Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000971-97.2022.4.03.6113

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA

APELANTE: RULLIAN SILVA DE PAULA
REPRESENTANTE: RULLIAN SILVA DE PAULA

Advogados do(a) APELANTE: ANDRESSA SILVA GARCIA DE OLIVEIRA - SP343225-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A,

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000971-97.2022.4.03.6113

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA

APELANTE: RULLIAN SILVA DE PAULA
REPRESENTANTE: RULLIAN SILVA DE PAULA

Advogados do(a) APELANTE: ANDRESSA SILVA GARCIA DE OLIVEIRA - SP343225-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A,

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que julgou improcedente o pedido inicial de revisão da renda mensal (RMI) de aposentadoria por incapacidade permanente e de declaração de inexistência ou inexigibilidade de débito previdenciário.

Em suas razões, a parte autora alega que faz jus à revisão da RMI de sua aposentadoria por incapacidade permanente, uma vez que o benefício de auxílio-doença foi convertido em aposentadoria por invalidez pelo próprio INSS, que reconheceu a existência de incapacidade total e permanente desde 26/04/2019, o que afastaria a incidência da EC nº 103/2019 no cálculo da RMI, porquanto a incapacidade laboral ocorreu antes da vigência da nova legislação.

O apelante também pretende a declaração de inconstitucionalidade incidental do art. 26, § 2º, III, da EC nº 103/2019, defendendo a aplicação do art. 44 da Lei nº 8.213/91 em substituição. Aduz a inexigibilidade do valor descontado pelo INSS de seu benefício, argumentando que em nenhum momento agiu de má-fé e, portanto, os valores já descontados devem ser restituídos.

O Ministério Público Federal opinou pelo provimento parcial do recurso (ID 318295763), alegando a impossibilidade de discutir a data do início da incapacidade, ante a coisa julgada vinculada ao mandado de segurança nº 5000833-67.2021.4.03.6113. Manifestou-se, ainda, pela constitucionalidade do artigo 26, parágrafo 2º, da EC 103/2019, defendendo a manutenção do cálculo já empregado para o benefício de aposentadoria por invalidez. Contudo, afirmou que a sentença deve ser reformada no tópico que declarou exigíveis os descontos efetuados pelo INSS diretamente no benefício do segurado, uma vez ser forçoso reconhecer a má-fé do beneficiário.

Sem contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal.

É o relatório. 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
10ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000971-97.2022.4.03.6113

RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. MARCOS MOREIRA

APELANTE: RULLIAN SILVA DE PAULA
REPRESENTANTE: RULLIAN SILVA DE PAULA

Advogados do(a) APELANTE: ANDRESSA SILVA GARCIA DE OLIVEIRA - SP343225-A, JOSE CARLOS THEO MAIA CORDEIRO - SP74491-A,

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

Do cerceamento de Defesa 

É notório que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, conforme o artigo 479 do CPC, podendo formar sua convicção com base no conjunto probatório. Portanto, no presente caso, não se faz necessário laudo judicial para determinar a data de início da incapacidade da parte autora, dada a vasta documentação do próprio INSS, já mencionada anteriormente. 

Ademais, a parte autora, devidamente intimada a especificar as provas que pretendia produzir (ID 282821781), limitou-se a declarar a inexistência de outras provas (ID 282821799). Assim, o pedido de produção de novas provas tornou-se precluso, afastando-se a alegação de cerceamento de defesa. 

 

Do mérito   

Cinge-se a controvérsia à possibilidade de revisão da renda mensal inicial do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente, tendo em vista que decorre da conversão de auxílio-doença concedido antes da vigência da EC 103/2019, com a consequente restituição ao autor dos valores descontados de sua aposentadoria, cuja RMI fora calculada nos termos do artigo 26 da referida emenda.  

Em suas razões a parte autora alega que faz jus à revisão da renda mensal inicial de sua aposentadoria por incapacidade permanente, NB 631.301.066-7, pois teve seu benefício de auxílio-doença convertido em aposentadoria por invalidez pelo próprio INSS ao reconhecer a existência de incapacidade total e permanente desde 26/04/2019, o que, em tese, afastaria a incidência da EC 103/2019 quanto ao cálculo da RMI, visto que a incapacidade laboral iniciou antes do advento da novel legislação. 

O apelante também busca a inconstitucionalidade do art. 26, §2º, III, da EC n. 103/2019, incidentalmente, devendo ser aplicado em substituição o art. 44 da Lei n. 8.213/91, exclusivamente para admitir a utilização do coeficiente correspondente a 100% do salário de benefício para a revisão da RMI do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente.  

O histórico de benefícios do autor revela que recebeu benefício de incapacidade temporária de 18/09/2015 até a concessão da aposentadoria por incapacidade permanente a partir de 10/01/2020 (ID 282821733), sendo:  

NB 631.301.066-7 - ATIVO - APOSENTADORIA POR INVALIDEZ PREVIDENCIARIA, DIB 10/01/2020;  

NB 624.897.946-8 – cessado - auxílio-doença previdenciário -  recebido de 21/09/2018 a 31/03/2019;  

NB 627.723.251-0 - cessado - auxílio-doença previdenciário - recebido de  27/04/2018 a 09/01/2020;  

NB 611.912.269-2 -  cessado - auxílio-doença previdenciário - recebido de 18/09/2015 a 26/04/2018.  
 

Com relação ao NB 627.723.251-0, foi emitida "Comunicação de Decisão" (ID 282821745), informando que: "Em atenção ao seu pedido de Auxílio-Doença, apresentado no dia 26/04/2019, informamos a V.Sa. que foi concedida Aposentadoria por Incapacidade Permanente. Este benefício será revisto a cada dois anos, conforme determinação legal."   

Quanto ao NB 631.303.066-7, verifica-se que, em 10/01/2020, o autor foi notificado da concessão da aposentadoria por incapacidade permanente a partir daquela data, sendo solicitado que informasse se havia percepção de outro benefício decorrente de outro regime previdenciário (ID 282821775 - Pág. 65).  

Em 20/11/2020, o INSS verificou que o benefício de aposentadoria por incapacidade permanente ainda não havia sido implantado porque o autor não havia informado até então se recebia benefício pelo regime próprio de previdência.  

Em 05/01/2021, o autor enviou a declaração exigida para readequação do benefício desde a data estipulada pelo perito (ID 282821775 - Pág. 63 e 64).  

Em 25/01/2021, a Agência da Previdência Social de Franca enviou ao autor o Despacho de n 122231769, referente ao NB  735.673.432 - Auxílio-Doença - Urbano (Acerto Pós-perícia - ID 282821775), informando que: "Com a homologação do pedido favorável, bem como o cumprimento da exigência (apresentação da declaração do Anexo I), seu benefício foi processado e lhe foi concedida a Aposentadoria por Incapacidade Permanente (Aposentadoria por Invalidez) sob nº 631.301.066-7 com data de início em 10/01/2020, conforme comunicado de decisão que segue anexo. Com a concessão do novo benefício, em breve os créditos serão regularizados, aguarde correspondência com informações sobre o seu pagamento ou consulte a Carta de Concessão e Histórico de Crédito de Benefício pelo site MEU INSS." (ID 282821775 - Pág. 66).  

Em 06/02/2019, o autor ingressou com a ação nº 0001631-85.2018.4.03.6318 no Juizado Especial Federal de Franca, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, sob a alegação de incapacidade para o exercício de qualquer atividade laboral. O juízo julgou o pedido parcialmente procedente, concedendo auxílio-doença a partir de 27/04/2018 (dia subsequente à cessação do benefício NB 611.912.269-2, conforme postulado na inicial), determinando o desconto dos valores pagos administrativamente pelo INSS em razão do benefício NB 624.897.946-8. O trânsito em julgado dessa ação ocorreu em 08/07/2020 (ID 1178660096 – autos de origem). 

Igualmente, verifica-se que a perícia realizada nos autos do processo n 0001631-85.2018.4.03.6318 constatou que o autor é portador de TRANSTORNO MENTAL COM EPILEPSIA PÓS-TRAUMATISMO CRANIOENCEFÁLICO, estando, dessa forma, total e temporariamente incapaz para o trabalho (ID 282821738). 

Do exame do laudo médico psiquiátrico elaborado em 20/07/2018, nos autos da ação de interdição que tramitou no Juízo de Direito da 1ª Vara de Família e Sucessões da Comarca de Franca/SP (processo nº 1009136-71.2018.8.26.0196), verifica-se que o autor, então com 41 anos, foi declarado total e definitivamente incapaz para os atos da vida civil, por não reunir condições de reger sua pessoa e administrar seus bens, em razão de "transtorno mental de etiologia organocerebral mista", síndrome pós-traumática e epilepsia, sendo interditado por sentença proferida em 10/09/2018 (ID 282821736). 

A perícia administrativa realizada em 09/08/2019, referente ao benefício nº 627.723.251-0, constatou que a parte autora apresentava incapacidade laborativa no momento do exame pericial, em decorrência do seguinte diagnóstico: F06.9 - Transtorno mental não especificado devido a lesão e disfunção cerebral e a doença física. A data de início da doença e da incapacidade foi fixada em 05/09/2015. O benefício por incapacidade temporária foi concedido até 31/12/2019 (ID 282821735 - p. 10). 

Da perícia administrativa realizada em 10/01/2020, consta:  

"História:  

Exame Físico: PPMC - (09/08/19) = TRAZ RMA - 11/07/19 - DR. TIAGO BUCCI - CRM: 134313 - CID: F418 + F060 + F064 + F067. RMA - 23/07/19 - DR. SINÉSIO GRACE DUARTE - CRM: 61630 - CIDS: S065 / F069. PMRESOL- CONTINUA EM TTO PSIQUIATRICO, COM DOENÇAS DIVERSAS DIAGNOSTICAS, COM PREDOMINIO DE CLINICA DE DESMAIOS, APO´S TCE GRAVE, E CRISES CONVULSIVAS. RMA DR SINÉSIO GRACE DUARTE, CRM 61630, DE 17/12/2019...TCE GRAVISSIOMO...EDEMA CEREBRAL COM HEMORRAGIA SUBARACNOIDEA E CONTUSÃO HEMORRÁGICA BIFRONTAL...ATUALMENTE QUADRO COMPORTAMENTAL DE COMPROMETIMENTO MENTAL COM DESORIENTAÇÃO ES PACIAL E TEMPORAL, REBAIXAMENTO COGNITIVO E ORGANIZAÇÃO D EPENSAMENTO, ANOSMIA, SINAIS DISAUTONOMICOS E PARESTESIA DE DIMIDIO D...RECENTES 02 CRISES CONVULSIVAS GENERALIZADAS....CARBAMAZEPINA, PREGABALINA, FNB...RNM COM ÁREAS DE POREENCEFALIA FRONTAIS, BILATEAL, ...TCE GRAVE COM SINDROME FRONTAL SEQUELAR, CRISES CONVULSIVAS, CIDS S06.5, F06.9, G40.9....COMPROMETIMENTO EM DEFINITIVO...17/12/2019. DATAS MANTIDAS, PMRESOL.  

(...)  

Início da Doença: 05/09/2015  

Início da Incapacidade: 05/09/2015. CID: F069  

Considerações: NO MOMENTO MANTÉM QUADRO SEQUELAR NEUROLÓGICO, CONFORME ANOTADO.  

Resultado: Existe incapacidade laborativa."  

Outrossim, o Relatório Médico psiquiátrico emitido em 21/10/2021 atesta que o autor apresenta quadro gerador de prejuízo funcional, social e laboral desde setembro de 2016, com diagnóstico de transtorno mental orgânico, como sequela de TCE (ID 282821731).  

Acresça-se que o extrato do CNIS de ID 282821742 autor demonstra que seu último vínculo empregatício ocorreu no período de 20/08/2008 a 09/2015, data em que sofreu o acidente, e desde então não houve mais períodos contributivos ou registro de retorno às atividades laborais.  

A análise dos autos revela que o autor não recuperou sua capacidade laborativa desde o acidente sofrido em 2015, nem após a sentença de interdição, proferida em 10/09/2018, evidenciando que, desde a concessão do primeiro auxílio-doença (NB 108.570.589-4, com DIB em 18/09/2015), o segurado já possuía direito à aposentadoria por incapacidade total e permanente. 

Em relação à data de início do benefício de aposentadoria por invalidez, observa-se que o próprio INSS reconheceu o início da incapacidade da parte autora em setembro de 2015. Contudo, em respeito à coisa julgada (aperfeiçoada em 08/07/2020 – ID 1178660096, autos de origem) do processo nº 0001631-85.2018.4.03.6318, que condenou a autarquia a conceder auxílio-doença (NB 627.723.251-0) no período de 27/04/2018 a 09/01/2020, fixo a DIB da aposentadoria por invalidez (conversão) em 10/01/2020. Ressalta-se que, à época da concessão do auxílio-doença, os requisitos de carência e qualidade de segurado já haviam sido reconhecidos e permanecem válidos, em virtude do quadro de incapacidade total e permanente da parte autora. 

É fato que, na data da conversão em aposentadoria por incapacidade permanente, a Emenda Constitucional nº 103/2019 já estava em vigor, tendo alterado a forma de cálculo do benefício, conforme previsto no artigo 26, parágrafo 2º, inciso III. 

Desde 18/09/2015, a parte autora recebeu auxílio por incapacidade temporária em diversas ocasiões, culminando na conversão para aposentadoria por invalidez em 10/01/2020, conforme já exposto. Frisa-se que os documentos do INSS anexados aos autos demonstram uma continuidade da patologia.  

 A Emenda Constitucional nº 103/2019 estabelece que o cálculo do benefício previdenciário deve ser feito com base na média aritmética simples dos salários de contribuição, corrigidos monetariamente, abrangendo 100% do período contributivo desde 1994 ou desde o início da contribuição, se posterior. Para a aposentadoria por invalidez permanente, o valor corresponde a 60% dessa base de cálculo, acrescido de 2% para cada ano de contribuição que exceder 20 anos (ou 15 anos para mulheres, conforme a Portaria INSS nº 450/2020, art. 41), exceto em casos de acidente de trabalho, doença profissional ou doença do trabalho, nos quais o valor corresponde a 100%, conforme previsto no parágrafo 3º e inciso II da referida emenda. 

Tal dispositivo modifica profundamente a renda mensal inicial da aposentadoria por invalidez, mormente para aqueles que contribuíram por menor tempo para o regime, bem como restabelece distinção prevista na Lei nº 8.213/91, em sua redação primitiva, entre o valor do benefício acidentário (assim entendido aquele decorrente de acidente do trabalho) e o do previdenciário, regra que vigorou até a entrada em vigor da Lei nº 9.032/95, que a suprimiu.  

O entendimento do STF é pela constitucionalidade da reforma promovida pela EC 103/2019. Nesse sentido, veja-se o seguinte julgado:  

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONCEDIDA APÓS A EC N. 103/2019 E PRECEDIDA DE AUXÍLIO DOENÇA PREVIDENCIÁRIO. CÁLCULO DA RMI. APLICAÇÃO DAS REGRAS ANTERIORES À EC N. 103/2019. IMPOSSIBILIDADE. TEMPUS REGIT ACTUM. SUCUMBÊNCIA.   

- Para as aposentadorias por incapacidade permanente não acidentárias, cujo fato gerador é posterior a EC n. 103/2019, a RMI corresponderá a 60% (sessenta por cento) do salário de benefício, com acréscimo de 2% (dois por cento) para cada ano de contribuição que exceder o tempo de 20 anos de contribuição, se homem, e 15 anos de contribuição, se mulher. A seu turno, o salário de benefício será calculado com base na média aritmética simples de 100% (cem por cento) dos salários de contribuição do segurado a partir da competência de julho/1994.   

- Constatado o surgimento da incapacidade permanente não acidentária, fato gerador do benefício deferido, após o advento da EC n. 103/2019, as regras aplicáveis à jubilação são aquelas vigentes no momento do surgimento da contingência definitiva, o que inclui o critério de cálculo do artigo 26 da EC n. 103/2019 (60% do salário de benefício, com acréscimo de 2% para cada ano de contribuição) e, nesse aspecto, não se cogita de ilegalidade tampouco de inconstitucionalidade.   

- Invertida a sucumbência, deve a parte autora pagar custas processuais e honorários de advogado, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa corrigido, conforme critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 4º, III, do CPC, suspensa, porém, a exigibilidade, na forma do artigo 98, § 3º, do mesmo estatuto processual, por tratar-se de beneficiária da justiça gratuita.   

- Apelação do INSS provida."   

(TRF3, ApCiv nº 5079528-80.2022.4.03.9999, 9ª Turma, Relatora Desembargadora Federal Daldice Santana, DJEN 23/02/2023)   

Contudo, considerando que o auxílio-doença foi concedido anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 103/2019, mas a conversão desse benefício em aposentadoria por invalidez ocorreu após a promulgação da referida emenda, a regra vigente no início da incapacidade laboral deve ser observada. Essa medida visa evitar a redução indevida do valor do benefício, em respeito ao princípio da irredutibilidade dos benefícios. Vejamos: 
 

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. REVISÃO DA APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. EC Nº 103/2019. CÁLCULO DO BENEFÍCIO. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. IRREDUTIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS. VALOR DA RENDA MENSAL INICIAL (RMI). JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA. ENCARGOS DE SUCUMBÊNCIA. APELO PROVIDO. PEDIDO PROCEDENTE. 
I. CASO EM EXAME 
1. Apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de revisão do cálculo da renda mensal inicial de aposentadoria por incapacidade permanente, mantida nos termos da Emenda Constitucional nº 103/2019, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, com execução suspensa em razão da gratuidade de justiça concedida. 
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 
2. Há duas questões em discussão: (i) a alegação de inconstitucionalidade da nova regra de cálculo do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente introduzida pela EC nº 103/2019; e (ii) a definição da legislação aplicável ao cálculo do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente. 
III. RAZÕES DE DECIDIR 
3. A legislação aplicável para o cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente deve ser a vigente à data do início da incapacidade, em observância ao princípio tempus regit actum.   
4. A EC nº 103/2019, que estabelece o cálculo do benefício com base em 60% da média aritmética simples dos salários de contribuição, é constitucional, conforme entendimento majoritário do STF, devendo ser afastada a alegação de inconstitucionalidade feita pela parte autora.   
5. Tanto o auxílio por incapacidade temporária quanto a aposentadoria por incapacidade permanente tiveram origem no mesmo mal incapacitante, devendo ser aplicada a legislação em vigor quando se constatou a incapacidade inicial.   
6. Para casos de conversão de benefícios, deve-se observar a regra vigente no início da incapacidade laboral, antes da promulgação da EC nº 103/2019, para evitar a redução indevida do valor do benefício, em atenção ao princípio da irredutibilidade dos benefícios.   
7. Os critérios de juros e correção monetária devem ser aplicados conforme o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, vigente na data da execução. 
8. Honorários advocatícios devidos pelo INSS fixados em 10% sobre o valor das prestações vencidas até a data do julgamento (Súmula nº 111/STJ), estando ele isento de custas, mas não do reembolso de eventuais despesas processuais. 
IV. DISPOSITIVO E TESE 
9. Apelo provido. Pedido procedente. 
Tese de julgamento: 
1. A Emenda Constitucional nº 103/2019 é constitucional no que tange à alteração do cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente.   
2. O cálculo da aposentadoria por incapacidade permanente deve observar a legislação vigente na data de início da incapacidade laboral, mesmo que a conversão do benefício tenha ocorrido posteriormente, em respeito ao princípio tempus regit actum e à irredutibilidade dos benefícios.  
 

(TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5102832-40.2024.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL INES VIRGINIA PRADO SOARES, julgado em 30/01/2025, DJEN DATA: 06/02/2025) 
 
AGRAVO DE INSTRUMENTO. APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE ANTECEDIDA POR AUXÍLIO-DOENÇA. TUTELA DE URGÊNCIA EM SENTENÇA. RENDA MENSAL INICIAL (RMI). DIREITO ADQUIRIDO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IRREDUTIBILIDADE DO VALOR DOS BENEFÍCIOS. RECURSO IMPROVIDO. 
I- A sentença proferida na fase de conhecimento foi expressa com relação à determinação de implantação da aposentadoria com 100% do salário-de-benefício, não tendo o INSS manifestado insurgência contra a forma de cálculo da RMI da aposentadoria, em sua apelação. 
II- O perito judicial, em seu laudo, fixou o início da incapacidade total e permanente em setembro/2019, quando a agravada sofreu trauma decorrente de “queda de altura”. Portanto, é plausível a alegação de que a agravada preencheu os requisitos da aposentadoria por invalidez em data anterior à entrada em vigor da EC nº 103/2019, obtendo direito adquirido ao cálculo da RMI em conformidade com a legislação então em vigor – ainda que a DIB tenha sido fixada na data em que ocorreu a cessação indevida do auxílio-doença, em 21/11/2019. 
III- Ademais, a agravada se encontrava no gozo de auxílio-doença -- com RMI equivalente a 91% do salário-de-benefício -- até a data em que esta passou a fazer jus à aposentadoria por incapacidade permanente. 
IV- Considerando-se que a referida aposentadoria é decorrente da conversão de auxílio-doença iniciado em data anterior à entrada em vigor da EC nº 103/2019, é imperativo que o cálculo do benefício também seja realizado em conformidade com as regras da legislação anterior à reforma, sob pena de flagrante infração ao princípio da irredutibilidade dos benefícios, previsto no art. 194, parágrafo único, inc. IV, da CF. 
V- Não é possível que o segurado no gozo de determinado benefício previdenciário tenha seus rendimentos diminuídos exclusivamente em decorrência do agravamento de seu estado de saúde, caso em que haveria a paradoxal situação em que um estado de maior vulnerabilidade social conduziria a uma redução da proteção previdenciária, em manifesta contrariedade aos princípios e finalidades perseguidas com a criação da Seguridade Social. 
VI - Agravo de instrumento improvido. 

(TRF 3ª Região, 8ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5032502-81.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal HERBERT CORNELIO PIETER DE BRUYN JUNIOR, julgado em 25/07/2023, DJEN DATA: 31/07/2023. 
 

Quando a incapacidade é reconhecida e resulta na concessão de benefício temporário, e, posteriormente, constata-se a condição permanente, a legislação aplicável é a vigente na data do início da incapacidade laborativa. 

Assim, considerando que a aposentadoria por incapacidade permanente foi originada de auxílio por incapacidade temporária concedido antes da vigência da Emenda Constitucional nº 103/2019, o cálculo do benefício deve seguir as regras vigentes à época, em observância aos princípios do tempus regit actum e da irredutibilidade dos benefícios. 

Da devolução dos valores indevidamente recebidos  

Como é conhecido de todos, o Colendo Supremo Tribunal Federal (STF) pacificou o entendimento admitindo a possibilidade de a Administração Pública rever os seus atos, quando eivados de nulidades e vícios, mediante o exercício de autotutela para fins de proceder a anulação ou revogação, nos termos das Súmulas 346 e 473, in verbis:  

Súmula 346: "A administração pública pode declarar a nulidade de seus próprios atos" (STF, Sessão Plenária 13/12/1963)  

Súmula 473: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial" (STF, Sessão Plenária 03/12/1969).  

Com o advento do artigo 114 da Lei n. 8.112, de 11/12/1990, a ordem jurídica passou a conter norma legal expressa concedendo suporte ao princípio da autotutela administrativa, estabelecendo que: "A administração deverá rever seus atos, a qualquer tempo, quando eivados de ilegalidade”.  

Nessa senda, a Lei n. 9.784, de 29/01/1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, passou a disciplinar o dever de a Administração anular os seus atos quando maculados por vícios de ilegalidade, bem assim revogá-los por razões de conveniência e oportunidade, na forma preconizada pelos artigos 53 e 54, in verbis:  

Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos.  

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.  

§ 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.  

§ 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.  

De outro giro, o Código Civil disciplina a obrigação de devolução de valores recebidos ilicitamente, na forma do que dispõem os seus artigos 876, 884 e 927, in verbis:  

Art. 876. Todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir; obrigação que incumbe àquele que recebe dívida condicional antes de cumprida a condição.   

(...) Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários.  

(...) Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.  

Na esfera previdenciária, o artigo 115, inciso II, da Lei n. 8.213, de 24/07/1991, estabelece que cabe à Autarquia Previdenciária efetuar a cobrança de valores pagos indevidamente, identificados em regular processo administrativo, nos seguintes termos:  

Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:  

(...)II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da sua importância, nos termos do regulamento; (Redação dada pela Lei nº 13.846, de 2019)  

Ademais, se comprovada a hipótese de dolo, fraude ou má-fé, a restituição das importâncias recebidas indevidamente deverá ser efetuada de uma só vez, consoante o artigo 154, § 2º, do Decreto n. 3.048, de 06/05/1999.  

Nessa senda, a controvérsia sobre os limites aplicáveis à restituição conduziu o C. Superior Tribunal de Justiça a afetar o tema para perscrutar a respeito da seguinte questão: "Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social".  

O assunto foi pacificado no julgamento do REsp 1.381.734/RN, Relator Ministro BENEDITO GONÇALVES, no bojo do qual foi cristalizado o Tema 979/STJ: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido".  

Além disso, houve modulação dos efeitos, em obséquio ao princípio da segurança jurídica, mormente em razão do interesse social e da repercussão do julgamento, razão por que o C. STJ fixou a aplicação do Tema 979/STJ somente aos processos distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação do v. acórdão, ocorrida em 23/04/2021. Vejamos:  

PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. RESTITUIÇÃO DE VALORES. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. FRAUDE APURADA. FORMULÁRIO FALSO. NÃO COMPROVADA QUALQUER CONDUTA FRAUDULENTA DO AUTOR. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. DECLARADA A INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO.  

- Pretende a autarquia a devolução de valores de benefício de aposentadoria por tempo de contribuição deferido com base em formulário DSS 8030 supostamente falso.    

- O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido."   

- A respeito especificamente do conceito de boa-fé objetiva, conforme definido pela Exma. Ministra Nancy Andrighi no julgamento do Recurso Especial nº 803.481/GO, “esta se apresenta como uma exigência de lealdade, modelo objetivo de conduta, arquétipo social pelo qual impõe o poder-dever de que cada pessoa ajuste a própria conduta a esse arquétipo, agindo como agiria uma pessoa honesta, escorreita e leal” (REsp 803.481/GO, Terceira Turma, julgado em 28/06/2007).   

- O enquadramento incorreto do período decorreu de erro da administração, para o qual a parte autora não concorreu.  

- Não restou comprovada nos autos a adoção de qualquer conduta fraudulenta pelo autor.  

- Ademais, que é de responsabilidade da autarquia o controle e fiscalização dos atos praticados pelos seus agentes, não cabendo ao segurado ser responsabilizado por qualquer erro ou transgressão praticado pelo servidor no exame do requerimento administrativo.  

-Não comprovada a má-fé, presume-se a boa-fé da parte autora.  

- Majorados os honorários advocatícios.  

- Apelação do INSS desprovida.                                      

(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000548-87.2023.4.03.6183, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 12/12/2024, DJEN DATA: 18/12/2024)  

Conclui-se, portanto, da tese estabelecida que, para definir a obrigação de restituição de valores recebidos indevidamente em decorrência de erro administrativo (distinto de interpretação equivocada da legislação), é indispensável avaliar a presença ou ausência de boa-fé objetiva na percepção dos benefícios.  

O INSS vem descontando do benefício de aposentadoria por incapacidade permanente de titularidade do autor, sob o fundamento de que a renda mensal do auxílio-doença que vinha recebendo era maior do que a da aposentadoria concedida nos termos do artigo 26 da EC 103/2019.

No presente caso, a comunicação utilizada pelo INSS (ID 282821803 – fl. 62) para justificar a cobrança do valor pago indevidamente não esclarece que a conversão do benefício dependeria da apresentação, pelo autor, de comprovação sobre a percepção ou não de outro benefício. O referido documento menciona, ainda, a possível suspensão da aposentadoria por invalidez caso o documento não fosse apresentado, levando a crer que o benefício já estava efetivado.  

A cobrança dos valores pagos à parte autora, referentes às verbas de natureza alimentar, não se mostra possível. O E. Supremo Tribunal Federal pacificou o entendimento de que a restituição de valores indevidamente recebidos pressupõe a comprovação de má-fé do beneficiário, o que não se verifica no presente caso. Além da ausência de indícios suficientes para demonstrar má-fé, o cálculo aplicável deveria seguir as regras vigentes antes da EC nº 113/2019.

Nesse sentido:    

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-SUPLEMENTAR. CUMULAÇÃO INDEVIDA COM APOSENTADORIA POR IDADE. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS AO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. APELAÇÃO PROVIDA.  

1. A parte autora era beneficiário do auxílio-suplementar nº 95/072.324.299-2, concedido com DIB em 20.12.1980.  

2. Posteriormente, em 10.03.2000, teve concedido o benefício de aposentadoria por idade nº 41/116.316.185-0.  

3. Sendo indevida a cumulação de tais benefícios, a autarquia reconheceu a prescrição quinquenal do montante despendido até 07/2006 e passou à cobrança dos valores pagos a título de auxílio-suplementar no período de 01.08.2006 a 31.07.2011.  

4. Não se mostra possível, porém, a cobrança dos valores pagos à parte autora, pois, conforme pacificado pelo E. Supremo Tribunal Federal, os valores indevidamente recebidos somente devem ser restituídos quando demonstrada a má-fé do beneficiário, tendo em vista tratar-se de verbas de caráter alimentar, o que não ocorreu no caso concreto.  

5. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, nos termos do art. 85 do Código de Processo Civil.  

6. Apelação da parte autora provida.  

(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0006995-33.2011.4.03.6108, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 28/09/2021, Intimação via sistema DATA: 01/10/2021)  

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS PAGAS INDEVIDAMENTE AO BENEFICIÁRIO. DESNECESSIDADE. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. NATUREZA ALIMENTAR DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. IMPOSSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO DO INSS. APELAÇÕES DESPROVIDAS.  

1. A parte ré foi beneficiária da aposentadoria por tempo de contribuição nº 42/119.676.805-3 no período de 26.06.2002 a 30.09.2010.  

2. Identificada irregularidade na concessão do referido benefício, consistente na inclusão indevida de contribuições de terceiros referentes ao período de 01.05.1978 a 31.05.2002 em nome da parte ré, foi considerado indevido o pagamento e efetuada a cobrança de todo o valor pago a este título.  

3. Não se mostra possível, porém, a cobrança dos valores pagos equivocadamente à parte ré, pois, conforme pacificado pelo E. Supremo Tribunal Federal, os valores indevidamente recebidos somente devem ser restituídos quando demonstrada a má-fé do beneficiário, tendo em vista tratar-se de verbas de caráter alimentar, o que não ocorreu no caso concreto.  

4. Com relação à fixação de honorários advocatícios para a Defensoria Pública da União, tendo em vista que a ação foi ajuizada pelo INSS, ambos estão inseridos no conceito de Fazenda Pública, de modo que verificada a confusão de credor e devedor, inviável o reconhecimento da obrigação pretendida, como, aliás, encontra-se pacificado na jurisprudência, por meio da Súmula 421, do STJ.  

5. Apelações do INSS e da parte ré desprovidas.  

(TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0000040-68.2015.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 28/09/2021, Intimação via sistema DATA: 01/10/2021)                                  

Desta feita, impõe-se a procedência do pedido de inexigibilidade da devolução das parcelas recebidas pelo autor a título de benefício de auxílio-doença.  

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO. DEVOLUÇÃO DE VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS. TEMA 979. MODULAÇÃO DE EFEITOS. PRESCRIÇÃO. RESTITUIÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS. AGRAVO IMPROVIDO. 

- Ante pedido de declaração de inexigibilidade de valores recebidos a título de aposentadoria por tempo de contribuição, cessada administrativamente por suposta fraude de concessão, decidiu-se prescrita a iniciativa de ressarcimento ao INSS, condenando-se a autarquia a restituir o valor indevidamente descontado, àquele título, de benefício do autor. Insurge-se o INSS contra referida condenação. 

- Considerando que o débito apurado pelo INSS remonta ao período de 14/12/1995 a 30/04/1998, mas foi cobrado apenas em 2011, a decisão agravada reputou prescrita a cobrança, nos termos do artigo 1º do Decreto nº 20.910/1932. 

- Antes entendimento firmado pelo C. STJ no julgamento de Tema 979, prevalecia a intelecção de que benefícios recebidos por segurado que não usava de má-fé eram irrepetíveis, em razão de seu caráter alimentar (STF – AgReg no RE com Agravo 734.242/DF, Rel. o Min. Roberto Barroso). 

- Assim, na devolução de valores para o INSS: (i) o pagamento decorrente de interpretação errônea da lei não é repetível; (ii) o pagamento decorrente de erro material ou operacional do INSS é suscetível de repetição, salvo comprovada boa-fé do segurado; (iii) a exigência de comprovação de boa-fé vale para os processos distribuídos a partir de 23/04/2021; (iv) a repetição, quando admitida, permite o desconto de do percentual de até 30% do valor do benefício do segurado. 

- Ao tempo da propositura da ação, o autor estava dispensado de provar boa-fé comportamento. E não demonstrada má-fé, não responde pela repetição do indébito. Precedentes. 

- E se não é exigível o ressarcimento visado pela autarquia porque, não bastasse prescrito, conduta temerária do autor não se positivou, os valores descontados de benefício titularizado pelo autor, sem dúvida, devem ser restituídos. 

- Agravo interno improvido. 

(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0002145-31.2013.4.03.6183, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO DAVID FONSECA GONCALVES, julgado em 13/02/2025, DJEN DATA: 18/02/2025) 

 

Assim, pelos mesmos fundamentos, fica evidente a impossibilidade dos descontos realizados pelo INSS, sendo indevida a cobrança. Determino, portanto, a cessação imediata de quaisquer descontos e, após o recálculo com base nas regras anteriores à vigência da EC nº 113/2019, a devolução dos valores indevidamente subtraídos do benefício da parte autora, observando-se a restituição apenas do que era efetivamente devido.

 

Consectários legais e honorários advocatícios 

Para o cálculo dos juros de mora e correção monetária, devem ser aplicados os índices e critérios previstos pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos da Justiça Federal, aprovado pelo Conselho da Justiça Federal, vigente na data da execução. 

A Autarquia Previdenciária é isenta do pagamento de custas e emolumentos no âmbito da Justiça Federal e nas ações processadas perante a Justiça Estadual de São Paulo, por força do artigo 4º, I, da Lei Federal 9.289/1996, e do artigo 6º da Lei Estadual paulista 11.608/2003.  

A isenção, porém, não a exime do reembolso das despesas judiciais eventualmente recolhidas pela parte vencedora, desde que devidamente comprovadas nos autos, consoante o parágrafo único do referido artigo 4º da Lei 9.289/1996. Contudo, a parte vencida deverá arcar com as despesas processuais e as custas somente ao final, na forma do artigo 91 do CPC.  

Em razão da sucumbência, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em patamar mínimo sobre o valor da condenação, observadas as normas do artigo 85, §§ 3º e 5º, do CPC. 

A verba honorária, conforme a Súmula 111 do STJ e o Tema 1105/STJ, incide sobre as parcelas vencidas até a sentença de procedência; porém, tendo em vista que a pretensão da requerente apenas foi deferida nesta sede recursal, a condenação incidirá sobre as parcelas vencidas até a data do presente acórdão. 

Dispositivo  

Ante o exposto, dou provimento à apelação da parte autora, para determinar a revisão da renda mensal inicial da aposentadoria por incapacidade permanente, calculando-a conforme as regras anteriores à Emenda Constitucional nº 103/2019. Declaro a inexigibilidade da cobrança efetuada pela autarquia e a consequente suspensão dos descontos realizados. De ofício, fixo os consectários legais e a verba honorária, nos termos da fundamentação acima.

É o voto.  

 

 



E M E N T A

 

 

PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. REVISÃO DA APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. EC Nº 103/2019. CÁLCULO DO BENEFÍCIO. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. IRREDUTIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS. VALOR DA RENDA MENSAL INICIAL (RMI). NÃO CARACTERIZADA SITUAÇÃO QUE EVIDENCIA MA-FÉ.  RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS  DESCONTADAS PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. A EC nº 103/2019, que estabelece o cálculo do benefício com base em 60% da média aritmética simples dos salários de contribuição, é constitucional, conforme entendimento majoritário do STF, devendo ser afastada a alegação de inconstitucionalidade feita pela parte autora.

2. É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados, com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.  

3.  O Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o Tema 979 (REsp 1.381.734/RN), fixou a seguinte tese: "Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados, decorrentes de erro administrativo (material ou operacional) não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% do valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprove sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido. 

4. Não sendo possível transpor o óbice da coisa julgada existente nos autos nº 0001631-85.2018.4.03.6318 e no referido mandado de segurança, deve-se observar que a aposentadoria por incapacidade permanente foi concedida após a vigência da EC 103, publicada em 13 de novembro de 2019, e, assim, à luz do princípio tempus regit actum, a renda mensal inicial do benefício deverá ser calculada nos termos do artigo 26, § 2º, da referida norma.

5. Considerando a impossibilidade de afastar a boa-fé no presente caso, é evidente a improcedência dos descontos realizados pelo INSS sobre o valor pago a título de aposentadoria por incapacidade permanente, sob o fundamento de que a renda mensal do auxílio-doença que o segurado recebia era superior à da aposentadoria concedida nos termos do artigo 26 da EC 103/2019, sendo, portanto, indevida a cobrança.

6. Não há que se falar em restituição à parte autora a respeito do montante já descontado do benefício, uma vez que os descontos foram realizados nos termos da Súmula 473 do STF, no exercício do poder-dever do INSS de apurar atos ilegais, não se mostrando razoável impor à autarquia o pagamento de algo que, de fato, não lhe é devido.

7. Apelação do autor parcialmente provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Turma, por unanimidade, decidiu dar provimento à apelação, explicitados, de ofício os consectários legais e verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARCOS MOREIRA
DESEMBARGADOR FEDERAL