Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000290-60.2022.4.03.6006

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: ZENI TEREZINHA SENKOSKI

Advogado do(a) APELANTE: FAUZE WALID SELEM - MS15508-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000290-60.2022.4.03.6006

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: ZENI TEREZINHA SENKOSKI

Advogado do(a) APELANTE: FAUZE WALID SELEM - MS15508-A

APELADO: ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DE MUNDO NOVO, INSPETOR DA RECEITA FEDERAL DE MUNDO NOVO - MS, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de ação anulatória de ato administrativo e subsidiariamente pedido de perdas e danos c/c pedido de tutela de urgência ajuizada por ZENI TEREZINHA SENKOSKI, em face da União, objetivando a restituição do veículo de sua propriedade (CAMINHONETE CHEVROLET S1O LTZ DD4, ano/modelo 2013/2013, placas AXL3G90, presta, chassi9BG148MH0DC493786), apreendido por agentes públicos e encaminhado à Inspetoria da Receita Federal do Brasil em Mundo Novo/MS, em razão da condução de mercadorias estrangeiras sem a regular comprovação de introdução no território brasileiro.

A União, devidamente citada, contestou o feito (Núm. 304965411).

 Em decisão de ID 304965393, é indeferido o pedido de tutela provisória de urgência, por não serem observadas a probabilidade do direito e o perigo da demora ou o risco ao resultado útil do processo.

   Em sentença proferida em 24 de agosto de 2024, o D. Juízo de origem julgou improcedentes os pedidos, com resolução do mérito, na forma do disposto no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, com a consequente condenação da parte autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor do advogado do réu.

 A parte autora insurge-se contra a sentença, alegando em síntese, que não há prova qualquer do envolvimento ou responsabilidade da proprietária do veículo com acontecimentos posteriores à apreensão do veículo, ao inferior que os fundamentos da sentença não seriam aplicáveis à apelante. Alega se tratar de ato administrativo ilegal, por inexistir prova de qualquer responsabilidade ou participação dos fatos de 14/10/2020.

Requer, ao final, a reforma da sentença, a fim de que seja julgada procedente a ação, para declarar a nulidade do ato administrativo de perdimento do veículo de sua propriedade a CAMINHONETE CHEVROLET S10 LTZ DD4 2013/2013 AXL3G90,PRETA, chassi 9BG148MH0DC493786, referente o processo administrativo nº 10142.722457/2020-60, subsidiariamente em caso do bem já ter sido leiloado, o pagamento de reparação material a título de perdas e danos no valor de R$ 83.563,00 (oitenta e três mil e quinhentos e sessenta e três reais), equivalente ao valor de avaliação do veículo a época da apreensão, e condenar a requerida ao pagamento das custas processuais, das verbas sucumbenciais e dos honorários advocatícios, que devem ser fixados nos termos do artigo 85 do Código de Processo Civil. (ID. 304965423)

   Com contrarrazões da UNIÃO (ID. 304965430), os autos subiram a esta Eg. Corte e vieram-me conclusos.

    É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000290-60.2022.4.03.6006

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY

APELANTE: ZENI TEREZINHA SENKOSKI

Advogado do(a) APELANTE: FAUZE WALID SELEM - MS15508-A

APELADO: ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DE MUNDO NOVO, INSPETOR DA RECEITA FEDERAL DE MUNDO NOVO - MS, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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V O T O

 

 

A questão discutida nos autos cinge-se com a apreensão e a aplicação da pena de perdimento de veículo envolvimento no transporte de mercadorias de procedência estrangeira desacompanhadas de documento de regularidade fiscal.

Do Tema 1.041, do STJ

O Superior Tribunal de Justiça, quando da fixação do Tema Repetitivo n.º 1.041, determinou o sobrestamento de todos os feitos que tivesse por objeto da lide a discussão sobre a sujeição do transportador (proprietário ou possuidor) à pena de perdimento de veículo terrestre, de carga ou de passageiros, em razão de ilícitos praticados por cidadãos que transportam mercadoria sujeitas à pena de perdimento. No entanto, na sessão de julgamento realizada aos 09.06.2021, restou determinada a desafetação do Recurso Especial n.º 1.818.587, que tratava do exame da responsabilidade do proprietário/locador do veículo utilizado pelo locatário para cometimento de infração aduaneira atinente ao transporte de mercadorias provenientes do exterior irregularmente introduzidas no território nacional, em razão da ausência de similaridade com a questão objeto do Tema 1.041, referente à aplicação da sanção à empresa prestadora de serviços de transporte de pessoas ou de carga pelos ilícitos fiscais praticados por seus passageiros.

Em assim sendo, uma vez que a discussão junto ao Colendo Superior Tribunal de justiça trata da aplicação da pena de perdimento a veículos de empresas transportadores, sejam elas de mercadoria ou passageiros, entendo que a circunstância jurídica do Tema não é aplicável no caso aqui apreciado.

Da Apreensão

A apelante é proprietária do veículo apreendido pelos agentes públicos na cidade de Novo Mundo/MS, conduzido pelo condutor AGNALDO DE SOUZA SENKOSKI, seu filho, que transportava mercadoria de procedência estrangeira que não se enquadráveis no conceito de bagagem de viajantes, revelando destinação comercial irregular.

Consta dos autos que o veículo foi apreendido em 14 de outubro de 2020, consoante do Auto de Infração e Apreensão de Veículo n. 0147700-03773/2021, a saber:

"Em 14/10/2020, na RODOVIA MS 295, no município de IGUATEMI/MS, agentes da POLÍCIA MILITAR/DEPARTAMENTO DE OPERAÇÕES DA FRONTEIRA - DOF/MS, abordaram o veículo marca/modelo CHEVROLET/S10 LTZ DD4, placas AXL3G90, que era conduzido por AGNALDO DE SOUZA SENKOSKI, CPF 028.860.299-47, acompanhado de LORENI PEREIRA MACHADO, CPF 904.911.909-30.

Durante a vistoria, os agentes constataram o transporte de mercadorias de procedência estrangeira não enquadráveis no conceito de bagagem de viajantes e que revelam destinação comercial. Em entrevista, o condutor relatou que comprou as mercadorias na cidade paraguaia de Pindoty Porã e as levaria até a cidade de Piracicaba/SP. Como não foi apresentada documentação comprobatória da regular importação ou da aquisição no mercado nacional, as mercadorias e o veículo foram retidos mediante a lavratura da OCORRÊNCIA No 987/2020 e encaminhados para esta Alfândega." (Núm. 247357071, p. 3).

Pois bem.

Acerca da legislação aplicável à hipótese, cumpre consignar o seguinte.

O Decreto-Lei nº 37/66, que regulamenta a administração das atividades aduaneiras e a fiscalização, prevê em seu artigo 96, de forma geral, acerca da pena de perdimento, verbis:

Art. 96 - As infrações estão sujeitas às seguintes penas, aplicáveis separada ou cumulativamente:

I - perda do veículo transportador;

II - perda da mercadoria;

III - multa;

IV - proibição de transacionar com repartição pública ou autárquica federal, empresa pública e sociedade de economia mista.

Já o artigo 104, do mesmo Diploma Legal, prevê as situações concretas ensejadoras da aplicação do perdimento do veículo a saber:

Art.104 - Aplica-se a pena de perda do veículo nos seguintes casos:

(...)

V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção;

Também dispõe sobre a pena de perdimento, o Decreto nº 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro), em seu art. 688, inciso V, § 2º:

Art. 688. Aplica-se a pena de perdimento do veículo nas seguintes hipóteses, por configurarem dano ao Erário (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 104; Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, art. 24; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 75, § 4º):

(...)

V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se pertencente ao responsável por infração punível com essa penalidade;

(...) § 2 Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, o na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito.

Quanto à responsabilidade do proprietário de veículo, estabelece o art. 674 do Decreto n.º 6.759/2009 (Regulamento Aduaneiro):

Art. 674. Respondem pela infração (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95):

I - conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática ou dela se beneficie;

II- conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorrer do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes;

(...)

Da leitura dos artigos acima transcritos, observa-se que a pena de perdimento somente deve ser aplicada quando for comprovada a má-fé do proprietário.

Também, nesse sentido, é a Súmula nº 138 do antigo Tribunal Federal de Recursos: (a) pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário, na prática do ilícito.

            Sobre a atuação da apelante, cito a fundamentação da sentença impugnada:

"In casu, aduz a requerente, na presente demanda: i) que é proprietária do veículo; ii) que é terceira de boa-fé, sem participação no ilícito; iii) que a apreensão é desproporcional. 

Porém, depreende-se dos fatos narrados na petição inicial, que o veículo da parte autora era conduzido por pessoa de sua família - c.f. os sobrenomes da autora (ZENI TEREZINHA SENKOSKI) e do condutor (AGNALDO DE SOUZA SENKOSKI) no id. 247375071 - Pág. 3 -, quando foi abordado por agentes federais transportando mercadorias estrangeiras sem comprovação de sua regular importação ou de aquisição no território nacional.

Apesar da tese sustentada pela parte demandante, no sentido de que se trata de ato administrativo ilegal, observo que autos contêm inequívocas evidências de que a proprietária tinha conhecimento dos fatos e das consequências da irregular importação de produtos, sobretudo quando se verifica que a demandante e o condutor do veículo, o Sr. AGNALDO DE SOUZA SENKOSKI, são parentes. Além disso,  o Senhor Agnaldo ostenta histórico de inúmeras infrações à legislação aduaneira, conforme muito bem exposto na defesa da ré, afastando-se, desse modo, a presunção de boa-fé da autora.

Na esteira decisão que indeferiu a liminar, ressalto que o Auto de Infração e Apreensão n. 10142.722457/2020-60, acostado ao id. 247375071, p.1, demonstra que o veículo foi abordado na Rodovia MS 295, em Iguatemi/MS, pelo DOF/MS e encaminhado à Inspetoria da Receita Federal, sendo que a relação de bens apreendidos (c.f. id. 247375071, p. 18) evidencia, por si só, a evidente finalidade comercial da ação ilícita, porquanto foram apreendidos 100 aparelhos celulares, 400 (quatrocentos) fones de ouvido, dentre outros bens.

Desse modo, as circunstâncias que envolveram a apreensão do veículo, dentre outros elementos desfavoráveis no contexto fático, elidem a boa-fé da proprietária e seu desconhecimento dos fatos, justificando sua responsabilização e a incidência da pena de perdimento, posto que inegavelmente contribuiu para o cometimento da infração.

No que tange à alegação de desproporcionalidade do valor do veículo em cotejo com o montante das mercadorias, anoto que não há qualquer afronta ao princípio da proporcionalidade e razoabilidade, porque a penalidade de perdimento prevista na legislação aduaneira deve ser analisada somada a outros aspectos valorativos de cada caso, notadamente à gravidade do fato, a reiteração da conduta e a boa-fé dos envolvidos, bem como deve se ter em vista que o objetivo maior da pena de perdimento é punir os infratores, retirando deles o instrumento que facilita as ações ilegais e impedir suas reincidentes infrações à legislação.

Necessário, portanto, se conjugar o princípio da proporcionalidade com outros elementos, de forma a bem conformar a condição para sua aplicabilidade no exame da pena de perdimento de veículo flagrado na circunstância de conduzir mercadorias estrangeiras desacompanhadas de regular documentação (c.f. AgInt no AREsp 863.425/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2019, DJe 30/05/2019).

Portanto, abstraindo o critério apenas matemático, justifica-se a aplicação do perdimento de veículo no presente caso, uma vez caracterizada a responsabilidade da proprietária do veículo apreendido, de forma a evitar a reiteração da conduta, pelo menos, com o mesmo veículo.

Por conseguinte, na hipótese vertente, todos os aspectos valorativos do caso e as circunstâncias que envolvem a apreensão do veículo, dentre outros elementos desfavoráveis no contexto fático, não comprovam de pronto a boa-fé da proprietária, justificando a incidência da pena de perdimento, posto que, inegavelmente, o veículo de sua propriedade foi utilizado para cometimento da infração (c.f. TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001103-90.2022.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 22/05/2023, Intimação via sistema DATA: 24/05/202; TRF3. ACÓRDÃO 5000874-04.2020.4.03.6005. Terceira Turma. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA. Data da publicação: 05/03/2021).

Desse modo, a apreensão do veículo da autora e seu posterior perdimento são legais, razão pela qual os pedidos formulados devem ser julgados improcedentes."

(Núm. 304965416).

Vale ressaltar que a parte Autora não trouxe aos autos qualquer elemento ou prova que pudesse ilidir o auto de infração, não se desobrigando, portanto, do ônus que lhe incumbia na forma do artigo 3732, inciso I, do CPC/15.

A tese de boa-fé ficou afastada, portanto, em face da presença suficiente de indícios colhidos no momento da fiscalização, de que o veículo estrangeiro trafegava no país com finalidades comerciais, com anuência do proprietário, além da constatação de habitualidade pelo condutor.

Assim configurada a culpa in vigilando da Apelante, resta justificada sua responsabilidade, com a consequente confirmação da pena de perdimento, posto que inegavelmente contribuiu para o cometimento da infração.

Em consonância com o entendimento exposto, colaciono os seguintes precedentes desta Eg. Corte:

PROCESSO CIVIL - APELAÇÃO CÍVEL - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – PENA DE PERDIMENTO DE VEÍCULO UTILIZADO NA DISTRIBUIÇÃO DE CIGARROS IMPORTADOS – INDEPENDÊNCIA ENTRE AS INSTÂNCIAS PENAL E ADMINISTRATIVA – EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL – NULIDADE DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO – PRINCÍPIO DO INFORMALISMO – PUBLICAÇÃO DE EDITAL -  SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.

– A documentação acostada aos autos comprova que o marido da autora/apelante foi processado e condenado criminalmente por transportar ilegalmente cigarros estrangeiros importados clandestinamente. A pena de perdimento do veículo utilizado no transporte foi reformada com o julgamento da apelação.

– Apesar da determinação do juízo criminal liberando o veículo, a devolução do bem não foi possível porque, no âmbito administrativo, também foi aplicada a sanção de perdimento.

– Face a independência das instâncias cível, penal e administrativa, não constitui ilegalidade o ato que, após regular procedimento administrativo, declara o perdimento de veículo utilizado na prática de transporte ilegal de mercadoria estrangeira (art. 104 do Decreto-lei nº 37/66).

– Não houve nulidade do procedimento administrativo, pois apesar de a carta com aviso de recebimento ter sido enviada para endereço equivocado, sobreveio a intimação por edital, autorizada pelo art. 27, § 1º, do Decreto-Lei nº 1.455/76 e pelo art. 774 do Decreto nº 6.759/09. Efetivada a comunicação por edital, considera-se sanada eventual falha anterior, pois no procedimento administrativo vigora o princípio do informalismo.

– Honorários advocatícios majorados (art. 85, § 11, CPC).

– Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001125-74.2020.4.03.6117, Rel. Desembargador Federal RUBENS ALEXANDRE ELIAS CALIXTO, julgado em 04/10/2024, DJEN DATA: 09/10/2024)

 

DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR.  APELAÇÃO DESPROVIDA.

1.  A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da pena de perdimento do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal.

2. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal deve levar em conta, na análise do caso concreto, a eventual reincidência na conduta infracional a justificar o afastamento da presunção de boa-fé do proprietário, assim como a gravidade do fato e proporcionalidade entre o valor da mercadoria e do veículo apreendidos. 

3. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

4. É no mesmo sentido a jurisprudência do STJ e desta C. Turma (AgInt no AREsp 863.425/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2019, DJe 30/05/2019 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000367-92.2019.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 04/03/2021, Intimação via sistema DATA: 09/03/2021 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000280-61.2018.4.03.6004, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 02/06/2020, Intimação via sistema DATA: 05/06/2020).

5. No caso vertente, não há dúvida quanto à utilização do veículo da apelante para a prática de descaminho e contrabando de mercadoria estrangeira. Cinge-se a controvérsia à possibilidade de aplicação da pena de perdimento à luz da alegada boa-fé da proprietária.  

6. Os atos da Administração Pública gozam da presunção de veracidade e legitimidade, de forma que caberia à parte impetrante demonstrar, por meio de prova inequívoca e pré-constituída, a existência de fato capaz de infirmá-la.  Ao contrário, apenas sustenta que emprestou o veículo para terceiro — Tais Pedroso Neves — empreender viagem ao Paraguai e não estava presente na data dos fatos. Não esclarece, entretanto, a natureza da relação mantida com a condutora e nem as circunstâncias do suposto empréstimo. Não consta dos documentos juntados que a Sra. Tais tenha assumido propriedade exclusiva das mercadorias transportadas e nem confirmado o alegado empréstimo do bem que conduzia. 

7. Tampouco se vislumbra insignificância ou desproporcionalidade entre o valor das mercadorias — R$22.088,86 — e do veículo — R$28.058,00.   

8. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002197-39.2023.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 23/08/2024, Intimação via sistema DATA: 27/08/2024)

 

ADMINISTRATIVO. AÇÃO ORDINÁRIA. ADUANEIRO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. NÃO COMPROVAÇÃO DE BOA FÉ. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. AFASTADO. APELAÇÃO DESPROVIDA.

- A legislação aduaneira (artigos 94, 95, 96 e 104 do Decreto-Lei 37/66 e artigos 674 e 688 do Decreto 6.759/2009), prevê que o proprietário e o consignatário do veículo respondem pela infração decorrente do exercício de atividade própria realizada por ele, ou de ação ou omissão de seus tripulantes, com possibilidade de aplicação da pena de perdimento.

- A aplicação da pena de perdimento não é condicionada, pela legislação aduaneira, à comprovação da intenção ou do dolo do proprietário do veículo em lesar o Fisco, podendo ser a responsabilidade tanto por dolo quanto por culpa, nos termos do disposto no Código Tributário Nacional em seu artigo 136: “Salvo disposição de lei em contrário, a responsabilidade por infração da legislação tributária independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, natureza e extensão dos efeitos do ato.”

- Todos os aspectos valorativos do caso e as circunstâncias que envolvem a apreensão do veículo, dentre outros elementos desfavoráveis no contexto fático, não comprovam a boa-fé do proprietário, justificando a incidência da pena de perdimento, posto que, inegavelmente, o veículo de sua propriedade foi utilizado no transporte de mercadorias sem a devida documentação fiscal. Os argumentos trazidos nas razões de apelação não são suficientes a afastar a pena aplicada, e tampouco fazer incidir o princípio da proporcionalidade a fim de que o veículo seja liberado. Precedentes.

- Majoração dos honorários advocatícios em 1% sobre o valor anteriormente arbitrado.

- Recurso de apelação não provido.

(TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003483-61.2019.4.03.6112, Rel. Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO, julgado em 12/07/2024, Intimação via sistema DATA: 22/07/2024)

 

DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. ILÍCITO FISCAL. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. HABITUALIDADE. AFASTAMENTO DA PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO PROPRIETÁRIO E DO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1.  A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da pena de perdimento do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal.

2. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal deve levar em conta, na análise do caso concreto, a eventual reincidência na conduta infracional a justificar o afastamento da presunção de boa-fé do proprietário, assim como a gravidade do fato e proporcionalidade entre o valor da mercadoria e do veículo apreendidos. 

3. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

4. É no mesmo sentido a jurisprudência do STJ e desta C. Turma (AgInt no AREsp 863.425/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2019, DJe 30/05/2019 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000367-92.2019.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 04/03/2021, Intimação via sistema DATA: 09/03/2021 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000280-61.2018.4.03.6004, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 02/06/2020, Intimação via sistema DATA: 05/06/2020).

5. No caso vertente, é fato incontroverso que já estiveram envolvidos em ilícito aduaneiro tanto o veículo quanto o condutor (pai do proprietário), além do próprio impetrante, quando conduzia veículo de propriedade de sua mãe. A habitualidade afasta a presunção de boa-fé e a incidência do princípio da proporcionalidade, nos termos da jurisprudência e da legislação analisadas.  

6. Não se verifica qualquer ilegalidade na destinação do bem em leilão antes do esgotamento das vias administrativa e judicial. Ao contrário, a Resolução CONTRAN 331/2009 a que alude o apelante prevê que o veículo que acusar pendência administrativa ou judicial terá sua destinação definida em razão do problema detectado, reforçando a regularidade do procedimento adotado pelo fisco.  

7. Apelação desprovida.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002678-79.2021.4.03.6002, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 08/08/2024, Intimação via sistema DATA: 09/08/2024)

Assim sendo, o pleito recursal é de ser rechaçado, sendo de rigor a manutenção da sentença.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação supra.

Vencida a Autora tanto em primeira como em segunda instância, sujeita-se ao acréscimo de honorários de advogado de sucumbência recursais de que trata o § 11 do art. 85 do CPC/15. Determino, portanto, a majoração do saldo final de honorários de advogado de sucumbência fixados pelo Juízo de origem, em um por cento, observada a suspensão da exigibilidade na forma do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil.

É como voto.

 



E M E N T A

 

 

APELAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. ADUANEIRO.  MERCADORIA IMPORTADA SUJEITA À PENA DE PERDIMENTO. VEÍCULO TRANSPORTADOR. MÁ-FÉ DO PROPRIETÁRIO. POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DA PENA DE PERDIMENTO. CULPA IN VIGILANDO. MATIDA SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.

1. A controvérsia travada nos autos com a legalidade da apreensão e aplicação da pena de perdimento de veículo envolvido no transporte de mercadorias de procedência estrangeira desacompanhadas de documento de regularidade fiscal, de propriedade da empresa locadora autora.

2. Ausência de correspondência jurídica com a matéria discutida no Tema 1041 do C. Superior Tribunal de Justiça, razão pela qual, afigura-se inaplicável ao caso o sobrestamento deste feito.

3. A análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) denota que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal (importação irregular de mercadorias), somente deve ser aplicada ao veículo transportador se houver prova de que o proprietário do veículo apreendido concorreu de alguma forma para o ilícito fiscal.

4. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

5. Parte Autora que não trouxe aos autos qualquer elemento ou prova que pudesse ilidir o auto de infração, não se desobrigando, portanto, do ônus que lhe incumbia na forma do artigo 3732, inciso I, do CPC/15.

6. A tese de boa-fé ficou afastada, portanto, em face da presença suficiente de indícios colhidos no momento da fiscalização, de que o veículo estrangeiro trafegava no país com finalidades comerciais, com anuência do proprietário, além da constatação de habitualidade no cometimento da infração pelo condutor.

7. Configurada a culpa in vigilando da Apelante, resta justificada sua responsabilidade, com a consequente confirmação da pena de perdimento, posto que inegavelmente contribuiu para o cometimento da infração.

8. Precedentes.

9. Recurso de apelação a que nega provimento.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à apelação. Vencida a Autora tanto em primeira como em segunda instância, sujeita-se ao acréscimo de honorários de advogado de sucumbência recursais de que trata o § 11 do art. 85 do CPC/15. Determinar, portanto, a majoração do saldo final de honorários de advogado de sucumbência fixados pelo Juízo de origem, em um por cento, observada a suspensão da exigibilidade na forma do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil, nos termos do voto do Des. Fed. WILSON ZAUHY (Relator), com quem votaram o Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN e o Juiz Fed. Conv. RAPHAEL DE OLIVEIRA. Ausentes, justificadamente, por motivo de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN) e a Des. Fed. LEILA PAIVA (substituída pelo Juiz Fed. Conv. RAPHAEL DE OLIVEIRA) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
WILSON ZAUHY
DESEMBARGADOR FEDERAL