Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017955-17.2020.4.03.6182

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: AGENCIA NACIONAL DE AVIACAO CIVIL - ANAC

APELADO: AMERICAN AIRLINES INC

Advogados do(a) APELADO: CARLA CHRISTINA SCHNAPP - SP139242-A, RICARDO BERNARDI - SP119576-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017955-17.2020.4.03.6182

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: AGENCIA NACIONAL DE AVIACAO CIVIL - ANAC

 

APELADO: AMERICAN AIRLINES INC

Advogados do(a) APELADO: CARLA CHRISTINA SCHNAPP - SP139242-A, RICARDO BERNARDI - SP119576-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de Apelação da Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC (ID 268365013) contra sentença (ID 268365012) que julgou procedentes os Embargos, opostos por American Airlines Inc., à Execução pela qual é exigida multa administrativa por infração às Condições Gerais de Transporte, afastando a cobrança de multa em virtude do reconhecimento da infração como de natureza continuada, havendo decisão transitada em julgado que já condenou a embargante pela infração. Condenada a ANAC em honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor da causa.

 

Em seu Apelo, a ANAC argumenta não se configurar a infração continuada, mas diversas infrações autônomas, devendo ser reformada a sentença para reconhecimento da exigibilidade da multa aplicada contra a empresa aérea.

 

Contrarrazões (ID 268365017).

 

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5017955-17.2020.4.03.6182

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: AGENCIA NACIONAL DE AVIACAO CIVIL - ANAC

 

APELADO: AMERICAN AIRLINES INC

Advogados do(a) APELADO: CARLA CHRISTINA SCHNAPP - SP139242-A, RICARDO BERNARDI - SP119576-A

OUTROS PARTICIPANTES:

  

 

 

V O T O

 

 

 

O caso concreto cinge-se à configuração ou não de infração continuada, alegando a apelante, em síntese, tratar-se de diversas infrações autônomas ao disposto pelo art. 302, III, alínea “u”, da Lei 7.565/86 – o Código Brasileiro de Aeronáutica, conforme abaixo se reproduz:

 

Art. 302. A multa será aplicada pela prática das seguintes infrações:

(...)

III - infrações imputáveis à concessionária ou permissionária de serviços aéreos:

(...)

u) infringir as Condições Gerais de Transporte, bem como as demais normas que dispõem sobre os serviços aéreos;

 

Oportuno reproduzir excerto da sentença que trata da conduta infracional:

 

“No caso, cumpre transcrever o respectivo relatório de fiscalização (pág.39/40 do id 42135946 e id 42135947):

 

“No dia 11/12/2012, o voo AA221 que partiria de Miami com destino a Recife foi cancelado por problemas técnicos. Parte dos passageiros foi reacomodada no voo de mesmo número que partiu no dia seguinte, 12/12/2012. Entretanto, 54 passageiros tiveram que ser reacomodados no voo AA 239, que também partiu em 12/12/2012, com destino a Salvador., onde os passageiros embarcariam em conexão para Recife. Ao chegarem a Salvador, na manhã do dia 13/12/2012, o grupo foi informado pela autuada que não havia mais conexão disponível em voos da empresa aérea parceira no Brasil e que, por isso, todos seriam acomodados em hotel, para embarque no voo de conexão para Recife no dia seguinte, 14/12/2012. Mas, conforme informação prestada à American Airiines pelos próprios passageiros, em 13/12/2012 ainda havia voos disponíveis para Recife em empresas congêneres como a Azul e a Avianca. Mesmo assim a empresa respondeu que, pela norma vigente, poderia optar entre reacomodá-los em voo de outra companhia ou em hotel até ter voo próprio ou de parceira, e que adotaria a segunda alternativa. Diante disso, parte do grupo aceitou a acomodação em hotel enquanto os demais se encaminharam à sala da ANAC para pedir apoio e informar o que se passava.

Para averiguar o que se passava o INSPAC Audir Mendes de Assunção Filho solicitou que o supervisor da American Airiines de serviço na ocasião, Sr.Marcelo, comparecesse à sala da ANAC para a prestação de esclarecimentos. A conversa, isolada dos passageiros, também tinha o objetivo de evitar o acirramento de ânimos daqueles que haviam se recusado a ir ao hotel. Durante o encontro o INSPAC mostrou ao supervisor o disposto no Art. 4º da Resolução 141, que determina que:

Art. 4º Em caso de atraso no aeroporto de escala ou de conexão por mais de 4 (quatro) horas, o transportador deverá oferecer as seguintes alternativas ao passageiro:

I - a reacomodação:

a) em voa próprio ou de terceiro, que ofereça serviço equivalente para o mesmo destino, na primeira oportunidade;

b) em voo próprio, a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro;

II - o reembolso:

a) integral, assegurado o retorno ao aeroporto de origem;

b) do trecho não utilizado, se o deslocamento já realizado aproveitar ao passageiro;

III - a conclusão do serviço por outra modalidade de transporte. (grifo nosso)

O supervisor da autuada concordou com o que o INSPAC esclarecera acerca da norma, mas informou que não tinha condições de atendê-la conforme estabelecido no caput do Art.4°; que sua autonomia lhe permitia apenas reacomodar os passageiros em empresa parceira (no caso, a GOL, que não tinha mais voos com destino a Recife no dia 13) ou hospedá-los em hotel até que houvesse disponibilidade de vagas em voo da empresa parceira. O INSPAC replicou solicitando ao supervisor da empresa que procurasse cumprir o que está previsto na Resolução 141.

Diante do INSPAC, o Sr. Marcelo entrou em contato com sua coordenação por telefone e comunicou que a ANAC estava instando a empresa a cumprir o que dispõe a Resolução 141. Em resposta, foi autorizado a perrnitir que os passageiros que desejassem comprassem bilhetes de outras companhias aéreas - para que viajassem a Recife ainda em 13/12/2012 para posterior reembolso, mas não recebeu autorização para que ele próprio adquirisse esses bilhetes.

Em face da situação, o INSPAC informou ao supervisor que a alternativa adotada pela empresa poderia não atender os passageiros que não dispusessem de recursos financeiros para a aquisição dos bilhetes naquele momento, e que todos os passageiros faziam jus ao direito garantido pela norma. Mesmo tendo concordado com o INSPAC, o Sr.Marcelo disse que aquela tinha sido a única solução disponibilizada pela coordenação da empresa.

O INSPAC pediu então que o supervisor entrasse em contato com todos os passageiros que já se encontravam nos hotéis e lhes oferecesse a mesma opção, posto que, a eles, a alternativa de comprar bilhetes de outras empresas não fora oferecida.

Apesar de o Sr. Marcelo ter entrado novamente em contato com a coordenação da autuada para informá-la da solicitação do INSPAC, a empresa se negou a atendê-la, alegando que os passageiros já estavam acomodados e descansando no hotel.

o INSPAC, por sua vez, alertou o supervisor da companhia aérea que as soluções dadas não atendiam a Resolução 141 e solicitou que a empresa apresentasse o plano de contingência contendo os detalhes das ações adotadas para cada passageiro. O plano entregue pela empresa encontra-se em anexo a este Relatório.

Resumindo, houve problemas técnicos que preveniram a realização o voo 221 da American Airllnes do dia 11/12/2012, com origem em Miaml e destino Recife. Parte dos passageiros embarcou em voo de mesmo número no dia seguinte e um grupo restante de 54 passageiros foi reacomodado no voo 239 da mesma empresa, também no dia seguinte, com destino a Salvador e posterior conexão para Recife.

Na chegada a Salvador, no dia 13/01/2012, não havia mais voos da empresa aérea GOL - parceira da American Airlines - para Recife. Mas, conforme apontado por passageiros, havia voos de outras empresas, como a Azul e a Avianca.

A autuada prestou assistência, como hospedagem e traslado de e para hotel, e deu permissão para que os próprios passageiros adquirissem bilhetes de outras companhias aéreas para Recife, para embarque ainda no dia 13/12/12, e posterior reembolso pela empresa, mas só o fez depois de instada pela ANAC e em desacordo com o que determina a legislação e sua norma complementar.

Diante dos fatos elencados, testemunhados e reportados pelos IN5PAC Audir Mendes de Assunção Filho e Rodrigo Cavalcanti Nunes Moraes, a empresa American Airlines descumpriu o disposto no caput do Art.40 da Resolução 141, de 9 de março de 2012. Destarte foram lavrados os Autos de Infração números 000126/2013 a 000144/2013, 000146/2013 a 000157/2013, e 000162/2013 a 000184/2013”

 

Verifica-se do relatório fiscal, que os relatos dos passageiros foram confirmados pelo supervisor da autuada, quando acionado pelo INSPAC:

 

"conforme informação prestada à American Airlines pelos próprios passageiros, em 13/12/2012 ainda havia voos disponíveis para Recife em empresas congêneres como a Azui e a Avianca. Mesmo assim a empresa respondeu que, pela norma vigente, poderia optar entre reacomodá-los em voo de outra companhia ou em hotel até ter voo próprio ou de parceira, e que adotaria a segunda alternativa"

(...)

"o supervisor da autuada concordou com o que o INSPAC esclarecera acerca da norma, mas Informou que não tinha condições de atendê-la conforme estabelecido no caput do Art.4°; que sua autonomia lhe permitia apenas reacomodar os passageiros em empresa parceira (no caso, a GOL, que não tinha mais voos com destino a Recife no dia 13) ou hospedá-los em hotel até que houvesse disponibilidade de vagas em voo da empresa parceira. O INSPAC replicou solicitando ao supervisor da empresa que procurasse cumprir o que está previsto na Resolução 141.

Diante do INSPAC, o Sr. Marcelo entrou em contato com sua coordenação por telefone e comunicou que a ANAC estava instando a empresa a cumprir o que dispõe a Resolução 141. Em resposta, foi autorizado a perrnitir que os passageiros que desejassem comprassem bilhetes de outras companhias aéreas - para que viajassem a Recife ainda em 13/12/2012 para posterior reembolso, mas não recebeu autorização para que ele próprio adquirisse esses bilhetes".

 

Logo, resta claro que a autuada não cumpriu com a obrigação prevista no inciso I, “a”, do art.4º da Resolução nº.141/2010, qual seja oferecer ao passageiro reacomodação em voo próprio ou de terceiro, em caso de atrasos no aeroporto de escala ou conexão por mais de 4 (quatro) horas, limitando-se a ofertar traslado e pernoite em hotel para os passageiros optantes por voo no dia seguinte ou reembolso para os passageiros que optassem por comprar bilhete de outra companhia.”

 

Em resumo, constata-se que as autuações se deram em razão do cancelamento do mesmo voo, aplicadas tantas multas quantos passageiros a reacomodar; em outras palavras, ilícitos de idêntica natureza apurados durante a mesma ação fiscalizatória. Semelhante ocorrência configura infração continuada, diversamente do pretendido pela apelante, devendo ser imposta meramente multa singular.

 

Nesse sentido:

 

ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INFRAÇÃO ADMINISTRATIVA CONTINUADA. APLICAÇÃO DE MULTA SINGULAR. POSSIBILIDADE. REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

1. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, há continuidade infracional quando diversos ilícitos de idêntica natureza são apurados durante mesma ação fiscal, devendo tal medida ensejar a aplicação de multa singular.

2. A alteração das conclusões adotadas pela Corte de origem, de modo a averiguar a presença dos requisitos necessários à configuração da infração continuada, bem como da ausência de demonstração do dolo múltiplo, demandaria novo exame do acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em recurso especial, conforme o óbice previsto na Súmula 7/STJ.

3. Agravo interno não provido.

(STJ, AgInt no AREsp 1.129.674/RJ, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª Turma, DJ 08.03.2021)

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. ANAC.  INFRAÇÃO. ART. 302, INC. III, DO CÓDIGO BRASILEIRO DE AERONÁUTICA. ÚNICA AÇÃO FISCAL. APLICAÇÃO DE 307 MULTAS. INFRAÇÃO CONTINUADA. RECONHECIMENTO. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO. AGRAVO PROVIDO.

1. Consta do Relatório de Fiscalização de n.º 78/2013/DAR/SAR/UR/SP que, durante auditoria técnica, “constatou-se que a aeronave PR-TAP foi operada por diversas vezes sem o cumprimento da ação requerida no parágrafo (f) (f) da diretriz de aeronavegabilidade AD 2010-12-01, emitida pela Federal Aviation Administration”, dando origem à abertura de 307 autos de infração (Processo Administrativo Sancionador – PAS), correspondendo ao número de operações realizadas pela aeronave em desacordo com o quanto determinado na mencionada diretriz. Assim, foi aplicada a pena de multa, por infração ao disposto no art. 302, inc. III, do Código Brasileiro de Aeronáutica, no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais) para cada uma das 307 operações realizadas com a aeronave PR-TAP, resultando no montante de R$ 2.149.000,00 (dois milhões, cento e quarenta e nove mil reais).

2. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de reconhecer como infração continuada aquelas hipóteses em que a Administração, no exercício de seu poder de polícia, constata, numa mesma atuação fiscalizatória, a ocorrência de diversas infrações da mesma natureza; resultando daí a possibilidade de aplicação de multa singular, afastando-se, por conseguinte, a cobrança cumulada da totalidade das infrações constadas.

3. A Lei n.º 9.873/1999, que trata da prescrição para o exercício de ação punitiva da Administração Pública Federal, traz, em seu art. 1º, o instituto da infração continuada, dispondo que “Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado”.

4. Agravo de instrumento provido.

(TRF3, AI 5013034-68.2019.4.03.0000/SP, Rel. Des. Fed. Nelton dos Santos, 3ª Turma, DJ 02.06.2020)

 

Impõe-se, portanto, a manutenção da sentença.

 

Face ao exposto, nego provimento à Apelação, conforme fundamentação.

 

É o voto.



E M E N T A

 

 

ADMINISTRATIVO. ANAC. MULTA ADMINISTRATIVA. CONDIÇÕES GERAIS DE TRANSPORTE.CANCELAMENTO DE VOO. INFRAÇÃO CONTINUADA. CONFIGURAÇÃO.

1. O caso concreto cinge-se à configuração ou não de infração continuada, alegando a apelante, em síntese, tratar-se de diversas infrações autônomas ao disposto pelo art. 302, III, alínea “u”, da Lei 7.565/86 – o Código Brasileiro de Aeronáutica.

2. Constata-se que as autuações se deram em razão do cancelamento do mesmo voo, aplicadas tantas multas quantos passageiros a reacomodar; em outras palavras, ilícitos de idêntica natureza apurados durante a mesma ação fiscalizatória. Semelhante ocorrência configura infração continuada, diversamente do pretendido pela apelante, devendo ser imposta meramente multa singular.

3. Apelo improvido.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram o Des. Fed. WILSON ZAUHY e o Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN. Ausentes, justificadamente, por motivo de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN) e a Des. Fed. LEILA PAIVA (substituída pelo Juiz Fed. Conv. RAPHAEL DE OLIVEIRA). , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARCELO SARAIVA
DESEMBARGADOR FEDERAL