AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5027258-35.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
AGRAVANTE: SINDICATO EMP TRANSP COL URB RIB PRETO S-TRANSPASS-URB
Advogado do(a) AGRAVANTE: EVALDO RODRIGUES PEREIRA - SP250412
AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5027258-35.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO AGRAVANTE: SINDICATO EMP TRANSP COL URB RIB PRETO S-TRANSPASS-URB Advogado do(a) AGRAVANTE: EVALDO RODRIGUES PEREIRA - SP250412 AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Trata-se de agravo de instrumento interposto por SINDICATO DAS EMPRESAS DE TRANSPORTE COLETIVO URBANO DE RIBEIRÃO PRETO E REGIÃO (S-TRANSPASS-URB) contra decisão que indeferiu a medida liminar requerida no mandado de segurança de referência a fim de que fosse determinada a imediata suspensão das regras de sujeição tributária da INRFB nº 2.198/2024 e Medida Provisória nº 1.227/2024, assegurando-se às contribuintes representadas pela agravante a manter a opção pela sujeição à Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), regulada pelos artigos 7º a 9º da Lei nº 12.546/2011 e alterações posteriores (sem as restrições e condicionantes impostas pela normatividade atacada), vedando-se a adoção de quaisquer medidas punitivas ou restritivas, especialmente aquelas sanções definidas pelo art. 3º da MP nº 1.227/2024. Sustenta a agravante que o rol de condicionantes do art. 2º da MP 1.227/24, bem como a criação da obrigação acessória de apresentação de Declaração de Incentivos, Renúncias, Benefícios e Imunidades de natureza tributária (BIRBI), inviabiliza a fruição do benefício fiscal do regime da CPRB pelas empresas de transporte coletivo de passageiros representadas pelo Sindicato autor, e que a IN RFB nº 2.198/2024 extrapolou sua competência regulamentadora e alargou os contornos da referida MP para incluir em seu campo de incidência a CPRB de que trata a Lei nº 12.546/2011, passando a impor restrições não contempladas em lei à sujeição tributária ao regime da CPRB. Alega a inconstitucionalidade e ilegalidade das novas regras de tributação, especialmente por equiparar indevidamente a CPRB à espécie de incentivo ou benefício fiscal, bem como violação ao princípio da legalidade tributária e ao art. 7º da Lei nº 12.016/09. Aduz o caráter preventivo da impetração e afirma a existência de risco de dano irreparável ou de difícil reparação pois o não afastamento das novas regras de sujeição tributária da MP 1.227/24 pode trazer prejuízos materiais irreparáveis e irreversíveis às empresas associadas à entidade sindical agravante, dentre os quais a adoção de medidas restritivas e punições pela autoridade coatora por desobediência às novas regras de tributação. Pleiteia a antecipação da tutela recursal, e sua posterior confirmação, com a concessão da medida liminar pleiteada, para que seja determinada a imediata suspensão das regras de sujeição tributária da INRFB nº 2198/2024 e da Medida Provisória nº 1.227/2024, nos termos do pleito inicial. Indeferida a antecipação dos efeitos da tutela recursal (Id 308485886). Com contrarrazões pela agravada, vieram os autos conclusos. É o relatório. lor
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5027258-35.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO AGRAVANTE: SINDICATO EMP TRANSP COL URB RIB PRETO S-TRANSPASS-URB Advogado do(a) AGRAVANTE: EVALDO RODRIGUES PEREIRA - SP250412 AGRAVADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): O deferimento da tutela provisória de urgência tem como requisitos, nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil, de um lado, a existência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito e, de outro, o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, advindos da não concessão da medida. Ademais, o deferimento da tutela de urgência não pode implicar a irreversibilidade dos efeitos do provimento antecipado, nos termos do § 3º do mesmo dispositivo. Esses requisitos, assim postos, implicam a existência de sólida prova pré-constituída da veracidade do quanto arguido pela parte requerente, na medida em que a antecipação do provimento postulado, nas tutelas provisórias, provoca a postergação do contraditório. Na hipótese, não restou demonstrados a probabilidade do direito e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação a ensejar a concessão da medida liminar pleiteada. A Lei 12.546/2011 instituiu regime de desoneração da folha de pagamentos e criou, em seu art. 7º, a contribuição previdenciária a ser calculada sobre o valor da receita bruta (CPRB), em substituição às contribuições previdenciárias previstas no art. 22, I e III, da Lei 8.212/90. O referido regime foi prorrogado sucessivas vezes desde sua criação e, recentemente, a Lei 14.288/2021, alterando a Lei 12.546/2011, estabeleceu o dia 31 de dezembro de 2023 para o seu fim. Pouco antes do prazo final da benesse, veio a ser promulgada a Lei 14.784 em 27/12/2023, prorrogando para 31 de dezembro de 2027 os prazos da citada desoneração para todos os 17 setores da economia antes contemplados, permitindo que as empresas beneficiadas pudessem substituir o recolhimento da contribuição equivalente a 20% do montante da folha de salários por valor situado entre 1% e 4,5% da receita bruta, conforme a atividade. Aponte-se que a Lei 14.784/23 é originada do Projeto de Lei 334/2023, que havia sido integralmente vetado pelo Presidente da República em 23/11/2023 (Veto Presidencial nº 38/2023). O veto, entretanto, foi rejeitado pelo Congresso Nacional, que, estribado em sua competência constitucional (art. 57, § 3º, IV c/c art. 66, § 4º), promulgou a citada Lei 14.784/2023 por ato do Presidente do Senado Federal. Na sequência, a Presidência da República editou a Medida Provisória 1.202, de 28/12/2023, revogando os benefícios fiscais dos arts. 7º a 10 da Lei 12.545/2011 e reonerando gradualmente a folha de pagamentos dos setores anteriormente desonerados, com efeitos a partir de 1º de abril de 2024. Posteriormente, a Medida Provisória 1.208, de 27/2/2024, revogou diversos dispositivos da MP 1.202/23, importando na retomada dos efeitos da desoneração da folha de pagamentos implementada pela Lei 14.784/2023. A controvérsia foi então judicializada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.633 MC/DF, proposta pelo Presidente da República junto ao STF, objetivando: (i) a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 1º, 2º, 4º e 5º da Lei Federal 14.784, de 27 de dezembro de 2023, bem como da “prorrogação seletiva” da Medida Provisória 1.202/2023, de 28 de dezembro de 2023, levada a efeito pelo Presidente do Congresso Nacional; e (ii) a declaração de constitucionalidade do art. 4º da mesma MP 1.202/2023. O Ministro relator do feito, Cristiano Zanin, proferiu decisão monocrática em 25/04/2024, concedendo parcialmente medida liminar para “suspender a eficácia dos arts. 1º, 2º, 4º e 5º da Lei n. 14.784, de 27 de dezembro de 2023, enquanto não sobrevier demonstração do cumprimento do que estabelecido no art. 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (com a oportunidade do necessário diálogo institucional) ou até o ulterior e definitivo julgamento do mérito da presente ação pelo Supremo Tribunal Federal, conforme o caso”. Determinados efeitos prospectivos (ex nunc) para a decisão, na forma do art. 11 da Lei 9.868/99. Na prática, foi suspensa a eficácia da prorrogação da CPRB até 31 de dezembro de 2027, sem fixação de prazo para os contribuintes se readequarem ao regime anterior do art. 22 da Lei 8.212/91. Entretanto, a Constituição Federal veda a tributação surpresa, o que se concretiza, no campo específico das contribuições à Seguridade Social, pela indispensável observância do prazo de noventa dias contados desde a “publicação da lei que as houver instituído ou modificado”, na forma do art. 195, § 6º, da Constituição Federal. Tem-se, pois, o princípio da anterioridade nonagesimal, que consiste em garantia ao contribuinte de não ser surpreendido com a majoração de sua carga tributária de forma repentina, de modo a ter tempo para se planejar financeiramente de maneira segura. Apesar de as regras citadas referirem-se especificamente a lei, no caso, entendo que a decisão monocrática proferida pelo Ministro Cristiano Zanin, em sede de controle de constitucionalidade, produz normatividade que se compara à atividade legislativa. Inclusive, a jurisprudência do C. STF tem se firmado no sentido de que a revogação ou redução de benefícios fiscais equivale, de forma indireta, à majoração tributária, e por isso deve observar o princípio da anterioridade tributária. Confira-se: “Aplica-se o princípio da anterioridade tributária, geral e nonagesimal, nas hipóteses de redução ou de supressão de benefícios ou de incentivos fiscais, haja vista que tais situações configuram majoração indireta de tributos” (STF. Plenário. RE 564225 AgR-EDv-AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 20/11/2019.) “O ato normativo que revoga um benefício fiscal anteriormente concedido configura aumento indireto do tributo e, portanto, está sujeito ao princípio da anterioridade tributária: Não apenas a majoração direta de tributos atrai a eficácia da anterioridade, mas também a majoração indireta decorrente de revogação de benefícios fiscais.” (STF. 1ª Turma. RE 1053254 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 26/10/2018.) No presente caso, as sucessivas alterações de sistema de pagamento de contribuição previdenciária, ora mais, ora menos oneroso ao contribuinte, desatende não só ao princípio da anterioridade como, também, ao próprio princípio basilar da segurança jurídica. Inobstante, o Min. Cristiano Zanin proferiu nova decisão monocrática em 17/05/2024 atribuindo efeitos prospectivos à decisão anteriormente proferida de suspensão da eficácia dos arts. 1º, 2º, 4º e 5º da Lei nº 14.784/2023, que somente passará a produzir efeitos no prazo de sessenta dias. A decisão, publicada em 20/05/2024, restou proferida nos seguintes termos: "(...) Assim, com o objetivo de assegurar a possibilidade de obtenção de solução por meio de diálogo interinstitucional voltado a superar os afirmados vícios presentes na Lei n. 14.784/2023, atribuo efeito prospectivo à decisão que proferi em 25 de abril de 2024, a fim de que passe a produzir efeitos no prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da publicação desta decisão. Transcorrido o prazo de 60 (sessenta) dias sem solução, a liminar deferida retomará sua eficácia plena, sem prejuízo da instrução e do julgamento da presente ação de controle concentrado e independentemente de nova intimação. Nos termos do art. 21, IV e V, e § 5º, do Regimento Interno do STF, e do art. 10, caput e § 3º, da Lei n. 9.868/1999, determino a submissão imediata da presente decisão ao Plenário, em ambiente virtual, a ser inserida na pauta da sessão subsequente ou extraordinária, para julgamento do referendo." Em 16/07/2024, a Vice-Presidência do E. STF, no exercício da Presidência, deferiu o pedido de prorrogação do prazo apresentado pela Federação das Indústrias do Estado do Paraná (FIEP), amicus curiae na ADI 7.633/DF. A segunda medida cautelar, portanto, passou a ter validade até 11/09/2024. Confira-se: (...) Assiste razão à alegação. A construção dialogada da solução não permite o açodamento e requerem o tempo necessário para o diálogo e para a confecção da solução adequada. Está comprovado nos autos o esforço efetivo dos Poderes Executivo e Legislativo federal, assim como dos diversos grupos da sociedade civil para a resolução da questão. Portanto, cabe a jurisdição constitucional fomentar tais espaços e a construção política de tais soluções. Tais razões militam a favor da concessão do pedido deduzidos. Ademais, a excepcional atuação neste momento justifica-se em razão do iminente fim do prazo anteriormente concedido pelo Ministro relator do presente processo. Igualmente justifica a concessão da presente medida liminar o diálogo institucional em curso e razões de segurança jurídica, pois a retomada abrupta dos efeitos ora suspensos pode gerar relevante impacto sobre diversos setores da economia nacional. Diante do exposto, defiro o pedido de prorrogação da segunda medida cautelar (eDOC 169) concedida nos presentes autos até o dia 11.09.2024. Diante da nova decisão proferida no bojo da ADI 7.633, entendo que não subsiste mais periculum in mora nem urgência no caso concreto a justificar a concessão da antecipação da tutela recursal, tendo em vista ter sido assegurado aos contribuintes pelo menos mais sessenta dias para se adequarem à mudança de regimes. Assim, considerando os elementos disponíveis nos autos nessa fase processual inicial, entendo que a decisão agravada se mostra devidamente fundamentada e respaldada pelos elementos probatórios disponibilizados, não merecendo reparos o entendimento exarado pelo c. juízo a quo. Dispositivo Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. Consigno que a oposição de embargos declaratórios infundados, podem ensejar aplicação de multa nos termos do art. 1.026, § 2°, do CPC. É o voto.
E M E N T A
DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. DESONERAÇÃO DA FOLHA DE PAGAMENTOS. LEI 12.546/2011. MP 1.208/2024. PRORROGAÇÃO DA CPRB. SUSPENSÃO DE EFICÁCIA. ADI 7.633. PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. PROLAÇÃO DE NOVA DECISÃO PELO STF. PERIGO DA DEMORA. URGÊNCIA. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
I. Caso em exame
Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu pedido liminar para manter o recolhimento da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), conforme prorrogação prevista na Lei 14.784/2023, em substituição à contribuição previdenciária patronal sobre a folha de salários, vedando-se a adoção de quaisquer medidas punitivas ou restritivas, especialmente as sanções definidas pelo art. 3º da MP nº 1.227/2024. A agravante alega quebra de expectativa, violação dos princípios da anterioridade nonagesimal e da segurança jurídica, além de prejuízo econômico decorrente de mudanças abruptas no regime tributário.
II. Questão em discussão
Há duas questões em discussão:
(i) verificar se a suspensão da eficácia da Lei 14.784/2023 por decisão liminar em ADI 7.633/DF viola os princípios constitucionais da anterioridade tributária e da segurança jurídica; e
(ii) analisar se há periculum in mora suficiente para justificar a concessão de tutela recursal que garanta a manutenção do regime da CPRB.
III. Razões de decidir
A decisão monocrática proferida pelo relator da ADI 7.633, em sede de controle de constitucionalidade, importa em revogação ou redução de benefícios fiscais e equivale, de forma indireta, à majoração tributária, nos termos da jurisprudência do STF, e por isso deve observar o princípio da anterioridade tributária e o princípio da vedação da tributação surpresa.
Em atenção ao princípio da segurança jurídica, foi proferida nova decisão pelo relator da ADI 7.633 assegurado aos contribuintes pelo menos mais sessenta dias para se adequarem à mudança de regimes fiscais. Consequentemente, deixou de existir periculum in mora ou urgência no caso concreto a justificar a concessão da medida liminar pleiteada.
Inexistência de urgência ou risco de dano irreparável que justifique a antecipação dos efeitos da tutela recursal, considerando a decisão superveniente no controle concentrado de constitucionalidade.
IV. Dispositivo e tese
Agravo de instrumento desprovido.
Tese de julgamento:
"1. A suspensão da eficácia de norma tributária em sede de controle de constitucionalidade deve observar os princípios da anterioridade nonagesimal e da segurança jurídica."
"2. A concessão de tutela recursal em matéria tributária exige comprovação inequívoca de periculum in mora e probabilidade do direito, não configurados no caso concreto."
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 195, § 6º; CTN, art. 150, III, “b”; Lei 14.784/2023.
Jurisprudência relevante citada: STF, RE 564225 AgR-EDv-AgR, Rel. Min. Alexandre de Moraes, j. 20/11/2019; STF, RE 1053254 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 26/10/2018.