APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003085-54.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADJALMA FREITAS
REPRESENTANTE: BETH FREITAS
Advogados do(a) APELADO: JOSE ROBERTO MARQUES BARBOSA JUNIOR - MS20461-A,
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003085-54.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ADJALMA FREITAS Advogados do(a) APELADO: JOSE ROBERTO MARQUES BARBOSA JUNIOR - MS20461-A, R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta em face de sentença, integrada por embargos de declaração, que julgou procedente o pedido de restabelecimento de pensão por morte (NB 21/138.445.379-0), desde a cessação administrativa, com acréscimo dos consectários legais. Houve antecipação da tutela jurídica e dispensa do reexame necessário. A Autarquia Previdenciária suscita, preliminarmente, a falta de interesse de agir, diante da ausência de pedido administrativo de restabelecimento de benefício, além da ausência de pressuposto processual, uma vez que não citado litisconsorte passivo necessário, filha menor do mesmo instituidor. No mérito, alega ser indevido o restabelecimento do benefício, por haver "fortes indícios de graves irregularidades e/ou fraude na obtenção benefício previdenciário de pensão por morte (NB:21/138.445.379-0), ao qual pretende o autor seja restabelecido com pagamento retroativo à cessação" e requer a reforma integral do julgado. Subsidiariamente, requer: "1. A observância da prescrição quinquenal; 2. Seja a parte intimada a firmar e juntar aos autos a autodeclaração prevista no anexo I da Portaria INSS nº 450, de 03 de abril de 2020, em observância às regras de acumulação de benefícios estabelecida no art. 24, §§ 1.º e 2.º da Emenda Constitucional 103/2019; 3. Nas hipóteses da Lei 9.099/95, caso inexista nos autos declaração com esse teor, seja a parte autora intimada para que renuncie expressamente aos valores que excedam o teto de 60 (sessenta) salários-mínimos na data da propositura da ação e que eventualmente venham a ser identificados ao longo do processo, inclusive em sede de execução (renúncia expressa condicionada); 4. A fixação dos honorários advocatícios nos termos da Súmula 111 do STJ; 5. A declaração de isenção de custas e outras taxas judiciárias; 6. O desconto, de eventual montante retroativo, dos valores já pagos administrativamente ou de qualquer benefício inacumulável recebido no período, bem como pelo deferimento da cobrança de eventuais valores pagos indevidamente à parte autora em sede de antecipação dos efeitos da tutela." Com contrarrazões, os autos subiram a esta Corte. O Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso. É o relatório.
REPRESENTANTE: BETH FREITAS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003085-54.2023.4.03.9999 RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: ADJALMA FREITAS Advogados do(a) APELADO: JOSE ROBERTO MARQUES BARBOSA JUNIOR - MS20461-A, OUTROS PARTICIPANTES: V O T O - V I S T A O Exmo. Desembargador Federal Gilberto Jordan: Em sessão realizada em 19/02/2025, a e. relatora proferiu voto para dar provimento ao apelo autárquico, reconhecendo a improcedência do pedido de pensão por morte formulado pelo autor da demanda. Com a devida vênia, divirjo da e. relatora, no tocante à qualidade de dependente do autor, na condição de filho do falecido segurado. O autor acostou aos autos certidão de nascimento emitida pela FUNAI em 2003, anos antes do óbito do segurado (ID 275791672, pág. 74). Os documentos emitidos pela FUNAI possuem a mesma validade dos registros civis. Anote-se o disposto nos arts. 12 e 13 da Lei n. 6.001/1973 (Estatuto do Índio): "Art. 12. Os nascimentos e óbitos, e os casamentos civis dos índios não integrados, serão registrados de acordo com a legislação comum, atendidas as peculiaridades de sua condição quanto à qualificação do nome, prenome e filiação. Parágrafo único. O registro civil será feito a pedido do interessado ou da autoridade administrativa competente." "Art. 13. Haverá livros próprios, no órgão competente de assistência, para o registro administrativo de nascimentos e óbitos dos índios, da cessação de sua incapacidade e dos casamentos contraídos segundo os costumes tribais. Parágrafo único. O registro administrativo constituirá, quando couber documento hábil para proceder ao registro civil do ato correspondente, admitido, na falta deste, como meio subsidiário de prova". Nesse sentido, trago à colação a ementa do seguinte julgado, proferido por esta Egrégia Corte: “PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. INDÍGENA. DOCUMENTOS EMITIDOS PELA FUNAI. VALIDADE. ÓBITO, QUALIDADE DE SEGURADO E DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADOS. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. AUTORA ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. DIB FIXADA NA DATA DO ÓBITO. 1. Nos termos dos artigos 74 e 26 da Lei 8.213/91, a pensão por morte é devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, independentemente de carência. 2. De acordo com os artigos 12 e 13 da Lei n 6.001/73 (Estatuto do Índio), os documentos emitidos pela FUNAI possuem a mesma validade dos registros civis. 3. Comprovados o óbito, a qualidade de segurado do falecido e a dependência econômica da parte autora, restaram satisfeitos todos os requisitos exigidos. 4. Preenchidos os requisitos necessários à concessão do benefício, faz jus a autora ao recebimento da pensão por morte. 5. O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do falecimento do segurado (29/12/1999), nos termos do artigo 74, I, da Lei nº 8.213/91, uma vez que na ocasião a autora era absolutamente incapaz, em face de quem não corre prescrição (art. 3º c/c art. 198, I, do CC/02, com a redação vigente à época, e art. 79 c/c art. 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91). (...) 8. Remessa oficial e apelação do INSS desprovidas. Fixados, de ofício, os consectários legais” (TRF3, 10ª Turma, ApReeNec 00010573820124036006/SP, Relator Desembargador Federal Nelson Porfírio, e-DJe 08/11/2007). O extrato do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV revela que, em razão do nascimento da irmã do autor (Jani Freitas), ocorrido em 15 de março de 1998, o INSS efetuou o pagamento administrativo do benefício de salário maternidade (NB 80/138.445.317-0), em prol da genitora (Doraci Arce), o qual esteve em vigor até 11 de julho de 1998 (id. 275791672 – p. 49). Implica em dizer que o reconhecimento da relação de parentesco entre o autor, sua irmã e seus genitores pelo INSS remonta à época remota, ocorrido muito antes do falecimento do segurado instituidor (15/12/2006). Eventuais dúvidas concernentes à real filiação do autor, em razão da idade da mãe e do pai não foram objeto de persecução exauriente pelos órgãos competentes. Não há qualquer ato oficial de anulação do registro de nascimento do autor em razão de fraude e descaberia ao INSS por mera suposição e ilação de seus servidores cessar o pagamento do benefício da pensão por morte paga ao então menor de idade e declarando inválido o registro para fins previdenciários, extrapolando sua competência. Ainda que tenha ocorrido na hipótese a “adoção à brasileira”, cabe ao Estado amparar e proteger o direito do menor e não o punir com a cessação da verba alimentar e ainda o considerar filho de ninguém. Some-se a isso que o povo indígena tem sua própria cultura e costumes, por vezes com linguagem própria, portanto, não se pode exigir o grau de exatidão e acurácia das informações a serem prestadas aos órgãos públicos que se exigiria de um morador nascido e criado nos centros urbanos. Certo é que, produzida a prova testemunhal, os depoentes reconhecem o autor como filho do falecido segurado, e, portanto, deve-se determinar o restabelecimento do benefício, a contar da data da cessação indevida. NÃO INCIDÊNCIA DE PRESCRIÇÃO O autor, nascido em 04 de junho de 2002, por ocasião do ajuizamento da presente demanda (05/10/2016), contava com 14 anos de idade, não havendo parcelas atingidas pela prescrição quinquenal. De fato, tendo em vista a natureza prescricional do prazo estipulado no art. 74 e o disposto no parágrafo único do art. 103, ambos da Lei nº 8.213/91, e art. 198, I, do Código Civil (Lei 10.406/2002), os quais vedam a incidência da prescrição contra os menores de dezesseis anos. Assim, o benefício deve ser pago até a data em que atingiu o limite etário de 21 anos, ocorrido em 04 de junho de 2023. Por ocasião da liquidação da sentença, deverá ser compensado o valor das parcelas já auferidas pelo autor, por força da tutela antecipada deferida no curso da demanda. BENEFÍCIO AUFERIDO POR OUTRO DEPENDENTE O dependente incapaz que não pleiteie a pensão por morte no prazo estipulado pelo art. 74, I da Lei 8.213/91, não tem direito ao recebimento do referido benefício a partir da data do falecimento do instituidor, na hipótese em que outro dependente, integrante do mesmo núcleo familiar, já tiver recebido o benefício, evitando-se a dupla condenação da autarquia previdenciária. Precedente: AgRg no REsp 1.523.326/SC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 18/12/2015; REsp 1.513.977/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/6/2015, DJe 5/8/2015. Conforme se depreende do processo administrativo que instrui a presente demanda, em decorrência do falecimento do genitor (Dorico Freitas), ocorrido em 15 de dezembro de 2006, o INSS instituiu administrativamente o benefício de pensão por morte (NB 21/138.445.379-0), o qual esteve em vigor entre 15 de dezembro de 2006 e 31 de janeiro de 2012. O extrato do Sistema Único de Benefícios – DATAPREV revela que a pensão por morte (NB 21/138.445.379-0) foi paga em rateio entre o autor e sua irmã (Jani Freitas), ou seja, a suspensão administrativa do benefício implicou na cessação do pagamento para ambos, contudo, apenas o autor pleiteou o restabelecimento de sua cota-parte (id. 275791673 – p. 14). O extrato carreado aos autos pelo INSS, em suas razões recursais, o qual aponta que o pagamento da pensão por morte até 06 de novembro de 2019, data em que a irmã Jani de Freitas completou 21 anos de idade, refere-se a benefício diverso (NB 21/175.466.104-9). Aludida pensão foi instituída administrativamente em prol de Jani Freitas, em decorrência do falecimento da genitora, Doraci Arce, ocorrido em 11 de novembro de 2010, conforme demonstra a respectiva certidão de óbito (id. 275791672 – p. 49). Por outras palavras, ao contrário do suscitado pelos INSS, a condenação ao restabelecimento da pensão por morte de que trata os presentes autos (NB 21/138.445.379-0) não implicará na quitação do mesmo benefício em duplicidade. Frise-se, ademais, que as parcelas da pensão pela morte do genitor, cujo restabelecimento não foi pleiteado pela irmã do autor (Jani Freitas), que atingiu o limite etário em 06 de novembro de 2019, foram atingidas pela prescrição quinquenal. DA APLICAÇÃO ÚNICA DA SELIC A PARTIR DA EC 113, DE 08/12/21 Desde o mês de promulgação da Emenda Constitucional n. 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado, com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015, bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal. Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS A teor do disposto no art. 4º, I, da Lei Federal nº 9.289/96, as Autarquias são isentas do pagamento de custas na Justiça Federal. De outro lado, o art. 1º, §1º, deste diploma legal, delega à legislação estadual normatizar sobre a respectiva cobrança nas causas ajuizadas perante a Justiça Estadual no exercício da competência delegada. Assim, o INSS está isento do pagamento de custas processuais nas ações de natureza previdenciária ajuizadas nesta Justiça Federal e naquelas aforadas na Justiça do Estado de São Paulo, por força da Lei Estadual/SP nº 11.608/03 (art. 6º). Contudo, a legislação do Estado de Mato Grosso do Sul que dispunha sobre a isenção referida (Leis nº 1.135/91 e 1.936/98) fora revogada a partir da edição da Lei nº 3.779/09 (art. 24, §§1º e 2º), razão pela qual é de se atribuir ao INSS o ônus do pagamento das custas processuais nos feitos que tramitam naquela unidade da Federação. De qualquer sorte, é de se ressaltar, que o recolhimento somente deve ser exigido ao final da demanda, se sucumbente. PREQUESTIONAMENTO Cumpre salientar, diante de todo o explanado, que a r. sentença monocrática não ofendeu qualquer dispositivo legal, não havendo razão ao prequestionamento suscitado pelo Instituto Autárquico. DISPOSITIVO Pelo exposto, com a devida vênia da e. Relatora, rejeito a matéria preliminar e dou parcial provimento à apelação do INSS, apenas para alterar os critérios de incidência da correção monetária, mantendo o restabelecimento da pensão por morte (NB 21/138.445.379-0), entre a data em que havia sido suspensa e aquela em que o autor atingiu o limite etário de 21 anos (04/06/2023), na forma da fundamentação. Os honorários advocatícios deverão ser fixados por ocasião da liquidação do julgado. É o voto.
REPRESENTANTE: BETH FREITAS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003085-54.2023.4.03.9999
RELATOR: Gab. 31 - DES. FED. DALDICE SANTANA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ADJALMA FREITAS
REPRESENTANTE: BETH FREITAS
Advogados do(a) APELADO: JOSE ROBERTO MARQUES BARBOSA JUNIOR - MS20461-A,
V O T O
O recurso preenche os pressupostos de admissibilidade e merece ser conhecido.
Preliminarmente, rejeito a alegação de falta de interesse processual, pois a parte autora, na condição de suposto filho menor do falecido Dorico Freitas, apresentou prévio requerimento administrativo do benefício (NB 21/138.445.379-0).
Nesta ação, pretende o restabelecimento do benefício desde a cessação administrativa, estando patente, portanto, o interesse processual, conforme entendimento do Recurso Extraordinário n. 631.240/MG do Supremo Tribunal Federal (STF).
Também não há falar em necessidade de regularização do polo passivo porque a outra dependente habilitada, Jani Freitas (nascida em 15/3/1998), contava mais de 18 anos na data do ajuizamento desta ação.
No mérito, discute-se o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício de pensão por morte, previsto nos artigos 74 a 79 da Lei n. 8.213/1991, cujo texto original, alterado diversas vezes ao longo dos anos, vigora atualmente com a redação dada pela Lei n. 13.846/2019.
No entanto, em atenção ao princípio tempus regit actum, aplica-se, no tocante à concessão desse benefício previdenciário, a lei vigente à época do fato que o originou, qual seja, a da data do óbito.
De toda forma, são requisitos para a obtenção de pensão por morte: a condição de dependente e a qualidade de segurado do falecido.
Segundo o artigo 26, I, da Lei n. 8.213/1991, a concessão do benefício independe do cumprimento de período de carência, conquanto sua duração possa variar conforme a quantidade de contribuições recolhidas pelo instituidor, como previsto no artigo 77 da mesma lei.
Quanto à condição de dependente do segurado, o artigo 16 da Lei n. 8.213/1991 estabelece o rol dos beneficiários, divididos em três classes, e indica as hipóteses em que a dependência econômica é presumida e aquelas em que esta deverá ser comprovada.
No caso em análise, o autor postula o restabelecimento do benefício de pensão por morte (NB 21/138.445.379-0), uma vez que o benefício foi cessado na via administrativa em 31/1/2012, em razão do motivo 65: “suspenso por mais de 06 meses sem o saque do benefício”.
O óbito de Dorico Freitas ocorreu em 15/12/2006, consoante certidão de óbito apresentada quando do ajuizamento desta ação.
A qualidade de segurado do de cujus é incontroversa, pois ele era beneficiário de aposentadoria por idade rural na data do óbito (NB 41/119.088.294-6).
O autor, nascido em 4/6/2002, é supostamente filho menor do falecido, consoante demonstrado por meio de certidão de nascimento e de seus documentos pessoais.
Ao que se depreende do Relatório Individual emitido pela Gerência Executiva do INSS de Dourados/MS, a autarquia, em reanálise às peças concessórias e os dados constantes no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS), vislumbrou, em resumo, as seguintes irregularidades quando da concessão do benefício:
“Em análise a regularidade da concessão, de acordo com o artigo 11 da Lei n. 10.666/2003, concluímos existirem os seguintes indícios de irregularidade:
a) mãe da titular (Doraci Arce nascida em 01.11.1941) com mais de 50 anos na data do nascimento da filha (Jani Freitas nascida em 15.03.1998).
Na tentativa de saneamento da dúvida e regularização do processo, na forma do artigo 30 da OI/INSS/DIRBEN/110/2005 emitimos ofício à FUNAI solicitando esclarecimentos, conforme fls. 31 a 41 e 45, cujas respostas não forneceram dados conclusivos, motivo pelo qual emitimos solicitação de pesquisa de fls. 46.
Em resposta às informações solicitadas na pesquisa, não houve confirmação da veracidade do registro de nascimento por existir rasura, sem ordem cronológica e nome da mãe da titular diferente da tutora nata cadastrada no processo (Dora Arce/Doraci Arce), bem como a informação do coordenador técnico da FINAI às fls. 48 do motivo de existência de registros de nascimentos para supostas mães com mais de 50 anos de idade, que na realidade não são as genitoras.”
Com efeito, no processo administrativo, há indícios de irregularidade na obtenção benefício previdenciário de pensão por morte (NB 21/138.445.379-0), ao qual pretende o autor seja restabelecido com pagamento retroativo à cessação.
Quando do nascimento do autor, em 4/6/2002, o instituidor Dorico Freitas, nascido em 12/8/1940, contava com 62 (sessenta e dois) anos, e a suposta genitora, Doraci Arce, representante legal, nascida em 1º/11/1941, contava com 61 (sessenta e um) anos de idade, demonstrando fragilidade probatória das certidões emitidas para comprovar a progenitura (materna e paterna) do autor.
Acrescente-se ainda o fato que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) desconhecia, à época da concessão do benefício previdenciário, esquema de fraude em pensões de indígenas, com participação, inclusive, de funcionário da Fundação Nacional do Índio (FUNAI). No caso, verifica-se que a certidão de óbito de Doraci Arce, a suposta genitora do autor, foi emitida por funcionário expressamente mencionado em operações de investigação da Polícia Federal.
A Polícia Federal instaurou Inquérito Policial n. 130/2015, em 3/6/2016, sob codinome “Operação Uroboros”, tendo como objeto a atuação de organização criminosa estruturada por servidor da FUNAI que, se utilizando de sua posição aliciava os indígenas para obter vantagens indevidas decorrentes da concessão fraudulenta de benefícios previdenciários, na região de Amambaí/MS.
Destaque para a contradição relativa à data do óbito do instituidor Dorico Freitas, filho de Inácio Freitas e Danacia Aquino. Segundo certidão de óbito, emitida pela FUNAI em 10/1/2006, consta que o óbito ocorreu em 15/12/2006, ou seja, a certidão foi emitida antes da ocorrência do óbito. Por sua vez, a certidão de óbito, emitida pela mesma autarquia federal em 25/4/2011, juntada pelo INSS em sua contestação, consta que o óbito ocorreu em 15/8/2005.
Não se ignora que os registros de identificação emitidos pela FUNAI possuem a mesma validade que o Registro Geral, nos termos do artigo 12 do Estatuto do Índio (Lei n. 6.001/1973), contudo a presunção de veracidade das informações contidas nos documentos públicos apresentados restou afastada.
A Constituição Federal alberga a proteção do indígena, porém, em momento algum, o faz com menoscabo ao patrimônio público, cuja vigilância e cuidado é responsabilidade de todos, sob pena de prejuízo à toda sociedade.
A prova testemunhal não tem o condão de infirmar o conjunto probatório.
Em decorrência, concluo pelo não preenchimento dos requisitos exigidos à concessão do benefício pretendido.
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora a pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 12% (doze por cento) sobre o valor atualizado da causa, já majorados em razão da fase recursal, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, dou provimento à apelação para, nos termos da fundamentação, julgar improcedente o pedido de pensão por morte e revogo a tutela jurídica provisória, consoante Tema Repetitivo n. 692 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Informe-se ao INSS, via sistema, para fins de revogação da tutela provisória anteriormente concedida.
É o voto.
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5003085-54.2023.4.03.9999 |
Requerente: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Requerido: | ADJALMA FREITAS |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. PENSÃO POR MORTE. INDÍGENA. CERTIDÕES EMITIDAS PELA FUNAI. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA COMPROVADA. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação interposta pelo INSS, suscitando, preliminarmente, a nulidade da sentença, ante a necessidade de formação do litisconsórcio passivo necessário e, no mérito, a ausência de comprovação da dependência econômica da parte autora em relação ao segurado.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há duas questões em discussão: (i) Aferir se está caracterizada a nulidade da sentença; (ii) Avaliar a validade dos documentos emitidas pela FUNAI, para a comprovação da dependência econômica do autor, na condição de filho do falecido segurado.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. Desnecessária a formação do litisconsórcio passivo necessário, quando demonstrado que a irmã do autor já atingiu a maioridade.
4. A certidão de nascimento emitida pela FUNAI tem o mesmo valor jurídico daquela emitida pelo Cartório de Registro Civil, a teor do disposto nos arts. 12 e 13 da Lei nº 6.001/1973.
IV. DISPOSITIVO
5. Recurso provido parcialmente.
Dispositivos relevantes citados: L. 8213/91, arts. 16, I, §4º; L. 6.001/73, arts. 12 e 13.