RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5011134-27.2023.4.03.6332
RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR SP
RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RECORRIDO: LOURDES TAMIKO FUKUDA UEDA
Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA CRISTINA SERAFIM ALVES - SP81528-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5011134-27.2023.4.03.6332 RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: LOURDES TAMIKO FUKUDA UEDA Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA CRISTINA SERAFIM ALVES - SP81528-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Dispensado o relatório nos termos do art. 46 da Lei 9.099/1995.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5011134-27.2023.4.03.6332 RELATOR: 5º Juiz Federal da 2ª TR SP RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS RECORRIDO: LOURDES TAMIKO FUKUDA UEDA Advogado do(a) RECORRIDO: MARIA CRISTINA SERAFIM ALVES - SP81528-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O recurso deve ser provido. Destaco os motivos já expostos na ementa deste voto, em fundamentação sucinta autorizada pelo artigo 46 da Lei 9.099/1995, aos quais me reporto e que se consideram transcritos e integrantes desta fundamentação. DISPOSITIVO Recurso provido para julgar improcedente o pedido, cassar a tutela provisória e determinar à parte autora a restituição ao INSS dos valores eventualmente recebidos por força da tutela provisória, na forma do tema 692/STJ: "A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475- O, II, do CPC/73)”. A partir da publicação deste acórdão fica o INSS autorizado a cancelar o benefício, independentemente de qualquer outra providência por parte desta Turma Recursal. Sem honorários advocatícios porque não há recorrente integralmente vencido (artigo 55 da Lei 9.099/1995; RE 506417 AgR, Relator Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 10/05/2011). O regime jurídico dos honorários advocatícios é regido exclusivamente pela Lei 9.099/1995, lei especial, que neste aspecto regulou inteiramente a matéria, o que afasta o regime do Código de Processo Civil.
E M E N T A
Previdenciário. Sentença concessiva do benefício de aposentadoria por idade híbrida, a contar de 01/03/2023 (data da DER). impugnada por recurso do INSS. Procedência das razões recursais para afastar o reconhecimento da atividade rural e julgar improcedentes os pedidos. Tutela provisória cassada.
Período rural reconhecido pela sentença. O recurso deve ser provido. Não há prova suficiente de que a parte autora exerceu atividade rural em regime de economia familiar.
Na petição inicial, a parte autora, nascida em 04/01/1952, pede o reconhecimento da atividade rural exercida sob regime de economia familiar durante o período de 1976 até 1993. Como início de prova material, apresentou os seguintes documentos: i) a certidão de casamento com Paulo Kenyti Ueda, datada de 21/05/1979, sem as profissões do casal; ii) a escritura de compra e venda do imóvel localizado em São Miguel Arcanjo – SP, datada de 22/07/1981, na qual seu pai figura como vendedor da propriedade, adquirida no ano 1974, e a parte autora e seu marido, Paulo Kanyiti Ueda, qualificado como comerciário, figuram como anuentes; iii) declaração em nome de Kentauro Fukunda, afirmando que a autora trabalhou como lavradora no sitio Sol Nascente localizado no bairro Colônia Pinhal no município de São Miguel arcanjo no período de 1976 até 1993, e iv) o comprovante do INCRA, em nome de Kentauro Fukunda, referente ao imóvel rural sitio sol Nascente em São Miguel arcanjo – SP, datado em 24/06/1985.
As questões invocadas pelo INSS em sua contestação a respeito dos diversos vínculos urbanos do cônjuge não foram esclarecidas pela prova oral produzida nos autos tampouco abordadas pela sentença.
Em seu depoimento pessoal, a parte autora narrou que nasceu em Flórida Paulista/SP e se mudou com a família para a zona rural da cidade de Marília/SP, onde residiu dos 8 aos 13 anos, época em que só estudava; que aos 13 anos de idade se mudou com a família para São Miguel Arcanjo; que nessa época ajudava em casa: fazia o almoço para os irmãos que trabalhavam desde cedo na roça, levava as marmitas e depois trabalhava também na roça no período da tarde; que a família plantava tomate, repolho e pepino para subsistência, e comercializava o remanescente (para o CEASA); que trabalhavam nas terras do seu pai; que trabalhou na roça até casar com Paulo (residente em Guarulhos), em 27/05/1979, aos 26 anos de idade; que o casal teve 3 filhos (o primeiro filho Edson, aos 29 anos de idade; Paula e Hélio, que foram trabalhar em atividades diversas), cujas certidões de nascimento não foram juntadas aos autos; que após o casamento passou a residir em uma chácara em Guarulhos, onde continuou a trabalhar na lavoura de rabanete, almeirão, espinafre (principalmente hortaliças); que tinham uma banca na feira para vender parte dos produtos e que os feirantes também compravam deles, e que sobreviviam disso; que parou de trabalhar na roça no ano de 1994, aos 42 anos, quando passou a trabalhar juntamente com o seu marido em um “sacolão”, que primeiramente era de propriedade de terceiros, após passaram a possuir a propriedade deles.
A única testemunha da autora, Melchior, afirmou que conhece a autora de Guarulhos desde 1979, época em que esta já trabalhava na feira; que trabalhou com o primo do marido da autora (também chamado Paulo Ueda), na revenda das verduras plantadas pela parte autora e seu marido; que comprava do casal todos os tipos de folhagens; que a propriedade era de aproximadamente 2 alqueires; que o casal era recém casados e não possuíam filhos; que comprou da família da autora até 1992 quando se separou e mudou e não mais manteve contato com o casal.
Em relação ao período anterior ao casamento, a matrícula do imóvel rural revela a propriedade do pai da autora, mas sem qualquer qualificação dele. A testemunha ouvida não presenciou o trabalho desenvolvido à época. A parte autora narrou que ajudava em casa nesse período, no preparo da alimentação dos irmãos que trabalhavam na roça. A parte autora nada esclareceu a respeito das funções que efetivamente desempenhava na lavoura após a entrega das marmitas.
Quanto ao período após o casamento, do depoimento da parte autora se extrai que seu cônjuge era feirante e comercializava parte da produção, e a remanescente era consumida pela família. Tal atividade (venda) o enquadra como empresário contribuinte individual, nos termos do art. 11, V, “h”, da Lei nº 8.213/91. Ou seja, no comércio, o marido da parte autora exercia, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos, cabendo-lhe recolher as contribuições previdenciárias. A parte autora se enquadra no conceito de produtor rural, tratando-se, portanto, de contribuinte individual. Com efeito, da prova oral produzida nos autos se extrai que a parte autora exerce atividade na lavoura, cuja produção é comercializada na feira da cidade. A rigor, além da condição de produtor rural, a parte autora exerce atividade típica de feirante.
No mais, conforme bem argumentado pelo INSS, do CNIS do marido da parte autora consta que ele possui histórico laboral urbano de 01/01/1985 até 05/1991.
Se é certo que o exercício de atividade urbana intercalada com a atividade rural não impede a concessão de benefício previdenciário de trabalhador rural, condição que deve ser analisada no caso concreto (interpretação resumida no verbete da Súmula 46 da TNU) e que a circunstância de um dos integrantes do núcleo familiar desempenhar atividade urbana não implica, por si só, a descaracterização do trabalhador rural como segurado especial, condição que deve ser analisada no caso concreto (interpretação resumida no verbete da Súmula 44 da TNU), é certo que a autora afirmou em seu depoimento pessoal que a sobrevivência da família era oriunda da comercialização dos produtos na feira e não apresentou nenhuma prova de que, mesmo com os rendimentos oriundos dos vínculos urbanos desempenhados pelo cônjuge, a atividade rural que ela teria exercido, em regime de economia familiar, era indispensável à subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar, como o exige o § 1º do artigo 11 da Lei 8.213/1991.
Com efeito, segundo esse dispositivo, “[e]ntende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
Ante os rendimentos de atividade urbana percebidos pelo cônjuge da parte autora durante longo período (de 01/01/1985 até 05/1991, conforme CNIS), cabia a ela comprovar, a fim de não ver descaracterizado o regime de economia familiar, que a atividade rural que afirma ter exercido fora indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar. Mas, a autora apenas afirma tal fato, sem que exista prova dele nos autos. Ao contrário. O conjunto probatório descaracterizada o regime de economia familiar, tanto pela atividade de feirante exercida, como pelo trabalho urbano do cônjuge.
Segundo o conjunto probatório, concomitantemente ao período rural reconhecido pela sentença, o cônjuge possui histórico profissional como empresário/empregador, além de vínculo bancário e com a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, os filhos do casal não trabalharam na roça e a parte autora comercializava produtos com o próprio cônjuge nas feiras da cidade, a revelar que o trabalho rural não era destinado apenas à subsistência familiar. Trata-se, na verdade, de produtor rural contribuinte individual, a quem recai a obrigação de recolher contribuições à Previdência Social (artigo 11, inciso v, “a”, da Lei 8.213/91).
Sentença reformada. Recurso do INSS provido para afastar o reconhecimento da atividade rural do período de 1976 a 1993 e julgar improcedentes os pedidos. Tutela provisória cassada.