Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006995-47.2008.4.03.6105

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: APEMI COMERCIAL EIRELI - ME

Advogado do(a) APELANTE: CINTIA DE CASSIA FROES MAGNUSSON - SP265258-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006995-47.2008.4.03.6105

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: APEMI COMERCIAL EIRELI - ME

Advogado do(a) APELANTE: CINTIA DE CASSIA FROES MAGNUSSON - SP265258-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Trata-se de recurso de apelação cível interposto por APEMI COMERCIAL EIRELI – ME em face de sentença (fls. 6/29 do ID 90180906) que julgou improcedente o pedido formulado pela parte autora, nos autos da presente ação de anulação de ato administrativo, revogando os efeitos da tutela antecipada concedida. No r. pronunciamento recorrido, consignou-se que restaram comprovadas as infrações cometidas pela autora que configuram dano ao erário, sujeitando as mercadorias importadas à pena de perdimento, nos exatos termos da legislação aduaneira aplicável ao caso, sendo de rigor a manutenção do auto de infração.

Nas razões do seu apelo (fls. 6/29 do ID 90180906), alega a empresa recorrente que: (i) as circunstâncias trazidas pela fiscalização não configuram prova inequívoca de falsificação ou adulteração de documentos, e sem o amparo de provas robustas e iniludíveis, não há como concluir pela ocorrência de alguma infração que enseje a aplicação da pena de perdimento, sob pena de afronta ao princípio da legalidade e caracterização de abuso de poder; (ii) os bens foram legitimamente importados e as pessoas que intervieram na operação são legítimas e regularmente estabelecidas conforme a documentação autêntica apresentada, devendo ser afastada a presunção de participação de um terceiro na condição de “real comprador ou “real financiador”; (iii) o valor do câmbio corresponde efetivamente ao valor da negociação e não foi demonstrada a infração de subfaturamento ou de dano ao erário, afastando a possibilidade de aplicação do art. do Decreto-Lei n° 1.455/72; (iv) a simples requisição de documentos e informações não caracterizaram o respeito ao contraditório e a ampla defesa, uma vez que deveria ter sido concedida a oportunidade de manifestação sobre a valoração aduaneira antes da formalização do auto de infração e da aplicação da pena de perdimento, observando assim o devido processo legal.

A apelante continua a aduzir que: (v) as empresas Double Trading Inc. e Double Cargo possuem objetos sociais próprios e atuam regularmente e legitimamente em estrita obediência à lei, e a titularidade de várias empresas intervenientes em operação comercial pela mesma pessoa física não caracteriza conluio, e sim prática comercial corriqueira; (vi) as informações constantes na Declaração de Importação coincidem com a carga que chegou ao Brasil e enumeraram em separado o preço do “monitor” e do “software”, atendendo assim todos os requisitos legais, sendo que eventual discordância da classificação deveria ensejar discussão quanto à valoração e codificação aduaneira e, consequentemente, ao montante dos tributos devidos, permitindo a liberação dos bens mediante garantia/pagamento de tributos; (vii) deveria ter sido concedida à empresa interessada a oportunidade de manifestação relativamente aos valores tidos como devidos; (viii) houve supressão de instância administrativa, porque a aplicação da pena de perdimento não se sujeita ao duplo grau de jurisdição. Por fim, requer a anulação do auto de infração por ausência de comprovação da suposta fraude fiscal e pela inexistência de tipificação legal adequada e de provas concretas.

A Fazenda Nacional apresentou contrarrazões (fls. 56/65 do ID 90180906) ao apelo cível, postulando o seu desprovimento, a fim de que seja mantida a sentença em seus termos.

É o relatório.

 

 


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3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0006995-47.2008.4.03.6105

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: APEMI COMERCIAL EIRELI - ME

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APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

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V O T O

 

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): No caso em apreço, a empresa importadora propôs ação objetivando a  anulação de auto de infração, lavrado no âmbito da fiscalização aduaneira, advogando em síntese pelo reconhecimento da nulidade do referido ato administrativo: (i) por ausência de provas robustas para embasá-lo; (ii) por ofensa aos princípios da legalidade, ante a falta de observância das regras procedimentais, do contraditório, da ampla defesa, do duplo grau de jurisdição na seara administrativa e pela caracterização de abuso de poder. Pugnou, por fim, pela liberação da carga retida mediante prestação de garantia, afastando a aplicação da pena de perdimento.

Em decisão singular (fl. 169/171 do ID 90180892), havia sido deferida a tutela antecipada requerida pelo ente comercial para sustar qualquer ato material de efetivação do perdimento, mantendo sob a responsabilidade deste último todos os custos de armazenamento dos bens. Consecutivamente, em sentença de mérito (fls. 6/29 do ID 90180906), revogaram-se os efeitos do provimento liminar e julgou-se improcedente o pedido de anulação do auto de infração aduaneira, uma vez que comprovadas as infrações cometidas pela empresa importadora que configuravam dano ao erário e são puníveis com a pena de perdimento.

Irresignada, a entidade empresarial interpôs recurso de apelação (fls. 6/29 do ID 90180906), pugnando pela anulação do auto de infração lavrado no âmbito da fiscalização aduaneira e pela liberação da carga mediante garantia.

Consecutivamente, conforme a previsão legal, o juízo de origem remeteu os autos a esta E. Corte Regional para processamento do recurso de apelação.

Sempre controvertida a questão da possibilidade de revisão judicial de ato administrativo.

Em se tratando de ato de natureza vinculada, incumbe ao administrador observar fielmente os requisitos legais para a sua prática, sem espaço para deliberação individual sobre a sua conveniência e oportunidade, atuação sempre sujeita ao controle jurisdicional.

Todavia, em se tratando de ato administrativo de natureza discricionária – portanto, que comporta margem de avaliação pela Administração sobre o seu conteúdo –, não cabe ao Poder Judiciário, a princípio, substituir a avaliação do administrador público sobre as medidas que julgar adequadas, desde que seu ato esteja devidamente motivado, cumpra a sua finalidade e não ultrapasse os limites impostos pelas leis ou atos regulamentares.

Importante ressaltar que a motivação exige pertinência fática e jurídica com o ato praticado pelo administrador, não podendo subsistir quando ficar evidente a dissociação com um ou outro, circunstância que converteria a discricionariedade administrativa em arbitrariedade estatal.

Em outras palavras, são passíveis de revisão ou anulação judicial os atos administrativos que falhem em sua motivação, se desviem da sua finalidade ou ultrapassem os limites legais.

O que não cabe ao Poder Judiciário é substituir a avaliação do administrador quanto à conveniência e oportunidade de atuar, segundo os critérios que entender razoáveis, estando o ato devidamente motivado e cumprindo a sua finalidade, dentro dos limites estabelecidos em lei.

No caso em apreço, da leitura do “Termo de Verificação Fiscal e Descrição dos Fatos” (fls. 101/116 do ID 90180892 e fls. 3/9 do ID 90180852), atinente ao procedimento aduaneiro de fiscalização n° 19482.000071/2007-40, observa-se que foi imputada à empresa apelante, APEMI COMERCIAL EIRELI – ME, a prática das infrações de utilização de faturas ideologicamente falsificadas e ocultação do real comprador, em conluio com o exportador Doubie Trading In., que ensejaram a aplicação da pena de perdimento das mercadorias descritas nas DIs n° 07/0971075-0, 07/0972183-2 e 07/0973474-8.

No respetivo auto de infração, a autoridade fiscal concluiu pela ocorrência das infrações aduaneiras (a) de documento necessário ao desembaraço que tenha sido falsificado, previsto no art. 618, inciso VI, do Decreto n° 4.543/02 (atualmente revogado, mas vigente à época dos fatos), (b) em conluio da empresa importadora com a exportadora, circunstância qualitativa da infração, conforme previsão dos arts. 68, §2º, e 73 da Lei n° 4.502/64, (c) e de ocultação do real comprador, conforme era previsto no art. 618, inciso XXII, do citado Decreto n° 4.543/02), tendo sido apontadas as seguintes questões fáticas e jurídicas que embasaram a conclusão do procedimento de fiscalização: (i) a grande discrepância entre o valor unitário declarado na importação dos monitores de plasma ORION MPDP de 42 polegadas (US$ 1.300,00) e o valor de venda direta ao consumidor no mercado norte americano (US$ 8.500,00); (ii) a declaração de que os softwares (programas) contido em CD (suporte físico) seriam comercializados separadamente dos hardwares (equipamentos físicos dos monitores), informação que diverge do manual do usuário que acompanha a carga e do catálogo promocional fornecido pelo próprio importador, além de não representar a prática comercial de venda dos monitores praticadas por empresas do ramo e pela própria importadora, o que se observa da leitura das notas fiscais de entrada relativas a importações anteriores (DIs n° 07/0193264-8, 07/0193319-9 e 07/0604293-4).

Foram apontados os fatos e as ocorrências, no referido termo de verificação fiscal, enumerados a seguir: (iii) atribuição de um preço altíssimo aos softwares Multi Screen Controler Software - MSCS (meros acessórios necessários e não opcionais) contidos em CD (suporte físico) no valor de US$ 3.200,00, correspondendo cerca de 72% do valor total do monitor, que não condiz com a baixa complexidade da tecnologia usada (funções liga e desliga, ajuste de imagem e contraste, seleção de tipo de entrada, desligamento automático), possibilitando a redução indevida de cerca de R$ 252.755,56 de tributos federais e estaduais que deveriam ser recolhidos no desembaraço da mercadoria; (iv) o histórico da empresa Apemi Comercial Ltda. de importar softwares declarados em “Dados Complementares” sem recolher o imposto de renda sobre tal operação, o que se alinha ao seu modus operandi de declaração de débitos sem recolhimento posterior apurado do Sistema DCTF (2° semestre de 2005 R$ 48.075,13,  1º semestre de 2006 R$ 70,903.37; 2º semestre de 2006 R$ 64.787,72 e 1º semestre de 2007 R$ 112.232,1).

Também foram enumeradas as seguintes provas e correlações: (v) o comando das empresa importadora (Apemi Comercial Ltda.) e exportadora (Double Tradin Inc) era exercido pela mesma pessoa, o Sr. Sergio Bueno Brandão Filho, que possuía participação societária em ambas empresas, e que também representava a empresa fabricante, ORION PDP, sendo que essa constatação de identidade entre exportador e importador inclusive levou o bloqueio da carga para averiguação; (vi) orientação do fabricante, ORION PDP, de que os esclarecimentos e informações dos preços dos monitores e softwares deveriam ser buscadas junto a Double Trading Inc. na pessoa do Sr. Sérgio B. Brandão F. e que a Apemi Comercial Ltda. seria o contato no Brasil para elucidar as questões das respectivas mercadorias, informações essas que associadas ao histórico de alterações do capital social da empresa Apemi Comercial Ltda. e à Declaração de Importo de Renda Pessoa Física-DIPF 2007 do Sr. Sérgio B. Brandão F., permitem a conclusão da ocorrência do conluio empresarial, elucidando assim a falsidade das faturas n° 136420, 136422 e 136423, que instruíram as DIs n° 07/0973474-8. 07/0972183-2 e 07/0971075-0, e dos “invoices” (documentos particulares) entre fabricante e exportador e entre fabricante e importador, conforme apontado pela autoridade de fiscalização

Por último, foram aventados os seguintes fatos e conclusões: (vii) a existência de embaraço no modo de pagamento e financiamento das importações procedidas pela Double Trading Inc. e pela Apemi Comercial Ltda., conforme os contratos de câmbio apresentados, marcado pela divergência de informações fornecidas, inexistência de vinculação de um contrato de câmbio até solicitação da fiscalização, e pendência de pagamentos dos débitos declarados; (viii) omissão no registro de importação do comprador predeterminado, Indoor Midia Comunicações Ltda., real interessado nas mercadorias, e ausência dos requisitos, condições e obrigações acessórias, para registro de importação por encomenda, além do fluxo de pagamentos realizados por essa última empresa que descaracteriza a modalidade de importação por encomenda; (ix) contrato de locação firmado entre a empresa Indoor Midia Comunicações Ltda. e a Infraero para locação dos monitores que estavam a ser importados pela Apemi Comercial Ltda., elucidando que aquela empresa era a real compradora das mercadorias importadas.

Desta feita, o Termo Fiscal do procedimento aduaneiro de fiscalização n° 19482.000071/2007-40 (fls. 101/116 do ID 90180892 e fls. 3/9 do ID 90180852) demonstrou devidamente, e de forma pormenorizada, não só a materialidade da infração de falsidade da documentação necessária ao desembaraço aduaneiro, referente às faturas n° 136420, 136422 e 136423, cometida sob a circunstância qualitativa de conluio entre a empresa importadora e a exportadora, mas também da infração de ocultação do real comprador. O termo que integra o auto de infração, cuja conclusão determina a aplicação da pena de perdimento das mercadorias descritas nas DIs 07/0971075-0, 07/0972183-2 e 07/0973474-8, enumerou os fatos coerentemente, em detalhada sucessão lógica dos argumentos, em ordem temporal particularizada e conectada aos acontecimentos que integram a prática dos ilícitos.

As circunstâncias apontadas pela fiscalização, portanto, estão amparadas em provas robustas que dão solidez à conclusão da ocorrência das infrações sob circunstância qualitativa. Desse modo, detalhou-se com zelo a ocorrência das infrações de falsificação de documento necessário ao desembaraço das mercadorias importadas, nos termos do art. 618, inciso VI, do Decreto n° 4.543/02, vigente à época dos fatos, em conluio da empresa importadora com a exportadora conforme previsto nos arts. 68, §2º, e 73 da Lei n° 4.502/64, e de ocultação do real comprador previsto no art. 618, inciso XXII, do citado Decreto n° 4.543/02.

Registre-se que respectivas informações descritas têm como referência: (i) instrumento particular de alteração do contrato social e consolidação da empresa Apemi Comercial Ltda., datado de 02/01/2007 e registrado na JUCESP em 25/06/2007; (ii) intimações da SAPEA n° 105/2007 e 124/2007 dirigidas a Apemi Comercial Ltda. para comprovação da integralização do capital social e resposta à intimação n° 124/2007; (iii) informações do sistema de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais- DCTF relativas aos anos de 2005, 2006 e 2007 e Declaração de Informações Econômico-Fiscais Pessoa Jurídica- DIPJ relativa ao ano calendário de 2006; (iv) Declaração de Importo de Renda Pessoa Física- DIPF de 2007 dos sócios Sergio Bueno Brandão Filho e Alexandre Fagundes; (iv) anúncios de empresas especializadas na comercialização de monitores de plasma do mercado norte-americano e manual técnico do usuário que acompanha os monitores; (v) catálogos promocionais, informações e esclarecimentos, fornecidos pela empresa fabricante ORION PDP; (vi) notas fiscais de entrada relativas à importações anteriores (DIs n° 07/0193264-8, 07/0193319-9 e 07/0604293-4) e nota fiscal de saída n° 001434 relativa aos monitores ORION, datada de 06/09/2007; (vii) contratos de câmbio  n° 07-003323, 07-021929 e 07/004198, proposta de venda de 4/06/2007, contrato de fornecimento de 11/07/2007, fluxos de pagamentos da empresa Indoormidia Comunicações Ltda., e contrato entre a Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária- Infraero e a empresa Indoormidia Comunicações Ltda..

Deste modo, conclui-se que a materialidade das infrações aduaneiras, cometidas em conluio entre as empresas importadora e exportadora, foi pormenorizada em congruente argumentação expendida pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal. A descrição do conjunto probatório acerca dos ilícitos e o nexo desse com a narrativa dos fatos, a qual foi expendida em congruente análise temporal, são amplos e suficientes para ensejar a conclusão das ocorrências das infrações, puníveis com a pena de perdimento. Anote-se ainda que o respectivo “Termo de Verificação Fiscal e Descrição dos Fatos” (fls. 101/116 do ID 90180892 e fls. 3/9 do ID 90180852), atinente ao procedimento aduaneiro de fiscalização n° 19482.000071/2007-40, goza de presunção de legitimidade e de veracidade, a qual não foi contestada por prova inequívoca em sentido contrário pela entidade importadora.

A parte autora foi intimada para manifestar-se em diversas etapas do procedimento de fiscalização, conforme a legislação aduaneira aplicável, e não foi formulado pedido para apresentar novas provas ou razões necessárias à elucidação das questões discutidas nos autos, e nem foi apontada eventual dificuldade na reunião de elementos probatórios a serem apresentados perante à autoridade fiscal, tendo sido observado o devido processo legal administrativo. Do mesmo modo, não foi apontada alguma violação pelas autoridades fiscais às normas relativas às manifestações e notificações dirigidas aos entes investigados. Por conseguinte, não há que se falar em afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa ou na ocorrência de supressão de instância administrativa. Na verdade, o curso da apuração das infrações foi marcado, em diversos momentos, pela falta de esclarecimentos necessários por parte das entidades investigadas e pela ausência de juntada de alguns documentos solicitados pelos agentes da Aduana Brasileira.

A alegação da parte cerceamento de defesa constitui alegação vaga e genérica, uma vez que a parte não se desincumbiu ao menos de apontar algum prejuízo efetivo que haveria experimentado em sua defesa.

Dito isso, tem-se que o ente apelante não se desincumbiu de demonstrar, portanto, ilegalidade, arbitrariedade ou abuso de poder que vicie o procedimento administrativo de fiscalização, razão pela qual não há fundamento plausível que justifique a necessidade de intervenção judicial e a eventual discussão do mérito administrativo. Ao reverso, o que se depreende dos autos é que o auto de infração, objeto de análise dessa ação, está devidamente motivado, cumprindo a sua finalidade e foi lavrado dentro dos limites impostos pelas leis e atos regulamentares. Acertada, portanto, está a sentença guerreada que considerou legal a aplicação da pena de perdimento pela autoridade aduaneira, não assistindo razão à parte apelante.

Por fim, no que tange ao requerimento de liberação da mercadoria mediante garantia que assegure a efetividade da pena de perdimento, tem-se que este não pode ser acolhido. É importante ressaltar que a liberação da carga apreendida foi indeferida nos autos do mandado de segurança impetrado perante o Juízo da 8 Vara Federal (processo n° 2008.61.05.000112-7 - fls. 30/33 90180892), e a segurança foi denegada em sentença de mérito. Nos autos em epígrafe, remanescia apenas a discussão acerca do reconhecimento de eventual nulidade do auto de infração atinente ao procedimento de fiscalização n° 19482.000071/2007-40, a qual foi dirimida, uma vez que não foi verificada mácula no referido processo aduaneiro.

A possibilidade da entrega da mercadoria ao importador mediante a adoção das necessárias medidas de cautela fiscal, por sua vez, dá-se antes da conclusão do procedimento de fiscalização, nos termos do art. 68, parágrafo único, da Medida Provisória n° 2.158-35/01, e o requerimento de liberação mediante caução deve ser dirigido à autoridade aduaneira que apreciará a postulação administrativa. No presente caso, já houve a lavratura do auto de infração, sendo que é incabível o pedido de adoção de medida cautelar consistente na aplicação de pena de multa substitutiva ao perdimento.

Ante o exposto, nego provimento à apelação cível do ente particular.

É como voto.



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. APREENSÃO DE MERCADORIAS. APURAÇÃO DE INDÍCIOS DE DOCUMENTO FALSO NECESSÁRIO AO DESEMBARAÇO E OCULTAÇÃO DO REAL COMPRADOR MEDIANTE CONLUIO ENTRE IMPORTADOR E EXPORTADOR. LAVRATURA DO AUTO E INFRAÇÃO. APLICAÇÃO DA PENA DE PERDIMENTO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. ABUSO DE AUTORIDADE E ILEGALIDADE. NÃO VERIFICADOS. ADOÇÃO DE MEDIDA CAUTELAR DA MULTA SUBSTITUTIVA AO PERDIMENTO. CONCLUSÃO DO PROCESSO DE FISCALIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE ENTREGA DOS BENS.

1. Ação cível de anulação de auto de infração, lavrado no âmbito da fiscalização aduaneira, julgada improcedente. Apelação em que se advoga pela nulidade do ato administrativo por ausência de provas robustas para embasá-lo e por ofensa aos princípios da legalidade, do contraditório, da ampla defesa, do duplo grau de jurisdição na seara administrativa e pela caracterização de abuso de poder.

2. Tratando-se de ato administrativo de natureza discricionária –que comporta margem de avaliação pela Administração sobre o seu conteúdo –, não cabe ao Poder Judiciário, a princípio, substituir a avaliação do administrador público sobre as medidas que julgar adequadas, desde que seu ato esteja devidamente motivado, cumpra a sua finalidade e não ultrapasse os limites impostos pelas leis ou atos regulamentares.

3. No caso em apreço, foi imputada à empresa importadora a prática das infrações de utilização de faturas ideologicamente falsificadas e ocultação do real comprador, em conluio entre os entes importador e exportador, que ensejaram a aplicação da pena de perdimento das mercadorias importadas apreendidas.

4. Desta feita, o termo fiscal do procedimento de fiscalização demonstrou devidamente, e de forma pormenorizada, não só a materialidade da infração de falsidade da documentação necessária ao desembaraço aduaneiro, cometida sob a circunstância qualitativa de conluio entre a empresa importadora e a exportadora, mas também da infração de ocultação do real comprador. A narrativa constante do auto de infração enumerou os fatos coerentemente, em detalhada sucessão lógica dos argumentos, em ordem temporal particularizada e conectada aos acontecimentos que integram a prática dos ilícitos.

5. As circunstâncias apontadas pela fiscalização estão amparadas em provas robustas que dão solidez à conclusão da ocorrência das infrações sob circunstância qualitativa. Desse modo, detalhou-se com zelo a ocorrência das infrações de falsificação de documento necessário ao desembaraço das mercadorias importadas, nos termos do art. 618, inciso VI, do Decreto n° 4.543/02, vigente à época dos fatos, em conluio da empresa importadora com a exportadora conforme previsto nos arts. 68, §2º, e 73 da Lei n° 4.502/64, e de ocultação do real comprador previsto no art. 618, inciso XXII, do citado Decreto n° 4.543/02.

6. A parte autora foi intimada para manifestar-se em diversas etapas do procedimento de fiscalização, conforme à legislação aduaneira aplicável, e não foi formulado pedido para apresentar novas provas ou razões necessárias à elucidação das questões discutidas nos autos, e nem foi apontada eventual dificuldade na reunião de elementos probatórios a serem apresentados perante à autoridade fiscal, tendo sido observado o devido processo legal administrativo.

7. Não foi apontada alguma violação pelas autoridades fiscais às normas relativas às manifestações e notificações dirigidas aos entes investigados. Por conseguinte, não há que se falar em afronta aos princípios do contraditório e da ampla defesa ou na ocorrência de supressão de instância administrativa. Na verdade, o curso da apuração das infrações foi marcado, em diversos momentos, pela falta de esclarecimentos necessários por parte das entidades investigadas e pela ausência de juntada de alguns documentos solicitados pelos agentes da Aduana Brasileira.

8. O ente apelante não se desincumbiu de demonstrar, portanto, ilegalidade, arbitrariedade ou abuso de poder que vicie o procedimento administrativo de fiscalização, razão pela qual não há fundamento plausível que justifique a necessidade de intervenção judicial e a eventual discussão do mérito administrativo. O auto de infração, objeto de análise dessa ação, está devidamente motivado, cumprindo a sua finalidade e foi lavrado dentro dos limites impostos pelas leis e atos regulamentares. Acertada, portanto, está a sentença guerreada que considerou legal a aplicação da pena de perdimento pela autoridade aduaneira, não assistindo razão à parte apelante.

9. A possibilidade da entrega da mercadoria ao importador mediante a adoção das necessárias medidas de cautela fiscal, por sua vez, dá-se antes da conclusão do procedimento de fiscalização, nos termos do art. 68, parágrafo único, da Medida Provisória n° 2.158-35/01, e o requerimento de liberação mediante caução deve ser dirigido à autoridade aduaneira que apreciará a postulação administrativa. No presente caso, já houve a lavratura do auto de infração, sendo que é incabível o pedido de adoção de medida cautelar consistente na aplicação de pena de multa substitutiva ao perdimento.

10. Apelação cível do ente particular não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação cível do ente particular, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
Desembargador Federal