Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5802047-13.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: AMAURY MODESTO DUARTE

Advogado do(a) APELADO: EVANDRO LUIZ FAVARO MACEDO - SP326185-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5802047-13.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: AMAURY MODESTO DUARTE

Advogado do(a) APELADO: EVANDRO LUIZ FAVARO MACEDO - SP326185-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

R E L A T Ó R I O

A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):

Apelação interposta pelo INSS em face de sentença que reconheceu a atividade rural para o período de 27/08/1977 a 01/10/1989 e a especialidade dos períodos de 16/10/1989 a 06/03/1991 e de 21/03/1991 a 07/02/1995, concedendo a aposentadoria por ter o autor atingido 35 anos de tempo de contribuição, condenando o INSS a pagar os valores em atraso a partir de 15/01/2018, data do requerimento administrativo, acrescidos dos juros de mora e da correção monetária nos termos da Lei nº 11.960/09. Fixou a condenação do INSS ao pagamento da verba honorária em 10% sobre o valor da condenação.

O INSS, em sua apelação, argumentou que:

- a sentença admitiu a prova exclusivamente testemunhal, não logrando êxito o autor em apresentar documentação suficiente e contemporânea que qualificasse a sua atividade como rural;

- o PPP anexado não está acompanhado de um laudo técnico elaborado por um engenheiro de segurança do trabalho ou médico do trabalho;

- embora o PPP tenha sido emitido em 2018, a informação do responsável pelo monitoramento ambiental no campo reservado indica que só há uma pessoa registrada após 2000;

- o PPP não traz informações suficientes sobre o responsável técnico pelo monitoramento ambiental, como CREA ou CRM, questionando o fato de o responsável estar assinando sem o devido protocolo ou comprovação de sua autoridade técnica para assinar o laudo;

- o autor dos PPPs estava autorizando a si mesmo a assinar os documentos em nome da empresa (KIUTY IND E COMÉRCIO DE CALÇADOS LTDA), o que é um indicativo de que o procedimento de assinatura e envio dos PPPs pode não ter seguido os trâmites regulares da empresa, criando um risco de irregularidade na apresentação dos documentos ao INSS;

- o PPP foi apresentado sem um protocolo de recebimento, o que significa que não há como confirmar que o INSS recebeu oficialmente os documentos.

O autor ofertou suas contrarrazões.

Não foi apresentada nos autos a cópia do procedimento administrativo no qual foi proferido o indeferimento do benefício previdenciário. Constou apenas a carta comunicando o indeferimento, mas nela não constam informações acerca dos motivos pelos quais os formulários previdenciários foram recusados (ID 74432734 - Pág. 7).

É o Relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5802047-13.2019.4.03.9999

RELATOR: Gab. 50 - DES. FED. SILVIA ROCHA

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

 

APELADO: AMAURY MODESTO DUARTE

Advogado do(a) APELADO: EVANDRO LUIZ FAVARO MACEDO - SP326185-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

A Exma. Desembargadora Federal SILVIA ROCHA (Relatora):

O INSS, em seu apelo, refutou o reconhecimento do período rural e da especialidade, buscando a desconstituição da decisão que concedeu a aposentadoria por tempo de contribuição.

Para comprovar a atividade rural, o autor juntou aos autos os seguintes documentos:

- cópia da Escritura de gleba adquirida pela família do autor em 25/10/1965, constando a qualificação de alguns de seus membros, incluindo o pai do autor, como lavradores, em terras inscritas no INCRA, na Comarca de Santa Isabel do Ivaí/PR;

- atestado da Secretaria Municipal de Educação de Santa Isabel do Ivaí, emitido em 25/06/2018, informando que o autor cursou a 3ª série em 1974 na Escola Rural Bandeirantes e a 4ª série em 1975 na Escola Rural Rocha Bombo, no Município de Santa Isabel do Ivaí, Paraná;

- Certidão de Casamento de Altair Modesto Duarte, irmão do autor, celebrado em 19/09/1985, qualificado como lavrador;

- Certidão de Nascimento de Ademir Modesto Duarte, irmão do autor, ocorrido em 13/04/1975, constando a profissão de seu pai, Alcides Modesto Duarte, como lavrador;

- Certidão de Casamento do autor, Amaury Modesto Duarte, celebrado em 21/01/1988, na Comarca de Loanda/PR, constando como sua profissão e a de seu pai a de lavrador;

- Certidão de Nascimento da filha do autor, Aline Modesto Duarte, ocorrida em 14/09/1988, na Comarca de Loanda/PR, em que constou a profissão do autor como lavrador.

Toda a documentação apresentada, composta pela cópia da escritura de gleba adquirida pela família do autor, atestando a qualificação de seus membros como lavradores, o atestado da Secretaria Municipal de Educação de Santa Isabel do Ivaí, confirmando a matrícula do autor em escolas rurais, e as certidões de casamento e nascimento, qualificando o pai do autor e o próprio autor como lavradores, constituem uma prova material robusta que demonstra o exercício da atividade rural.

A primeira testemunha, João de Souza Barros Filho, afirmou conhecer o autor desde a infância e confirmou que ele começou a trabalhar na roça com a família ainda criança, em lavoura de café, em Santa Isabel do Ivaí, Paraná. O depoente, que era vizinho de sítio, via o autor trabalhando, realizando atividades rurais 5 dias por semana. O pai do autor não possuía empregados. Após venderem a chácara, o autor trabalhou como meeiro em outra propriedade rural. O depoente deixou Santa Isabel em 1988, mas acredita que o autor tenha continuado a trabalhar na roça até 1990.

José Geraldo de Barros, a segunda testemunha, afirmou conhecer o autor desde os 10 anos e relatou que, na época, ele já trabalhava na roça com a família em uma chácara de café em Santa Isabel do Ivaí, Paraná. O autor trabalhava a semana inteira na roça e o depoente, que morava nas proximidades, via o autor trabalhando. O pai do autor não tinha empregados. O autor trabalhou na roça até 1989, quando se mudou para Birigui. O depoente também mencionou que o autor trabalhou para Catu e em outro sítio para Erpinio Prieto antes de se mudar para Birigui, onde passou a trabalhar na Kiuti.

A documentação que comprova o exercício da atividade rural, para ser considerada um indício razoável de prova material, não precisa ser, necessariamente, contemporânea aos fatos. O que se exige é que tenha uma relação temporal com o período de atividade rural a ser comprovado, sendo compatível com o período alegado, para que possa ser corroborada com a prova testemunhal.

Com base no conjunto probatório, não há dúvida de que o autor laborou na atividade rural desde os 12 anos até 01/10/1989, inicialmente com seus familiares, no regime de economia familiar, e, após, por volta de 1988, como meeiro, deixando o meio rural para trabalhar na área urbana.

Dessa forma, fica mantido o reconhecimento da atividade rural, conforme foi realizado pelo juízo de origem, para o período de 27/08/1977 a 01/10/1989.

Agora, passamos à análise do enquadramento da especialidade nos períodos de 16/10/1989 a 06/03/1991 e de 21/03/1991 a 07/02/1995, realizados pelo juízo de origem, que considerou como prova o conteúdo informado em PPPs extemporâneos, emitidos em 09/02/2018.

Ao analisar a tramitação destes autos, percebe-se que não consta o inteiro teor do procedimento administrativo que resultou no indeferimento do pedido de aposentadoria por tempo de contribuição, requerido em 25/01/2018 (ID 74432734 - Pág. 7). Isso, no entanto, não impede o reconhecimento do período rural, pois, notoriamente, trata-se de um pedido que o INSS tende a não reconhecer sistematicamente. Contudo, a entrega desses documentos aos autos, no que tange à especialidade, torna-se relevante, pois é necessário verificar se o segurado apresentou o PPP em seu requerimento, permitindo ao INSS avaliar se aquele formulário previdenciário é válido ou não.

Sem essa verificação, não é possível saber, por exemplo, se o INSS realizou diligências para aferir a veracidade do PPP. Caso não tenha feito o que lhe competia, conforme o art. 422 do CC, a boa-fé do segurado é protegida, e ele não deve ser responsabilizado por falhas ou omissões da empresa, especialmente no que diz respeito a documentos internos como o contrato social.

O art. 264, § 1º, II, do Decreto nº 3.048/99, estabelece que o PPP deve ser fornecido ao trabalhador obrigatoriamente no momento da rescisão contratual ou sempre que solicitado. Nos termos do art. 295, § 4º, da IN 128/22, ficou estabelecido que o PPP pode ser apresentado pelo próprio segurado no requerimento de benefícios previdenciários, não sendo necessário que a via do documento contenha o protocolo de entrega ao INSS. Apenas o empregador tem a obrigação de manter a prova de entrega do PPP ao trabalhador.

Nunca houve exigência legal para que a via do trabalhador contenha o protocolo de entrega ao INSS.

A responsabilidade de verificar a regularidade do PPP e a autoridade de quem assinou o documento é do INSS, não do segurado. Para isso, no entanto, é necessário que o segurado apresente o PPP no procedimento administrativo.

O art. 54, § 1º, da Lei nº 8.213/91 estabelece que "A documentação que instruir o pedido de concessão de benefício deverá ser apresentada pelo segurado, ficando o INSS responsável pela verificação das informações."

O art. 26 da Lei nº 8.212/91, por sua vez, prevê que "O INSS poderá, quando necessário, solicitar à empresa documentos ou informações complementares que comprovem a regularidade da documentação apresentada."

Nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso II, do CPC, em relação ao reconhecimento da especialidade, a sentença está anulada, e, consequentemente, também está anulada a concessão judicial do benefício. Assim, cabe ao juízo de origem requisitar a vinda do procedimento administrativo para os autos, a fim de que possa avaliar se todos os questionamentos levantados, tanto na contestação quanto no apelo do INSS, foram ou não objeto de diligências administrativas.

É necessário esclarecer qual foi o fundamento utilizado pelo INSS para se recusar a reconhecer a especialidade, caso ela tenha sido, de fato, recusada, uma vez que essa informação não consta na carta de indeferimento do benefício.

Se comprovado que, no procedimento administrativo, o autor não apresentou o PPP, caberá ao juízo de origem extinguir o processo em relação ao pleito de reconhecimento de especialidade, por falta de interesse de agir, uma vez que foi tolhido ao INSS avaliar a validade daquele formulário previdenciário, ficando, no entanto, mantido o reconhecimento judicial da atividade rural para o período de 27/08/1977 a 01/10/1989, o qual deverá ser averbado.

Obviamente, a concessão judicial ou não do benefício e a eventual fixação de efeitos financeiros dependerão do resultado desta diligência.

Ante o exposto, nega-se provimento ao apelo do INSS, mantendo-se o reconhecimento da atividade rural conforme realizado pelo juízo de origem. No mais, anula-se, de ofício, a sentença para que o referido juízo promova, nos termos da fundamentação, as diligências necessárias, ficando, neste ponto, prejudicadas as demais alegações recursais.

É o voto.

 



Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA QUANTO À ATIVIDADE ESPECIAL E À CONCESSÃO JUDICIAL DO BENEEFÍCIO. NECESSIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA: CÓPIA DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO.

I. CASO EM EXAME

  1. Apelação interposta pelo INSS contra sentença que reconheceu a atividade rural no período de 27/08/1977 a 01/10/1989 e a especialidade dos períodos de 16/10/1989 a 06/03/1991 e de 21/03/1991 a 07/02/1995, concedendo aposentadoria por tempo de contribuição e condenando o INSS ao pagamento dos valores em atraso.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

  1. Há duas questões em discussão:
    i. Se há comprovação suficiente para o reconhecimento da atividade rural no período de 27/08/1977 a 01/10/1989.
    ii. Se os períodos de 16/10/1989 a 06/03/1991 e de 21/03/1991 a 07/02/1995 podem ser reconhecidos como atividade especial, diante das inconsistências apontadas pelo INSS em relação aos Perfis Profissiográficos Previdenciários (PPP) apresentados.

III. RAZÕES DE DECIDIR

  1. A atividade rural no período de 27/08/1977 a 01/10/1989 foi devidamente comprovada por documentos materiais e prova testemunhal coerente, confirmando o labor rural do autor em regime de economia familiar e, posteriormente, como meeiro.
  2. O reconhecimento da especialidade dos períodos de 16/10/1989 a 06/03/1991 e de 21/03/1991 a 07/02/1995 foi embasado em PPPs extemporâneos e sem comprovação adequada da assinatura do responsável técnico, gerando incerteza quanto à regularidade da documentação.
  3. A ausência do procedimento administrativo completo impede a verificação de eventuais diligências realizadas pelo INSS para aferir a veracidade dos documentos, tornando necessária a complementação da instrução probatória.
  4. Nos termos do artigo 1.013, § 3º, inciso II, do CPC, a sentença deve ser anulada quanto ao reconhecimento da especialidade e à concessão do benefício, determinando-se o retorno dos autos ao juízo de origem para a obtenção do procedimento administrativo e eventual complementação da prova.
  5. Mantém-se o reconhecimento judicial da atividade rural e sua averbação, sem prejuízo da reavaliação do pedido de aposentadoria após a complementação da instrução processual.

IV. DISPOSITIVO E TESE

  1. Apelação do INSS desprovida, ficando mantido o reconhecimento da atividade rural. Sentença anulada, de ofício, no ponto em que trata do reconhecimento da atividade especial, determinando-se a reabertura da instrução probatória. Mantém-se o reconhecimento da atividade rural. Anulada a concessão judicial do benefício.

Tese de julgamento:

  1. O reconhecimento da atividade rural pode se basear em prova material indireta corroborada por prova testemunhal idônea.
  2. A validade dos PPPs para reconhecimento de atividade especial exige que sua emissão observe os requisitos técnicos e administrativos previstos na legislação previdenciária.
  3. A ausência do procedimento administrativo completo impede a adequada aferição da validade da documentação apresentada, justificando a anulação da sentença para reabertura da instrução probatória.

Dispositivos relevantes citados: Lei nº 8.213/91, art. 54, § 1º; Lei nº 8.212/91, art. 26; Decreto nº 3.048/99, art. 264, § 1º, II; IN 128/22, art. 295, § 4º; CPC, art. 1.013, § 3º, II.
Jurisprudência relevante citada: Não há jurisprudência citada expressamente na decisão.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo do INSS, mantendo-se o reconhecimento da atividade rural conforme realizado pelo juízo de origem e, no mais, anulou, de ofício, a sentença para que o referido juízo promova, nos termos da fundamentação, as diligências necessárias, ficando, neste ponto, prejudicadas as demais alegações recursais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
SILVIA ROCHA
Desembargadora Federal