Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Seção

CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) Nº 5029673-88.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MARISA SANTOS

SUSCITANTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 2ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS

SUSCITADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 14ª VARA FEDERAL CÍVEL

OUTROS PARTICIPANTES:

PARTE AUTORA: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DE SÃO PAULO
 

ADVOGADO do(a) PARTE AUTORA: ALEXANDRA BERTON SCHIAVINATO - SP231355-A

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Seção
 

CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) Nº 5029673-88.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MARISA SANTOS

SUSCITANTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 2ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS

SUSCITADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 14ª VARA FEDERAL CÍVEL

OUTROS PARTICIPANTES:

PARTE AUTORA: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DE SÃO PAULO
ADVOGADO do(a) PARTE AUTORA: ALEXANDRA BERTON SCHIAVINATO - SP231355-A

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora):

 

Conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo Federal da 2ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP em face do Juízo Federal da 14ª Vara Cível de São Paulo/SP, nos autos da ação de execução de título extrajudicial n. 5024983-59.2018.4.03.6100, ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil, objetivando o pagamento de anuidades devidas por advogada inscrita na Seccional.

Em decisão declinatória de competência, o juízo suscitado argumenta que as anuidades exigidas pela OAB apresentam nítido caráter tributário e as respectivas execuções devem observar a Lei n. 6.830/1980, segundo entendimento adotado pelo STF e por este tribunal regional federal.

O juízo suscitante, por sua vez, diz que a execução fiscal é procedimento voltado à cobrança de dívida ativa, sendo certo que a “certidão de débito” emitida pela OAB não pode ser considerada como tal. Reconhece sua incompetência para processar e julgar o feito e suscita o presente conflito.

Encaminhados os autos a esta Corte, foi designado o juízo suscitante para resolver, em caráter provisório, eventuais medidas urgentes (ID 308237148).

O Ministério Público Federal opinou pelo prosseguimento do feito, sendo desnecessária a sua intervenção (ID 308687133).  

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
2ª Seção
 

CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL (221) Nº 5029673-88.2024.4.03.0000

RELATOR: Gab. 20 - DES. FED. MARISA SANTOS

SUSCITANTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 2ª VARA FEDERAL DAS EXECUÇÕES FISCAIS

SUSCITADO: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 14ª VARA FEDERAL CÍVEL

OUTROS PARTICIPANTES:

PARTE AUTORA: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECÇÃO DE SÃO PAULO
ADVOGADO do(a) PARTE AUTORA: ALEXANDRA BERTON SCHIAVINATO - SP231355-A

 

 

V O T O

 

 

A Desembargadora Federal MARISA SANTOS (Relatora):

Conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo Federal da 2ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP em face do Juízo Federal da 14ª Vara Cível de São Paulo/SP, nos autos da ação de execução de título extrajudicial n. 5024983-59.2018.4.03.6100, ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil, objetivando o pagamento de anuidades devidas por advogada inscrita na Seccional.

De início, cumpre esclarecer que não há óbice ao julgamento deste conflito em razão da pendência de julgamento pelo STF do Tema de Repercussão Geral n. 1302, tendo em vista que não houve determinação daquela Corte para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a matéria.

A controvérsia diz respeito à natureza jurídica das contribuições – anuidades - cobradas pela OAB, a fim de definir se as ações judiciais propostas pela entidade estariam submetidas à competência do juízo especializado em execuções fiscais ou ao crivo do juízo comum (cível).

A questão é tormentosa.

Os conselhos profissionais são autarquias que fiscalizam o exercício das profissões regulamentadas; as anuidades cobradas de seus inscritos são consideradas contribuições de interesse das categorias profissionais, previstas no art. 149 da Constituição Federal. Logo, há que se observar as limitações ao poder de tributar, como a legalidade e as anterioridades, dentre outros princípios tributários.

Ocorre que a OAB, embora se enquadre no conceito de conselho profissional, é vista como entidade sui generis; o STF, por ocasião do julgamento da ADI n. 3.026/DF, firmou o entendimento de que “a Ordem é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro”. Assim, não se sujeitaria aos ditames impostos à Administração Pública direta e indireta e nem estaria submetida à regra do concurso público, questão que foi o objeto central da ADI.   

Como se vê, nada foi dito acerca da natureza jurídica das anuidades cobradas pela entidade. Restou consignado, porém, que a OAB “não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional”, conforme se extrai da ementa do julgado (ADI n. 3.026/DF, Rel. Min. Eros Grau, Pleno, j. 08/06/2006).

Assim, ausente posicionamento expresso do STF, a questão das contribuições da OAB não estava pacificada. 

Como resume Eduardo Sabbag, “a doutrina, majoritariamente, sempre viu a feição tributária nas anuidades exigidas pela Ordem. Por outro lado, a jurisprudência não lograva se manter uníssona, ora concebendo a natureza tributária, ora afastando-a. O próprio STJ não conseguia, em suas Turmas, uma uniformidade” (in: Manual de Direito Tributário. 16 ed., São Paulo: SaraivaJur, 2024, p. 605).

Em 2016, o STF definiu a OAB como “autarquia corporativista”, cumprindo à Justiça Federal processar e julgar ações em que a entidade figure como parte (RE n. 595.332/PR, Tema RG n. 258, Rel. Min. Marco Aurélio, Pleno, j. 31/08/2016).

Após, em 2020, o Plenário daquela Corte, apreciando feito em que a OAB/RS figurava como parte - e que versava sobre a sanção de suspensão do exercício laboral por inadimplência -, sinalizou que as anuidades devidas às entidades de classe seriam tributos da espécie contribuições de interesse das categorias profissionais (Tema 732).

Eis a ementa do julgado:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. DIREITO TRIBUTÁRIO E ADMINISTRATIVO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - OAB. SANÇÃO. SUSPENSÃO. INTERDITO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. INFRAÇÃO DISCIPLINAR. ANUIDADE OU CONTRIBUIÇÃO ANUAL. INADIMPLÊNCIA. NATUREZA JURÍDICA DE TRIBUTO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERESSE DE CATEGORIA PROFISSIONAL. SANÇÃO POLÍTICA EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA. LEI 8.906/1994. ESTATUTO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. 1. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que as anuidades cobradas pelos conselhos profissionais caracterizam-se como tributos da espécie contribuições de interesse das categorias profissionais, nos termos do art. 149 da Constituição da República. Precedentes: MS 21.797, Rel. Min. Carlos Velloso, Tribunal Pleno, DJ 18.05.2001; e ADI 4.697, de minha relatoria, Tribunal Pleno, DJe 30.03.2017. 2. As sanções políticas consistem em restrições estatais no exercício da atividade tributante que culminam por inviabilizar injustificadamente o exercício pleno de atividade econômica ou profissional pelo sujeito passivo de obrigação tributária, logo representam afronta aos princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e do devido processo legal substantivo. Precedentes. Doutrina. 3. Não é dado a conselho de fiscalização profissional perpetrar sanção de interdito profissional, por tempo indeterminado até a satisfação da obrigação pecuniária, com a finalidade de fazer valer seus interesses de arrecadação frente a infração disciplinar consistente na inadimplência fiscal. Trata-se de medida desproporcional e caracterizada como sanção política em matéria tributária. 4. Há diversos outros meios alternativos judiciais e extrajudiciais para cobrança de dívida civil que não obstaculizam a percepção de verbas alimentares ou atentam contra a inviolabilidade do mínimo existencial do devedor. Por isso, infere-se ofensa ao devido processo legal substantivo e aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, haja vista a ausência de necessidade do ato estatal. 5. Fixação de Tese de julgamento para efeitos de repercussão geral: “É inconstitucional a suspensão realizada por conselho de fiscalização profissional do exercício laboral de seus inscritos por inadimplência de anuidades, pois a medida consiste em sanção política em matéria tributária.” 6. Recurso extraordinário a que se dá provimento, com declaração de inconstitucionalidade dos arts. 34, XXIII, e 37, §2º, da Lei 8.906/1994.
(RE n. 647.885/RS, Tema RG n. 732, Rel. Min. Edson Fachin, Pleno, j. 27/04/2020) (grifo nosso)

Embora parecesse claro o posicionamento de que os advogados também estariam sujeitos ao pagamento de um tributo – contribuição de interesse da categoria -, surgiram argumentos no sentido de que o Relator não distinguiu os conselhos profissionais genericamente considerados da Ordem dos Advogados do Brasil, que é considerada sui generis. Ou seja, os fundamentos do julgado se aplicariam às demais entidades fiscalizadoras, tais como o CREA, o CRECI e o CRM, mas não à OAB.

Tal argumento não prospera, pois o recurso extraordinário versava sobre o cabimento da sanção disciplinar de suspensão do exercício profissional de advogado, por inadimplemento junto à OAB.

Em seu voto, o Ministro Fachin delimitou a controvérsia nos seguintes termos:  

O tema com repercussão geral consiste em saber se as disposições do Estatuto da OAB que preveem a suspensão do exercício profissional de seus inscritos por inadimplência de anuidade afrontam o livre exercício da atividade profissional dos causídicos.  

Adiante, afirma que “a questão constitucional é se conselho profissional ou entidade prestadora de serviço ‘sui generis’ tem como possibilidade perpetrar sanção de interdito profissional, por tempo indeterminado até a satisfação da obrigação pecuniária, com a finalidade de fazer valer seus interesses de arrecadação frente a infração disciplinar consistente na inadimplência fiscal. Postos nesses termos, firmo convicção sobre a higidez da irresignação apresentada pela parte Recorrente, à luz da inconstitucionalidade das disposições em tela da Lei 8.906/1994, merecendo provimento o recurso extraordinário. Isso porque a suspensão do exercício profissional de seus inscritos por inadimplência de anuidades por parte de conselho dotado de atributos de estatalidade traduz-se em sanção política rechaçada pela jurisprudência assente deste Tribunal” (grifo nosso).

Houve expressa referência à “entidade prestadora de serviço ‘sui generis’” e à Lei n. 8.906/1994, que dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil.

A conclusão, portanto, vale para todos os conselhos, isto é, não se permite a suspensão do profissional inscrito diante de inadimplência fiscal.

Não se ignora que a OAB é entidade sui generis, esse é o entendimento sedimentado pelo STF desde o julgamento da ADI n. 3.026/DF. Contudo, essa característica não tem o condão de estabelecer diferenças substanciais entre a Ordem e os demais Conselhos, naquilo que se refere à fiscalização profissional.

Para o que interessa ao caso – execução de valores a título de anuidades não pagas -, a OAB se porta como as demais entidades. Não está exercendo suas outras finalidades institucionais, tais como a defesa da Constituição e da ordem jurídica.

De acordo com Hugo de Brito Machado Segundo, “não é correto estabelecer diferença entre as contribuições devidas à OAB e as devidas aos demais conselhos de regulamentação profissional. Todas são contribuições corporativas, em nossa concepção, não havendo por que afirmar que a exação paga pelos advogados é sui generis.” (in: Manual de Direito Tributário, 13ª ed., Barueri: Atlas, 2023, p. 325).

O debate – ainda que de forma tangencial - veio novamente à tona no STF, com o julgamento do RE n. 1.182.189/BA em abril de 2023, em sede de repercussão geral.

Analisando a obrigatoriedade de prestação de contas perante o TCU, o Pleno concluiu, em síntese, que os valores arrecadados pela OAB não se confundem com receitas fazendárias, de modo que a entidade não se submete ao controle estatal.

A Corte reiterou o caráter sui generis da entidade, porém não abordou com profundidade a questão da parafiscalidade. Os demais conselhos profissionais também sustentam suas atividades por meio dos recursos obtidos de seus inscritos, de modo que a arrecadação não parece ser o critério diferenciador ideal para definir a natureza jurídica das contribuições (anuidades). 

No julgamento em que reconhecida a repercussão geral, o STF admite que existe “controvérsia com origem em conflito aparente de fundamentos de decisões do próprio STF” (ARE 1.479.101/SP, j. 24/05/2024, DJe 29/05/2024).  

Por ora, destaco que esta Segunda Seção vem adotando o entendimento de que o decidido no RE n. 1.182.189 (Tema 1054) não infirma a tese sobre a natureza jurídica tributária das anuidades devidas pela OAB, a qual restou sedimentada por ocasião do julgamento do RE n. 647.885 (Tema 732):

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. ANUIDADE. NATUREZA JURÍDICA DE TRIBUTO. TEMA 732 DO STF. EXECUÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO ESPECIALIZADO EM EXECUÇÕES FISCAIS.
1.  A questão ora discutida se resume ao entendimento da natureza jurídica das anuidades cobradas pela Ordem dos Advogados do Brasil.
2.  Os julgamentos contidos na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.026/DF, no Recurso Extraordinário nº 595.332 - Tema 258 e no RE nº 1.182.189 - Tema 1.054 não infirmam não infirmam o entendimento sobre a natureza jurídica tributária das anuidades devidas à OAB fundamentado no julgamento do STF no RE n.º 647.885 - Tema 732.
3.  No contexto do julgamento do RE n.º 647.885 - Tema n.º 732, em que se decidiu pela inconstitucionalidade de disposições da Lei 8.906/1994, o STF entendeu que a suspensão do exercício profissional por conselhos de fiscalização profissional, ante o inadimplemento de anuidades, é inconstitucional, caracterizando-se como uma sanção política em matéria tributária. Mais ainda, reafirmou-se que as anuidades cobradas por conselhos profissionais configuram tributos da espécie contribuições de interesse das categorias profissionais, à luz do art. 149 da Constituição da República. Portanto, atribuiu-se de maneira específica a natureza jurídica tributária às anuidades devidas à OAB.
4.  No contexto do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7.020/DF, o STF reforçou que “a natureza sui generis da OAB não afasta a natureza tributária das contribuições e o respectivo regime jurídico a elas atribuído”.
5.  Mesmo diante da personalidade jurídica ímpar da OAB, a natureza jurídica tributária das anuidades exige a observância do rito processual da Lei 6.830/1980. Por isso, a cobrança das contribuições para a OAB deve ser submetida ao juízo federal especializado em execuções fiscais. Precedentes desta e. 2ª Seção.
6.  Conflito de competência conhecido e julgado improcedente.
(Conflito de competência cível n. 5006473-52.2024.4.03.0000, Rel. Desembargadora Federal Adriana Pileggi, por maioria, j. 07/05/2024, DJe 15/05/2024)

Seguindo o entendimento majoritário da Seção, conclui-se que as demandas que versem sobre a cobrança judicial das anuidades pagas pelos advogados à OAB devem ser processadas de acordo com o disposto na Lei n. 6.830/1980. Por consequência, a competência para julgamento é do juízo federal das execuções fiscais.  

Diante do exposto, julgo improcedente este conflito negativo de competência, restando mantida a competência do Juízo Federal da 2ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP.

É o voto.

 


DECLARAÇÃO DE VOTO

O Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal MARCELO SARAIVA:

Trata-se de conflito negativo de competência suscitado entre Juízo Federal da Vara de Execuções Fiscais e Juízo Federal da Vara Cível, ambos da Subseção Judiciária de São Paulo/SP, nos autos da Ação de Execução de Título Executivo Extrajudicial, ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil – Secção de São Paulo (OAB/SP) para a cobrança de valores relativos a anuidades devidas por advogado inscrito na Seccional.

Adoto, na íntegra, o relatório.

Acompanho a Excelentíssima Desembargadora Federal Marisa Santos (Relatora) no tocante à inexistência de óbice ao exame deste incidente em razão de pendência de julgamento pela Suprema Corte do Tema de Repercussão Geral nº 1302, “tendo em vista que não houve determinação daquela Corte para suspensão da tramitação dos processos que versam sobre a matéria”.

Todavia, a Excelentíssima Relatora, no mérito, julgou improcedente o conflito negativo de competência, sob o fundamento de que a dívida relativa à cobrança de anuidade da OAB tem natureza tributária, cuja execução compete ao Juízo Federal especializado em Execuções Fiscais.

Com a devida máxima vênia, ouso divergir do entendimento adotado para julgar procedente o conflito negativo de competência, pelos fundamentos a seguir exarados.

Cinge-se a controvérsia neste incidente em verificar se a cobrança de anuidade da Ordem dos Advogados do Brasil – OAB está ou não sujeita ao regime das execuções fiscais e, consequentemente, ao Juízo Federal especializado em Execuções Fiscais.

A respeito do tema, a Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que “as contribuições cobradas pela OAB não têm natureza tributária e não se destinam a compor a receita da Administração Pública, mas a receita da própria entidade” (EREsp nº 463.258/SC). Assim, consagrou que, sendo a Lei nº 6.830/1980 um veículo de execução da dívida ativa tributária e não-tributária da Fazenda Pública, a cobrança de anuidade da Ordem dos Advogados do Brasil, título executivo extracontratual, não segue o rito estabelecido na Lei de Execução Fiscal – LEF, devendo ser exigido em execução disciplinada pelo Código de Processo Civil.

Para melhor ilustração, trago a ementa desse específico precedente:

 

PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - EXECUÇÃO PARA COBRANÇA DAS CONTRIBUIÇÕES DA OAB.

1. A OAB é classificada como autarquia sui generis e, como tal, diferencia-se das demais entidades que fiscalizam as profissões.

2. A Lei 6.830/80 é o veículo de execução da dívida tributária e da não-tributária da Fazenda Pública, estando ambas atreladas às regras da Lei 4.320, de 17/3/64, que disciplina a elaboração e o controle dos orçamentos de todos entes públicos do país.

3. As contribuições cobradas pela OAB, como não têm natureza tributária, não seguem o rito estabelecido pela Lei 6.830/80.

4. Embargos de divergência providos.

(EREsp 463.258/SC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/12/2003, DJ 29/03/2004, p. 167)

 

Na mesma linha de exegese, destaco outros julgados da Corte Superior de Justiça:

 

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. OMISSÃO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. VÍCIO NÃO CONFIGURADO. PRESCRIÇÃO. COBRANÇA DE ANUIDADES DA OAB. DÍVIDA LÍQUIDA FUNDADA EM INSTRUMENTO PARTICULAR. PRAZO QUINQUENAL.

1. Não há violação do art. 535 do CPC/1973 quando o acórdão recorrido fundamenta claramente seu posicionamento de modo a prestar a jurisdição que lhe foi postulada.

2. Conforme a jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça, as anuidades pagas à OAB não têm natureza tributária, devendo os títulos executivos extrajudiciais delas decorrentes sujeitarem-se ao prazo prescricional de cinco anos previsto no art. 206, § 5º, do Código Civil.

3. Agravo interno a que se nega provimento. G.n.

(AgInt no REsp n. 1.419.757/SC, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 16/3/2017, DJe de 22/3/2017.)

 

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. OFENSA AO ART. 535 DO CPC NÃO DEMONSTRADA. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL/OAB. PRETENSÃO EXECUTÓRIA. COBRANÇA DE ANUIDADE. NATUREZA CIVIL DO CRÉDITO EXEQUENDO. OBSERVÂNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL QUINQUENAL PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL.

1. Não ocorre ofensa ao art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem dirime, fundamentadamente, as questões que lhe são submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos autos.

2. Os créditos decorrentes da relação jurídica travada entre a OAB e os advogados não compõem o erário e, consequentemente, não têm natureza tributária. Por isso, a pretensão executória de tais verbas observará o prazo prescricional estabelecido no Código Civil.

3. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que em relação às anuidades cobradas pela OAB deve incidir o prazo prescricional previsto no art. 206, § 5º, I, do Código Civil de 2002, uma vez que se trata de títulos executivos extrajudiciais, consubstanciados em espécie de instrumento particular de dívida liquida.” (AgRg no REsp 1.562.062/SC, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 9/12/2015).

4. Recurso especial a que se nega provimento. G.n.

(STJ, REsp 1574642/SC, Ministro SÉRGIO KUKINA, julgamento em 16/02/2016, DJe 22/02/2016)

 

Cito ainda precedentes desta Colenda Corte Regional:

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. OAB. ANUIDADES. AUSÊNCIA DE NATUREZA TRIBUTÁRIA. NÃO SUBMISSÃO À LEI Nº 6.830/1980. COMPETÊNCIA DO JUÍZO CIVIL. MANUTENÇÃO.

1. Os valores recolhidos a título de anuidade aos conselhos profissionais, em regra, têm natureza de tributo. Não obstante, as anuidades exigidas pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não ostentam tal condição, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (SEGUNDA TURMA, Rel. Min. OG FERNANDES, AgInt no REsp n.º 1.419.757/SC, j. 16/03/2017, DJe 22/03/2017).

2. Consolidou-se na jurisprudência o entendimento segundo o qual a OAB não tem natureza de mero conselho profissional, uma vez que seu desígnio vai além de todos os objetivos fixados para as demais entidades de classe.

3. Assim, em geral, lhe é aplicável regime jurídico diferenciado. Por essa razão, as suas contribuições não são consideradas tributos e, portanto, são passíveis de execução civil, não se subsumindo ao procedimento da Lei n.º 6.830/1980, de aplicação restrita às execuções fiscais.

4. Afastada a natureza tributária das anuidades exigidas pela OAB, não há que se falar em incidência da Lei de Execuções Fiscais (Lei n.º 6.830/1980) e consequente processamento e julgamento do caso subjacente pelo Juízo especializado, merecendo reforma, portanto, a decisão agravada.

5. Precedente desta Terceira Turma: Desembargador Federal NERY DA COSTA JUNIOR, ApCiv 0021820-30.2016.4.03.6100, j. 31/05/2022, DJEN DATA: 06/06/2022.

6. Agravo de instrumento provido. G.n.

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5015828-57.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 16/02/2023, DJEN DATA: 23/02/2023)

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMISSÃO. ANUIDADES. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. NATUREZA JURÍDICA. COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA.

- O rol do art. 1.015 do CPC é de taxatividade mitigada e, assim, apesar de não estar prevista a possibilidade de interposição do agravo de instrumento contra decisão do juízo que reconhece sua incompetência para processar e julgar o feito, o recurso deve ser conhecido.

- As anuidades devidas à OAB não possuem natureza de tributo e não são passíveis de lançamento fiscal. Logo, não estão excepcionadas pela ressalva prevista no inciso III do § 1º do artigo 3º da Lei nº 10.259/2001, que dispõe sobre a competência do Juizado Especial Cível no âmbito da Justiça Federal.

(...)

- Agravo de instrumento provido. G.n.

(TRF 3ª Região, 4ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5002499-12.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 03/08/2022, DJEN DATA: 12/08/2022)

 

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. OAB. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. ANUIDADES. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECURSO PROVIDO.

- Com efeito, as varas especializadas de execuções fiscais atendem ao julgamento de feitos abrangidos pelo disposto no art. 2º da Lei das Execuções Fiscais.

- No caso em comento, a anuidade cobrada pela Ordem dos Advogados do Brasil não se trata de dívida de natureza tributária e não se enquadra no âmbito das dívidas ativas da Fazenda Pública, vez que embora a instituição possua função reguladora e fiscalizadora da classe dos advogados, a OAB é reconhecida pelo C. Superior Tribunal Federal como entidade autônoma e independente da administração pública.

- Ademais, tem sido reiterado o posicionamento de que a competência para processar e julgar as execuções desses títulos extrajudiciais é atribuída à Justiça Federal:

- Assim sendo, deve ser afastada a competência das varas de execução fiscal para o processamento e julgamento da execução proposta.

- Recurso provido. G.n.

(TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AI 0010294-67.2015.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, julgado em 02/03/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/03/2016)

 

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CONSIGNATÓRIA. VIA ADEQUADA. APLICAÇÃO DO ARTIGO 515, § 3º DO CPC. ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. ANUIDADES. FIXAÇÃO POR MEIO DE RESOLUÇÃO. LEGALIDADE. ARTIGOS 46 E 58 DA LEI N. 8.906/94.

(...)

A Primeira Seção do STJ pacificou o entendimento de que a cobrança das anuidades devidas à Ordem dos Advogados do Brasil não segue o rito da Lei nº 6.830, mas sim do CPC. Precedentes: REsp 462823, Rel. Min. Eliana Calmon; EREsp 503252/SC, Rel. Min. Castro Meira; REsp 915.753/RS, Rel. Min. Humberto Martins; REsp 1.073.369/PR, Rel. Min. Mauro Campbell Marques; REsp 447.124/SC, Rel. Min. João Otávio de Noronha; REsp 572.080/PR, Rel. Min. Castro Meira; Edcl no REsp 755.526/RS, Rel. Min. José Delgado; REsp 541.504/SC, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins; Embargos de Divergência em REsp 495.918/SC, Rel. Min. Franciulli Netto; Embargos de Divergência em REsp 527.077/SC, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins. Apelação provida para afastar a extinção do processo, sem resolução de mérito, imposta no juízo singular. No mérito, nos termos do artigo 515, §3º do CPC, julga-se improcedente o pedido, com amparo no artigo 269, I, do CPC. Em consequência, mantida a condenação nas custas processuais e honorários advocatícios fixados em primeiro grau. G.n.

(TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AC 0001319-65.1996.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARLI FERREIRA, julgado em 26/01/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:29/03/2012)

 

Corroborando o entendimento adotado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI nº 3.026/DF, assentou que a Ordem dos Advogados do Brasil não integra a Administração Indireta da União, visto que, muito embora exerça relevante serviço público de natureza constitucional, não está sujeita ao controle da Administração Pública, cuidando-se de “categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro”. Confira-se:

 

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º DO ARTIGO 79 DA LEI N. 8.906, 2ª PARTE. "SERVIDORES" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PRECEITO QUE POSSIBILITA A OPÇÃO PELO REGIME CELESTISTA. COMPENSAÇÃO PELA ESCOLHA DO REGIME JURÍDICO NO MOMENTO DA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. IMPOSIÇÃO DOS DITAMES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). INEXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA A ADMISSÃO DOS CONTRATADOS PELA OAB. AUTARQUIAS ESPECIAIS E AGÊNCIAS. CARÁTER JURÍDICO DA OAB. ENTIDADE PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO INDEPENDENTE. CATEGORIA ÍMPAR NO ELENCO DAS PERSONALIDADES JURÍDICAS EXISTENTES NO DIREITO BRASILEIRO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA ENTIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA.

1. A Lei n. 8.906, artigo 79, § 1º, possibilitou aos "servidores" da OAB, cujo regime outrora era estatutário, a opção pelo regime celetista. Compensação pela escolha: indenização a ser paga à época da aposentadoria.

2. Não procede a alegação de que a OAB sujeita-se aos ditames impostos à Administração Pública Direta e Indireta. 3. A OAB não é uma entidade da Administração Indireta da União. A Ordem é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro.

4. A OAB não está incluída na categoria na qual se inserem essas que se tem referido como "autarquias especiais" para pretender-se afirmar equivocada independência das hoje chamadas "agências".

5. Por não consubstanciar uma entidade da Administração Indireta, a OAB não está sujeita a controle da Administração, nem a qualquer das suas partes está vinculada. Essa não-vinculação é formal e materialmente necessária.

6. A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente privilegiada, na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça [artigo 133 da CB/88]. É entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados. Não há ordem de relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público.

7. A Ordem dos Advogados do Brasil, cujas características são autonomia e independência, não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional. A OAB não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas. Possui finalidade institucional.

(...)

12. Julgo improcedente o pedido. G.n.

(STF, ADI 3026, Relator(a):  Min. EROS GRAU, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2006, DJ 29-09-2006 PP-00031 EMENT VOL-02249-03 PP-00478 RTJ VOL-00201-01 PP-00093)

 

Destarte, consoante orientação adotada no Colendo Superior Tribunal de Justiça “em razão do exercício de serviço público independente, a OAB não se sujeita a qualquer tipo de controle pelo Tribunal de Contas da União. Logo, os créditos decorrentes da relação jurídica travada entre a OAB e seus inscritos não integram o erário e, consequentemente, não ostentam natureza tributária” (REsp n. 1.574.642/SC, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 16/2/2016, DJe de 22/2/2016.)

Outrossim, o Plenário do Egrégio Supremo Tribunal no recente julgamento do RE nº 1.182.189, em Tema 1054 de repercussão geral, realizado no dia 25.04.2023, reforçou tal entendimento, ao assentar a tese jurídica: O Conselho Federal e os Conselhos Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil não estão obrigados a prestar contas ao Tribunal de Contas da União nem a qualquer outra entidade externa” (RE 1182189, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 25-04-2023, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-s/n  DIVULG 15-06-2023  PUBLIC 16-06-2023).

Por oportuno, destaca-se excertos do voto do Excelentíssimo Ministro Edson Fachin, Relator para acórdão (Tema 1054/STF), em que reconhece expressamente a natureza não tributária das anuidades arrecadadas e geridas pela OAB:

 

“Em segundo lugar, argumenta-se pela submissão da Ordem ao controle da Corte de Contas em razão da compulsoriedade de suas anuidades. Tal argumento também não merece abrigo. Afinal, os bens e valores arrecadados e geridos pela OAB não são públicos, na medida em que não são, nem se confundem, com valores que se consubstanciam em receitas fazendárias, advindas de movimentação financeira estatal. Trata-se, como já referido, de entidade arrecadadora de recursos privados de seus associados, que não se confundem com qualquer das espécies tributárias.

Diferente dos conselhos de fiscalização profissional, a OAB não recolhe contribuição natureza tributária e que, por sua natureza, respeita os contornos constitucionais próprios aos tributos. A OAB, a seu turno, como já mencionado, caracteriza-se como entidade ímpar no ordenamento jurídico, figura sui generis, cujas finanças não se submetem ao controle estatal, nem se enquadra no conceito jurídico de Fazenda Pública, submetido ao controle da Lei 4.320/1964”. G.n.

 

Assim sendo, entendo por afastar a competência da Vara Especializada de Execução Fiscal para o processamento e julgamento da cobrança de anuidade da OAB/MS, reconhecendo-se a competência do Juízo Federal Cível (suscitado).

Isto posto, vênia da Excelentíssima Relatora, julgo procedente o conflito negativo de competência.

É o voto divergente.

VOTO DESEMPATE - VICE-PRESIDÊNCIA

A aparente impossibilidade da OAB proceder a inscrição em dívida ativa das anuidades a ela devidas não têm o condão de alterar a competência funcional do Judiciário para a execução desses créditos. É que a autarquia pode adaptar-se a essa peculiaridade.

No mais,Tema n.º 732-STF especificamente atribuiu natureza tributária às anuidades devidas à OAB; esse o entendimento que está em vigor na suprema corte. Logo, no que concerne com a cobrança das anuidades devidas pelos advogados, dada a natureza tributária, há que observar o rito processual da Lei n.º 6.830/1980.

Nesse sentido vem sendo a compreensão desta Seção: 2ª Seção, CCCiv - CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL - 5033719-23.2024.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 01/04/2025, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS EDUARDO DELGADO - 2ª Seção, CCCiv - CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL - 5001279-37.2025.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 14/03/2025, Intimação via sistema DATA: 18/03/2025- 2ª Seção, CCCiv - CONFLITO DE COMPETÊNCIA CÍVEL - 5006351-39.2024.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal MARCELO MESQUITA SARAIVA, julgado em 22/08/2024, Desembargador Federal LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO.

Assim, julgo improcedente o conflito negativo de competência suscitado, mantida a competência do Juízo Federal Especializado em Execuções Fiscais

 

DESEMBARGADOR FEDERAL WILSON ZAUHY:

 

Peço vênia para divergir da e. Relatora para o efeito de julgar procedente o conflito para o fim de fixar a competência do Juízo da 14ª Vara Federal Cível de São Paulo para o julgamento do feito originário.

O dissenso instalado nos autos diz respeito à competência para processar ação que tenha como objeto a cobrança de anuidades devidas por advogados à Ordem dos Advogados do Brasil.

No julgamento do RE 647.885, o c. Supremo Tribunal Federal firmou a tese de repercussão geral no sentido de que "É inconstitucional a suspensão realizada por conselho de fiscalização profissional do exercício laboral de seus inscritos por inadimplência de anuidades, pois a medida consiste em sanção política em matéria tributária".

Como se percebe, o fundamento para a conclusão da inconstitucionalidade da suspensão do exercício profissional por inadimplência de anuidades considerou que tal ato constitui sanção política em matéria tributária, daí depreendendo-se que, segundo o entendimento da Corte Constitucional, a anuidade devida por profissionais ao respectivo conselho de fiscalização possuiria a natureza de tributo. Por via de consequência, defluiu desse entendimento a posição de que a competência para processar e julgar o feito que tem por objeto a cobrança de anuidades seria da Vara de Execuções Fiscais.

Neste sentido, vinham decidindo as Turmas desta Corte Regional (AI 5016005-84.2023.4.03.0000, Terceira Turma, Relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, p. 6/10/2023; AI 5014769-97.2023.4.03.0000, Quarta Turma, Relatora Desembargadora Federal Monica Nobre, p. 5/10/2023 e AI 5016801-75.2023.4.03.0000, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Valdeci dos Santos, p. 11/10/2023).

Em relação ao tema, assento posição pela competência do Juízo comum para o processamento das ações em que se exige a satisfação de anuidades de inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil, à míngua de condição de procedibilidade necessária para a cobrança por meio de execução, na modalidade fiscal.

E a impossibilidade de tramitação da ação de cobrança de anuidade da OAB, perante o Juízo especializado, se dá por óbice posto à entidade de classe para a emissão da certidão de dívida ativa, requisito esse indispensável para aparelhar o executivo fiscal, consoante o disposto no artigo 6º, § 1º da Lei 6.830/80, diploma que regulamente o rito da execução fiscal.

Com efeito, é cediço que a OAB está impossibilitada de emitir certidão de dívida ativa, já que a legislação somente lhe permite a emissão de certidão de débito simples, assinada pelo Diretor Tesoureiro, conforme disciplinado pelo artigo 46 da Lei nº 8.906/94, verbis:

 

“Art. 46. Compete à OAB fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas.

Parágrafo único. Constitui título executivo extrajudicial a certidão passada pela diretoria do Conselho competente, relativa a crédito previsto neste artigo.”

 

Ressalto que a problemática não se resolve pela afirmação singela de que bastaria a instituição de livro próprio, pela OAB, destinado ao registro dos débitos relativos a anuidades inadimplidas – a exemplo do que fazem os Conselhos de fiscalização profissional -, uma vez que a Dívida Ativa encontra conceito cerrado na legislação de regência (Lei 4.320/64). Confira-se:

 

Art. 39. Os créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, serão escriturados como receita do exercício em que forem arrecadados, nas respectivas rubricas orçamentárias.   (Redação dada pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)

§ 1º - Os créditos de que trata este artigo, exigíveis pelo transcurso do prazo para pagamento, serão inscritos, na forma da legislação própria, como Dívida Ativa, em registro próprio, após apurada a sua liquidez e certeza, e a respectiva receita será escriturada a esse título.  (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)

§ 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multas de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, aluguéis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.  (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)

§ 3º - O valor do crédito da Fazenda Nacional em moeda estrangeira será convertido ao correspondente valor na moeda nacional à taxa cambial oficial, para compra, na data da notificação ou intimação do devedor, pela autoridade administrativa, ou, à sua falta, na data da inscrição da Dívida Ativa, incidindo, a partir da conversão, a atualização monetária e os juros de mora, de acordo com preceitos legais pertinentes aos débitos tributários.   (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)

§ 4º - A receita da Dívida Ativa abrange os créditos mencionados nos parágrafos anteriores, bem como os valores correspondentes à respectiva atualização monetária, à multa e juros de mora e ao encargo de que tratam o art. 1º do Decreto-lei nº 1.025, de 21 de outubro de 1969, e o art. 3º do Decreto-lei nº 1.645, de 11 de dezembro de 1978.         (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)

§ 5º - A Dívida Ativa da União será apurada e inscrita na Procuradoria da Fazenda Nacional.   (Incluído pelo Decreto Lei nº 1.735, de 1979)” (grifei)

 

O tema perpassa, como sempre, a discussão sobre a natureza especialíssima da OAB, com o correspondente debate sobre o não ingresso das anuidades por ela recolhidas para os cofres públicos, bem como sobre a caracterização (ou não) dessas anuidades como contribuições de interesse de categoria profissional ou econômica, a exemplo do que já se assentou em relação aos Conselhos de fiscalização profissional.

Assim, tenho que, pela impossibilidade de inscrição, em Dívida Ativa, do débito decorrente do inadimplemento da anuidade devida à OAB, a competência se estabelece no Juízo Federal comum, à míngua, repita-se, de condição de procedibilidade para o aparelhamento da execução, na modalidade fiscal.

Aliás, em casos tais, em que se tem débito não inscrito em Dívida Ativa, como na hipótese de execução de condenação imposta pelo Tribunal de Contas da União, vem se reconhecendo a competência do Juízo comum justamente porque o rito a ser adotado será o do CPC e não o da Lei 6.830/80.

Confira-se precedente do c. Superior Tribunal de Justiça nesse sentido:

 

“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE ACÓRDÃO DO TCU. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. AUSÊNCIA DE INSCRIÇÃO NA DÍVIDA ATIVA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO FEDERAL COMUM. APLICAÇÃO DO RITO COMUM DO CPC. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO PROVIDO.

1. A pretensão merece ser acolhida.

2. Consoante a orientação jurisprudencial predominante no STJ, não se aplica a Lei 6.830/1980 à execução de decisão condenatória do Tribunal de Contas da União quando não houver inscrição em dívida ativa. Tal decisão já é título executivo extrajudicial, de modo que prescinde da emissão de Certidão de Dívida Ativa, o que determina a adoção do rito do Código de Processo Civil se o administrador discricionariamente opta pela não inscrição.

3. Assim sendo, merece reparo a tese, empregada pela Corte regional, de que "o fato de dispensar a inscrição não faz com que tais valores percam a sua natureza de Dívida Ativa da União, cobradas segundo o procedimento estabelecido pela Lei nº 6.830/1980 e através de Execução de Título Extrajudicial processada e julgada por Juízo de Execução Fiscal" (fl. 44, e-STJ).

4. Portanto, haja vista estar em dissonância com o entendimento do STJ, merece retificação o acórdão recorrido, que julgou o Conflito de Competência suscitado na origem.

5. Recurso Especial provido para declarar competente o juízo federal cível comum indicado nos autos.” (REsp 1.796.937/RJ, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 23/5/2019) (grifei)

 

Também na mesma direção precedente deste e. tribunal:

 

“PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETÊNCIA. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU). TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. AUSÊNCIA DE INSCRIÇÃO NA DÍVIDA ATIVA. LEI DAS EXECUÇÕES FISCAIS. INAPLICABILIDADE. COMPETÊNCIA DO JUÍZO COMUM.

1. O presente conflito negativo de competência decorre da execução de título extrajudicial, constituído por acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU), promovida pela União Federal.

2. Tanto a Carta Magna, quanto a Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União, atribuem força executiva ao acórdão proferido pelo TCU em que se apurem irregularidades, para fins de cobrança judicial da dívida decorrente de débito ou multa.

3. Embora a Lei n.º 6.830/80 se aplique aos débitos de natureza tributária e não tributária, a execução dos acórdãos do TCU não se subsome ao seu procedimento, porquanto lhes falta uma característica elementar, qual seja, a inscrição em dívida ativa.

4. Assim, restando inaplicável o rito insculpido na Lei n.º 6.830/80, exsurge a incompetência absoluta da Vara Especializada em execuções fiscais para o conhecimento, processamento e julgamento da demanda.

5. Conflito procedente.” (CC 0003351-63.2017.4.03.0000, Rel. Juíza Federal Convocada Leila Paiva, Segunda Seção, j. 3/10/2017) (grifei)

 

Solução de mesma natureza, portanto, deve ser aplicada no caso presente.

Face ao exposto, julgo procedente o conflito para declarar a competência do Juízo da 14ª Vara Federal Cível de São Paulo para o processamento do feito de origem.

É como voto.


E M E N T A

 

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. OAB. ANUIDADES. NATUREZA JURÍDICA TRIBUTÁRIA. COMPETÊNCIA DA VARA FEDERAL ESPECIALIZADA EM EXECUÇÃO FISCAL.  

- Conflito negativo de competência suscitado pelo Juízo Federal da 2ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP em face do Juízo Federal da 14ª Vara Cível de São Paulo/SP, nos autos da ação de execução de título extrajudicial n. 5024983-59.2018.4.03.6100, ajuizada pela Ordem dos Advogados do Brasil, objetivando o pagamento de anuidades devidas por advogada inscrita na Seccional.

- Não há óbice ao julgamento deste conflito em razão da pendência de julgamento pelo STF do Tema de Repercussão Geral n. 1302, tendo em vista que não houve determinação daquela Corte para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a matéria.

- A controvérsia diz respeito à natureza jurídica das contribuições – anuidades - cobradas pela OAB, a fim de definir se as ações judiciais propostas pela entidade estariam submetidas à competência do juízo especializado em execuções fiscais ou ao juízo comum (cível).

- Em 2020, o STF, apreciando feito em que a OAB/RS figurava como parte - e que versava sobre a sanção de suspensão do exercício laboral por inadimplência -, sinalizou que as anuidades devidas às entidades de classe seriam tributos da espécie contribuições de interesse das categorias profissionais (RE n. 647.885/RS, Tema RG n. 732).  

- O debate – ainda que de forma tangencial - veio novamente à tona no STF, com o julgamento do RE n. 1.182.189/BA em abril de 2023, em sede de repercussão geral. A Corte reiterou o caráter sui generis da entidade, porém não abordou com profundidade a questão da parafiscalidade.

- Mais recentemente, no julgamento em que reconhecida a repercussão geral - Tema 1302 -, o STF admite que existe “controvérsia com origem em conflito aparente de fundamentos de decisões do próprio STF” (ARE 1.479.101/SP, j. 24/05/2024, DJe 29/05/2024).  

- Esta Segunda Seção vem adotando o entendimento de que o decidido no RE n. 1.182.189 (Tema 1054) não infirma a tese sobre a natureza jurídica tributária das anuidades devidas pela OAB, conforme argumentos extraídos do julgamento do RE n. 647.885 (Tema 732).

- Seguindo o entendimento majoritário da Seção, conclui-se que as demandas que versem sobre a cobrança judicial das anuidades pagas pelos advogados devem ser processadas de acordo com o disposto na Lei n. 6.830/1980. Por consequência, a competência para julgamento é do juízo federal das execuções fiscais.  

- Conflito de competência que se julga improcedente. Competência do Juízo Federal da 2ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Segunda Seção, por maioria, JULGOU IMPROCEDENTE este conflito negativo de competência, restando mantida a competência do Juízo Federal da 2ª Vara de Execuções Fiscais de São Paulo/SP, nos termos do voto da Desembargadora Federal MARISA (Relatora), no que foi acompanhada pelos(as) Desembargadores(as) Federais VALDECI DOS SANTOS, CARLOS DELGADO, ADRIANA PILEGGI,MAIRAN MAIA, NERY JÚNIOR e pelo voto de qualidade do Presidente da Seção, Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO (art. 22,V do RITRF 3ª Região), restando vencidos os(as) Desembargadores(as) Federais MÔNICA NOBRE, MARCELO SARAIVA (que apresentou declaração de voto), WILSON ZAUHY (que apresentou declaração de voto), RUBENS CALIXTO e os Juízes Federais Convocados ROBERTO JEUKEN e RAPHAEL DE OLIVEIRA, que julgavam procedente o conflito negativo de competência. , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARISA SANTOS
DESEMBARGADORA FEDERAL