Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 0000506-38.2015.4.03.6108

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY

PARTE AUTORA: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

PARTE RE: JOSE ALTAIR GONCALVES, MARIA DE LURDES DA SILVA

Advogados do(a) PARTE RE: ARAI DE MENDONCA BRAZAO - SP197602-A, YASMIM ZANUTO LEOPOLDINO - SP441367-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 0000506-38.2015.4.03.6108

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY

PARTE AUTORA: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

PARTE RE: JOSE ALTAIR GONCALVES, MARIA DE LURDES DA SILVA

Advogados do(a) PARTE RE: ARAI DE MENDONCA BRAZAO - SP197602-A, YASMIM ZANUTO LEOPOLDINO - SP441367-A

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de agravo interno interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em face de decisão que, com base no art. 17-C, § 3º, da Lei n. 8.429/1992, e art. 932, III, do CPC, não conheceu de remessa necessária contra sentença que, nos autos da ação de improbidade administrativa movida pelo MUNICÍPIO DE UBIRAJARA contra JOSÉ ALTAIR GONÇALVES, MARIA DE LURDES DA SILVA e UNIÃO FEDERAL, (i) reconheceu a ausência de interesse processual no que se refere ao pedido de reparação dos danos causados ao erário, extinguindo o feito sem resolução de mérito com fundamento no art. 485, IV, do CPC; e (ii) reconheceu a ocorrência da prescrição do pedido sancionatório pela prática dos atos ímprobos, extinguindo o processo com resolução de mérito na parte remanescente, com fundamento no art. 487, II, do CPC (ID 301107704).

Alega, em suma, que de acordo com jurisprudência do STJ firmada antes da edição da Lei n. 14.230/2021, as sentenças de improcedência de pedidos formulados em ação de improbidade administrativa sujeitam-se ao reexame necessário por analogia à Lei da Ação Popular (art. 19 da Lei n. 4.717/1965), que junto às demais leis de vocação coletiva (Leis n. 7.347/1984, 8.078/1990, 8.429/1992, etc.) compõem o nominado microssistema processual coletivo. Afirma que, sendo a remessa necessária uma questão de cunho processual, a aplicação da nova lei é vedada, uma vez que a análise do cabimento do ato processual deve ser aferida com base nas normas vigentes à época da sua realização. Sustenta que, a partir do momento em que a sentença terminativa ou de improcedência é publicada, gera ao autor da lide a expectativa de que haverá a remessa necessária – inclusive com a possibilidade de optar pela não interposição de recurso voluntário. Portanto, postula que seja conhecida e provida a remessa necessária para reformar a sentença e determinar o regular prosseguimento do feito (ID 303368581).

Contrarrazões do agravado (ID 308053928).

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL (199) Nº 0000506-38.2015.4.03.6108

RELATOR: Gab. 12 - DES. FED. WILSON ZAUHY

PARTE AUTORA: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP

PARTE RE: JOSE ALTAIR GONCALVES, MARIA DE LURDES DA SILVA

Advogados do(a) PARTE RE: ARAI DE MENDONCA BRAZAO - SP197602-A, YASMIM ZANUTO LEOPOLDINO - SP441367-A

 

 

 

V O T O

 

 

 

O agravo interno deve ser provido.

Conforme se vê da decisão de ID 301107704, em juízo de admissibilidade da remessa necessária, entendi pelo seu não cabimento à luz do art. 17-C, § 3º, da Lei n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa), incluído pela Lei n. 14.230/2021, que prevê expressamente que “Não haverá remessa necessária nas sentenças de que trata esta Lei”, por se tratar de norma posterior mais benéfica ao réu, bem como porque o duplo grau de jurisdição obrigatório em tais ações não decorrida de determinação legal expressa, mas de construção jurisprudencial.

Não obstante, conforme restou consignado no voto proferido pela E. Desembargadora Federal MONICA NOBRE no julgamento do recurso de apelação e da remessa oficial tida por interposta nos autos n. 0011599-38.2010.4.03.6119 por esta Turma, em 25/11/2024, o C. Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp n. 2.163.140/SP, reformou acórdão da 4ª Turma que não conheceu da remessa nos autos 5005193-68.2019.4.03.6128, fundamentando que “a alteração advinda da Lei n. 14.230/2021 é inaplicável ao caso presente, considerando a teoria do isolamentos dos atos processuais, de modo que o regime de impugnação das decisões judiciais submete-se à legislação vigente à época da prolação da decisão recorrida, anteriormente à edição da lei que alterou substancialmente a LIA. Nesse sentido, tendo em conta que a sentença de improcedência foi prolatada em 06/4/2021 (e-STJ fl. 4349), é de ajustar o acórdão recorrido aos termos da jurisprudência do STJ, no sentido de que "as sentenças de improcedência de pedidos formulados em ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário, seja por aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (art. 475 do CPC/1973), seja pela aplicação analógica da Lei da Ação Popular (art. 19 da Lei n. 4.717/65)" (AgInt no AREsp 1.008.646/MG, rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, Segunda Turma, DJe 22/06/2018).”

Diante disso, e considerando que o mesmo entendimento vem sendo adotado reiteradamente pela 1ª Turma da Corte Superior (AgInt no REsp n. 1.543.207/SC, Rel. Min. Gurgel de Faria, 1ª Turma, j. 11/12/2023, DJe 14/12/2023; REsp n. 1.502.635/PI, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, 1ª Turma, j. 12/12/2023, DJe 18/12/2023; e AgInt no REsp n. 2.139.398/RJ, Rel. Min. Regina Helena Costa, 1ª Turma, j. 7/10/2024, DJe 9/10/2024), adoto-o a fim de alterar minha anterior compreensão sobre o tema e conhecer da remessa necessária na espécie, vez que a sentença foi proferida em 26/04/2019, antes, portanto, da vigência da Lei n. 14.230/2021 (ID 156856688, f. 165-168).

E, assim fazendo, tem-se que a sentença extinguiu os pedidos formulados pelo reconhecimento da prescrição e da ausência de interesse processual do autor nos seguintes termos:

A ação deve ser extinta, em face da ocorrência da prescrição.

Os atos imputados aos réus foram formalizados em 11 de agosto de 2009 e 05 de maio de 2011, segundo a informação do Ministério do Turismo na gestão do então do Prefeito Municipal, o Réu José Altair Gonçalves (2008 a 2012), que não foi reeleito, pois na gestão de 2013 a 2016, a administração municipal foi conduzida por José Oderige Jacinto Siqueira.

Assim, eventual ato de improbidade administrativa ocorreu há mais de 08 (oito) anos, encontrando-se, portanto, fulminado pela prescrição o direito à propositura da ação destinada a levar a efeito as sanções previstas na lei 8.429/92, nos termos do art. 23, inciso I.

Porém essa regra não se aplica ao ressarcimento ao erário da verba pública envolvida, cujo eventual dano está pendente de ser constituído.

De fato, a questão pertinente às contas, em si, está sendo discutida pelo TCU no processo de Contas Especial nº 33.237/2015-8, que analisa a regularidade da aplicação dos recursos financeiros referentes ao convênio celebrado entre o município de Ubirajara e o Ministério do Turismo.

Após julgamento pelo TCU, valerá o acórdão da Corte de Contas (caso haja apuração de haveres) como título executivo para ajuizamento da ação de execução, visando à recomposição do Erário. Aqui, neste ponto, fica a lide extinta sem resolução de mérito, por falta de interesse processual, eis que ainda não há dano apurado a ser reparado.

Ante o exposto, reconheça a falta de interesse processual quanto ao pedido de reparação civil de dano ao erário, na forma do art. 485, VI, do CPC e, no que pertine ao mérito da demanda (imputação de improbidade administrativa), declaro a ocorrência da prescrição, extinguindo o feito com resolução do mérito, na forma do art. 487, II, do Novo Código de Processo Civil.

Da leitura dos autos, verifica-se que a ação civil pública por ato de improbidade administrativa foi proposta pelo Município em 25/02/2015, a fim de apurar a contratação pelo então prefeito José Altair Gonçalves, mediante inexigibilidade de licitação, em 10/08/2009, da empresa Usina de Promoções de Eventos LTDA, representada por Maria de Lourdes da Silva, para realização de show da dupla Guilherme e Santiago no 1º Festival Cultural Solidário de Ubirajara, bem como para a sua divulgação em rádios, com recursos advindos do convênio n. 704408/2009 celebrado com o Ministério do Turismo. Postula a sua condenação pela prática dos atos descritos no art. 10, V, VIII, e XII, e art. 11, caput, da Lei n. 8.429/1992 nas sanções do art. 12, II e III, da mesma lei, quais sejam, o ressarcimento integral dos danos, perda da função pública eventualmente exercida, suspensão dos direitos políticos por oito anos, pagamento de multa civil no importe de duas vezes o valor dos danos ou até cem vezes a remuneração percebida pelo agente quando do exercício do cargo e a proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por meio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos (ID 156856685, f. 11-43).

Citada a ré em 02/08/2016 (ID 156856686, f. 89), ela não ofereceu contestação (f. 101).

Em 29/11/2017, o autor se manifestou nos autos pela ausência de legitimidade ou interesse processual da parte, por ter o Sr. José Altair Gonçalves reassumido como prefeito do Município no ano de 2017, bem como porque os fatos objeto da lide ainda estão em análise perante o Tribunal de Contas da União (autos TC n. 033.237/2015-8), conforme f. 108-111 do ID retro.

Pela manifestação de ID 156856688, f. 16-18, em 04/05/2018, o Ministério Público Federal assumiu a titularidade da demanda, nos termos do art. 9º da Lei n. 4.717/1965 c/c art. 17 da Lei n. 8.429/1992, na redação então vigente, juntando novos documentos (f. 19-54) e postulando “a intimação da corré MARIA DE LURDES DA SILVA, a fim de que esclareça sua participação na Usina de Promoção e Eventos Ltda., comprovando, documentalmente, que fez parte dela e tinha aptidão para contratar em seu nome na data da celebração do contrato com a Prefeitura de Ubirajara (10.08.2009 – fls. 47/50)”.

Em 18/10/2018, foi determinada a exclusão do Município do polo ativo do feito, substituindo-o pelo MPF; a citação do réu; e a posterior intimação do MPF e da União para fins de especificar provas ou reiterar os pedidos, se o caso (f. 63-65).

O réu compareceu aos autos e ofereceu contestação em 26/11/2018 (f. 70-88).

Após, em 08/01/2019, o Ministério Público Federal se manifestou pelo reconhecimento da prescrição da pretensão nos termos do art. 23, I, da Lei n. 8.429/1992, com a intimação da União a fim de que manifeste eventual interesse quanto à persecução do ressarcimento ao erário (f. 146-147).

A União informou a ausência de interesse em assumir o polo ativo da ação e que se valerá do acórdão da Corte de Contas como título executivo para o ajuizamento da ação de execução visando a recomposição do erário (f. 162-163).

Foi, então, proferida a sentença objeto da remessa necessária (f. 165-168).

Pois bem. A remessa deve ser provida.

Como é incontroverso, os atos tidos por ímprobos foram praticados durante a gestão do réu José Altair Gonçalves como prefeito de Ubirajara-SP no período de 2009 a 2012, sendo certo que, acerca do tema, o art. 23, I, da Lei n. 8.429/1992, na redação vigente à época da prolação da sentença, previa que:

Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas:

I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança;

II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.

III - até cinco anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único do art. 1º desta Lei.

Assim, o prazo prescricional, na espécie, teve início em 01/01/2013 e, ajuizada a presente ação em 25/02/2015, não há que se falar no advento de prescrição da pretensão sancionatória.

Registre-se que o fato de o próprio MPF não ter promovido oportunamente o ajuizamento da ação a partir dos elementos colhidos nos Inquéritos Civis n. 1.34.024.000134/2017-75 e 1.34.003.000632/2017-66, que restaram arquivados pela prescrição, não prejudica o fato de a pessoa jurídica interessada (o Município) o fez, nos termos do art. 17 da Lei n. 8.429/1992 (redação original), não se justificando a extinção do feito pela prescrição quando a pretensão foi tempestivamente exercida por pessoa legalmente legitimada, ainda que não componha mais o polo ativo da demanda.

Tal conclusão implica, igualmente, na subsistência da pretensão quanto à ré Maria de Lurdes da Silva, à luz da Súmula 634 do STJ, in verbis: "Ao particular aplica-se o mesmo regime prescricional previsto na Lei de Improbidade Administrativa para o agente público".

Nesse contexto, de rigor a reforma da sentença para que seja afastado o reconhecimento da prescrição da pretensão sancionatória.

Com relação à parcela do pedido extinta pela ausência de interesse processual (ressarcimento ao erário), igualmente, deve ser revista.

De fato, a existência do processo de Tomada de Contas Especial n. 33.237/2015-8, em que o Tribunal de Contas da União analisa a regularidade da aplicação dos recursos financeiros no convênio objeto dos autos, não obsta o prosseguimento da ação de improbidade administrativa e eventual condenação dos réus, ao final, ao integral ressarcimento ao erário, por força da independência das instâncias penal, civil e administrativa, positivada no art. 12, II e III, da LIA na redação então vigente:

Art. 12.  Independentemente das sanções penais, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato: (...)

II - na hipótese do art. 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de cinco a oito anos, pagamento de multa civil de até duas vezes o valor do dano e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de cinco anos;

III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos.

Ademais, conforme a Súmula 128 do TCU, eventual valor objeto de acórdão condenatório ao ressarcimento que já tenha sido pago será abatido na ação de execução, de modo que não há que se falar em bis in idem ou cobrança em duplicidade. Veja-se o enunciado:

Mesmo na hipótese de já se ter verificado recolhimento parcial, o Acórdão de condenação expressará o total da dívida, abatendo-se, na execução, o valor já satisfeito, sem a incidência da correção monetária e dos juros de mora sobre a quantia já ressarcida e a partir da data de cada pagamento.

Portanto, deve ser afastada, também, a extinção do processo sem resolução do mérito.

Considerando, porém, que a sentença foi proferida sem que fosse apreciado o pedido do Ministério Público Federal no sentido de intimar a “corré MARIA DE LURDES DA SILVA, a fim de que esclareça sua participação na Usina de Promoção e Eventos Ltda., comprovando, documentalmente, que fez parte dela e tinha aptidão para contratar em seu nome na data da celebração do contrato com a Prefeitura de Ubirajara (10.08.2009 – fls. 47/50)”, vez que suas pesquisas apontariam a existência de outros sócios administradores (ID 156856688, f. 17), bem como sem que as partes foram intimadas para especificar as provas que pretendiam produzir, conforme determinado à f. 65 do ID retro, tenho que o feito não está em condições de imediato julgamento, impossibilitando a análise do mérito por esta Corte (art. 1.013, §§ 3º, I, e 4º, do CPC).

Assim, o processo deverá retornar à origem para regular prosseguimento, com a prolação de novo julgamento, ao final, pelo juiz singular.

Ante o exposto, CONHEÇO E DOU PROVIMENTO ao agravo interno para CONHECER da remessa necessária e DAR-LHE PROVIMENTO, reformando a sentença de primeiro grau a fim de afastar o reconhecimento da ausência de interesse processual e da prescrição da pretensão, bem como determinando o retorno dos autos à origem para prosseguimento até seus ulteriores termos.

É como voto.



E M E N T A

 

AGRAVO INTERNO. IMPROBIDADE ADMIISTRATIVA. DECISÃO QUE NÃO CONHECEU DE REMESSA NECESSÁRIA. NÃO INCIDÊNCIA DO ART. 17-C, § 3º, DA LEI N. 8.429/1992 AOS PROCESSOS ANTERIORES À LEI N. 14.230/2021. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 19 DA LEI N. 4.717/1965. CONHECIMENTO DA REMESSA. SENTENÇA QUE RECONHECEU A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO SANCIONATÓRIA. ART. 23, I, DA LIA, NA REDAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL. TÉRMINO DO MANDATO ELETIVO. NÃO OCORRÊNCIA NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. EXISTÊNCIA DE PROCESSO DE TOMADA DE CONTAS ESPECIAL NO TCU. INDEPENDÊNCIA DAS INSTÂNCIAS. INEXISTÊNCIA DE BIS IN IDEM. SENTENÇA REFORMADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E PROVIDO. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E PROVIDA.

1. Considerando a teoria do isolamento dos atos processuais, a alteração advinda da Lei n. 14.230/2021 quanto ao não cabimento da remessa necessária às ações de improbidade administrativa (art. 17-C, § 3º, da Lei n. 8.429/1992) é aplicável apenas às sentenças proferidas após a edição da nova norma, incidindo, quanto às anteriores, o entendimento jurisprudencial então prevalecente pela aplicação analógica do art. 19 da Lei n. 4.717/1965. Precedentes do STJ.

2. Agravo interno provido para conhecer da remessa necessária, vez que a sentença, no caso, foi proferida em 26/04/2019.

3. A sentença objeto do duplo grau obrigatório reconheceu a ausência de interesse processual no que se refere ao pedido de reparação dos danos causados ao erário, extinguindo o feito com fundamento no art. 485, IV, do CPC, e a ocorrência da prescrição do pedido sancionatório pela prática dos atos ímprobos, extinguindo o processo com resolução de mérito neste ponto.

4. Os atos tidos por ímprobos foram praticados durante a gestão do réu como prefeito de Ubirajara-SP no período de 2009 a 2012, sendo certo que o art. 23, I, da Lei n. 8.429/1992, na redação vigente à época da prolação da sentença, previa que as ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas na LIA poderiam ser propostas até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança.

5. O prazo prescricional, na espécie, teve início em 01/01/2013 e, ajuizada a presente ação em 25/02/2015 pela pessoa jurídica interessada (o Município), não há que se falar no advento de prescrição da pretensão sancionatória, ainda que este não mais componha o polo ativo da ação, assumido pelo Ministério Público Federal.

6. Tal conclusão implica, igualmente, na subsistência da pretensão quanto à ré particular, à luz da Súmula 634 do STJ, in verbis: "Ao particular aplica-se o mesmo regime prescricional previsto na Lei de Improbidade Administrativa para o agente público".

7. A existência do processo de Tomada de Contas Especial no Tribunal de Contas da União não obsta o prosseguimento da ação de improbidade administrativa e eventual condenação dos réus, ao final, ao integral ressarcimento ao erário, por força da independência das instâncias penal, civil e administrativa, positivada no art. 12, II e III, da LIA na redação então vigente. Ausência de bis in idem ou cobrança em duplicidade, à luz da Súmula 128 do TCU.

8. Uma vez que o processo não está em condições de imediato julgamento, impossibilitando a análise do mérito por esta Corte (art. 1.013, §§ 3º, I, e 4º, do CPC), os autos devem retornar à origem para regular prosseguimento, com a prolação de novo julgamento, ao final, pelo juiz singular.

9. Agravo interno conhecido e provido. Remessa necessária conhecida e provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu CONHECER E DAR PROVIMENTO ao agravo interno para CONHECER da remessa necessária e DAR-LHE PROVIMENTO, reformando a sentença de primeiro grau a fim de afastar o reconhecimento da ausência de interesse processual e da prescrição da pretensão, bem como determinando o retorno dos autos à origem para prosseguimento até seus ulteriores termos, nos termos do voto do Des. Fed. WILSON ZAUHY (Relator), com quem votaram a Des. Fed. LEILA PAIVA e o Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN. Ausente, justificadamente, por motivo de férias, o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE (substituído pelo Juiz Fed. Conv. ROBERTO JEUKEN) , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
WILSON ZAUHY
Desembargador Federal