do Estado de São Paulo e do Município de Franca e deu parcial provimento à apelação da União em ementa assim redigida:

 

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. REMESSA OFICIAL E APELAÇÕES DOS ENTES PÚBLICOS E DA PARTE AUTORA. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. LEGITMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. CONFIGURAÇÃO. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE. MEDICAMENTO EFICAZ DISPONÍVEL PARA O TRATAMENTO DA DOENÇA.  INCAPACIDADE FINANCEIRA. COMPROVAÇÃO. MULTA. APLICAÇÃO CONTRA ENTE PÚBLICO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO. APELO DA PARTE AUTORA PROVIDO. APELOS DO MUNICÍPIO DE FRANCA E DO ESTADO DE SÃO PAULO DESPROVIDOS. REMESSA OFICIAL DESPROVIDA. APELAÇÃO DA UNIÃO PROVIDA EM PARTE.

- Descabida a alegação de ilegitimidade passiva da União, à vista de que o Pleno do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Suspensão de Segurança nº 3.355-AgR/RN, adotou entendimento no sentido de que a obrigação dos entes da federação no que tange ao dever fundamental de prestação de saúde é solidária (AI nº 808.059 AgR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, julgado em 02/12/2010, DJe de 01/02/2011). Ademais, da conjugação dos artigos 23, inciso II, e 196 a 200 da Constituição Federal decorre que o direito à saúde é de todos os cidadãos e dever da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Em consequência, a corte máxima assentou que a responsabilidade é dos entes públicos (RE nº 195.192/RS). Destaquem-se, ademais, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: (AgRg no AREsp 612.404/MG, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/05/2015, DJe 20/05/2015; AgRg no AREsp 264.335/CE, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/04/2014, DJe 07/05/2014).

- O direito ao fornecimento dos medicamentos decorre dos deveres impostos à União, Estados, Distrito Federal e Municípios pelos artigos 6º, 23, inciso II, e 196 a 200 da Lei Maior. As normas legais devem ser interpretadas em conformidade com as constitucionais referidas, a fim de que se concretize o direito fundamental à saúde dos cidadãos. É certo que cumpre ao Judiciário a efetivação dos direitos prescritos na Constituição Federal e nas leis. É a garantia fundamental do artigo 5º, inciso XXXV, da CF. O artigo 2º do Estatuto Constitucional deve ser interpretado em harmonia com o acesso à jurisdição e com os dispositivos pertinentes à saúde pública (artigo 6º, inciso II, e artigos 196 a 200 da CF). A reserva do possível, o denominado "mínimo existencial", no qual se incluem os direitos individuais e coletivos à vida e à saúde e que se apresenta com as características da integridade e da intangibilidade, e alegações genéricas, sem demonstração objetiva, no sentido da inexistência de recursos ou de previsão orçamentária não são capazes de frustrar a preservação e o atendimento, em favor dos indivíduos, de condições mínimas de existência, saúde e dignidade. Como parâmetro, as entidades federais, no atendimento ao direito à saúde, devem pautar-se pelos princípios e normas constitucionais. O SUS, na regulamentação que lhe dá a Lei nº 8.080/1990, deve-se orientar a mais ampla possível realização concreta do direito fundamental de que aqui se cuida (artigos 1º, 2º, 4º, 6º, 9º, 15, 19-M, 19-O, 19-P, 19-Q e 19-R). No caso dos autos, estão configuradas as condições excepcionais que justificam compelir o ente público ao fornecimento do medicamento ora requerido, nos termos das teses fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.657.156/RJ ) e pelo Supremo Tribunal Federal (RE 657.718).

- O artigo 497 do Código de Processo Civil dispõe que, nos casos de liminar e de concessão de pedido de obrigação de fazer ou não fazer, poderá o magistrado arbitrar multa diária para assegurar o cumprimento da decisão. Note-se que o meio de coação mais comum e eficaz é a imposição de pena pecuniária por dia de descumprimento, para que seja alcançada a efetivação da tutela específica, podendo ser imposto inclusive aos entes públicos. Ademais, a multa somente será exigível após o trânsito em julgado do decisum, mas será devida desde o dia em que restou configurada mora no adimplemento da obrigação, de modo que não há que se falar em  prejuízo aos cofres públicos. Ressalta-se que a penalidade imposta não viola o disposto no artigo 37, caput, da Constituição Federal tampouco acarretará dano irreparável, à vista da capacidade econômica dos entes envolvidos, bem como atende os princípios da razoabilidade e os ligados à organização orçamentária dispostos constitucionalmente.

- É cabível a fixação da verba honorária com base no artigo 85, §3º, inciso I, combinado com o § 4º, inciso III, do Diploma Processual Civil, que estabelecem o percentual entre 10% e 20% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico nas causas de até 200 salários mínimos, ou sobre o valor da causa, nas demandas em que não houver condenação ou não for possível mensurar o proveito econômico, observados os percentuais previstos para as ações cujo montante for superior a esse limite.

- Preliminar de ilegitimidade passiva da União rejeitada. Apelação da parte autora provida. Remessa oficial e apelações do Estado de São Paulo e do Município de Franca desprovidos. Apelação da União provida em parte." (Id. 253723754)

 

Opostos embargos de declaração (Id. 254509669), foram rejeitados (Id. 260634501), conforme ementa a seguir colacionada:

 

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. ACLARATÓRIOS REJEITADOS.

- O analisou a questão do fornecimento de medicamento e entendeu que se trata de direito constitucionalmente previsto e de obrigação solidária de todos os entes da federação, cujo cumprimento deverá ser efetuado de acordo com a legislação do SUS, editada com base nos critérios de descentralização e hierarquia (CF, arts. 196, 198 e 200). Assim, não restou configurada omissão sob tal aspecto.

- Embargos de declaração rejeitados."

 

Apresentado recurso extraordinário (Id. 277103776), a Vice-Presidência desta Corte determinou a devolução dos autos a esta Turma, nos termos do artigo 1040 do Código de Processo Civil, à vista de o aresto não se amoldar à orientação do Recurso Extraordinário nº 1.366.243/SC (Tema 1234 - Id. 308452849).

 

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.366.243/SC (Tema 1234) fixou a seguinte tese:

 

Tema 1234 - RE 1.366.243 relator Ministro GILMAR MENDES – publicado acórdão 11/10/2024

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 1.234. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO E COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL NAS DEMANDAS QUE VERSAM SOBRE FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS REGISTRADOS NA ANVISA, MAS NÃO INCORPORADOS NO SUS. NECESSIDADE DE AMPLIAÇÃO DO DIÁLOGO, DADA A COMPLEXIDADE DO TEMA, DESDE O CUSTEIO ATÉ A COMPENSAÇÃO FINANCEIRA ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. DESIGNAÇÃO DE COMISSÃO ESPECIAL COMO MÉTODO AUTOCOMPOSITIVO DE SOLUÇÃO DE CONFLITOS. INSTAURAÇÃO DE UMA INSTÂNCIA DE DIÁLOGO INTERFEDERATIVA.

Questão em discussão: Análise administrativa e judicial quanto aos medicamentos incorporados e não incorporados, no âmbito do SUS.

Acordos interfederativos: Análise conjunta com Tema 6. Em 2022, foi reconhecida a repercussão geral da questão relativa à legitimidade passiva da União e à competência da Justiça Federal nas demandas sobre fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS (tema 1234). Para solução consensual desse tema, foi criada Comissão Especial, composta por entes federativos e entidades envolvidas. Os debates resultaram em acordos sobre competência, custeio e ressarcimento em demandas que envolvam medicamentos não incorporados, entre outros temas. A análise conjunta do presente tema 1234 e do tema 6 é, assim, fundamental para evitar soluções divergentes sobre matérias correlatas. Homologação parcial dos acordos, com observações e condicionantes.

I. COMPETÊNCIA

 1) Para fins de fixação de competência, as demandas relativas a medicamentos não incorporados na política pública do SUS, mas com registro na ANVISA, tramitarão perante a Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da Constituição Federal, quando o valor do tratamento anual específico do fármaco ou do princípio ativo, com base no Preço Máximo de Venda do Governo (PMVG – situado na alíquota zero), divulgado pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED - Lei 10.742/2003), for igual ou superior ao valor de 210 salários mínimos, na forma do art. 292 do CPC.

1.1) Existindo mais de um medicamento do mesmo princípio ativo e não sendo solicitado um fármaco específico, considera-se, para efeito de competência, aquele listado no menor valor na lista CMED (PMVG, situado na alíquota zero).

1.2) No caso de inexistir valor fixado na lista CMED, considera-se o valor do tratamento anual do medicamento solicitado na demanda, podendo o magistrado, em caso de impugnação pela parte requerida, solicitar auxílio à CMED, na forma do art. 7º da Lei 10.742/2003.

1.3) No caso de cumulação de pedidos, para fins de competência, será considerado apenas o valor do(s) medicamento(s) não incorporado(s) que deverá(ão) ser somado(s), independentemente da existência de cumulação alternativa de outros pedidos envolvendo obrigação de fazer, pagar ou de entregar coisa certa.

II. DEFINIÇÃO DE MEDICAMENTOS NÃO INCORPORADOS

2.1) Consideram-se medicamentos não incorporados aqueles que não constam na política pública do SUS; medicamentos previstos nos PCDTs para outras finalidades; medicamentos sem registro na ANVISA; e medicamentos off label sem PCDT ou que não integrem listas do componente básico.

2.1.1) Conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal na tese fixada no tema 500 da sistemática da repercussão geral, é mantida a competência da Justiça Federal em relação às ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa, as quais deverão necessariamente ser propostas em face da União, observadas as especificidades já definidas no aludido tema.

III. CUSTEIO

3) As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.

3.1) Figurando somente a União no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do Estado ou Município para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão, o que não importará em responsabilidade financeira nem em ônus de sucumbência, devendo ser realizado o ressarcimento pela via acima indicada em caso de eventual custo financeiro ser arcado pelos referidos entes.

3.2) Na determinação judicial de fornecimento do medicamento, o magistrado deverá estabelecer que o valor de venda do medicamento seja limitado ao preço com desconto, proposto no processo de incorporação na Conitec (se for o caso, considerando o venire contra factum proprium/tu quoque e observado o índice de reajuste anual de preço de medicamentos definido pela CMED), ou valor já praticado pelo ente em compra pública, aquele que seja identificado como menor valor, tal como previsto na parte final do art. 9º na Recomendação 146, de 28.11.2023, do CNJ. Sob nenhuma hipótese, poderá haver pagamento judicial às pessoas físicas/jurídicas acima descritas em valor superior ao teto do PMVG, devendo ser operacionalizado pela serventia judicial junto ao fabricante ou distribuidor.

3.3) As ações que permanecerem na Justiça Estadual e cuidarem de medicamentos não incorporados, as quais impuserem condenações aos Estados e Municípios, serão ressarcidas pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES ou ao FMS). Figurando somente um dos entes no polo passivo, cabe ao magistrado, se necessário, promover a inclusão do outro para possibilitar o cumprimento efetivo da decisão.

3.3.1) O ressarcimento descrito no item 3.3 ocorrerá no percentual de 65% (sessenta e cinco por cento) dos desembolsos decorrentes de condenações oriundas de ações cujo valor da causa seja superior a 7 (sete) e inferior a 210 (duzentos e dez) salários mínimos, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias.

3.4) Para fins de ressarcimento interfederativo, quanto aos medicamentos para tratamento oncológico, as ações ajuizadas previamente a 10 de junho de 2024 serão ressarcidas pela União na proporção de 80% (oitenta por cento) do valor total pago por Estados e por Municípios, independentemente do trânsito em julgado da decisão, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias. O ressarcimento para os casos posteriores a 10 de junho de 2024 deverá ser pactuado na CIT, no mesmo prazo.

IV. ANÁLISE JUDICIAL DO ATO ADMINISTRATIVO DE INDEFERIMENTO DE MEDICAMENTO PELO SUS

4) Sob pena de nulidade do ato jurisdicional (art. 489, § 1º, V e VI, c/c art. 927, III, §1º, ambos do CPC), o Poder Judiciário, ao apreciar pedido de concessão de medicamentos não incorporados, deverá obrigatoriamente analisar o ato administrativo comissivo ou omissivo da não incorporação pela Conitec e da negativa de fornecimento na via administrativa, tal como acordado entre os Entes Federativos em autocomposição no Supremo Tribunal Federal.

4.1) No exercício do controle de legalidade, o Poder Judiciário não pode substituir a vontade do administrador, mas tão somente verificar se o ato administrativo específico daquele caso concreto está em conformidade com as balizas presentes na Constituição Federal, na legislação de regência e na política pública no SUS.

4.2) A análise jurisdicional do ato administrativo que indefere o fornecimento de medicamento não incorporado restringe-se ao exame da regularidade do procedimento e da legalidade do ato de não incorporação e do ato administrativo questionado, à luz do controle de legalidade e da teoria dos motivos determinantes, não sendo possível incursão no mérito administrativo, ressalvada a cognição do ato administrativo discricionário, o qual se vincula à existência, à veracidade e à legitimidade dos motivos apontados como fundamentos para a sua adoção, a sujeitar o ente público aos seus termos.

4.3) Tratando-se de medicamento não incorporado, é do autor da ação o ônus de demonstrar, com fundamento na Medicina Baseada em Evidências, a segurança e a eficácia do fármaco, bem como a inexistência de substituto terapêutico incorporado pelo SUS.

4.4) Conforme decisão da STA 175-AgR, não basta a simples alegação de necessidade do medicamento, mesmo que acompanhada de relatório médico, sendo necessária a demonstração de que a opinião do profissional encontra respaldo em evidências científicas de alto nível, ou seja, unicamente ensaios clínicos randomizados, revisão sistemática ou meta-análise.

V. PLATAFORMA NACIONAL

5) Os Entes Federativos, em governança colaborativa com o Poder Judiciário, implementarão uma plataforma nacional que centralize todas as informações relativas às demandas administrativas e judiciais de acesso a fármaco, de fácil consulta e informação pelo cidadão, na qual constarão dados básicos para possibilitar a análise e eventual resolução administrativa, além de posterior controle judicial.

5.1) A porta de ingresso à plataforma será via prescrições eletrônicas, devidamente certificadas, possibilitando o controle ético da prescrição posteriormente, mediante ofício do Ente Federativo ao respectivo conselho profissional.

5.2) A plataforma nacional visa a orientar todos os atores ligados ao sistema público de saúde, possibilitando a eficiência da análise pelo Poder Público e compartilhamento de informações com o Poder Judiciário, mediante a criação de fluxos de atendimento diferenciado, a depender de a solicitação estar ou não incluída na política pública de assistência farmacêutica do SUS e de acordo com os fluxos administrativos aprovados pelos próprios Entes Federativos em autocomposição.

5.3) A plataforma, entre outras medidas, deverá identificar quem é o responsável pelo custeio e fornecimento administrativo entre os Entes Federativos, com base nas responsabilidades e fluxos definidos em autocomposição entre todos os Entes Federativos, além de possibilitar o monitoramento dos pacientes beneficiários de decisões judiciais, com permissão de consulta virtual dos dados centralizados nacionalmente, pela simples consulta pelo CPF, nome de medicamento, CID, entre outros, com a observância da Lei Geral de Proteção da Dados e demais legislações quanto ao tratamento de dados pessoais sensíveis.

5.4) O serviço de saúde cujo profissional prescrever medicamento não incorporado ao SUS deverá assumir a responsabilidade contínua pelo acompanhamento clínico do paciente, apresentando, periodicamente, relatório atualizado do estado clínico do paciente, com informações detalhadas sobre o progresso do tratamento, incluindo melhorias, estabilizações ou deteriorações no estado de saúde do paciente, assim como qualquer mudança relevante no plano terapêutico.

 VI. MEDICAMENTOS INCORPORADOS

6) Em relação aos medicamentos incorporados, conforme conceituação estabelecida no âmbito da Comissão Especial e constante do Anexo I, os Entes concordam em seguir o fluxo administrativo e judicial detalhado no Anexo I, inclusive em relação à competência judicial para apreciação das demandas e forma de ressarcimento entre os Entes, quando devido.

6.1) A(o) magistrada(o) deverá determinar o fornecimento em face de qual ente público deve prestá-lo (União, Estado, Distrito Federal ou Município), nas hipóteses previstas no próprio fluxo acordado pelos Entes Federativos, integrantes do presente acórdão.

VII. OUTRAS DETERMINAÇÕES

7.1) Os órgãos de coordenação nacional do MPF, da DPU e de outros órgãos técnicos de caráter nacional poderão apresentar pedido de análise de incorporação de medicamentos no âmbito do SUS, que ainda não tenham sido avaliados pela Conitec, respeitada a análise técnica dos órgãos envolvidos no procedimento administrativo usual para a incorporação, quando observada a existência de demandas reiteradas.

 7.2) A previsão de prazo de revisão quanto aos termos dos acordos extrajudiciais depende da devida homologação pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, para que a alteração possa ser dotada de eficácia plena. Até que isso ocorra, todos os acordos permanecem existentes, válidos e eficazes.

7.3) Até que sobrevenha a implementação da plataforma, os juízes devem intimar a Administração Pública para justificar a negativa de fornecimento na seara administrativa, nos moldes do presente acordo e dos fluxos aprovados na Comissão Especial, de modo a viabilizar a análise da legalidade do ato de indeferimento.

7.4) Excepcionalmente, no prazo de até 1 (um) ano a contar da publicação da ata de julgamento – em caso de declinação da Justiça Estadual para a Federal (unicamente para os novos casos) e na hipótese de inocorrer atendimento pela DPU, seja pela inexistência de atuação institucional naquela Subseção Judiciária, seja por ultrapassar o limite de renda de atendimento pela DPU –, admite-se que a Defensoria Pública Estadual (DPE), que tenha ajuizado a demanda no foro estadual, permaneça patrocinando a parte autora no foro federal, em copatrocínio entre as Defensorias Públicas, até que a DPU se organize administrativamente e passe a defender, isoladamente, os interesses da(o) cidadã(o), aplicando-se supletivamente o disposto no art. 5º, § 5º, da Lei 7.347/1985.

7.5) Concessão de prazo de 90 dias à Ministra da Saúde, para editar o ato de que dispõem os itens 2.2. e 2.4 do acordo extrajudicial e adendo a este, respectivamente, ambos firmados na reunião da CIT, ressaltando que os pagamentos devem ser realizados no prazo máximo de 5 anos, a contar de cada requerimento, abarcando a possibilidade de novos requerimentos administrativos.

7.6) Comunicação: (i) à Anvisa, para que proceda ao cumprimento do item 7, o qual será objeto de acompanhamento por esta Corte na fase de implementação do julgado, além da criação e operacionalização da plataforma nacional de dispensação de medicamentos (item 5 e subitens do que foi aprovado na Comissão Especial), a cargo da equipe de TI do TRF da 4ª Região, repassando, após sua criação e fase de testes, ao Conselho Nacional de Justiça, que centralizará a governança em rede com os órgãos da CIT do SUS, conjuntamente com as demais instituições que envolvem a judicialização da saúde pública, em diálogo com a sociedade civil organizada; (ii) ao CNJ, para que tome ciência do presente julgado, operacionalizando-o como entender de direito, além de proceder à divulgação e fomento à atualização das magistradas e dos magistrados.

VIII. MODULAÇÃO DE EFEITOS TÃO SOMENTE QUANTO À COMPETÊNCIA: somente haverá alteração aos feitos que forem ajuizados após a publicação do resultado do julgamento de mérito no Diário de Justiça Eletrônico, afastando sua incidência sobre os processos em tramitação até o referido marco, sem possibilidade de suscitação de conflito negativo de competência a respeito dos processos anteriores ao referido marco.

IX. PROPOSTA DE SÚMULA VINCULANTE:

“O pedido e a análise administrativos de fármacos na rede pública de saúde, a judicialização do caso, bem ainda seus desdobramentos (administrativos e jurisdicionais), devem observar os termos dos 3 (três) acordos interfederativos (e seus fluxos) homologados pelo Supremo Tribunal Federal, em governança judicial colaborativa, no tema 1.234 da sistemática da repercussão geral (RE 1.366.243)”.

(RE 1.366.243, Relator Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 16/09/2024, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n  divulg 10/10/2024  public 11/10/2024)

 

Vê-se que foi determinado no item 3 que: "As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias)". No caso dos autos, o acórdão recorrido adotou orientação contrária à estabelecida pela Corte Suprema ao não direcionar o cumprimento da obrigação ao ente federal. Dessa forma, de rigor a retratação do aresto para estabelecer que o medicamento deve ser fornecido pela União e, no caso seja entregue pelo ente estadual ou municipal, deve a União ressarci-los por meio de repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES).

 

Ante o exposto, voto para que se retrate do acórdão de Id. 253723754 para estabelecer que o medicamento deve ser fornecido pela União e, no caso seja entregue pelo ente estadual ou municipal, deve a União ressarci-los por meio de repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES). Mantido, no mais, o julgado.

 



Autos: APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 0003116-61.2015.4.03.6113
Requerente: JULIA FERREIRA SILVA MACHADO e outros
Requerido: UNIÃO FEDERAL e outros

 

Ementa: DIREITO DA SAÚDE. REMESSA OFICIAL E APELAÇÕES. RETRATAÇÃO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. DIRECIONAMENTO DA OBRIGAÇÃO À UNIÃO.

I. Caso em exame

1. Ação de rito ordinário ajuizada para obter o fornecimento do medicamento Hemp Oil (RSHO) por ser a parte autora portadora de epilepsia refratária.

II. Questão em discussão

2. A questão em discussão consiste em saber qual o ente público responsável pelo cumprimento da obrigação.

III. Razões de decidir

3. De acordo com o estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário nº 1.366.243/SC (Tema 1234): "As ações de fornecimento de medicamentos incorporados ou não incorporados, que se inserirem na competência da Justiça Federal, serão custeadas integralmente pela União, cabendo, em caso de haver condenação supletiva dos Estados e do Distrito Federal, o ressarcimento integral pela União, via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES), na situação de ocorrer redirecionamento pela impossibilidade de cumprimento por aquela, a ser implementado mediante ato do Ministério da Saúde, previamente pactuado em instância tripartite, no prazo de até 90 dias)".

IV. Dispositivo e tese

4. Acórdão retratado.

Tese de julgamento: Nos casos de fornecimento de medicamento incorporado ou não e que forem de competência da Justiça Federal, a obrigação deverá ser cumprida integralmente pela União, assegurado o ressarcimento dos entes estatual e municipal via repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES).

_________

Dispositivos relevantes citados: CPC, art. 1040.

Jurisprudência relevante citada: RE 1.366.243 (Tema 1234).


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu votar para se retratar do acórdão de Id. 253723754 para estabelecer que o medicamento deve ser fornecido pela União e, no caso seja entregue pelo ente estadual ou municipal, deve a União ressarci-los por meio de repasses Fundo a Fundo (FNS ao FES). Mantido, no mais, o julgado, nos termos do voto Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN (Relator), com quem votaram o Juiz Fed. Conv. RAPHAEL DE OLIVEIRA e a Des. Fed. MÔNICA NOBRE. Ausentes, justificadamente, por motivo de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN) e a Des. Fed. LEILA PAIVA (substituída pelo Juiz Fed. Conv. RAPHAEL DE OLIVEIRA) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
ROBERTO MODESTO JEUKEN
JUIZ FEDERAL