APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030556-05.2023.4.03.6100
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: MERCEDES VACA HURTADO
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO CARLOS AMARO - SP463842-A
APELADO: UNIÃO FEDERAL
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APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030556-05.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: MERCEDES VACA HURTADO Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO CARLOS AMARO - SP463842-A APELADO: UNIÃO FEDERAL R E L A T Ó R I O Trata-se de ação ordinária intentada para obter a naturalização ordinária da autora, sob a alegação de preenchimento dos requisitos previstos no art. 12, inc. II, da Constituição Federal. A autora, de origem boliviana, relata residir no Brasil desde 1986. A r. sentença extinguiu o processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC. Nas razões de apelação, a autora sustenta a existência do interesse de agir. Argumenta com o preenchimento dos requisitos para a concessão da naturalização e requer a procedência do pedido. Houve apresentação de contrarrazões. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5030556-05.2023.4.03.6100 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: MERCEDES VACA HURTADO Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO CARLOS AMARO - SP463842-A APELADO: UNIÃO FEDERAL V O T O O recurso não comporta provimento. A autora requer sua naturalização ordinária, com fundamento no art. 12, inc. II, alínea “b”, que preceitua: “Art. 12- "São brasileiros: (...) II- Naturalizados: (...) b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira" Por sua vez, o art. 65, da Lei nº 13.445/2017 dispõe que: “Art. 65. Será concedida a naturalização ordinária àquele que preencher as seguintes condições: I - ter capacidade civil, segundo a lei brasileira; II - ter residência em território nacional, pelo prazo mínimo de 4 (quatro) anos; III - comunicar-se em língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando; e IV - não possuir condenação penal ou estiver reabilitado, nos termos da lei.” Ainda que a autora, ora apelante, preencha os requisitos legais para a obtenção da naturalização, a concessão é de competência exclusiva do Ministério da Justiça e Segurança Pública, nos termos do Decreto n.º 9.199/2017: “Art. 224. O interessado que desejar ingressar com pedido de naturalização ordinária, extraordinária, provisória ou de transformação da naturalização provisória em definitiva deverá apresentar requerimento em unidade da Polícia Federal, dirigido ao Ministério da Justiça e Segurança Pública”. A jurisprudência: “CONSTITUCIONAL. CANCELAMENTO DE NATURALIZAÇÃO. ARTIGO 12, §4º DA CF. LEI Nº 818/49, ARTIGO 22, INCISO III. ATIVIDADE NOCIVA AO INTERESSE SOCIAL. ARTIGOS 226 E SEGUINTES DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO DIREITO DE PROTEÇÃO. 1. A concessão da nacionalidade brasileira a estrangeiros é ato discricionário que atende aos princípios da soberania nacional, desde que presentes as condições dispostas na Constituição Federal e na legislação infra constitucional, em especial da Presidência da República por meio de decreto do Ministro da Justiça, cuja outorga da cidadania, obedece aos pressupostos da Lei nº 818/49. 2. Tão importante é essa extensão de cidadania ao estrangeiro que alguns requisitos devem ser observados, destacando-se por oportuno dentre outros, bom procedimento ( inciso V) e a ausência de pronúncia ou condenação no Brasil, por crime cuja pena seja superior a um ano de prisão (inciso VI do art. 8º, com a redação que lhe emprestou a Lei nº 5.145/1966). 3. À espécie, a naturalizada se utilizou de sua condição de brasileira para abrigar no país, em condições subumanas, chineses em situação irregular, explorando o sofrimento alheio com intuito de lucro, atividade esta nociva ao interesse nacional. 4. Ausência de malferimento do direito de proteção outorgado pelo Estado nos artigos 226 e seguintes da Constituição Federal, em razão da conduta da apelante, incompatível com a dignidade que se espera de cidadãos de bem. Apelação improvida. (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AC 0016348-97.2006.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MARLI FERREIRA, julgado em 30/08/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:26/09/2013 - o destaque não é original) “CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. NATURALIZAÇÃO EXTRAORDINÁRIA. ARTIGO 12, II, "B", DA CF. PEDIDO DEDUZIDO DIRETAMENTE NO JUDICIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. EXISTÊNCIA DE PROCEDIMENTO FORMAL LEGALMENTE PREVISTO. LEI Nº 6.815/80. DECRETO REGULAMENTADOR Nº 86.715/81. CARÊNCIA DA AÇÃO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. FALTA DE INTERESSE DE AGIR. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. SENTENÇA REFORMADA. VERBAS DA SUCUMBÊNCIA. JUSTIÇA GRATUITA. APELAÇÃO DO AUTOR IMPROVIDA. RECURSO DA UNIÃO PROVIDO. 1- De acordo com os arts. 111 a 121 da Lei nº 6.815/80, somente o Poder Executivo tem atribuição para a concessão ou denegação da nacionalidade derivada, prevista no art. 12, II, alínea "b", da CF/88, com a redação determinada pela ECR nº 3/94, cumprindo ao Judiciário, após homologado o pedido e emitida a respectiva portaria de naturalização, apenas a promoção da entrega solene do respectivo certificado. 2- Caso o interessado tenha negado seu pedido administrativo de naturalização, cabe ao Judiciário, em processo contencioso, a apreciação da legalidade do ato discricionário do órgão governamental competente. 3- A competência da Justiça Federal para as causas relativas à naturalização (art. 109, X, da CF/88) refere-se à solução de conflitos porventura existentes entre as partes envolvidas, como, por exemplo, na hipótese em que a naturalização é negada administrativamente e o interessado se socorre à via judicial para questionar os critérios utilizados pela Administração, cabendo-lhe apenas dizer se aquela agiu com observância da lei, dentro da sua competência. 4- Não há se falar em inconstitucionalidade da legislação que rege a matéria em comento no tocante a eventual negativa do acesso à Justiça (CF, art. 5º, inciso XXXV), porque a restrição a esse direito fundamental encontra apoio no princípio da separação de poderes (CF, art. 2º) e, além disso, o cidadão terá pleno acesso ao Poder Judiciário para questionar qualquer ato do Poder Executivo no curso do processo administrativo. 5- Carência da ação que se impõe, com a extinção do processo sem resolução do mérito, na forma do artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, em face da ausência de interesse de agir do autor, por inadequação da via processual eleita. 6- Custas processuais e honorários advocatícios, estes, na ordem de R$ 240,00 (duzentos e quarenta reais), devidos pela parte autora. Suspensa a execução de tais verbas por se encontrar sob o pálio da justiça gratuita, enquanto perdurar a situação de pobreza, pelo prazo máximo de 05 (cinco) anos, quando, então, estarão prescritas, por força da regra contida no artigo 12 da Lei nº 1.060/50. 7- Apelação da autoria a que se nega provimento. 8- Recurso da União provido. (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, AC 0000529-79.2004.4.03.6104, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL ALDA BASTO, julgado em 06/12/2012, e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/12/2012 - o destaque não é original) DIREITO CONSTITUCIONAL. NATURALIZAÇÃO. ART. 12, II, B, CF. PEDIDO ADMINISTRATIVO. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE IMPEDIMENTO E PROIBIÇÃO DE ARQUIVAMENTO DO PEDIDO. CONDENAÇÃO PENAL. 15 ANOS DE RESIDÊNCIA. CONDENAÇÃO ANTERIOR, EM 1973. NACIONALIDADE E SOBERANIA NACIONAL. JUÍZO POLÍTICO-DISCRICIONÁRIO. DESPROVIMENTO DA APELAÇÃO. 1. Caso em que o autor discute naturalização extraordinária, em razão de residência no Brasil sem condenação nos últimos 15 anos, mas alegando que o pleito administrativo foi arquivado por condenação por crime de receptação em 1973, o que não seria válido à luz do artigo 12, II, CF, sendo ajuizada a presente ação para declaração da inexistência de tal restrição e para impedir o Ministério da Justiça de arquivar o respectivo processo de naturalização. 2. Ainda que preenchidos os requisitos constitucionais e legais, não tem o estrangeiro direito subjetivo à naturalização, pois a outorga da nacionalidade brasileira fica sujeita à discricionariedade política do Estado no exercício de sua soberania. 3. Não cabe ao Poder Judiciário conceder naturalização, revisar juízo de conveniência e oportunidade quanto à naturalização, ou mesmo declarar inexistente condenação impeditiva à naturalização para impedir arquivamento de pedido administrativo, pois, em quaisquer das hipóteses, a decisão judicial invadiria a esfera de competência discricionária do Executivo de formular juízo político em matéria intrinsecamente vinculada ao exercício da soberania nacional. 4. Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, TERCEIRA TURMA, AC 0015131-09.2012.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS MUTA, julgado em 17/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:22/07/2014 - o destaque não é original) No caso concreto, a prova dos autos demonstra que a autora ingressou com pedido administrativo de naturalização ordinária, porém não apresentou os documentos pertinentes. Desta forma, deve a r. sentença ser mantida, uma vez que a decisão de concessão ou não de visto de naturalização é, a princípio, típica hipótese de ato discricionário, com teor político de atribuição exclusiva do Poder Executivo, sendo descabida a sua concessão pela via judicial. Por fim, a fixação dos honorários advocatícios observou o disposto no art. 85 do NCPC, e levando-se em conta o não provimento do recurso de apelação, de rigor a aplicação da regra do § 11 do artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos honorários advocatícios em 1%, sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 3º, I, observada a suspensão da exigibilidade em decorrência do deferimento dos benefícios da justiça gratuita. Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação. É o meu voto.
E M E N T A
DIREITO CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO CÍVEL. PEDIDO DE NATURALIZAÇÃO ORDINÁRIA. COMPETÊNCIA EXCLUSIVA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
1. Trata-se de apelação interposta por cidadã de origem boliviana, contra sentença que extinguiu o processo sem julgamento de mérito, com fundamento no art. 485, inciso VI, do CPC, por ausência de interesse de agir. A autora pleiteia a concessão da naturalização ordinária, alegando residir no Brasil desde 1986 e atender aos requisitos do art. 12, inciso II, alínea "b", da Constituição Federal.
II. Questão em discussão
2. A controvérsia consiste em verificar se é cabível o pedido de naturalização ordinária pela via judicial, diante da previsão constitucional e infraconstitucional que atribui ao Poder Executivo a competência para a concessão do pedido.
III. Razões de decidir
3. Nos termos do art. 12, inciso II, alínea "b", da Constituição Federal, a concessão da nacionalidade brasileira mediante naturalização ordinária depende de requerimento do interessado e é de competência exclusiva do Poder Executivo.
4. O art. 65 da Lei nº 13.445/2017 estabelece os requisitos para a naturalização, sendo que a análise do pedido deve ser realizada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, conforme determina o Decreto nº 9.199/2017, que regulamenta o procedimento.
5. A jurisprudência é pacífica no sentido de que a naturalização é ato discricionário do Poder Executivo, não cabendo ao Poder Judiciário a concessão originária da nacionalidade, mas apenas o controle da legalidade de eventual negativa administrativa.
6. No caso concreto, verifica-se que a autora não demonstrou a existência de decisão administrativa denegatória do pedido de naturalização, tampouco comprovou a apresentação dos documentos exigidos para a formalização do requerimento. Dessa forma, resta caracterizada a ausência de interesse de agir.
IV. Dispositivo e tese
7. Recurso desprovido.
Tese de julgamento: "1. A naturalização ordinária é ato discricionário do Poder Executivo, nos termos do art. 12, inciso II, alínea 'b', da Constituição Federal. 2. A ausência de negativa administrativa impede o controle judicial da decisão, caracterizando falta de interesse de agir."
Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal, art. 12, II, "b"; Lei nº 13.445/2017, art. 65; Decreto nº 9.199/2017, art. 224; CPC, art. 485, VI.
Jurisprudência relevante citada: TRF 3ª Região, AC 0016348-97.2006.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Marli Ferreira, j. 30.08.2013; TRF 3ª Região, AC 0000529-79.2004.4.03.6104, Rel. Des. Fed. Alda Basto, j. 06.12.2012; TRF 3ª Região, AC 0015131-09.2012.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Carlos Muta, j. 17.07.2014.