APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031664-69.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: MARCUS VINICIUS ESTACIO SOUSA
Advogado do(a) APELANTE: MARCUS VINICIUS ESTACIO SOUSA - SP421027-A
APELADO: SUPERINTENDENTE REGIONAL - SR/PF/SP (DELEAQ/DREX/SR/PF/SP), UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031664-69.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: MARCUS VINICIUS ESTACIO SOUSA Advogado do(a) APELANTE: MARCUS VINICIUS ESTACIO SOUSA - SP421027-A APELADO: SUPERINTENDENTE REGIONAL - SR/PF/SP (DELEAQ/DREX/SR/PF/SP), UNIÃO FEDERAL R E L A T Ó R I O Trata-se de mandado de segurança impetrado para possibilitar a expedição de porte de arma ao impetrante. O impetrante requer a nulidade da decisão administrativa que negou seu porte de arma. Argumenta, em síntese, que é advogado atuante na seara penal, já tendo sofrido ameaças e tentativas de invasão ao seu domicílio, sendo plenamente justificável a necessidade do porte. A r. sentença denegou a segurança. Nas razões de apelação, o impetrante sustenta ter comprovado o atendimento aos requisitos da Lei 10.823/2003. Justifica estar em profissão de risco e alega que o poder discricionário não pode ser invocado para descumprimento da lei. Requer a concessão da segurança. Houve apresentação de contrarrazões. O Ministério Público Federal apresentou parecer opinando pela manutenção da r. sentença. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5031664-69.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: MARCUS VINICIUS ESTACIO SOUSA Advogado do(a) APELANTE: MARCUS VINICIUS ESTACIO SOUSA - SP421027-A APELADO: SUPERINTENDENTE REGIONAL - SR/PF/SP (DELEAQ/DREX/SR/PF/SP), UNIÃO FEDERAL V O T O O recurso não comporta provimento. O impetrante relata que solicitou protocolou o requerimento para concessão do porte de arma de fogo, instruído com toda documentação necessária, entretanto, foi indeferido sob a justificativa de que não foi comprovada efetiva necessidade a justificar a concessão tão-somente para defesa pessoal, vez que não houve também uma comprovação de ameaça à sua integridade física de forma pessoal, atual e concreta, o que entende indevido. Pois bem. O indeferimento do pedido do impetrante foi fundamentado na ausência de cumprimento dos requisitos dispostos no Decreto n.º 11.615/2023. Como prova de sua necessidade o apelante afirma ser advogado militante na área penal e ter risco concreto de morte por conta de suposta ameaça proferida por parente de cliente, sendo patente a necessidade de proteção pessoal decorrente de sua atividade profissional. Pois bem, de início, cumpre destacar que o porte de arma previsto no art. 10 da Lei nº 10.826/2003 só pode ser deferido, em caráter excepcional, para fins de defesa pessoal. Não se presta, portanto, para o exercício profissional. No que se refere à condição de advogado, é sabido que não se trata em tese, de uma atividade profissional de risco. Por outro lado, não se ignora que de referida atuação profissional, como em tantas outras, possa eventualmente advir ameaça concreta à integridade física, o que carece de comprovação no caso em tela. O apelante não demonstrou estar inserido em situação de profissão de risco, restando-lhe a comprovação de efetiva ameaça à integridade física. Como prova, o apelante juntou cópias de notícias de mídia, relatando crimes contra outros advogados, cópia de folha de rosto de boletim de ocorrência, de 23/04/2023, onde figura como vítima do crime de ameaça (ID 313549892 – pág. 5) e cópia de folha de rosto de boletim de ocorrência de 21/06/2023 que trata de furto em residência (ID 343549892 – pág. 6). Todavia, apenas esses documentos não comprovam a efetiva necessidade, pois se trata de comunicação de delito do ponto de vista de quem alega. Para tanto, haveria de ser apresentado algum desdobramento da ocorrência apresentada: como instauração de inquérito, oitiva de testemunhas ou outras diligências capazes de demonstrar que a ameaça persiste e é verossímil. A autorização para o porte de arma exige a inequívoca comprovação de situações concretas de exposição a maior risco do que aqueles a que está exposta a população em geral que, embora relevantes, por serem ordinários e comuns a todos perdem o caráter individual e excepcional exigidos pela lei. O artigo 10, da Lei n.º 10.826/03, estabelece: “Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm. § 1.º A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente: I – demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física; (Vide ADI 6139) II – atender às exigências previstas no art. 4o desta Lei; III – apresentar documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente. § 2.º A autorização de porte de arma de fogo, prevista neste artigo, perderá automaticamente sua eficácia caso o portador dela seja detido ou abordado em estado de embriaguez ou sob efeito de substâncias químicas ou alucinógenas.” No caso concreto, consoante destacado, o impetrante não demonstrou os requisitos do artigo 10, § 1.º, incisos I e II, do referido diploma legal. Por ocasião da análise, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, na ADI n.º 6139, em 21/09/2022, a liminar analisada foi referendada para, entre outras determinações, “ii) dar interpretação conforme à Constituição ao art. 10, §1º, I, da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, para fixar a tese hermenêutica de que a atividade regulamentar do Poder Executivo não pode criar presunções de efetiva necessidade outras que aquelas já disciplinadas em lei”. A necessidade do porte de arma deve ser sempre concretamente verificada e não presumida. No caso concreto, não há prova da necessidade do porte pelo impetrante, ora apelante. Ademais, a decisão administrativa de indeferimento foi regular e motivada. Neste sentido, o precedente desta Turma: “MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. PORTE DE ARMA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO QUE DEMONSTRASSE O MOTIVO DA NECESSIDADE DO PORTE. ATO ADMINISTRATIVO DISCRICIONÁRIO. RECURSO DESPROVIDO. 1. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido é ato sujeito ao preenchimento de requisitos legais e ao juízo favorável de conveniência e oportunidade da Administração Pública. 2. O apelante não comprovou minimamente acerca da sua alega necessidade, apenas informou ser atirador desportivo e que recebeu uma ameaça no ano de 1996, conforme Boletim de Ocorrência carreado às fls. 16, o que por si só não o autoriza a portar uma arma de fogo. 3. Em razão da ausência de demonstração da efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou ameaça da integridade física do impetrante, não há qualquer justificativa para que lhe seja concedido o porte de ama, à luz do Estatuto do Desarmamento. 4. Apelo desprovido”. (Ap. 0011430-06.2013.4.03.6100, Rel. Des.Fed. Marcelo Saraiva, 4ª Turma, j. 22/11/2017, e-DJF3 Judicial 108/02/2018). A r. sentença deve ser mantida. Por estes fundamentos, nego provimento à apelação. É o meu voto.
E M E N T A
DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PORTE DE ARMA DE FOGO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NECESSIDADE EFETIVA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Mandado de segurança impetrado com o objetivo de possibilitar a expedição de porte de arma de fogo ao impetrante. Alegação de que exerce a profissão de advogado na área penal e sofre ameaças decorrentes da atividade profissional. Sentença denegatória da segurança.
II. Questão em discussão
2. A controvérsia consiste em determinar se o impetrante comprovou a efetiva necessidade da concessão do porte de arma, nos termos do art. 10 da Lei nº 10.826/2003.
III. Razões de decidir
3. O porte de arma de fogo, nos termos do Estatuto do Desarmamento, tem caráter excepcional e exige comprovação inequívoca da necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à integridade física do requerente.
4. No caso concreto, o impetrante apresentou apenas boletins de ocorrência e reportagens jornalísticas, sem qualquer elemento que demonstrasse a persistência ou verossimilhança da ameaça, como a instauração de inquérito ou diligências complementares.
5. O ato administrativo que indeferiu o pedido de porte de arma está devidamente motivado e amparado no Decreto nº 11.615/2023, não havendo ilegalidade a ser sanada pelo Judiciário.
6. Precedentes indicam que a atividade advocatícia, por si só, não é considerada atividade de risco para fins de concessão do porte de arma.
IV. Dispositivo e tese
7. Apelação desprovida.
Tese de julgamento: "1. O porte de arma de fogo tem caráter excepcional e depende da comprovação inequívoca da necessidade. 2. A atividade advocatícia, por si só, não caracteriza atividade de risco. 3. A apresentação de boletins de ocorrência, sem elementos adicionais que comprovem a persistência e verossimilhança da ameaça, não é suficiente para deferimento do porte de arma."
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 10.826/2003, art. 10; Decreto nº 11.615/2023.
Jurisprudência relevante citada: STF, ADI nº 6139, Rel. Min. [Nome do Ministro], Plenário, j. 21.09.2022; STJ, Ap. nº 0011430-06.2013.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Marcelo Saraiva, 4ª Turma, j. 22.11.2017.