AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5009784-51.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
AGRAVANTE: RONALDO DAL FABBRO, CARMEN SHEILA CASTRO CORDEIRO
Advogado do(a) AGRAVANTE: PERCIVAL JOSE BARIANI JUNIOR - SP252566-A
AGRAVADO: FABRÍCIO BOTELHO MENNA DE OLIVEIRA, BRUNO GANEM VERSIANI, COORDENADOR DO GRUPO NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO DA RECEITA FEDERAL, PRESIDENTE DA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA PATRIMONIAL, UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5009784-51.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: RONALDO DAL FABBRO, CARMEN SHEILA CASTRO CORDEIRO Advogado do(a) AGRAVANTE: PERCIVAL JOSE BARIANI JUNIOR - SP252566-A AGRAVADO: FABRÍCIO BOTELHO MENNA DE OLIVEIRA, BRUNO GANEM VERSIANI, COORDENADOR DO GRUPO NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO DA RECEITA FEDERAL, PRESIDENTE DA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA PATRIMONIAL, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Trata-se de embargos de declaração opostos por RONALDO DAL FABBRO e CARMEN SHEILA CASTRO CORDEIRO em face de acórdão deste colegiado. Em síntese, a parte embargante afirma que o julgado padece de omissão. Por isso, pede que seja sanado o problema que indica. Foram apresentadas contrarrazões. Os autos vieram conclusos. Memoriais apresentados pela parte-embargante. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5009784-51.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO AGRAVANTE: RONALDO DAL FABBRO, CARMEN SHEILA CASTRO CORDEIRO Advogado do(a) AGRAVANTE: PERCIVAL JOSE BARIANI JUNIOR - SP252566-A AGRAVADO: FABRÍCIO BOTELHO MENNA DE OLIVEIRA, BRUNO GANEM VERSIANI, COORDENADOR DO GRUPO NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO DA RECEITA FEDERAL, PRESIDENTE DA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA PATRIMONIAL, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Exmo. Desembargador Federal Carlos Francisco (Relator): Nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração podem ser opostos contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão, e corrigir erro material. E, conforme dispõe o art. 1.025 do mesmo CPC/2015, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade. Embora essa via recursal seja importante para a correção da prestação jurisdicional, os embargos de declaração não servem para rediscutir o que já foi objeto de pronunciamento judicial coerente e suficiente na decisão recorrida. Os efeitos infringentes somente são cabíveis se o julgado tiver falha (em tema de direito ou de fato) que implique em alteração do julgado, e não quando desagradar o litigante. Por força do art. 1.026, §§2º e 3º, do CPC/2015, se os embargos forem manifestamente protelatórios, o embargante deve ser condenado a pagar ao embargado multa não excedente a 2% sobre o valor atualizado da causa (elevada a até 10% no caso de reiteração), e a interposição de qualquer recurso ficará condicionada ao depósito prévio do valor da multa (à exceção da Fazenda Pública e do beneficiário de gratuidade da justiça, que a recolherão ao final). E a celeridade e a lealdade impõem a inadmissibilidade de novos embargos de declaração se os 2 anteriores forem considerados protelatórios. No caso dos autos, a parte-embargante sustenta que o julgado padece de omissão, pois não se extrai de seu teor justificativa apta a afastar a alegação da ausência de qualquer autorização judicial específica para a quebra de sigilo bancário e/ou telemático dos embargantes. Elenca seus argumentos e afirma que a análise da questão é imprescindível para o correto deslinde do feito, em especial por possuir o condão de alterar o entendimento adotado quando da prolação do v. acórdão (art. 489, § 1º, inciso IV, do CPC). Ressalta a finalidade de prequestionamento. A decisão recorrida tem o seguinte conteúdo: “No presente caso, nenhuma das partes trouxe qualquer argumento apto a infirmar o entendimento já manifestado na decisão que apreciou o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso. Passo a transcrever os fundamentos da decisão por mim lavrada: “Embora o acesso à prestação jurisdicional tenha conteúdo de garantia fundamental (art. 5º, XXXV, da Constituição), permitindo a judicialização de controvérsias envolvendo atos da administração pública, a separação de poderes e as legítimas competências conferidas às autoridades administrativas impõem limites à apreciação judicial. O Poder Judiciário deve analisar a validade jurídica de aspectos formais (notadamente as garantias do devido processo legal) de feitos administrativos, mas o mérito de decisões administrativas somente pode ser controlado se houver violação ao postulado da proporcionalidade (ou da razoabilidade), ou se o julgamento administrativo transgredir os parâmetros da legalidade de modo claro, objetivo ou manifesto. Se a decisão administrativa for compatível com o ordenamento jurídico constitucional e infraconstitucional, e congruente com as provas dos autos, o magistrado deve respeitar as interpretações e as avaliações feitas pela autoridade administrativa competente. Como exemplo, trago à colação os seguintes julgados do E.STJ: ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REITOR DE UNIVERSIDADE FEDERAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR (PAD). PENA DE DEMISSÃO. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. IMPARCIALIDADE DOS MEMBROS DA COMISSÃO DE PAD QUE PARTICIPARAM DE OUTRAS COMISSÕES. CONTROLE JURISDICIONAL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. EXAME DA REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO E DA LEGALIDADE DO ATO. IMPOSSIBILIDADE DE INCURSÃO DO MÉRITO DO ATO ADMINISTRATIVO. FUNDAMENTAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. 1. Processo administrativo disciplinar (PAD) que aplicou penalidade de demissão ao impetrante, professor e ex-Reitor de Universidade Federal, por concluir que o impetrante valeu-se do cargo que ocupava junto à Universidade para lograr proveito pessoal ou de outrem, em detrimento da dignidade da função pública, ao assinar contrato com o Governo do Distrito Federal e subcontratos com Fundações ligadas à Universidade, utilizadas em desvio de finalidade, para que recursos do Distrito Federal fossem destinados a particulares, sem a realização de licitação. 2. O impetrante respondeu a quatro PADs por irregularidades constatadas ao tempo em que foi Reitor, sendo cada qual decorrente de um Relatório de Demandas Especiais (RDE) elaborado pela CGU (Controladoria-Geral da União). Embora os fatos sejam conexos e pudessem ser apurados em um único PAD, foram agrupados em 4 PADs por uma questão de eficiência, operando-se a interrupção da prescrição relativa a cada grupo de fatos com a abertura do respectivo PAD. Art. 142, parágrafo 3º, da Lei 8.112/90. 3. Não há parcialidade de membro da Comissão Processante apenas por compor outra Comissão Processante, que apura outros fatos pelos quais é investigado o mesmo servidor público. Precedente: MS 21859. 4. O exame da prova produzida no PAD foi feito de forma fundamentada pela autoridade impetrada, que concluiu pela participação dolosa do impetrante nos atos a ele imputados a partir dos elementos de prova indicados e sopesados no Relatório Final da Comissão processante, adotado pela autoridade impetrada. 5. O servidor acusado no processo administrativo disciplinar defende-se dos fatos a ele imputados e não da tipificação legal relacionada. O valimento do cargo (art. 117, IX) ou a improbidade administrativa já levariam por si só à imposição da penalidade de demissão (art. 132, IV e XIII, da Lei 8.112/90), não havendo que se falar em nulidade se não houve prejuízo à ampla defesa do impetrante. 6. A avaliação da gravidade da infração efetuada em sede de Processo Administrativo Disciplinar, se não ultrapassa a esfera do proporcional e do razoável, como nos presentes autos, não se sujeita à revisão judicial. 7. Ordem denegada. (MS 21.773/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 23/10/2019, DJe 28/10/2019) ADMINISTRATIVO. PROCESSO DISCIPLINAR. INCURSÃO NO MÉRITO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE. PENA APLICADA. PROPORCIONALIDADE. PARÂMETROS. MAGISTRADO. CONDUTA INCOMPATÍVEL COM A DIGNIDADE, HONRA E DECORO DAS FUNÇÕES. SANÇÃO. ADEQUAÇÃO. 1. No controle jurisdicional do processo administrativo, a atuação do Poder Judiciário limita-se ao campo da regularidade do procedimento, bem como à legalidade do ato, não sendo possível nenhuma incursão no mérito administrativo a fim de aferir o grau de conveniência e oportunidade. 2. É firme o entendimento de que é possível o exame da penalidade imposta, acerca da proporcionalidade e da razoabilidade na aplicação da pena, já que estaria relacionada com a própria legalidade do ato administrativo. 3. Nos termos do art. 2º da Lei n. 9.784/1999, a Administração obedecerá, entre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa e contraditório, devendo os referidos postulados ser observados inclusive na aplicação dos atos sancionatórios. 4. Especificamente em relação à proporcionalidade, alguns parâmetros devem ser adotados, sendo três as balizas a serem observadas: i) adequação - verificando-se se a medida adotada é eficaz para alcançar o resultado pretendido; ii) necessidade - devendo ser observado se o fim almejado pode ser atingido por meio menos gravoso ou oneroso; iii) proporcionalidade em sentido estrito - consubstanciada na relação custo-benefício, ponderando-se se a providência acatada não irá sacrificar bem de categoria jurídica mais elevada do que aquele que se pretende resguardar. 5. Do magistrado exige-se comportamento ético, moral, ilibado e probo tanto na vida pública como na particular, devendo agir sempre de forma compatível com a relevante função que exerce, conforme inteligência do Código de Ética da Magistratura, aprovado pelo Conselho Nacional de Justiça em agosto de 2008, que estabeleceu preceitos complementares aos deveres funcionais dos juízes que emanam da Constituição Federal, do Estatuto da Magistratura e das demais disposições legais. 6. Hipótese em que mostra-se correta a aplicação da pena de aposentadoria compulsória com proventos proporcionais à magistrada ante a prática de conduta gravísssima, incompatível com a dignidade, honra e decoro de suas funções, qual seja, a determinação de busca e apreensão de armas que estariam em poder, supostamente, de um morador do condomínio no qual ela residia, sem provocação do Ministério Público ou de autoridade policial, diligência que ela conduziu pessoalmente, e, ainda, o confisco de câmera fotográfica e a voz de prisão dada à empregada doméstica da residência. Aplicação do art. 56, II, da LC 73/1979. 7. Recurso desprovido. (RMS 33.671/RJ, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, Rel. p/ Acórdão Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/02/2019, DJe 14/03/2019) Ressalte-se que a análise dos pontos elencados pelos agravantes partirá dessa premissa, e apreciados segundo o respeito pela Administração aos princípios constitucionalmente garantidos. Indo adiante, o entendimento dominante no direito brasileiro é no sentido de o sigilo bancário ter natureza de garantia constitucional amparada no direito fundamental à segurança pertinente à vida privada e à intimidade do (art. 5º, X, da Constituição de 1988), ainda com reflexos na transferência ou comunicação de dados (art. 5º, XII do mesmo diploma). Embora tenha natureza de garantia constitucional, o sigilo bancário não pode acobertar atos ilícitos, e deve se harmonizar com os demais direitos, garantias e deveres igualmente fundamentais, daí decorrendo legítimas restrições e limites jurídicos. A rigor, o ordenamento brasileiro estabelece proteções graduais dependendo das informações bancárias, de modo que, quanto maior o conteúdo analítico pertinente à vida privada e à intimidade, mais haverá elementos para a garantia do sujeito (em alguns casos extremos, exigindo prévia determinação judicial). Informações gerais e de acesso amplo sequer estão abrigadas pelo sigilo bancário, de modo que podem ser armazenadas e comercializadas por empresas (p. ex., em favor do sistema de proteção de crédito). Já dados quantitativos e naturezas de operações bancárias estão disponíveis para autoridades do Estado, sem a necessidade de intervenção do Poder Judiciário, quando se trata de regular e ordinário exercício de funções públicas (tais como informações prestadas por bancos comerciais sobre transações de clientes para fins de cruzamento visando à apuração de Imposto de Renda). Aspectos ainda mais específicos de transações bancárias (incluindo extratos analíticos e documentos de operações) também podem ser acessados por autoridades públicas para apurações específicas ou extraordinárias em suas áreas de atribuição, com a devida pertinência quanto aos fatos e a necessária fundamentação da determinação administrativa. Após décadas de discussão, desde a redação do art. 38 da Lei 4.595/1964 e do art. 197 do CTN, e também após a edição da Lei Complementar nº 104/2001 e da Lei Complementar nº 105/2001, autoridades fiscais passaram a ser reconhecidamente competentes para requisitar diretamente (sem previa decisão judicial) a quebra de sigilo bancário no curso de processo administrativo formalmente instaurado, sendo igualmente obrigadas ao sigilo fiscal quanto aos dados obtidos, harmonizando a proteção da vida privada e da intimidade de contribuições com o dever fundamental de pagar impostos, com a igualdade e a capacidade contributiva, e com o objetivo de justiça fiscal à luz do Estado de Direito. O E.STF analisou os limites do sigilo bancário e do sigilo fiscal de autoridades tributárias em vários julgados tais como as ADI 2.386/DF, ADI 2.390/DF, ADI 2.397/DF e ADI 2.859/DF), dentre os quais destaco o RE 601314, no qual foi firmada a Tese no Tema 225 (“I - O art. 6º da Lei Complementar 105/01 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal; II - A Lei 10.174/01 não atrai a aplicação do princípio da irretroatividade das leis tributárias, tendo em vista o caráter instrumental da norma, nos termos do artigo 144, §1º, do CTN”), com a seguinte ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. DIREITO AO SIGILO BANCÁRIO. DEVER DE PAGAR IMPOSTOS. REQUISIÇÃO DE INFORMAÇÃO DA RECEITA FEDERAL ÀS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS. ART. 6º DA LEI COMPLEMENTAR 105/01. MECANISMOS FISCALIZATÓRIOS. APURAÇÃO DE CRÉDITOS RELATIVOS A TRIBUTOS DISTINTOS DA CPMF. PRINCÍPIO DA IRRETROATIVIDADE DA NORMA TRIBUTÁRIA. LEI 10.174/01. 1. O litígio constitucional posto se traduz em um confronto entre o direito ao sigilo bancário e o dever de pagar tributos, ambos referidos a um mesmo cidadão e de caráter constituinte no que se refere à comunidade política, à luz da finalidade precípua da tributação de realizar a igualdade em seu duplo compromisso, a autonomia individual e o autogoverno coletivo. 2. Do ponto de vista da autonomia individual, o sigilo bancário é uma das expressões do direito de personalidade que se traduz em ter suas atividades e informações bancárias livres de ingerências ou ofensas, qualificadas como arbitrárias ou ilegais, de quem quer que seja, inclusive do Estado ou da própria instituição financeira. 3. Entende-se que a igualdade é satisfeita no plano do autogoverno coletivo por meio do pagamento de tributos, na medida da capacidade contributiva do contribuinte, por sua vez vinculado a um Estado soberano comprometido com a satisfação das necessidades coletivas de seu Povo. 4. Verifica-se que o Poder Legislativo não desbordou dos parâmetros constitucionais, ao exercer sua relativa liberdade de conformação da ordem jurídica, na medida em que estabeleceu requisitos objetivos para a requisição de informação pela Administração Tributária às instituições financeiras, assim como manteve o sigilo dos dados a respeito das transações financeiras do contribuinte, observando-se um translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal. 5. A alteração na ordem jurídica promovida pela Lei 10.174/01 não atrai a aplicação do princípio da irretroatividade das leis tributárias, uma vez que aquela se encerra na atribuição de competência administrativa à Secretaria da Receita Federal, o que evidencia o caráter instrumental da norma em questão. Aplica-se, portanto, o artigo 144, §1º, do Código Tributário Nacional. 6. Fixação de tese em relação ao item “a” do Tema 225 da sistemática da repercussão geral: “O art. 6º da Lei Complementar 105/01 não ofende o direito ao sigilo bancário, pois realiza a igualdade em relação aos cidadãos, por meio do princípio da capacidade contributiva, bem como estabelece requisitos objetivos e o translado do dever de sigilo da esfera bancária para a fiscal”. 7. Fixação de tese em relação ao item “b” do Tema 225 da sistemática da repercussão geral: “A Lei 10.174/01 não atrai a aplicação do princípio da irretroatividade das leis tributárias, tendo em vista o caráter instrumental da norma, nos termos do artigo 144, §1º, do CTN”. 8. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 601314, Relator(a): EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 24/02/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-198 DIVULG 15-09-2016 PUBLIC 16-09-2016) O mesmo Pretório Excelso estendeu a representantes do Ministério Público a competência para a requisição direta da quebra de sigilo bancário (sem intervenção judicial) em se tratando de apuração criminal, resguardado o dever de sigilo dessas informações quando em posse do parquet com destaque para o RE 1055941 (no qual foi firmada a Tese no Tema 990: “I - É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil, que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional; II - O compartilhamento pela UIF e pela RFB, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.”), com a seguinte ementa: Repercussão geral. Tema 990. Constitucional. Processual Penal. Compartilhamento dos Relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil com os órgãos de persecução penal para fins criminais. Desnecessidade de prévia autorização judicial. Constitucionalidade reconhecida. Recurso ao qual se dá provimento para restabelecer a sentença condenatória de 1º grau. Revogada a liminar de suspensão nacional (art. 1.035, § 5º, do CPC). Fixação das seguintes teses: 1. É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional; 2. O compartilhamento pela UIF e pela RFB referido no item anterior deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios. (RE 1055941, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-243 DIVULG 05-10-2020 PUBLIC 06-10-2020 REPUBLICAÇÃO: DJe-052 DIVULG 17-03-2021 PUBLIC 18-03-2021) A rigor, a prévia determinação judicial para acesso a informações bancárias por parte da administração pública ou do Ministério Público somente será exigida se envolver o enfrentamento de temas submetidos à reserva de jurisdição, ou em assuntos extremamente íntimos. De todo modo, a requisição direta dessas informações por parte de autoridade pública está sempre exposta ao imparcial controle judicial posterior, em vista da pertinência da medida para os fatos apurados e da fundamentação apresentada pela determinação administrativa. Os mesmos interesses legítimos movem autoridades na apuração de infrações cometidas por servidores, de modo que é possível a imposição legal de acesso ordinário a informações patrimoniais e tributárias (p. ex., previstas no art. 13, §5º da Lei nº 8.112/1990, na Lei nº 8.429/1992, e no art. 13 da Lei nº 12.813/2013 e no Decreto 10.571/2020), como também a requisição direta da quebra de sigilo bancário em processo administrativo disciplinar regularmente instaurado, sem a prévia permissão judicial (embora seja possível o controle posterior), respeitado também o sigilo das informações obtidas. Nesse sentido é a orientação do E.STJ (p. ex., AREsp 1068263/RJ, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/ Acórdão Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/02/2020, DJe 05/03/2020). Nessa toada, destaco, ainda, a fim de exemplificar o comum acesso a dados sigilosos no âmbito da Administração Tributária, que, com o intuito de regulamentar a sindicância patrimonial prevista na Lei nº 8.429/1992, o art. 2º do Decreto 5.483/2005, estabeleceu a obrigatoriedade de os agentes públicos apresentarem declaração de bens próprios e de seu cônjuge, companheiro, filhos ou outras pessoas que estejam em situação de dependência econômica, in verbis: Art. 2º. A posse e o exercício de agente público em cargo, emprego ou função da administração pública direta ou indireta ficam condicionados à apresentação, pelo interessado, de declaração dos bens e valores que integram o seu patrimônio, bem como os do cônjuge, companheiro, filhos ou outras pessoas que vivam sob a sua dependência econômica, excluídos apenas os objetos e utensílios de uso doméstico. Parágrafo único. A declaração de que trata este artigo compreenderá imóveis, móveis, semoventes, dinheiro, títulos, ações e qualquer outra espécie de bens e valores patrimoniais localizados no País ou no exterior. Pontua-se, ademais, que no caso de apurações de irregularidades no âmbito interno da Receita Federal, o parágrafo único do art. 3º da Portaria Coger nº 13, de 2014, diz respeito à faculdade de a comissão de sindicância patrimonial solicitar o afastamento de outros sigilos, tais como: sigilo bancário, sigilo profissional (em que se inclui a documentação de perícia médica), sigilo telefônico, segredo de justiça, informações pessoais sensíveis etc. A decisão agravada foi proferida nos seguintes termos: “RONALDO DAL FABBRO e CARMEN SHEILA CASTRO CORDEIRO impetraram o presente mandado de segurança em face de ato supostamente coator do COORDENADOR DO GRUPO NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO DA RECEITA FEDERAL (GNI) e do PRESIDENTE DA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA PATRIMONIAL designada para conduzir a Sindicância Investigativa nº 14044.720036/2020-63, visando em sede liminar a suspensão da Sindicância Patrimonial nº 14044.720264/2022-03, instaurada contra os impetrantes. Decisão de ID 313922612 determinou a retificação do polo passivo. Emenda à inicial em ID 314200042, requerendo a redução do polo passivo para o COORDENADOR DO GRUPO NACIONAL DE INVESTIGAÇÃO DA RECEITA FEDERAL (GNI) e do PRESIDENTE DA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA PATRIMONIAL apenas. Decisão de ID 314671387 recebeu a emenda à inicial e postergou a análise da liminar para momento seguinte à vinda das informações. Informações das autoridades coatoras em ID 316888791. É o relatório. Decido. Conforme narraram na inicial, os impetrantes são investigados em sindicância patrimonial após recebimento de representação correcional dos membros do Grupo Nacional de Investigação, iniciada com fundamento no art. 116, inciso VI, da Lei 8.112/90. Em apertada síntese, os impetrantes são auditores fiscais e são investigados pela sindicância patrimonial nº 14044.720264/2022-03 por enriquecimento incompatível com os rendimentos dos cargos públicos que ocupam. Referida investigação resultou de outra sindicância investigativa anterior, nº 14044.720036/2020-63 contra o auditor fiscal Euvaldo Dal Fabro Júnior, no bojo da qual foram solicitadas e deferidas judicialmente, nos autos dos processos nº 5002201-38.2020.4.03.6181, nº 5002203-08.2020.4.03.6181 e nº 5001161-84.2021.4.03.6181 diversas medidas judiciais investigativas, como quebra de sigilo bancário, fiscal e telemático, além de busca e apreensão de coisas e documentos. Nos autos do processo 5003392-21.2020.4.03.6181, foi deferida a quebra do sigilo fiscal e bancário da empresa Fratter Empreendimentos e Participações Ltda., com objetivo de apurar suposto uso da empresa para recebimento de depósitos ilegais provenientes de outras empresas fiscalizadas por Euvaldo Dal Fabbro Júnior. Referida quebra de sigilo encontrou, no período de 01/11/2016 a 20/03/2020, depósito da empresa Fratter Empreendimentos no valor de R$ 154.500,00 para impetrante Carmem Cordeiro e de R$ 76.300,00 para o impetrante Ronaldo Dal Fabbro. Ainda durante investigação mencionada, foi autorizado o compartilhamento de provas com a Receita Federal para “viabilizar eventuais sindicâncias ou processos administrativos disciplinares contra o investigado e outros eventuais membros do grupo criminoso”, constando transferência do sigilo às autoridades e servidores diretamente afetos à condução do procedimento administrativo no âmbito da Receita e da Corregedoria. Alega que os impetrantes não são investigados em nenhum dos processos mencionados e nenhuma das decisões judiciais referiram-se aos impetrantes, motivo pelo qual teria ocorrido compartilhamento indevido de documentos sigilosos, inclusive com incursões indevidas em dados sensíveis, como ofício dirigido ao cartório de registro civil e tabelionato de notas, empresa Enel, Sem para Instituição de Pagamento Ltda. e agências de turismo, a fim de serem obtidos documentos como notas fiscais, recibos, comprovantes de transferência bancária, extratos de cartão de crédito dos impetrantes e de seus filhos. Defende, em síntese, que a Sindicância Patrimonial nº 14044.720264/2022-03 questionada foi instaurada com abuso de poder, tendo em vista os impetrantes não terem qualquer envolvimento com os investigados no procedimento anterior e a partir de compartilhamento indevido de informações sigilosas e sem autorização judicial, além de uso indevido do poder de requisição sobre dados sensíveis. As autoridades coatoras informam que é possível a análise patrimonial do agente público seja vista pelos órgãos competentes de forma integrada à de seu cônjuge ou companheiro, dos filhos e, a depender das circunstâncias do caso, abranger outras pessoas, tanto físicas quanto jurídicas, relacionadas ao servidor. Sustentam que é poder-dever da autoridade administrativa apurar os fatos de que teve ciência, estando obrigada a fazer um juízo preliminar para verificar se há realmente potencial para vir a caracterizar uma infração disciplinar após a condução da apuração contraditória, ou se, ao contrário, o fato narrado não constitui evidente infração disciplinar. Trazem diversos indícios que ligam as impetrantes aos fatos narrados nos processos nº 5002201-38.2020.4.03.6181, nº 5002203-08.2020.4.03.6181 e nº 5001161-84.2021.4.03.6181. Arguem que as decisões judiciais exaradas pela 9ª Vara Criminal Federal de São Paulo, tratando de pedidos de busca e apreensão, de acesso ao conteúdo de computadores, smartphones, celulares e mídias (em geral), de afastamento de sigilo bancário e fiscal, de sigilo telemático e de dados telefônicos, bem como do compartilhamento das informações obtidas com a RFB, foram devidamente juntadas aos autos do processode nº 14044.720264/2022-03 (Arquivo não paginável de fl. 21 do processo nº 14044.720264/2022-03). E, ao autorizar o compartilhamento de provas com a Coger, tais decisões já previram que eventuais informações a respeito de outros servidores poderiam surgir e ser utilizadas em procedimentos disciplinares. Com efeito, a Sindicância Patrimonial questionada foi instaurada para apurar eventual enriquecimento incompatível com o rendimento do cargo público ocupado pelos impetrantes. Sendo assim, em tese, há interesse público na apuração dos fatos, o que pode ser prejudicado pela suspensão da sindicância em sede liminar. Ademais, a investigação, por si só, não compreende imediata punição dos impetrantes, pois o contraditório é constitucionalmente garantido aos litigantes em processo administrativo, com possibilidade de contraditar os fatos apresentados e de comprovarem a licitude de eventuais recursos recebidos por meio da empresa familiar inicialmente investigada. Por outro lado, eventual abuso nas investigações pode ensejar nulidade do procedimento administrativo de investigação, sendo passível de declaração pelo poder judiciário. No caso em tela, observo que o pleito autoral se funda na suposta ilegalidade da instauração da sindicância patrimonial nº 14044.720264/2022-03, pois derivou de provas ilícitas, obtidas por meio de quebra de sigilo bancário e/ou telemático dos impetrantes, sem a devida autorização judicial. Verifico que a investigação foi inicialmente direcionada ao servidor Euvaldo Dal Fabbro Júnior, contra quem foram obtidas decisões judiciais autorizando o afastamento do sigilo telemático dos e-mails pessoais e funcionais; o afastamento dos sigilos bancários e fiscal do servidor, do seu filho Alexandre Ferraz Dal Fabbro e da empresa Alexandre Ferraz Dal Fabbro Me; além da realização de busca e apreensão no local de trabalho do servidor, na Delegacia de Fiscalização de Comércio Exterior da Receita Federal do Brasil em São Paulo (DECEX/SP), em sua residência em São Paulo/SP e em sua casa de praia localizada em São Sebastião/SP. A partir do resultado das buscas, foram achados diversos indícios de envolvimento dos impetrantes nos fatos criminosos investigados, a saber: a) Os depósitos efetuados nas contas dos impetrantes, originados da empresa Fratter Emprendimentos e Participações Ltda, a despeito de não figurarem em seu quadro societário e de a referida empresa apresentar um montante de créditos financeiros muito superior aos declarados; b) Ao envolvimento indevido do impetrante nas negociações da floresta de eucaliptos localizada na Fazenda Rio Formoso, em operação superavaliada com a empresa Fibria Celulose S/A, autuada por seu irmão, também Auditor-Fiscal da Receita Federal; c) Relação do impetrante com os sócios do grupo JBS, que envolveu a prestação de consultoria para a implantação da referida floresta de eucalipto e utilização da sua influência junto ao grupo empresarial para beneficiar seu filho com um estágio a ser realizado em filial do grupo no exterior; d) Atuação do impetrante junto à Construbroker para viabilizar operação milionária de planejamento sucessório e blindagem patrimonial, evolvendo a movimentação de valores vultosos em dinheiro, cuja origem não foi ainda satisfatoriamente explicada. Assim, não assiste razão às impetrantes quando alegam que houve ilegalidade na instauração do procedimento por ausência de justa causa que aponte o enriquecimento ilícito ou variação patrimonial incompatível com a renda dos impetrantes, bem como a prática de infração funcional. Em relação à suposta ilicitude das provas que ensejaram a instauração da Sindicância contra as impetrantes, derivaram das buscas determinadas por autoridade judicial em face do investigado Euvaldo Dal Fabbro Júnior. Ora, o C. STJ possui entendimento firme quanto à admissibilidade do fenômeno do encontro fortuito, ou serendipidade, entendido como a descoberta inesperada, no decorrer de uma investigação legalmente autorizada, de provas sobre crime que a princípio não estava sendo investigado. Nesse sentido: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA VOLTADA PARA A RECEPTAÇÃO DE MERCADORIAS ROUBADAS, FRAUDE EM LICITAÇÃO, CORRUPÇÃO E LAVAGEM DE DINHEIRO. INEXISTÊNCIA DE ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR O DECISÓRIO IMPUGNADO. FATOS DELITUOSOS DESCOBERTOS A PARTIR DA INVESTIGAÇÃO TELEFÔNICA AUTORIZADA EM RELAÇÃO A TERCEIRO. ENCONTRO FORTUITO DE PROVAS (SERENDIPIDADE). AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Não obstante os esforços do agravante, a decisão deve ser mantida por seus próprios fundamentos. 2. Consoante orientação jurisprudencial desta Corte Superior, o denominado encontro fortuito de provas é fato legítimo, refletido, no caso concreto, na descoberta, em interceptação telefônica judicialmente autorizada, do envolvimento de pessoas diferentes daquelas inicialmente investigadas, não gerando irregularidade a macular as demais provas decorrentes. 3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 826.400/PE, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 4/3/2024, DJe de 6/3/2024.). Nesse sentido, não diviso ilegalidade na instauração da sindicância patrimonial em face dos impetrantes com base nos indícios obtidos em investigação direcionada a outro investigado. Por fim, também não acolho a alegação de ilegalidade na busca de dados sigilosos dos Impetrantes, pelo Presidente da Comissão Sindicante, mediante expedição de ofícios para cartórios de registro civil e tabelionato de notas; empresa Enel; Sem Parar Instituição de Pagamento LTDA; e agências de turismos requerendo documentos, notas fiscais, recibos, com informações sigilosas relativas aos Impetrantes e aos seus filhos, sem prévia autorização judicial para a quebra de sigilo bancário e/ou telemático dos Impetrantes. Os referidos dados não estão abarcados pelo sigilo bancário e/ou telemático. Trata-se de informação de interesse público, eis que relevante à investigação, não envolvendo movimentação financeira ou dados de usuários de serviços eletrônicos que possam atrair o sigilo constitucional. Assim, ao menos em cognição sumária, não há fundamento relevante que autorize a concessão da liminar. Isto posto, INDEFIRO o pedido de liminar. 1) Publique-se; 2) Intimem-se; 3) Notifique-se a parte impetrada, dando-lhe ciência desta decisão; 4) Em seguida, abra-se vista ao Ministério Público Federal para manifestação, no prazo legal. 5) Decorrido o prazo acima, venham conclusos para prolação de sentença. ” Consta dos autos que os agravantes/impetrantes, ambos Auditores Fiscais da RFB e em relação de união estável, tiveram contra eles instaurada a sindicância patrimonial n. 14044.720264/2022-03, decorrente de elementos colhidos a instrução dos processos n. 5002201-38.2020.4.03.6181, nº 5002203- 08.2020.4.03.6181, nº 5003392-21.2020.4.03.6181 e nº 5001161-84.2021.4.03.6181, nos quais se constatou indícios, em desfavor dos agravantes, de variação patrimonial a descoberto e infrações funcionais. Esclareça-se que referidos processos são relativos à apreciação de medidas a serem adotadas com o fim de instruir a sindicância patrimonial n. 14044.720036/2020-63, movida em desfavor de terceiro (Euvaldo Dal Fabro Júnior, irmão do agravante Ronaldo). Não há notícia que já tenha havido decisão final na sindicância instaurada em desfavor dos agravantes, sindicância esta que eles intentam ver suspensa. Os impetrantes alegam que apenas fora deferida a quebra de sigilo fiscal e bancário da empresa Fratter, além de outras pessoas físicas e jurídicas, dentre eles um auditor fiscal, sem menção aos agravantes. Nenhuma das decisões judiciais os cita, não havendo, portanto, fundamento para a quebra de sigilo em seu desfavor. Contudo, não verifico existentes tais violações, pois conforme demonstrado, os servidores públicos já devem permitir acesso a seus dados fiscais por imposição do regime jurídico a que vinculados. Acrescente-se que há decisão judicial concedendo expressamente autorização de compartilhamento de provas com a Receita Federal para viabilizar eventuais sindicâncias ou processos administrativos disciplinares contra o investigado e outros eventuais membros do grupo criminoso, com transferência do sigilo às autoridades e servidores diretamente afetos à condução do procedimento administrativo no âmbito da Receita e da Corregedoria (Id. 31471212 - Pág. 18/20 dos autos de origem). Por tudo quanto exposto, não se vislumbra violação a dados fiscais sigilosos no presente feito, haja vista que essa proteção não tem caráter absoluto, sendo mitigada pelos diversos aspectos apontados. No que tange ao acesso a outros dados (junto a cartórios de registro civil e tabelionatos de notas, Enel, instituições de pagamento e agências de turismo, com o fim de obtenção de notas fiscais, recibos, comprovantes de transferência bancária, extratos de cartão de crédito dos impetrantes e de seus filhos), deve ser registrado que os dados constantes em bancos de dados, públicos ou privados, não podem ser confundidos com dados íntimos e sigilosos, portanto sua requisição não está sujeita à reserva de jurisdição que impõe o inciso XII do art. 5º da Constituição Federal. Nesse sentido firmou-se a jurisprudência do STF (grifei): EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. ACESSO A DADOS CADASTRAIS E DE USUÁRIOS. SIGILO DAS COMUNICAÇÕES. AUSÊNCIA DE TERATOLOGIA. 1. Não cabe habeas corpus em substituição ao recurso ordinário constitucional (HC 109.956, Rel. Min. Marco Aurélio). 2. As decisões proferidas pelas instâncias de origem estão alinhadas com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que “a proteção a que se refere o art. 5º, XII, da Constituição, é da comunicação ‘de dados’ e não dos ‘dados em si mesmos’” (RE 418.416, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário) 3. Ausência de teratologia, ilegalidade flagrante ou abuso de poder que autorize a concessão da ordem de ofício para invalidar a prova. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (HC 124322 AgR, Relator(a): ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09-12-2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-268 DIVULG 16-12-2016 PUBLIC 19-12-2016) HABEAS CORPUS. NULIDADES: (1) INÉPCIA DA DENÚNCIA; (2) ILICITUDE DA PROVA PRODUZIDA DURANTE O INQUÉRITO POLICIAL; VIOLAÇÃO DE REGISTROS TELEFÔNICOS DO CORRÉU, EXECUTOR DO CRIME, SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL; (3) ILICITUDE DA PROVA DAS INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS DE CONVERSAS DOS ACUSADOS COM ADVOGADOS, PORQUANTO ESSAS GRAVAÇÕES OFENDERIAM O DISPOSTO NO ART. 7º, II, DA LEI 8.906/96, QUE GARANTE O SIGILO DESSAS CONVERSAS. VÍCIOS NÃO CARACTERIZADOS. ORDEM DENEGADA. 1. Inépcia da denúncia. Improcedência. Preenchimento dos requisitos do art. 41 do CPP. A denúncia narra, de forma pormenorizada, os fatos e as circunstâncias. Pretensas omissões – nomes completos de outras vítimas, relacionadas a fatos que não constituem objeto da imputação –- não importam em prejuízo à defesa. 2. Ilicitude da prova produzida durante o inquérito policial - violação de registros telefônicos de corréu, executor do crime, sem autorização judicial. 2.1 Suposta ilegalidade decorrente do fato de os policiais, após a prisão em flagrante do corréu, terem realizado a análise dos últimos registros telefônicos dos dois aparelhos celulares apreendidos. Não ocorrência. 2.2 Não se confundem comunicação telefônica e registros telefônicos, que recebem, inclusive, proteção jurídica distinta. Não se pode interpretar a cláusula do artigo 5º, XII, da CF, no sentido de proteção aos dados enquanto registro, depósito registral. A proteção constitucional é da comunicação de dados e não dos dados. 2.3 Art. 6º do CPP: dever da autoridade policial de proceder à coleta do material comprobatório da prática da infração penal. Ao proceder à pesquisa na agenda eletrônica dos aparelhos devidamente apreendidos, meio material indireto de prova, a autoridade policial, cumprindo o seu mister, buscou, unicamente, colher elementos de informação hábeis a esclarecer a autoria e a materialidade do delito (dessa análise logrou encontrar ligações entre o executor do homicídio e o ora paciente). Verificação que permitiu a orientação inicial da linha investigatória a ser adotada, bem como possibilitou concluir que os aparelhos seriam relevantes para a investigação. 2.4 À guisa de mera argumentação, mesmo que se pudesse reputar a prova produzida como ilícita e as demais, ilícitas por derivação, nos termos da teoria dos frutos da árvore venenosa (fruit of the poisonous tree), é certo que, ainda assim, melhor sorte não assistiria à defesa. É que, na hipótese, não há que se falar em prova ilícita por derivação. Nos termos da teoria da descoberta inevitável, construída pela Suprema Corte norte-americana no caso Nix x Williams (1984), o curso normal das investigações conduziria a elementos informativos que vinculariam os pacientes ao fato investigado. Bases desse entendimento que parecem ter encontrado guarida no ordenamento jurídico pátrio com o advento da Lei 11.690/2008, que deu nova redação ao art. 157 do CPP, em especial o seu § 2º. 3. Ilicitude da prova das interceptações telefônicas de conversas dos acusados com advogados, ao argumento de que essas gravações ofenderiam o disposto no art. 7º, II, da Lei n. 8.906/96, que garante o sigilo dessas conversas. 3.1 Nos termos do art. 7º, II, da Lei 8.906/94, o Estatuto da Advocacia garante ao advogado a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia. 3.2 Na hipótese, o magistrado de primeiro grau, por reputar necessária a realização da prova, determinou, de forma fundamentada, a interceptação telefônica direcionada às pessoas investigadas, não tendo, em momento algum, ordenado a devassa das linhas telefônicas dos advogados dos pacientes. Mitigação que pode, eventualmente, burlar a proteção jurídica. 3.3 Sucede que, no curso da execução da medida, os diálogos travados entre o paciente e o advogado do corréu acabaram, de maneira automática, interceptados, aliás, como qualquer outra conversa direcionada ao ramal do paciente. Inexistência, no caso, de relação jurídica cliente-advogado. 3.4 Não cabe aos policiais executores da medida proceder a uma espécie de filtragem das escutas interceptadas. A impossibilidade desse filtro atua, inclusive, como verdadeira garantia ao cidadão, porquanto retira da esfera de arbítrio da polícia escolher o que é ou não conveniente ser interceptado e gravado. Valoração, e eventual exclusão, que cabe ao magistrado a quem a prova é dirigida. 4. Ordem denegada. (HC 91867, Relator(a): GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 24-04-2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-185 DIVULG 19-09-2012 PUBLIC 20-09-2012) De outro lado, a lei assegura aos órgãos policiais a prerrogativa de, diretamente (ou seja, sem necessidade de autorização judicial) solicitar e colher as provas necessárias às investigações que conduz. É o que se deduz da Lei nº 12.830/2013, que dispõe sobre a investigação criminal conduzida pelo delegado de polícia – mas que, como já assentado pelas cortes suprema e superior, já vinha estabelecida no próprio Código de Processo Penal, em seu art. 6º, inciso III. Com efeito, confiram-se os julgados (grifei): EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL. REQUISIÇÃO DE DADOS CADASTRAIS PELA AUTORIDADE POLICIAL. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE CONTRARIEDADE AO SIGILO DAS COMUNICAÇÕES GARANTIDO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (HC 230909 AgR, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 30-10-2023, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 03-11-2023 PUBLIC 06-11-2023) PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. DADOS CADASTRAIS. AUTORIDADE POLICIAL. REQUISIÇÃO DIRETA. POSSIBILIDADE. ART. 6º, III, E 13, I, DO CPP. ART. 2º, § 2º, DA LEI 12.830/2013. 2. MARCO CIVIL DA INTERNET. REGRAS MAIS CLARAS E MENOS RÍGIDAS. ENTRADA EM VIGOR APÓS A REQUISIÇÃO. IRRELEVÂNCIA. MERA CONSOLIDAÇÃO DA REALIDADE JURÍDICA. 3. INDICAÇÃO DE LEI EQUIVOCADA NA REQUISIÇÃO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. EXISTÊNCIA DE OUTRAS NORMAS QUE SUBSIDIAM O PEDIDO. 4. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior, "enquanto os 'dados' revelam aspectos da vida privada ou da intimidade do indivíduo e possuem proteção constitucional esculpida no art. 5º, incisos X e XII, da Constituição Federal, os 'dados cadastrais' se referem a informações de caráter objetivo que todos possuem, não permitindo a criação de qualquer juízo de valor sobre o indivíduo a partir de sua divulgação. São essencialmente um conjunto de informações objetivas fornecidas pelos consumidores/clientes/usuários sistematizadas em forma de registro de fácil acesso por meio de seu armazenamento em banco de dados de pessoas jurídicas de direito público ou privado, contendo informações como nome completo, CPF, RG, endereço, número de telefone etc." (REsp n. 1.561.191/SP, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 19/4/2018, DJe de 26/11/2018). - Mister distinguir o sigilo de dados da vida íntima e das comunicações, protegidos pelo art. 5º, incisos X e XII, da Constituição Federal, do simples acesso a dados cadastrais, que são livremente indicados pela própria pessoa, não se tratando, portanto, de sigilo constitucional. Assim, não se cuidando de informações que possuam reserva de jurisdição, não há óbice ao acesso direto pelos órgãos de investigação. - O art. 6º, inciso III, e o art. 13, inciso I, ambos do Código de Processo Penal, por si sós, já embasam a solicitação de dados ora considerada ilegal pela defesa. Não se pode descurar também que o art. 2º, § 2º, da Lei n. 12.830/2013, dispõe que, "durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados que interessem à apuração dos fatos". 2. Ainda que a Lei n. 12.965/2014 seja posterior à requisição dos dados cadastrais, ela apenas reflete a realidade jurídica de que "há diferenciação na proteção dada pela legislação ao conteúdo das comunicações mantidas entre indivíduos e às informações de conexão e de acesso a aplicações da internet. Ao tratar das informações de conexão e de acesso a aplicações de internet, encontram-se na Lei n. 12.965/2014 regras mais claras e menos rígidas, em que se estabelece, inclusive, a prescindibilidade de decisão judicial em hipóteses específicas" (AgRg no AREsp n. 1.789.994/GO, Relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 1º/6/2021, DJe de 7/6/2021). 3. eventual indicação equivocada da Lei de Lavagem de Capitais como fundamento para requisitar os dados cadastrais não revela prejuízo à defesa, porquanto autorizada a requisição com fundamento em diversas outras leis e, em especial, no próprio Código de Processo Penal. De igual sorte, se trata de prova que poderia ser repetida a qualquer momento. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no RHC n. 174.237/RS, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 27/4/2023, DJe de 3/5/2023.) Indo adiante, cumpre registrar que a comumente referida “variação patrimonial a descoberto” é a hipótese trazida na Lei de Improbidade Administrativa, em seu art. 9º, VII, que permite a configuração de ato ímprobo diante da incongruência entre o patrimônio do devedor e seus ganhos e rendas declarados. Frise-se que se trata de situação plenamente cabível no conjunto do ordenamento jurídico, haja vista a obrigação assumida pelo servidor estatutário, ao tomar posse em cargo público, de entregar anualmente sua declaração de imposto de renda à Administração, para justamente tornar clara e indene de dúvidas a probidade de sua evolução patrimonial. Nessa esteira, observe-se que o legislador fez expressa opção por, a partir da observância de situação incompatível com a condição dos ganhos conhecidos do servidor público, presumir a ocorrência de ato ilícito. Trata-se, obviamente, de presunção relativa que cabe ao servidor desconstituir, comprovando a licitude de seus ganhos e acréscimos patrimoniais. Nota-se que se trata de relevante situação excepcional criada pela lei, que autoriza que, a partir de dados de resultado (a riqueza patrimonial), sejam feitas inferências sobre o meio (atos ilícitos que levaram ao ganho de vantagens indevidas). Isso se deve, principalmente, a dois motivos: em primeiro lugar, à manifesta dificuldade em fazer prova dos atos ilícitos em si mesmos, nos casos infrações cometidas por servidores públicos no exercício da função, haja vista a utilização de instrumentos de simulação, fraude, falsificação etc., aos quais se empresta verniz de veracidade pela atuação de agente dotado de fé pública; e, em segundo lugar, ao dever colocado desde logo ao servidor público de que preste contas sobre percepção de salários, rendas e bens, constituindo a própria recusa em atualizar seus dados razão para demissão. Portanto, não há se falar em ilegal presunção de ilicitude em casos desse tipo, e nem que falhe a investigação conduzida pelo Poder Público ao não apontar um ato, ou conjunto de atos, que resultaram diretamente na percepção de vantagem indevida pelo servidor. Não é outro o entendimento que se expressa na jurisprudência do e.STJ (grifei): ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. EVOLUÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO. ART. 9º, VII, DA LEI 8.429/1992. CONDUTA ÍMPROBA. PROVA DA ORIGEM LÍCITA. ÔNUS DO AGENTE PÚBLICO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONTRARIEDADE À JURISPRUDÊNCIA DO STJ. HISTÓRICO DA DEMANDA 1. Cuida-se, na origem, de Ação de Improbidade Administrativa contra dois Auditores Fiscais da Previdência Social, acusados da prática de advocacia administrativa, excesso de exação e evolução patrimonial incompatível com a remuneração de seus cargos. 2. O Recurso Especial comporta conhecimento apenas em relação ao recorrido Joaquim Acosta Diniz e, exclusivamente, quanto à imputação de evolução patrimonial a descoberto prevista no art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA DE EVOLUÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO 3. O acórdão recorrido consigna que, para a incidência do inciso VII do art. 9º da LIA, "há necessidade de se atrelar a conduta ilícita do agente público no exercício de suas funções à evolução patrimonial considerada desproporcional" (fl. 2.141, e-STJ) (grifei). 4. Evolução patrimonial a descoberto, manifestada por bens materiais, despesas ou estilo de vida incompatíveis com rendimentos efetivamente recebidos, independe de alegação ou prova pelo Estado de conduta ilícita do servidor público. Ao revés, incumbe a este o ônus de cabalmente justificar a origem e a legitimidade do capital ou meios exibidos. Precedentes do STJ. 5. Vale destacar que a nova redação do art. 9º, VII, da Lei 8.429/1992, conferida pela Lei 14.230/2021 - em que pese inaplicável ao caso presente ante os limites do quanto decidido pelo STF no Tema 1.199 (irretroatividade do novo regime, salvo em relação às ações em andamento atinentes aos tipos culposos extintos) -, reforça o entendimento jurisprudencial supra-apontado, porque o próprio dispositivo ressalva que será "assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução". AUSÊNCIA DE ENFRENTAMENTO DA QUESTÃO DA LICITUDE DA VARIAÇÃO PATRIMONIAL NO ACÓRDÃO RECORRIDO 6. Como o acórdão recorrido adotou a premissa equivocada de que ao autor da Ação de Improbidade cabia o ônus de provar a correlação entre o acréscimo patrimonial e algum ato ilícito praticado no exercício do cargo, o Tribunal de origem deixou de se pronunciar sobre a alegada desproporção do patrimônio do agente com seus rendimentos como Auditor Fiscal e as eventuais provas por ele apresentadas no sentido da licitude da evolução patrimonial. 7. Deve a instância ordinária, firmada a tese jurídica que predomina no STJ, reapreciar os fatos e julgá-los de acordo com a orientação do STJ, motivo pelo qual é de se anular o julgamento para que outro seja realizado. CONCLUSÃO 8. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido, a fim de que, nos termos da fundamentação, os autos tornem à Corte de origem para, com base na orientação de que compete ao acusado comprovar a licitude da evolução patrimonial, reapreciar os fatos da causa, exclusivamente em relação a Joaquim Acosta Diniz e à imputação do art. 9°, VII, da Lei 8.429/1992. (REsp n. 1.923.138/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 6/12/2022, DJe de 19/12/2022.) Nessa mesma esteira, também deve ser reconhecido que a alegação sobre a ausência de um ato específico pelo qual se impute a conduta ímproba ao servidor não é razão para se intuir a inexistência de dolo de sua parte. A intenção de enriquecimento ilícito se mostra presente não apenas nos atos que se presumem ocorridos e que acarretaram o recebimento de vantagens espúrias, mas também na dissimulação e tentativa de escamotear esses ganhos, atitudes estas que só existem justamente porque o agente tem consciência da ilicitude que pratica. É correto, pois, falar em dolo do servidor pelo mero fato de não lograr demonstrar a legalidade do patrimônio acumulado em dissonância com seus rendimentos declarados. Nesse sentido, o entendimento do e.STJ (grifei): PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE DEMISSÃO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. VIA INADEQUADA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO ADMINISTRATIVA NÃO CONSUMADA. SÚMULA 635/STJ. VARIAÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO. DOLO GENÉRICO. NULIDADES. NÃO CONFIGURAÇÃO. PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. É ÔNUS DO SERVIDOR DEMONSTRAR A LICITUDE DE SUA EVOLUÇÃO PATRIMONIAL. ARGUMENTOS INSUFICIENTES PARA DESCONSTITUIR A DECISÃO ATACADA. 1. Cuida-se de de mandado de segurança onde se pretende a concessão da ordem para anular penalidade de demissão aplicada a Servidor Público devido à suposta prática da infração prevista no art. 132, IV, da Lei n. 8.112/1990, mediante a Portaria n. 293, de 20.08.2012 e publicada no DOU de 22.08.2012. 2. É firme o entendimento desta Corte de que o termo inicial do prazo prescricional do Processo Administrativo Disciplinar é a data do conhecimento inequívoco da infração pela autoridade competente para a instauração do PAD. 3. O prazo prescricional, previsto no art. 142 da Lei 8.213/1991 não se inicia no momento em que qualquer servidor tenha conhecimento dos fatos, mas, sim, no momento em que a autoridade competente para a abertura do processo administrativo disciplinar toma ciência, logo, o fato de a servidora ter apresentado declaração de IRPF retificadora em dezembro de 2003 e esclarecimentos ao Setor de Malha da DRF ? Volta Redonda/RJ em março de 2004 não tem o condão de deflagrar o termo inicial da prescrição. 4. O conhecimento dos fatos pela autoridade coatora somente se perfectibilizou após a abertura da Auditoria Patrimonial (Portaria ESCOR07 n. 68/2006, de 17.03.2006 ? fls 64/68e). Ato contínuo, foi constituída a Comissão de Sindicância Patrimonial, em 29.02.2008, sugerindo a instauração de processo administrativo disciplinar (fls. 69e e 82/97e), em 18.09.2009, que concluiu pela demissão da Acusada por suposta transgressão, em tese, ao disposto no inciso IV do art. 132 da Lei n. 8.112/1990 ? improbidade administrativa ? com a definição dada pelo art. 9º, VII, da Lei n. 8.429/1992 (fls. 98e e 132/289e), impondo à servidora a pena disciplinar de demissão, nos termos da Portaria n. 293, de 20.08.2012 (fl. 748e). 5.Nesse contexto, observo não assistir razão à Impetrante, no que toca à suscitada prescrição da pretensão punitiva, quando ainda não ultrapassado o prazo prescricional de 5 anos, entre a ciência dos fatos e a instauração do processo administrativo disciplinar. 6. Consoante o enunciado da Súmula n. 635 desta Corte, "os prazos prescricionais previstos no art. 142 da Lei n. 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido - sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar - e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção". 7. Nos casos de variação patrimonial a descoberto, resta caracterizado o dolo genérico na conduta do servidor que não demonstre a licitude da evolução patrimonial constatada pela Administração, caracterizado pela falta de transparência do servidor. 8. Em processo administrativo disciplinar, apenas se declara a nulidade de um ato processual quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa, por força da aplicação do princípio pas de nullité sans grief, não havendo efetiva comprovação, pelo Impetrante, de prejuízos por ele suportados, e, concluir em sentido diverso, demandaria dilação probatória, o que não é possível em sede de mandado de segurança, no qual se exige prova documental pré-constituída. Precedentes. 9. A Comissão Disciplinar não reconheceu a prática do delito administrativo somente em razão da inconsistência na declaração de imposto de renda da tia da servidora, que seria sua doadora, mas, em razão de diversas inconsistências verificadas nas provas apresentadas e nos testemunhos colhidos, inclusive, nas declarações dadas pela própria servidora no curso do processo administrativo disciplinar. 10. Nesse sentido, não é possível acolher a tese da ora agravante acerca de documento novo que comprova outro bem imóvel da doadora que não havia sido declarado em imposto de renda. Pois a conclusão que se pode extrair de tal prova é apenas acerca da irregularidade fiscal da doadora, contudo, não tem o documento o condão de comprovar a doação alegadamente recebida pela servidora. Nem mesmo tal documento teria o condão de ilidir todas as inconsistências bem delineadas no exame de todo o PAD, que não autorizam concluir pela absoluta regularidade do acréscimo patrimonial declarado. 11. Ao contrário do que sustenta a impetrante é seu o ônus de demonstrar a licitude de sua evolução patrimonial, não se revelando suficiente para isso a mera demonstração de que sua doadora não tinha regularidade fiscal. 12. Não apresentação de argumentos suficientes para desconstituir a decisão recorrida. 13. Agravo interno não provido. (AgInt no MS n. 19.524/DF, relatora Ministra Regina Helena Costa, Primeira Seção, julgado em 19/10/2021, DJe de 26/10/2021.) E nem se alegue que o que se faz, em casos tais, é admitir suposta responsabilidade objetiva do servidor. No âmbito do direito punitivo, é assente que a responsabilidade do agente é subjetiva, é dizer, deve ser aferido o elemento anímico daquele a quem se imputa determinada conduta ilícita. O reconhecimento da existência de dolo genérico, tal qual aqui delineado, afasta a alegação de que estaria a Administração responsabilizando o agente público de maneira objetiva. A alegação de que teria sido indevida a instauração da sindicância não se sustenta ao argumento de que os agravantes não eram investigados na sindicância original, nem eram partes nos procedimentos judiciais dela derivados. Embora os agravantes não fossem diretamente indicados na sindicância, os dados ali colhidos indicaram a existência de depósitos de valores elevados nas contas dos impetrantes/agravantes, originados da empresa Fratter Emprendimentos e Participações Ltda. Esclareça-se que os agravantes não integram o quadro societário. Apontou-se, ainda, envolvimento indevido do impetrante Ronaldo nas negociações da floresta de eucaliptos localizada na Fazenda Rio Formoso (de propriedade do pai do agravante Ronaldo), em operação superavaliada com a empresa Fibria Celulose S/A, autuada por seu irmão, também Auditor-Fiscal da Receita Federal, com prestação de consultoria para a implantação da referida floresta de eucalipto e possível utilização da sua influência junto ao grupo empresarial para beneficiar seu filho com um estágio a ser realizado em filial do grupo no exterior. Apontou-se, ainda, a possível atuação do impetrante junto à Construbroker para viabilizar operação milionária de planejamento sucessório e blindagem patrimonial, evolvendo a movimentação de valores vultosos em dinheiro, cuja origem não foi ainda explicada. Nesse contexto, justifica-se a instauração do procedimento, diante de indícios de enriquecimento ilícito e variação patrimonial incompatível com a renda dos impetrantes, bem como de prática de infração funcional. Tais elementos, como visto, não foram colhidos com violação de qualquer sigilo fiscal dos impetrantes, mas a partir de dados obtidos no âmbito da sindicância mencionada, dando ensejo à investigação que se seguiu. Por óbvio, trata-se de análise possível na estreita via do agravo de instrumento, sem prejuízo de melhor avaliação em outros meios recursais. Assim sendo, INDEFIRO o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso.” Ausente qualquer motivo para alteração, entendo que a decisão deve ser mantida. Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO ao agravo de instrumento." Em vista disso, constato que o acórdão recorrido tem fundamentação completa e regular para a lide posta nos autos. Ademais, o órgão julgador deve solucionar as questões relevantes e imprescindíveis para a resolução da controvérsia, não sendo obrigado a rebater (um a um) todos os argumentos trazidos pelas partes quando abrangidos pelas razões adotadas no pronunciamento judicial. A esse respeito, exemplifico com os seguintes julgados do E.STJ: AgInt nos EDcl no AREsp 1.290.119/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 30/08/2019; AgInt no REsp 1.675.749/RJ, Rel. Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 23/08/2019; REsp 1.817.010/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 20/08/2019; AgInt no AREsp 1.227.864/RJ, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 20/11/2018; e AREsp 1535259/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 07/11/2019, DJe 22/11/2019. Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração. É o voto.
E M E N T A
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. VARIAÇÃO PATRIMONIAL A DESCOBERTO. REQUISITOS. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. NÃO DEMONSTRAÇÃO.
- Nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, os embargos de declaração podem ser opostos contra qualquer decisão judicial para esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão de ponto ou questão, e corrigir erro material. E, conforme dispõe o art. 1.025 do mesmo CPC/2015, consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade.
- Embora essa via recursal seja importante para a correção da prestação jurisdicional, os embargos de declaração não servem para rediscutir o que já foi objeto de pronunciamento judicial coerente e suficiente na decisão recorrida. Os efeitos infringentes somente são cabíveis se o julgado tiver falha (em tema de direito ou de fato) que implique em alteração do julgado, e não quando desagradar o litigante.
- O acórdão recorrido tem fundamentação completa e regular para a lide posta nos autos. Ademais, o órgão julgador deve solucionar as questões relevantes e imprescindíveis para a resolução da controvérsia, não sendo obrigado a rebater (um a um) todos os argumentos trazidos pelas partes quando abrangidos pelas razões adotadas no pronunciamento judicial. Precedentes.
- Embargos de declaração rejeitados.