Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005555-24.2024.4.03.6119

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: SILVA E BARBOSA COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

Advogado do(a) APELADO: ALONSO SANTOS ALVARES - SP246387-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005555-24.2024.4.03.6119

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM GUARULHOS//SP

 

APELADO: SILVA E BARBOSA COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

Advogado do(a) APELADO: ALONSO SANTOS ALVARES - SP246387-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (Relator):

Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO, em ação mandamental, em face da sentença (ID 309192268) que concedeu a segurança, determinando à autoridade coatora que se abstenha da prática de qualquer ato tendente à exigência da contribuição previdenciária patronal, contribuição ao SAT/RAT e contribuições destinadas a outras entidades ou fundos (terceiros) sobre a remuneração paga aos menores aprendizes.

Insurgiu-se a União em recurso de apelação (ID 309192274), argumentando, em síntese, que o menor aprendiz deve ser considerado segurado obrigatório da Previdência Social na qualidade de empregado, e não como segurado facultativo; que o contrato de aprendizagem, previsto no art. 428 da Consolidação das Leis Trabalhistas, configura uma relação de emprego especial, preenchendo todos os requisitos legais para tanto; e que o Programa de Menores Assistidos (Decreto-Lei n.º 2.318/1986) não se confunde com o contrato de aprendizagem previsto na Consolidação das Leis Trabalhistas, de sorte que a isenção prevista naquele é inaplicável neste. Pugna, pois, pela reforma da sentença e improcedência dos pedidos deduzidos na inicial, mantendo-se a incidência das contribuições previdenciárias sobre a remuneração dos menores aprendizes.

Contrarrazões acostadas aos autos (ID 309192277).

O Ministério Público Federal, em parecer, se manifestou pela ausência de interesse de menores ou incapazes, ou interesse público relevante (ID 309751523).

Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005555-24.2024.4.03.6119

RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL, DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM GUARULHOS//SP

 

APELADO: SILVA E BARBOSA COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

Advogado do(a) APELADO: ALONSO SANTOS ALVARES - SP246387-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O EXCELENTÍSSIMO DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (Relator):

O cerne da controvérsia reside em definir se os menores aprendizes devem ser considerados segurados obrigatórios da Previdência Social, com a consequente incidência das contribuições previdenciárias sobre sua remuneração. 

Assiste razão à UNIÃO, pelos fundamentos seguintes. 

O art. 428 do Decreto-Lei nº 5.452/1943 (Consolidação das Leis do Trabalho - CLT) contém previsão do contrato de trabalho, definindo-o nos seguintes termos: 

Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.”

Nota-se que, apesar de suas peculiaridades, o contrato de aprendizagem é expressamente caracterizado como um contrato de trabalho especial. Portanto, salvo disposição legal em contrário, aplicam-se ao aprendizes os direitos trabalhistas e previdenciários inerentes à relação de emprego. 

De seu turno, a Lei nº 8.213/1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, em seu art. 11, descreve quem são considerados segurados obrigatórios, definindo, no inciso I, “a”, a categoria de empregado nos seguintes termos: 

"Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

I - como empregado:

a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;"

Dessume-se assim que o contrato de aprendizagem, conforme definido no art. 428 da CLT, preenche todos os requisitos elencados no art. 11, I, “a”, da Lei nº 8.213/1991. Portanto, o menor aprendiz enquadra-se na categoria de segurado obrigatório da Previdência Social na qualidade de empregado.

Corroborando esse entendimento, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990) dispõe em seu art. 65:

"Art. 65. Ao adolescente aprendiz, maior de quatorze anos, são assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários."

Sendo o menor aprendiz considerado segurado obrigatório, sua remuneração integra a base de cálculo das contribuições previdenciárias, nos termos do art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991:

"Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:
I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa."

A jurisprudência tem se consolidado no sentido de reconhecer a incidência das contribuições previdenciárias sobre a remuneração dos menores aprendizes.

Cito julgados da Segunda Turma deste Eg. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que componho: 

“APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. DISTINÇÃO ENTRE MENOR ASSISTIDO E JOVEM APRENDIZ. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE O TRABALHO DO MENOR APRENDIZ. APELAÇÃO DESPROVIDA.    

-  Quanto ao pedido de antecipação da tutela recursal. A r. sentença de improcedência, com resolução do mérito, não concedeu à impetrante a pretensão deduzida na petição inicial. Ausência de demonstração do risco de dano irreparável ou de difícil reparação.

- A Constituição Federal, confirmando seu viés social, confere especial proteção aos jovens.  Contudo, imperativo destacar a distinção entre o menor assistido e o jovem aprendiz.      

- O trabalho do menor assistido é regido pelo Decreto-Lei Nº 2.318, de 30 de dezembro de 1986, que de modo taxativo isenta a empresa de recolhimentos previdenciários de qualquer natureza sobre os valores pagos aos menores assistidos, inclusive quanto ao depósito do FGTS (Decreto-Lei Nº 2.318, art. 4°, § 4°).  Já o trabalho do jovem aprendiz é regido, entre outros, pela Lei n° 10.097/2000, que alterou dispositivos da CLT.   

- Ao contrário do que prevê a legislação atinente ao menor assistido, há expressa previsão legal acerca da incidência da contribuição previdenciária e do FGTS sobre os valores correspondentes à remuneração percebida pelo jovem aprendiz.  Vide artigo 65 do Estatuto da Criança e do Adolescente e art. 15, § 7º, da Lei n. 8.036/90.   

- Tendo em vista o resultado, julgo prejudicado o pedido de compensação.  

-  Indevidos honorários advocatícios na espécie. Súmula nº 105 do STJ.      

- Apelação desprovida.”                        

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001808-67.2023.4.03.6130, Rel. Desembargador Federal RENATA ANDRADE LOTUFO, julgado em 28/11/2024, Intimação via sistema DATA: 28/11/2024) - grifos acrescidos

 

“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. MENOR APRENDIZ. TRABALHADOR ENTRE 14 ANOS E 24 ANOS DE IDADE. RELAÇÃO DE EMPREGO. INCIDÊNCIA DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. DECRETO-LEI Nº 2.318/1986. REVOGAÇÃO. AMPLA NORMATIZAÇÃO POR LEGISLAÇÃO SUPERVENIENTE. 

- Considerando o art. 7º, XXXIII, da Constituição, entre 12 e até completarem 14 anos de idade, não é admitido qualquer trabalho, embora o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei nº 8.069/1990), visando à formação técnico-profissional, estimule que empresas paguem a adolescentes "bolsa aprendizagem", sem caracterização de relação de emprego regida pela CLT, e, logo, sem repercussão no âmbito de previdência e do FGTS (art. 64). Coerente com essa situação jurídica, o art. 28, §9º, "u", da Lei nº 8.212/1991 reconhece que pagamentos feitos a adolescentes até completarem 14 anos de idade, a título de "bolsa aprendizagem", não têm incidência de contribuição previdenciária patronal ou do menor.

- Contudo, na condição de menor aprendiz, o art. 65 do ECA expressamente estabelece que ao adolescente aprendiz, maior de 14 anos e até 24 anos, são assegurados os direitos trabalhistas e previdenciários, do que decorrem contrapartidas dos empregadores, inclusive a incidência de contribuição previdenciárias. Nada há de indenizatório nos pagamentos feitos pelo empregador ao aprendiz, sendo claro que a  regra de isenção do art. 28, §9º, "u", da Lei nº 8.212/1991 diz respeito a outro regime jurídico para adolescentes antes de completarem 14 anos de idade.

- Não está mais vigendo a regra prevista no art. 4º do Decreto-Lei nº 2.318/1986 diante da ampla reformulação normativa promovida pelo art. 7º, XXXIII, da Constituição (com Emenda Constitucional nº 20/1998), pelo ECA (Lei nº 8.069/1990, art. 60 a art. 69), e pela Lei nº 10.097/2000, e pela CLT (especialmente o art. 428 da CLT, com as alterações da Lei nº 11.180/2005). E o art. 13 da Lei nº 8.213/1991 considerada o aprendiz como segurado facultativo tão somente quando não se configurar a situação do art. 11 da mesma lei (o que, à evidência, torna-se obrigatório quando houver contratação por empregador, legitimando a tributação nos moldes da Lei nº 8.212/1991).

- No caso dos autos, a impetração diz respeito a contratos de aprendizagem de pessoas maiores de 14 anos e menores de 24, que estão sujeitas às características próprias de relação de emprego (em tarefas como de higiene, limpeza, serviços administrativos etc.), ainda que a documentação acostada aos autos indique contratação nos moldes do art. 428 da CLT e da Lei nº 10.0097/2000, legitimando a incidência de contribuição previdenciária. Ademais, os exemplos de contrato juntados pela impetrante dão conta que há anotação na CTPS do trabalhador e obrigação pelo recolhimento de tributos e contribuições previdenciárias incidentes de contratação, sendo certo que a via mandamental eleita não comporta dilação probatória.

- Apelação das impetrantes desprovida.                                     

(TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5020297-82.2022.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 26/07/2023, Intimação via sistema DATA: 26/07/2023) - grifos acrescidos

 

No mesmo sentido, o e. Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

"MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA PATRONAL. ADICIONAIS DE ALÍQUOTA DESTINADOS AO SAT/RAT E TERCEIROS. MENOR APRENDIZ. ART. 7º, XXXIII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.

1. A modalidade de contratação intitulada de "menor assistido", não se confunde com a de "menor aprendiz". A primeira, foi criada pelo DL 2.318/1986 e regulamentada no Decreto 94.338/1987, esse último posteriormente revogado por ato normativo que não estabeleceu nova regulamentação. Já, o "menor aprendiz", veio a existir somente no ano 2000, através da Lei nº 10.097, e foi destinada a pessoa maior de quatorze e menor de dezoito anos. Posteriormente, a Lei nº 11.180, de 2005, alterou as regras do contrato de aprendizagem, consolidando a redação do art. 428 da CLT.

2. O menor aprendiz, contratado nos termos do artigo 428 da CLT é sim segurado obrigatório da previdência social, já que o artigo 12 da Lei de Benefícios da Previdência Social, Lei nº 8.213/91, arrola entre os segurados obrigatórios da Previdência Social "aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração", sendo que o artigo 14 da mesma lei só considera segurado facultativo o maior de 14 (quatorze) anos que não estiver incluído nas disposições do artigo 12, o que não é o caso do menor aprendiz.

3. O artigo 11 do Decreto 3.048/1999 não incluiu o menor aprendiz dentre aqueles que podem se filiar facultativamente ao Regime Geral de Previdência Social, o que confirma a sua condição de segurado obrigatório em decorrência da relação mantida com a empresa a qual está vinculado como menor aprendiz, empresa esta que, por sua vez, tem a obrigação de recolher a contribuição previdenciária patronal e de terceiros sobre a remuneração paga aos menores aprendizes, conforme determina o artigo 22 da Lei nº 8.212/1991."

(TRF-4 - AC: 50097650520224047108, Relator: MARIA DE FÁTIMA FREITAS LABARRÈRE, Data de Julgamento: 18/10/2022, SEGUNDA TURMA) - grifos acrescidos

 

Por derradeiro, a alegação da impetrante de que a remuneração dos menores aprendizes estaria isenta das contribuições previdenciárias com base no art. 4º, §4º, do Decreto-Lei nº 2.318/1986, não prospera.    

Referido decreto-lei trata do programa de "menores assistidos", que não se confunde com o contrato de aprendizagem regulamentado pela CLT. Ademais, o Programa de Menores Assistidos encontra-se atualmente sem regulamentação, vez que o Decreto nº 94.338/1987, que o regulamentava, foi revogado pelo Decreto s/n de 10 de maio de 1991. Assim, não há que se falar em aplicação da isenção prevista no Decreto-Lei nº 2.318/1986 aos contratos de aprendizagem celebrados nos termos da CLT.

Custas ex lege.

Sem condenação em honorários advocatícios, nos termos do art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e Enunciado da Súmula nº 105 do C. Superior Tribunal de Justiça. 

Desse modo, reconheço a incidência das contribuições previdenciárias patronais, contribuições ao SAT/RAT e contribuições destinadas a outras entidades ou fundos (terceiros) sobre a remuneração paga aos menores aprendizes.

Ante o exposto, dou provimento à apelação da União e à remessa necessária, nos termos da fundamentação.

É o voto.

 



E M E N T A

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. MENOR APRENDIZ. EMPREGADO. SEGURADO OBRIGATÓRIO. INCIDÊNCIA. 

1 - O contrato de aprendizagem, previsto no art. 428 da CLT, configura relação de emprego especial, preenchendo os requisitos legais para caracterização do vínculo empregatício.

2 - O menor aprendiz é considerado segurado obrigatório da Previdência Social, na qualidade de empregado, conforme art. 11, I, "a" da Lei nº 8.213/1991 e art. 65 do Estatuto da Criança e do Adolescente.

3 - Incidência de contribuição previdenciária patronal, contribuição ao SAT/RAT e contribuições destinadas a outras entidades ou fundos (terceiros) sobre a remuneração paga aos menores aprendizes, nos termos do art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991.

4 - Inaplicabilidade da isenção prevista no Decreto-Lei nº 2.318/1986, que trata do Programa de Menores Assistidos, hipótese esta distinta do contrato do menor aprendiz regulamentado pela CLT.

5 - Jurisprudência consolidada no sentido de reconhecer a incidência das contribuições previdenciárias sobre a remuneração dos menores aprendizes.

6 - Apelação e remessa necessária providas.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Turma decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da União e à remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
ALESSANDRO DIAFERIA
DESEMBARGADOR FEDERAL