APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001269-24.2024.4.03.6112
RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA
APELANTE: JUSSARA OLIVERIO DA SILVA ALMEIDA, MAURICIO OLIVERIO PEREIRA DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: MARCOS PIOVEZAN FERNANDES - MG97622-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001269-24.2024.4.03.6112 RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA APELANTE: JUSSARA OLIVERIO DA SILVA ALMEIDA, MAURICIO OLIVERIO PEREIRA DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: MARCOS PIOVEZAN FERNANDES - MG97622-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (Relator): Cuida-se de recurso de apelação interposto por JUSSARA OLIVERIO DA SILVA ALMEIDA e MAURICIO OLIVERIO PEREIRA DA SILVA, em face da r. sentença proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara Federal de Presidente Prudente–SP, integrada pelo julgamento dos embargos de declaração, nos autos do cumprimento de sentença contra a União, que julgou extinto o processo e condenou os exequentes ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa observada a regra do artigo 98, § 3º do CPC. Na ocasião, entendeu o juízo sentenciante que, em virtude do acordo administrativo firmado entre as partes, não faz jus os exequentes ao recebimento do reajuste pleiteado. (ID 309895302). Os exequentes, em razões de apelação, alegam que o período executado é totalmente distinto ao mencionado pela executada no acordo administrativo. Requer a reforma da r. sentença (ID 309895309). A União apresentou contrarrazões (ID 309895312). É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001269-24.2024.4.03.6112 RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA APELANTE: JUSSARA OLIVERIO DA SILVA ALMEIDA, MAURICIO OLIVERIO PEREIRA DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: MARCOS PIOVEZAN FERNANDES - MG97622-A APELADO: UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (Relator): Trata-se de cumprimento de sentença contra UNIÃO, em que os exequentes requerem a incorporação do percentual de 28,86% em sua remuneração, reconhecida por sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública 0005019-15.1997.4.03.6000. As tutelas jurisdicionais coletivas são mecanismos processuais destinados à defesa de direitos e interesses que transcendem a esfera individual, abrangendo grupos, categorias ou mesmo a coletividade como um todo. Essas tutelas são especialmente relevantes em um contexto social onde o respeito aos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos se torna crucial, garantindo uma proteção efetiva e igualitária. O ordenamento jurídico brasileiro, dispõe de instrumentos específicos para a tutela coletiva, conforme estabelecido na Constituição Federal e em legislação específica, como o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90), a Lei da Ação Civil Pública (Lei 7.347/85) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90). Essa modalidade de tutela jurisdicional tem como principais objetivos a prevenção e reparação de danos que possam atingir a coletividade, além de promover o acesso à Justiça de forma mais ampla. A eficácia das tutelas coletivas se evidencia na possibilidade de decisões judiciais com efeito erga omnes, beneficiando todos os integrantes do grupo ou categoria afetados pela questão levada a juízo. Nesse sentido, os artigos 103 e 104 do Código de Defesa do Consumidor estabelecem normas específicas sobre a coisa julgada nas ações coletivas, apresentando um tratamento distinto em relação à disciplina geral, in verbis: Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este código, a sentença fará coisa julgada: I - erga omnes, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação, com idêntico fundamento valendo-se de nova prova, na hipótese do inciso I do parágrafo único do art. 81; II - ultra partes, mas limitadamente ao grupo, categoria ou classe, salvo improcedência por insuficiência de provas, nos termos do inciso anterior, quando se tratar da hipótese prevista no inciso II do parágrafo único do art. 81; III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81. § 1° Os efeitos da coisa julgada previstos nos incisos I e II não prejudicarão interesses e direitos individuais dos integrantes da coletividade, do grupo, categoria ou classe. § 2° Na hipótese prevista no inciso III, em caso de improcedência do pedido, os interessados que não tiverem intervindo no processo como litisconsortes poderão propor ação de indenização a título individual. § 3° Os efeitos da coisa julgada de que cuida o art. 16, combinado com o art. 13 da Lei n° 7.347, de 24 de julho de 1985, não prejudicarão as ações de indenização por danos pessoalmente sofridos, propostas individualmente ou na forma prevista neste código, mas, se procedente o pedido, beneficiarão as vítimas e seus sucessores, que poderão proceder à liquidação e à execução, nos termos dos arts. 96 a 99. § 4º Aplica-se o disposto no parágrafo anterior à sentença penal condenatória. Art. 104. As ações coletivas, previstas nos incisos I e II e do parágrafo único do art. 81, não induzem litispendência para as ações individuais, mas os efeitos da coisa julgada erga omnes ou ultra partes a que aludem os incisos II e III do artigo anterior não beneficiarão os autores das ações individuais, se não for requerida sua suspensão no prazo de trinta dias, a contar da ciência nos autos do ajuizamento da ação coletiva. No presente caso, trata-se de ação coletiva movida pelos sucessores, em nome próprio, fundamentada em direitos individuais homogêneos. A demanda busca a incorporação do percentual de 28,86% às remunerações de servidores, incluindo ativos, inativos e pensionistas. A coisa julgada resultante dessa ação possui características distintas daquelas aplicáveis às ações que tratam de interesses difusos e coletivos. Em contraste com os interesses difusos e coletivos, que são necessariamente protegidos por meio de ações coletivas propostas por legitimados específicos, os direitos individuais homogêneos podem ser resguardados tanto de forma coletiva quanto individualmente. Essa flexibilidade justifica o tratamento diferenciado da coisa julgada em ações relacionadas a esses direitos. Com base nessas características, estabelece-se que, nas ações coletivas fundamentadas em direitos individuais homogêneos, a sentença gerará coisa julgada erga omnes apenas em caso de procedência do pedido, beneficiando todos os demandantes e seus sucessores, conforme o art. 103, III, do CDC. Nessa ocasião, é permitido a execução direta da sentença sem a necessidade de novo processo de conhecimento. Por outro lado, se a ação coletiva for julgada improcedente, os efeitos da decisão não será “erga omnes” contra os titulares, que poderão ajuizar ações individuais para proteger seus direitos, desde que não tenham participado da ação coletiva como litisconsortes do autor da ação, conforme dispõe o artigo 103, § 2º do CDC. Além disso, no âmbito jurisprudencial, reconhece-se a legitimidade do exequente para buscar o cumprimento individual da sentença, mesmo quando domiciliado em área diversa daquela que corresponde à seção judiciária em que a sentença da ação coletiva foi prolatada. Cabe ressaltar a consolidação deste entendimento pelo Supremo Tribunal Federal, conforme expressado no Recurso Extraordinário 1.101.937, relacionado ao tema 1.075 de repercussão geral. Determinou-se que os efeitos da sentença não devem ser circunscritos à competência territorial do órgão emissor. Nesse sentido: “CONSTITUCIONAL E PROCESSO CIVIL. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 16 DA LEI 7.347/1985, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI 9.494/1997. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE DE RESTRIÇÃO DOS EFEITOS DA SENTENÇA AOS LIMITES DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DO ÓRGÃO PROLATOR. REPERCUSSÃO GERAL. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS DESPROVIDOS. 1. A Constituição Federal de 1988 ampliou a proteção aos interesses difusos e coletivos, não somente constitucionalizando-os, mas também prevendo importantes instrumentos para garantir sua pela efetividade. 2. O sistema processual coletivo brasileiro, direcionado à pacificação social no tocante a litígios meta individuais, atingiu status constitucional em 1988, quando houve importante fortalecimento na defesa dos interesses difusos e coletivos, decorrente de uma natural necessidade de efetiva proteção a uma nova gama de direitos resultante do reconhecimento dos denominados direitos humanos de terceira geração ou dimensão , também conhecidos como direitos de solidariedade ou fraternidade. 3. Necessidade de absoluto respeito e observância aos princípios da igualdade, da eficiência, da segurança jurídica e da efetiva tutela jurisdicional. 4. Inconstitucionalidade do artigo 16 da LACP, com a redação da Lei 9.494/1997, cuja finalidade foi ostensivamente restringir os efeitos condenatórios de demandas coletivas, limitando o rol dos beneficiários da decisão por meio de um critério territorial de competência, acarretando grave prejuízo ao necessário tratamento isonômico de todos perante a Justiça, bem como à total incidência do Princípio da Eficiência na prestação da atividade jurisdicional. 5. RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS DESPROVIDOS, com a fixação da seguinte tese de repercussão geral "I - É inconstitucional a redação do art. 16 da Lei 7.347/1985, alterada pela Lei 9.494/1997, sendo repristinada sua redação original. II - Em se tratando de ação civil pública de efeitos nacionais ou regionais, a competência deve observar o art. 93, II, da Lei 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor). III - Ajuizadas múltiplas ações civis públicas de âmbito nacional ou regional e fixada a competência nos termos do item II, firma-se a prevenção do juízo que primeiro conheceu de uma delas, para o julgamento de todas as demandas conexas"(STF, RE 1.101.937/SP, Pleno, DJe 24/08/2021) - Grifos acrescidos Nota-se que o Supremo Tribunal Federal, ao considerar inconstitucional o artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública, com redação da Lei nº 9.494/97, eliminou qualquer restrição aos efeitos condenatórios em ações coletivas, afastando a limitação territorial anteriormente imposta aos beneficiários dessas sentenças. Quanto aos efeitos decorrentes da aludida decisão, observa-se que a Corte não aplicou a modulação, baseando-se na inaplicabilidade do parágrafo 3º do artigo 927 do Código de Processo Civil, conforme posicionamento consolidado pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Constata-se, portanto, que a fundamentação do juízo sentenciante não incorpora os princípios que sustentam os interesses protegidos pela decisão coletiva. Ademais, no caso específico, a r. sentença proferida na ação coletiva, não restringiu a concessão do direito aos servidores localizados ou residindo no Estado do Mato Grosso do Sul, in verbis: “(...) Diante do exposto e por mais que dos autos consta, julgo procedente a presente ação para o fim de condenar os réus a incorporar o percentual de 28,86% às remunerações de seus servidores, ativos, inativos e pensionistas, não litigantes em outras ações ou cujas ações estejam suspensas e não firmatários de acordo, a partir de janeiro de 1993, com reflexos, respeitadas as datas de admissões, descontadas as reposições já feitas por força das Leis nº 8622/93 e 8627/93 (...)” Assim, no caso dos autos, a documentação anexada revela que os autores são herdeiros beneficiários da servidora Malvina Oliverio Pereira da Silva integrada a órgão identificado na exordial, possuindo direito às diferenças oriundas do reajuste dos 28,86% em decorrência das leis n° 8.622/1993 e 8.627/1993 . Ademais, ressalta-se que o referido servidor não foi excluído do rol de beneficiários da presente ação. Por outro lado, afirma a União, que a referida servidora recebeu pagamentos administrativos em razão de transação firmada alusiva ao reajuste de 28,86% no período de janeiro de 1993 a junho de 1998 (ID 309895286), e anexou documento com a ficha financeira referente a 1999 – 1 semestre a 2005 – 2º semestre com recebimentos da rubrica “ 00956 – Vant Administ. 28.86%” (fls. 7 - ID 309894130 e ID 309894129) Em análise, sabe-se que a Medida Provisória n° 2.169-43/2001 tratou especificamente sobre a realização de pagamento das diferenças do reajuste de 28,86%, devidas no período de 1993 a junho de 1998 feito ao servidores que não tinham ações individuais ajuizadas contra o ente público e àquelas que estavam em litígio judicial, in verbis: Art. 6º Os valores devidos em decorrência do disposto nos arts. 1º ao 5º, correspondentes ao período compreendido entre 1º de janeiro de 1993 e 30 de junho de 1998, serão pagos, a partir de 1999, em até sete anos, nos meses de maio e dezembro, mediante acordo firmado individualmente pelo servidor até 19 de maio de 1999. § 1º Os valores devidos até 30 de junho de 1994 serão convertidos em Unidade Real de Valor - URV, até aquela data, pelo fator de conversão vigente nas datas de crédito do pagamento do servidor público do Poder Executivo. § 2º Os valores de que trata o § 1º e os devidos após 30 de junho de 1994 serão, posteriormente a esta data e até o ano de 2000, atualizados monetariamente pela variação da Unidade Fiscal de Referência - UFIR e, a partir de 2001, pelo Índice de Preços ao Consumidor Ampliado - Especial - IPCA-E, acumulado ao longo do exercício anterior. Art. 7º Ao servidor que se encontre em litígio judicial visando ao pagamento da vantagem de que tratam os arts. 1º ao 6º, é facultado receber os valores devidos até 30 de junho de 1998, pela via administrativa, firmando transação, até 19 de maio de 1999, a ser homologada no juízo competente. § 1º Para efeito do cumprimento do disposto nesta Medida Provisória, a Advocacia-Geral da União e as Procuradorias Jurídicas das autarquias e fundações públicas federais ficam autorizadas a celebrar transação nos processos movidos contra a União ou suas entidades que tenham o mesmo objeto do Mandado de Segurança referenciado no art. 1o. § 2º Para efeito da homologação prevista no caput, a falta do instrumento da transação, por eventual extravio, será suprida pela apresentação de documento expedido pelo Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos - SIAPE, que comprove a celebração da avença. grifos acrescidos No que tange à comprovação da assinatura dos acordos extrajudiciais e à sua validade, o STJ afetou à sistemática dos recursos repetitivos os Temas 550 e 1102, sendo que o primeiro se refere aos casos previstos no artigo 6º e o segundos os casos dispostos no artigo 7° da aludida legislação. Cumpre destacar que, nos casos em que o servidor não ajuizava ação judicial pleiteando os valores em tela, o Superior Tribunal de Justiça estabeleceu que não se poderia exigir a homologação judicial para a validade do acordo celebrado extrajudicialmente, haja vista que o referido acordo, mesmo sem homologação, goza de presunção de legitimidade, assim como os pagamentos administrativos dele decorrentes. Neste sentido, foi firmada a tese no Tema 550: “É despicienda a homologação judicial do termo de transação extrajudicial, posto que inviável a execução de tal providência, diante da inexistência, à época da celebração do acordo, de demanda judicial entre as partes transigentes.” Assim foi ementado: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 458, II, E 535, II, DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AUDITOR FISCAL. REAJUSTE DE 28,86% SOBRE A RAV. INCIDÊNCIA NA FORMA INTEGRAL. LIMITAÇÃO TEMPORAL DO PAGAMENTO. MEDIDA PROVISÓRIA N. 1.915/99. EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA PROFERIDA EM AÇÃO COLETIVA. ACORDO EXTRAJUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO. DESNECESSIDADE. 1. Não se verificou, na hipótese, a alegada ofensa aos artigos 458, inciso II, e 535, inciso I, ambos do CPC. É que o Tribunal de origem abordou, de forma fundamentada, todos os pontos essenciais para o deslinde da controvérsia, conforme se pode verificar do acórdão de fls. 134/148-e, bem como na decisão dos aclaratórios acostada às fls. 79/92-e dos autos. 2. Por outro lado, o Poder Judiciário não está obrigado a emitir expresso juízo de valor a respeito de todas as teses e artigos de lei invocados pelas partes, bastando para fundamentar o decidido fazer uso de argumentação adequada, ainda que não espelhe quaisquer das linhas de argumentação invocadas. 3. Sobre a controvérsia em exame, o Tribunal de origem considerou que, por ocasião da entrada em vigor da Lei 8.627/93, o maior vencimento básico da tabela de Auditor Fiscal da Receita Federal era o da Classe "B", Padrão VI, cujos ocupantes, em razão da alteração legislativa, tiveram progressão remuneratória no percentual de 26, 66%. Para fundamentar tal entendimento, o voto condutor do acórdão faz referência a julgado desta Corte Superior, proferido nos autos do AgRg no AgRg no REsp n. 800.007/RS, (Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 06/06/2006, DJ 14/08/2006, p. 349). 4. Por sua vez, a parte recorrente alega que, à época da edição da Lei 8.627/93, o topo da carreira dos Auditores Fiscais era a Classe "A", Padrão III, e não a Classe "B", Padrão VI, o que, inclusive, já teria sido reconhecido por documento da Coordenação-Geral de Recursos Humanos do Ministério da Fazenda, juntado aos presentes autos. Sendo assim, os servidores que já estavam posicionados naquela classe/padrão não obtiveram o incremento de 26,66% em seus vencimentos. 5. A Lei 7.711/88 instituiu a Retribuição Adicional Variável - RAV, então calculada mensalmente com base na arrecadação, sem qualquer correlação com as verbas remuneratórias percebidas pelos servidores do cargo de Auditor Fiscal do Tesouro Nacional, para os quais era conferida uma pontuação decorrente de sua produtividade fiscal. Sendo assim, por ser uma vantagem decorrente da produtividade do servidor, sobre tal gratificação não incidia o percentual de 28,86%. 6. A partir da edição da Medida Provisória nº 831, de 18 de janeiro de 1995 (sucedida pela Medida Provisória nº 1.480-32 e reedições), posteriormente convertida na Lei 9.624, de 02 de abril de 1998, promoveu-se uma alteração da sistemática de retribuição da RAV, a qual passou a ser paga em valor fixo, correspondente ao seu teto de oito vezes o valor do maior vencimento da tabela da carreira de Auditor Fiscal do Tesouro Nacional 7. In casu, o acórdão do Tribunal de origem seguiu orientação que estava sedimentada na jurisprudência das Turmas da 3ª Seção, a qual, com todas as vênias, deve ser revista. 8. Não há que se confundir o pagamento do reajuste de 28,86% sobre o vencimento básico de um determinado Auditor Fiscal (o que é compensável pelo reposicionamento promovido pela Lei 8.627/93) com o pagamento do mesmo reajuste sobre a RAV, em que a base de cálculo é sempre o maior vencimento básico da respectiva tabela (= padrão A-III) multiplicado por oito, independentemente do padrão ocupado por este mesmo Auditor Fiscal. 9. No caso do Auditor Fiscal reposicionado do padrão B-VI para o A-III pela Lei 8.627/93 (utilizado como parâmetro pelo acórdão do Tribunal de origem para se chegar ao resíduo de 2,2%), há uma coincidência no fato deste padrão A-III surgir duas vezes no cálculo do reajuste de 28,86%: (i) está no vencimento básico deste Auditor Fiscal (aí sim, o reajuste de 28,86% sofrerá compensação pelo reposicionamento, o qual resultou em aumento de 26,66%); e (ii) está na base de cálculo da RAV (que, como visto, é sempre oito vezes o valor pago ao padrão A-III, independentemente do padrão ocupado pelo Auditor Fiscal). Ora, é situação que não se repete nos reposicionamentos dos Auditores Fiscais que estavam em outros padrões. Por exemplo, quem foi reposicionado do padrão B-V (Cr$-6.888.069,00 - Anexo II da Lei 8.622/92) para o A-II (Cr$-8.915.940,00 - Anexo II da Lei 8.622/92) por força do art. 3º, II, da Lei 8.627/93, beneficiou-se de outro percentual de reajuste no que se refere ao vencimento básico (29,44%), o qual deve ser considerado no pagamento dos 28,86% sobre esta verba; porém, o índice de 28,86% incide normalmente sobre a RAV. 10. É de se ressaltar que o padrão A-III, já se encontrava como o mais alto vencimento básico previsto pela Lei 8.460/92 (Anexo II), não tendo relevância a existência ou não de servidores ocupando padrões da classe A; e o aumento de valor promovido pelos arts. 1º e 2º da Lei 8.622/92 - de 100%, somado ao valor de Cr$-102.000,00 (cento e dois mil cruzeiros) - não é compensável no pagamento do reajuste de 28,86% sobre a RAV porque é reajuste de natureza diversa daquela constatada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RMS 22.307/DF, que reconheceu revisão geral de vencimentos no reajustamento a maior de 28,86% no mais alto soldo pago aos militares. 11. Por outro lado, por força do princípio do non reformatio in pejus, não há como determinar no caso a compensação do reposicionamento da Lei 8.627/93 no pagamento do reajuste de 28,86% sobre o vencimento básico do Auditor Fiscal. 12. Discute-se também a ocorrência ou não de violação frontal ao alcance da coisa julgada material na fase executória do título judicial produzido nos autos da Ação Ordinária n. 97.0003486-0, no qual se reconheceu o direito dos servidores públicos da carreira da Auditoria Fiscal do Tesouro Nacional de ter acrescido em seus vencimentos o percentual de reajuste de 28,86%, determinando a incidência do reajuste inclusive sobre a Retribuição Adicional Variável - RAV. 13. A matéria referente à compensação de reajustes em sede de execução foi posta a julgamento pelo rito previsto no art. 543-C do Código de Processo Civil, momento em que a Primeira Seção, em acórdão relatado pelo Ministro Castro Meira nos autos do Recurso Especial n.1.235.513/AL consignou que, após o trânsito em julgado da sentença do processo de conhecimento, acaso não haja previsão de qualquer limitação ao reajuste pelo índice de 28,86% em sua integralidade, é inviável promover, na fase executória, a compensação de valores já recebidos com base na Lei 8.627/93. 14. A interpretação a contrario sensu dessa orientação conduz à conclusão no sentido de que, havendo previsão no título executivo de exclusão de percentuais já concedidos, a mencionada imposição, em sede de embargos à execução, não importa violação da coisa julgada. 15. Na hipótese em análise, a edição da Medida Provisória n. 1.915, de 30.7.1999, promoveu uma reestruturação da Carreira Auditoria do Tesouro Nacional, alterando a sua nomenclatura para "Carreira Auditoria da Receita Federal", além de reajustar a remuneração, conceder aumento de um padrão para cada classe dos servidores em questão e extinguir a Retribuição Adicional Variável - RAV, que foi substituída pela Gratificação de Desempenho de Atividade Tributária - GDAT (art. 7º), calculada no percentual de até cinquenta por cento, incidente sobre o vencimento básico do servidor. 16. Destarte, é cabível a limitação ao pagamento do reajuste de 28.86% à data de reestruturação da carreira promovida pela Medida Provisória n. 1.915/99, a fim de que o percentual em comento seja absorvido pelos novos padrões remuneratórios estabelecidos. A ausência desse limite temporal, para se permitir a continuidade do pagamento do reajuste de 28,86%, resultaria num desbordamento desse percentual, o que sim representaria desrespeito à garantia da coisa julgada. 17. O acordo administrativo firmado por servidor que tenha ação em curso para se discutir a percepção das diferenças de vencimento somente surtirá efeitos sobre a lide quando homologado judicialmente. Entretanto, na hipótese dos autos, há uma peculiaridade que não pode ser desconsiderada, eis que houve exequente que fez acordo administrativo, mas não ajuizou individualmente ação de conhecimento, ou seja, não postulou, concomitantemente, tanto na esfera administrativa quanto na judicial, a percepção do reajuste em tela. 18. Desta feita, é despicienda a homologação judicial do termo de transação extrajudicial, posto que inviável a execução de tal providência, diante da inexistência, à época da celebração do acordo, de demanda judicial entre as partes transigentes. Precedentes: EREsp 1082526/RS, rel. Ministro Felix Fischer, Terceira Seção, DJe 12/03/2010; AgRg no REsp 1232758/RS, rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Turma, DJe 26/05/2011; AgRg no REsp 1221248/RS, rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Turma, DJe 26/04/2011; AgRg no REsp 1219171 / RS, rel. Ministro Benedito Gonçalves,DJe 25/03/2011. 19. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ n. 8/08. (REsp n. 1.318.315/AL, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 11/9/2013, DJe de 30/9/2013.) grifos acrescidos Por outro lado, no que se refere aos servidores que haviam proposto ações individuais, firmou-se o entendimento de que, para os acordos celebrados até a vigência da medida provisória mencionada, era imprescindível a homologação judicial do acordo extrajudicial. Na ausência desse homologação, os valores constantes nas fichas financeiras deveriam ser compensados em eventual liquidação judicial. Em contrapartida, a homologação se tornava indispensável e a validade do acordo poderia ser demonstrada por meio de fichas financeiras do ente público que comprovassem o pagamento administrativo, no caso de instrumentos de transação celebrados após a vigência da MP 1.962-33/2000. Confira-se a ementa do julgado do Tema 1102: PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL SOB O PROCEDIMENTO DOS RECURSOS REPETITIVOS. APLICAÇÃO DO ART. 7º, § 2º, DA MP 1.962-33/2000, REPRODUZIDO NA VIGENTE MP 2.169-43/2001. IMPOSSIBILIDADE DE COMPROVAÇÃO DAS TRANSAÇÕES CELEBRADAS ANTERIORMENTE À MP 1.962-33/2000 MEDIANTE DOCUMENTOS EXPEDIDOS UNILATERALMENTE PELO SIAPE. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. O objeto da ação é definir a possibilidade de comprovação de transação administrativa, relativa ao pagamento da vantagem de 28, 86%, por meio de fichas financeiras ou documento expedido pelo Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos - SIAPE, conforme o art. 7º, § 2º, da MP 2.169-43/2001, inclusive em relação a acordos firmados em momento anterior à vigência dessa norma. 2. O art. 840 do Código Civil é expresso em dizer de que forma deve ser feita a transação. Antes da edição da MP 1.962-33/2000, somente a escritura pública e o ajuste assinado por ambos os transigentes, e homologado judicialmente, faria prova do negócio jurídico. 3. Os extratos fornecidos pelo SIAPE poderiam, a princípio, demonstrar a existência de um pagamento, e não do ajuste celebrado. 4. A disposição contida no art. 7º, § 2º, da MP 1.962-33/2000, que foi reproduzida na vigente MP 2.169-43/2001, criou uma nova maneira de demonstração da existência do negócio jurídico, que anteriormente era feito por meio da apresentação da escritura pública ou instrumento de transação assinado por ambos os transigentes. 5. O meio de demonstração da transação criado pela MP 1.962-33/2000 é válido, mas somente pode ser aplicado aos negócios jurídicos celebrados após a sua edição, sob pena de surpreender os envolvidos e retroagir de forma prejudicial ao administrado. 6. Dessa forma, estando o acórdão recorrido em conformidade com a tese fixada, o REsp deve ser conhecido e improvido, mantendo-se íntegro o acórdão recorrido, nos termos da fundamentação. 7. Não é necessária a modulação dos efeitos do julgado, pois o instituto visa assegurar a efetivação do princípio da segurança jurídica, impedindo que o jurisdicionado de boa-fé seja prejudicado por seguir entendimento dominante que terminou superado, o que não ocorreu neste caso. 8. Tese jurídica firmada: "I) É possível a comprovação de transação administrativa, relativa ao pagamento da vantagem de 28,86%, por meio de fichas financeiras ou documento expedido pelo Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos - SIAPE, conforme art. 7º, § 2º, da MP nº 2.169-43/2001, apenas em relação a acordos firmados posteriormente à vigência dessa norma. II) Quando não for localizado o instrumento de transação devidamente homologado, e buscando impedir o enriquecimento ilícito, os valores recebidos administrativamente, a título de 28,86%, demonstrados por meio dos documentos expedidos pelo SIAPE, devem ser deduzidos do valor apurado, com as atualizações pertinentes". 9. Recurso especial conhecido e improvido, nos termos da fundamentação. 10. Recurso julgado sob a sistemática do art. 1.036 e seguintes do CPC/2015; e art. 256-N e seguintes do Regimento Interno deste STJ. (REsp n. 1.925.194/RO, relator Ministro Afrânio Vilela, Primeira Seção, julgado em 18/4/2024, DJe de 26/4/2024.) grifos acrescidos Assim sendo, para determinar se a alegação da existência de acordo extrajudicial e pagamento administrativo é suficiente para reconhecer a inexistência de valores a serem executados ou, alternativamente, se tais elementos devem ser considerados para reconhecer valores passíveis de compensação na execução individual de sentença coletiva, torna-se imprescindível, em cada situação, verificar a existência do referido acordo, a data de sua assinatura e a documentação pertinente que comprove o pagamento das verbas. No caso em apreço, embora não apresentado nos autos termo de acordo realizado entre as partes, de fato, existe comprovação de valor pago pela via administrativa (ID 309895286; fls. 7 - ID 309894130 e ID 309894129 ). Em face das peculiaridades do presente caso, estabelece-se a aplicação do entendimento consubstanciado no Tema 550 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), pelo qual é dispensado a homologação judicial. Portanto, a manutenção da sentença que julgou extinta o presente cumprimento de sentença é medida que se impõe. Logo, apesar de considerar que a parte recorrente é legítima para requerer o cumprimento da sentença, independentemente de sua lotação ou domicílio no Estado do Mato Grosso do Sul, entendo que, em virtude da realização de acordo entre as partes, não se pode cogitar a existência de valores a serem recebidos pela exequente. Diante do insucesso do recurso interposto é de ser aplicada a regra da sucumbência recursal estabelecida no art. 85, §11º do CPC, pelo que majoro 1% os honorários advocatícios fixados na r. sentença, totalizando 11% (onze por cento), acréscimo que se mostra adequado aos critérios legais estabelecidos no §2º, do art. 85 do CPC. Ante o exposto, nego provimento ao recurso, nos termos da fundamentação. É o voto.
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5001269-24.2024.4.03.6112 |
Requerente: | JUSSARA OLIVERIO DA SILVA ALMEIDA e outros |
Requerido: | UNIÃO FEDERAL |
Ementa: Direito administrativo e outras matérias de direito público. Apelação cível. Abono Pecuniário (Art. 78 Lei 8.112/1990).
I. Caso em exame
1. Cumprimento de sentença proferida na Ação Civil Pública n.º 0005019-15.1997.4.03.6000, que determinou a incorporação percentual a servidores, ativos, inativos e pensionistas.
II. Questão em discussão
2. A validade de acordo extrajudicial relativo ao pagamento do percentual de 28,86% e a desnecessidade de sua homologação judicial para efeitos de execução individual, além da possibilidade de aplicação da regra da sucumbência recursal.
III. Razões de decidir
3. O Tribunal reconheceu o direito à execução do percentual de 28,86% nas remunerações dos servidores e decidiu que a comprovação de acordo administrativo é suficiente para afastar valores a serem recebidos pela exequente. Nos termos do Tema 550 do STJ, é desnecessária a homologação judicial para validade do acordo, tendo em vista a presunção de legitimidade dos pagamentos administrativos realizados.
IV. Dispositivo e tese
5. Negou-se provimento ao recurso, mantendo a sentença que extinguiu o cumprimento de sentença, e majoraram-se os honorários advocatícios para 11%, considerando os critérios legais.
Tese de julgamento: Firmou-se a tese de que é dispensável a homologação judicial do termo de transação extrajudicial no cumprimento de sentença coletiva, conforme estabelecido no Tema 550 do STJ.
Jurisprudência relevante citada: EREsp 1082526/RS, AgRg no REsp 1232758/RS, AgRg no REsp 1221248/RS, AgRg no REsp 1219171/RS, e REsp n. 1.318.315/AL.