RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5107973-13.2023.4.03.6301
RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Advogado do(a) RECORRENTE: MARINA EMILIA BARUFFI VALENTE - SP109631-A
RECORRIDO: WILSON ROBERTO DE MORAES
Advogados do(a) RECORRIDO: CAIO CESAR BARROS TATTO - SP408972-A, VICTOR GOBBO LAMEIRINHAS - SP361950-A
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5107973-13.2023.4.03.6301 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) RECORRENTE: MARINA EMILIA BARUFFI VALENTE - SP109631-A RECORRIDO: WILSON ROBERTO DE MORAES Advogados do(a) RECORRIDO: CAIO CESAR BARROS TATTO - SP408972-A, VICTOR GOBBO LAMEIRINHAS - SP361950-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5107973-13.2023.4.03.6301 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL Advogado do(a) RECORRENTE: MARINA EMILIA BARUFFI VALENTE - SP109631-A RECORRIDO: WILSON ROBERTO DE MORAES Advogados do(a) RECORRIDO: CAIO CESAR BARROS TATTO - SP408972-A, VICTOR GOBBO LAMEIRINHAS - SP361950-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
E M E N T A
VOTO-EMENTA
CÍVEL. DANO MORAL E MATERIAL. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA CEF. DADO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
1. Pedido de indenização por danos materiais e morais.
2. Conforme consignado na sentença:
“Vistos.
Trata-se de ação que visa ao reconhecimento da responsabilidade civil da CEF por dano experimentado pela parte autora, na condição de cliente da instituição financeira.
No mais, relatório dispensado, nos termos do art. 38 da Lei n. 9.099/95.
Fundamento e decido.
Sem preliminares, passo ao exame do mérito.
A CEF tem natureza jurídica de instituição financeira, âmbito no qual se estabeleceu a relação com a parte autora, de forma que a pretensão deduzida em juízo envolve práticas comerciais e econômicas.
Portanto, a relação entre a CEF e a parte autora, objeto da demanda, é regida pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), conforme jurisprudência já pacificada pela Súmula n. 297 do E. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
“O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.”
O art. 14 do referido diploma legal assim dispõe:
“Art. 14. O fornecedor de serviços responde independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.”
Infere-se, desde logo, que a responsabilidade civil da CEF tem natureza objetiva, não exigindo, portanto, demonstração de dolo ou culpa.
Não obstante, registro que, na esteira da jurisprudência pacífica, os meros dissabores cotidianos, simples aborrecimentos, que não caracterizem sofrimento psicológico ou violação de direitos da personalidade, não implicam responsabilidade por dano moral. Nesse sentido:
“EMEN: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DANO MORAL. VERIFICAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. ENUNCIADO 7 DA SÚMULA DO STJ. DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL. MERO ABORRECIMENTO. PRECEDENTES. ENTENDIMENTO ADOTADO NESTA CORTE. VERBETE 83 DA SÚMULA DO STJ. NÃO PROVIMENTO. 1. O Tribunal de origem, com base nos fatos e provas dos autos, concluiu pela não ocorrência do dano moral. A revisão da conclusão adotada esbarra no óbice do verbete 7 da Súmula desta Corte. 2. O mero descumprimento contratual não acarreta dano moral indenizável. 3. O Tribunal de origem julgou nos moldes da jurisprudência pacífica desta Corte. Incidente, portanto, o enunciado 83 da Súmula do STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”
(AGRESP 201400668890, MARIA ISABEL GALLOTTI, STJ - QUARTA TURMA, DJE DATA:20/05/2014 ..DTPB:.)
“EMEN: RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO TELEFÔNICO. ALTO PARNAÍBA. CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA. MERO DISSABOR. A deficiência do fornecimento de energia elétrica pode justificar a paralisação do serviço de telefonia, em prejuízo da obrigação de continuidade, porém é indispensável a demonstração inequívoca da culpa exclusiva do terceiro, o que não se verifica na espécie. O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido.”
(RESP 200301849581, CESAR ASFOR ROCHA, STJ - QUARTA TURMA, DJ DATA:06/09/2004 PG:00268 RSTJ VOL.:00182 PG:00394 ..DTPB:.)
“EMEN: Dano moral. Devolução de cheque por insuficiência de assinatura. Ausência de envolvimento de terceiro. Cheque de transferência bancária entre a titular das contas. 1. Quando existe mero aborrecimento, como no caso, em que a devolução ocorreu por transferência bancária, sendo a titular das contas a própria autora, ausente qualquer repercussão negativa, assim, a inscrição em cadastro negativo, é incabível a indenização por dano moral. 2. Recurso especial conhecido e provido.”
(RESP 200400600596, CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, STJ - TERCEIRA TURMA, DJ DATA:19/03/2007 PG:00320 ..DTPB:.)
“EMEN: Indenização. Danos materiais e morais. Defeito do veículo. Precedentes da Corte. 1. Já assentou a Corte em diversas oportunidades que em casos como o presente existe solidariedade entre fabricante e fornecedor. 2. Não há dano moral quando os fatos narrados estão no contexto de meros dissabores, sem abalo à honra do autor. 3. Os juros legais devem ser calculados em 0,5% ao mês até a entrada do novo Código Civil e a partir daí de acordo com o respectivo art. 406. 4. Recursos especiais conhecidos e providos, em parte.”
(RESP 200400843138, CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, STJ - TERCEIRA TURMA, DJ DATA:28/08/2006 PG:00281 ..DTPB:.)
Igualmente, no que se refere à inclusão em cadastro de devedores, saliento que a jurisprudência pacífica afasta responsabilidade por dano moral, por ausência de nexo causal, se a negativação é preexistente. Nesse sentido é a Súmula n. 385, do STJ:
"Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento."
Registro, ainda, que a via judicial não é adequada para obrigar a CEF à repactuação ou renegociação de contratos (livremente firmados, dentro das normas legais e regulamentares), mediante a aplicação de critérios unilaterais invocados pela parte autora e segundo sua conveniência subjetiva, se não há demonstração concreta e específica de onerosidade desproporcional e ilegítima, abuso ou qualquer forma de vício do consentimento.
Em relação à inversão do ônus da prova, advirto que o instituto exige aplicação compatível com a razoabilidade, não podendo imputar à CEF o ônus da prova completamente incompatível com as expectativas legítimas à sua atuação normal como instituição financeira, com o princípio da boa-fé e com as normas regulamentares.
Nesse sentido:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MATERIAL E MORAL. EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS (ECT). EXTRAVIO DE CORRESPONDÊNCIA. VALOR NÃO DECLARADO NA POSTAGEM. INEXISTÊNCIA DE PROVA DO CONTEÚDO DA CORRESPONDÊNCIA. 1- Cuida-se de ação de conhecimento processada sob o rito comum ordinário movida em face da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, na qual se objetiva a reparação de dano material e moral decorrentes de extravio de correspondência. 2- O fato de a responsabilidade civil ser objetiva não exime a apelante de comprovar o dano e o nexo de causalidade, elementos essenciais para sua configuração. 3- A facilitação da defesa dos direitos do consumidor, inclusive mediante a inversão do ônus da prova, não pode ser aplicada no presente caso, pois seria incumbir a ECT do encargo de provar que na correspondência extraviada não existiam os documentos alegados pela apelante, posto que seria uma tarefa praticamente impossível, tendo em vista o princípio da inviolabilidade do sigilo de correspondência. 4- A autora não se desincumbiu do ônus de comprovar o fato constitutivo de seu direito, deixando de fazer prova não só de que a correspondência extraviada continha as notas fiscais, mas, principalmente, de que o extravio das referidas notas fiscais lhe acarretou prejuízo, portanto, indevida a indenização por dano moral. 5- Sem a comprovação do conteúdo do envelope extraviado, a indenização devida restringe-se apenas ao dano efetivamente demonstrado, correspondente ao valor da postagem. 6- Apelação da autora a que se nega provimento, para manter íntegra a sentença recorrida.”
(AC 00006048320034036127, DESEMBARGADOR FEDERAL NERY JUNIOR, TRF3 - TERCEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:14/12/2012 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
“AÇÃO INDENIZATÓRIA. CORRENTISTA. CEF. DANOS MATERIAIS E MORAIS NÃO COMPROVADOS. 1. A Lei n.º 8.078/90 prevê a facilitação da defesa do consumidor através da inversão do ônus da prova, adequando-se ao processo moderno, já que o modelo processual tradicional mostrou-se inadequado às sociedades de massa, obstando o acesso a uma ordem jurídica efetiva e justa. Assim, a inversão do ônus da prova, conforme pretendido pelo autor, é direito de facilitação da defesa e não pode ser determinada senão após o oferecimento e valoração da prova, se e quando o julgador estiver em dúvida. Logo, a inversão do ônus da prova não é automática, ela depende de circunstâncias concretas que serão apuradas pelo juiz no contexto da facilitação da defesa do consumidor. O reconhecimento da possibilidade de inversão do ônus probatório, de acordo com o caso concreto, não implica, entretanto, presunção de veracidade. Tal inversão deve ser analisada com cautela, não havendo a possibilidade de impor-se a produção de prova impossível. Significa dizer, portanto, que, pelo fato de ter sido realizada a inversão do ônus da prova, não se deve exigir da CEF a produção de prova em contrário às alegações do autor, independentemente de sua viabilidade. 2. No caso em apreço, não se verifica possibilidade de obrigar a CEF a comprovar que os saques foram efetivamente autorizados pelo demandante. Conforme análise dos documentos juntados, a transferência de valores foi feita entre contas do mesmo titular, no caso, o autor (fl. 107-108 e 120). Embora este alegue que tais movimentações foram realizadas por sua ex-esposa sem seu conhecimento, a conta nº 013-00823367-6 (conta de destino do depósito) consta como sendo conjunta, não havendo nos autos comprovação de encerramento ou modificação dos titulares na época da transferência. Ora, se o autor era titular das duas contas, a de origem e a de destino do depósito, não há como alegar desconhecimento da transação efetuada. 3. No mesmo sentido, pretende o autor comprovar que as contas nas quais tiveram origem os valores creditados na conta nº 007343-6 (fls. 170-174) seriam de titularidade de sua ex-esposa e do filho desta. No entanto, tal prova não aproveitaria ao autor, pois o fato de sua ex-esposa e o filho desta terem realizado depósitos em seu nome não evidenciaria qualquer ato ilícito praticado pela CEF capaz de gerar as indenizações pretendidas na inicial. 4. Assim, não há como dizer, pelas provas trazidas, que as movimentações financeiras contestadas pelo autor tenham sido realizadas de forma fraudulenta, mormente com a autorização ou participação da empresa ré. 5. As provas produzidas nos autos permitem apenas que se conclua que a conta aberta pelo autor acusou excesso no limite, em razão dos débitos efetuados e de transferência de valores para outra conta da qual o autor era também titular. Portanto, entendo que tais elementos não são suficientes para comprovar a existência de conduta ilícita da CEF na prestação do serviço bancário, de forma que não pode esta ser responsabilizada nos termos pretendidos pelo autor. 6. De outro lado, estando o autor em dívida com a CEF, em razão do excesso no limite do cheque especial, esta utilizou os recursos cabíveis para cobrança dos valores, até a quitação do débito, não restando comprovada a ocorrência de qualquer constrangimento ou humilhação experimentados pelo autor, nem a existência de danos materiais a serem ressarcidos pela ré. 7. Apelação improvida.”
(AC 200471000105269, CARLOS EDUARDO THOMPSON FLORES LENZ, TRF4 - TERCEIRA TURMA, D.E. 21/01/2010.)
Ademais, a inversão do ônus da prova não pode autorizar julgamento contrário aos elementos comprovados nos autos ou à versão exposta pela parte autora na inicial.
Esclareço, nesse passo, que a inversão do ônus da prova, eventual revelia da CEF ou ausência de impugnação específica não acarretam a automática procedência do pedido inicial, posto que esses institutos não prevalecem contra os fatos efetivamente comprovados nos autos; por outro lado, alcançam apenas a matéria de fato, não produzindo efeitos sobre a matéria de Direito, a ser aplicado pelo Juiz.
No caso concreto, a parte autora logrou comprovar, com razoabilidade, as alegações da inicial.
Narra que foi vítima de golpe. Expõe que: “No dia 19 de outubro de 2023 por volta das 16h, o requerente recebeu uma ligação que supostamente seria do Banco da Caixa Econômica Federal em que possuí conta, por meio do número (11) 3475-6550 se identificando como uma funcionária da referida instituição bancária, questionando-o se havia tentado realizar alguma transação financeira, sendo negado de pronto pelo autor. A suposta atendente disse que transferiria para o setor responsável e assim foi feito, porém já em conversa com a outra atendente foi dito que ‘houve transações em sua conta que veio a zerar o saldo’. Frisa-se que tal telefone era utilizado pelos funcionários da Instituição Financeira para entrar em contato com os seus clientes. Como já havia encerrado o expediente bancário, o requerente foi até a agência do Broklin no dia subsequente para saber o que havia acontecido. Em conversa com a sua gerente pessoa física NAYARA ROSA DOS SANTOS, a mesma informou que este número de telefone havia sido trocado recentemente e que ao consultar seus dados deparou-se com operações financeiras suspeitas realizadas em sua conta corrente. Entremeio foi entregue ao requerente o extrato bancário detalhado com os PIXs efetuados indevidamente de várias transações que não haviam sido realizados pelo autor para conta de terceiros.”.
A parte autora trouxe os seguintes elementos de prova: a) extrato da conta corrente, com a indicação das movimentações ocorridas em 19.10.2023 (fl. 1 do Id 306054262), b) boletim de ocorrência lavrado em 20.10.2023 (Id 306054267), c) carta de contestação das operações, dirigida à CEF (Id 306054273) e d) decisão da ré no sentido de inexistirem indícios de fraude (Id 306054274).
Deve prevalecer, assim, a versão trazida com a inicial.
Enquanto prestadora do serviço e instituição financeira, cumpre à ré a guarda de documentos, físicos ou virtuais, que comprovem a regularidade das transferências impugnadas.
A CEF, porém, não demonstrou a efetiva regularidade das operações contestadas.
O fato de a CEF permitir a realização de transações sem a devida verificação de quem as titulariza acaba por gerar danos, não podendo a parte autora arcar com as consequências da fraude. Assim, ao possibilitar que as transações sejam feitas por intermédio de canais digitais, as instituições financeiras assumem o risco de arcar com os prejuízos causados aos usuários. Somente a instituição financeira conta com mecanismos para monitorar o uso de tais canais e eleger sistemas seguros.
Em resumo, o deslinde dos casos que envolvem operações indevidas demanda basicamente a comprovação da pessoa que as efetuou. Exigir que a parte autora comprove que não efetuou as transações seria imputar-lhe prova diabólica, precisamente por se tratar de prova de “fato negativo”. Não se trata propriamente de inversão do ônus da prova, mas de distribuição regular de tal ônus, na forma da legislação processual civil.
Não fosse apenas isso, não se pode desconsiderar que as transações realizadas em nome da parte autora destoaram completamente do histórico de gastos dela, de modo que era possível à instituição financeira perceber, imediatamente, a ocorrência da fraude e adotar as medidas de segurança cabíveis para evitá-la. No mesmo dia (19.10.2023), com o intervalo de minutos (entre 17h35 e 18h23), foram efetuadas transferências com valores expressivos (uma delas alcançou o montante de R$ 14.999,99).
Embora seja dever dos consumidores zelar pela guarda e segurança do cartão magnético e das senhas pessoais, incumbe também à instituição financeira adotar mecanismos que obstem operações atípicas em relação ao padrão de consumo do cliente, sob pena de responsabilização do prestador de serviços.
Veja-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIBILIDADE DE DÉBITO. CONSUMIDOR. GOLPE DO MOTOBOY. RESPONSABILIDADE CIVIL. USO DE CARTÃO E SENHA. DEVER DE SEGURANÇA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. 1. Ação declaratória de inexigibilidade de débito. 2. Recurso especial interposto em 16/08/2021. Concluso ao gabinete em 25/04/2022. 3. O propósito recursal consiste em perquirir se existe falha na prestação do serviço bancário quando o correntista é vítima do golpe do motoboy. 4. Ainda que produtos e serviços possam oferecer riscos, estes não podem ser excessivos ou potencializados por falhas na atividade econômica desenvolvida pelo fornecedor. 5. Se as transações contestadas forem feitas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista, passa a ser do consumidor a incumbência de comprovar que a instituição financeira agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao efetivar a entrega de numerário a terceiros. Precedentes. 6. A jurisprudência deste STJ consigna que o fato de as compras terem sido realizadas no lapso existente entre o furto e a comunicação ao banco não afasta a responsabilidade da instituição financeira. Precedentes. 7. Cabe às administradoras, em parceria com o restante da cadeia de fornecedores do serviço (proprietárias das bandeiras, adquirentes e estabelecimentos comerciais), a verificação da idoneidade das compras realizadas com cartões magnéticos, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido roubo ou furto. Precedentes. 8. A vulnerabilidade do sistema bancário, que admite operações totalmente atípicas em relação ao padrão de consumo dos consumidores, viola o dever de segurança que cabe às instituições financeiras e, por conseguinte, incorre em falha da prestação de serviço. 9. Para a ocorrência do evento danoso, isto é, o êxito do estelionato, necessária concorrência de causas: (i) por parte do consumidor, ao fornecer o cartão magnético e a senha pessoal ao estelionatário, bem como (ii) por parte do banco, ao violar o seu dever de segurança por não criar mecanismos que obstem transações bancárias com aparência de ilegalidade por destoarem do perfil de compra do consumidor. 10. Na hipótese, contudo, verifica-se que o consumidor é pessoa idosa, razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto do Idoso e da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, sempre considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável. 11. Recurso especial provido. (REsp n. 1.995.458/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022.)
Comprovada a falha na prestação do serviço por parte da instituição financeira ré, na medida em que não adotou mecanismos para impedir a realização de transações financeiras atípicas e criminosas, é de rigor a procedência do pedido de ressarcimento.
Portanto, emerge desse quadro probatório a responsabilidade civil da CEF, pelos invocados danos materiais e morais, na linha da argumentação acima, o que acarreta a procedência do pedido inicial.
A Corte Especial do STJ definiu a questão no EAREsp 600.663/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Rel. para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, DJe de 30.3.2021, fixando a seguinte tese: "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo”. No caso em análise há documento comprobatório da efetiva cobrança indevida pela CEF (Id 313750888), de modo que a restituição de valores deve ser dobrada.
Em relação aos danos morais, a responsabilidade civil objetiva do fornecedor pelo fato do serviço, de acordo com o CDC (art. 12, caput), pressupõe a presença dos requisitos conduta (ação ou omissão), dano e nexo causal.
A conduta comissiva da CEF consistiu na disponibilização de serviço inadequado, aquém da segurança esperada, a despeito do conhecimento do risco de sua atividade, e esse comportamento constituiu a causa, direta e imediata, além de adequada, do dano psíquico suportado (nesse sentido: ApCiv 0003118-75.2012.4.03.6100, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:13/03/2018; ApCiv 0001202-78.2014.4.03.6118, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:01/03/2018).
Quanto ao dano, consistente no esvaziamento fraudulento de economias do autor, trata-se de dano in re ipsa, que decorre do próprio fato, sem necessidade de comprovação. Nesse sentido: “[...] O esvaziamento da conta da correntista é ato objetivamente capaz de gerar prejuízo moral, pelo sentimento de angústia que causa ao consumidor [...]”, RESP - RECURSO ESPECIAL - 835531 2006.00.94656-5, SIDNEI BENETI, STJ - TERCEIRA TURMA, DJ DATA:27/02/2008).
A propósito, ainda, confiram-se os seguintes julgados:
“Processual civil e civil. Agravo no recurso especial. Ação de reparação por danos morais e materiais. Ocorrência de saques indevidos de numerário depositado em conta poupança. Dano moral. Ocorrência. - A existência de saques indevidos em conta mantida junto à instituição financeira, acarreta dano moral. Precedentes. Agravo não provido.” (grifei) (AGRESP 200900821806, 3ª Turma do STJ, j. em 2.2.10, DJE de 10.2.10, Relatora NANCY ANDRIGHI)
“PROCESSUAL CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. SAQUES INDEVIDOS. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. RECURSO DE APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE. 1. A instituição financeira está sujeita ao regime de proteção ao consumidor, cujo plexo normativo está organizado segundo a Lei Federal 8.078, de 1990. (Súmula n.º 297 do Superior Tribunal de Justiça) 2. Consoante disposto no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor responde o fornecedor pelo defeito na prestação do serviço independentemente da existência de culpa, ou seja, mesmo que o banco-réu não tenha colaborado diretamente para a ocorrência do evento danoso, responderá pelo dano daí advindo, a não ser que comprove a culpa exclusiva do consumidor (Artigo 14, §3º, inciso II do CDC). 3. Este entendimento resultou na edição da Súmula 479 do STJ, segundo a qual "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias". 4. No caso, parte autora nega a autoria dos saques efetuados em sua conta corrente, contudo, a instituição financeira ré, não logrou comprovar que os saques impugnados pela correntista foram por ela efetuados. 5. Cabe lembrar que a parte autora não poderia provar um fato negativo, isto é, de que não sacou os valores da sua conta corrente, razão pela qual em se tratando de relação de consumo, e sendo verossímil a versão apresentada pelo consumidor, a sua defesa deve ser facilitada, com a inversão do ônus da prova, a teor do artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor (Precedente do STJ). 6. No caso, o dano moral se dá in re ipsa, ou seja, o abalo moral é consequência direta do próprio ato lesivo e deriva da gravidade do ato ilícito em si. 7. Desse modo, o saque indevido decorrente de fraude no serviço bancário é situação que por si só demonstra o dano moral, diante da situação aflitiva e constrangedora do cliente, que inesperadamente ficou sem saldo para honrar com os seus eventuais compromissos (precedentes do STJ). 8. Por outro lado, a condenação em dano moral tem um efeito admoestador ou punitivo, e, para além do mero ressarcimento da vítima, visa a desestimular o infrator ao cometimento de novos ilícitos ou práticas deletérias: RESP_200600464423 - STJ - Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS - DJ DATA:26/03/2007 PG:00242 - Decisão: 13/02/2007. 9. O seu escopo define-se pela incidência dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade da sanção em relação à extensão do dano ou do ilícito, evitando-se assim condenações extremas: RESP 664856/PR, desta relatoria, DJ de 02.05.2006; RESP 507574/MG, Relator Ministro Teori Zavascki, DJ de 08.05.2006; RESP 513.576/MG, Relator p/ acórdão Ministro Teori Zavascki, DJ de 06.03.2006; RESP 291.747, Relator Ministro Humberto Gomes de Barros, DJ de 18/03/2002; RESP 300.184/SP, Relator Ministro Franciulli Netto, DJ de 03.11. 10. Desse modo, o valor da condenação imposta à ré deve cumprir esse dúplice escopo, ou seja, ressarcir a vítima do dano moral sofrido e desestimular práticas correlatas; afastando a comissão de condutas análogas; não podendo, pois, tornar baixos os custos e riscos sociais da infração: RESP_200301321707 - STJ - Ministra ELIANA CALMON - DJ DATA:21/06/2004 - PG:00204 RNDJ VOL.:00057 PG:00123 - Decisão: 27/04/2004. 11. Na hipótese, não se mostra razoável e proporcional fixar a indenização em R$10.000,00(dez mil reais), nem tampouco mantê-la em valor ínfimo, que não atenda ao caráter punitivo/educativo. 12. Assim, diante das circunstâncias fáticas que nortearam o presente caso, se mostra razoável fixar a indenização a título de danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), eis que tal importância não proporcionará enriquecimento indevido e exagerado a parte autora e, ainda, é capaz de impor punição a parte ré, mormente na direção de evitar atuação reincidente. 13. Recurso de apelação parcialmente provido. Sentença reforma da em parte.” (AC 00070297220114036119, 5ª T. do TRF da 3ª Região, j. em 23/03/2015, e-DJF3 Judicial 1 de 30/03/2015, Relator: PAULO FONTES)
O arbitramento do quantum indenizatório deve ser justo, a ponto de alcançar seu caráter punitivo, sem arruinar o responsável, e proporcionar satisfação ao correspondente prejuízo moral sofrido pela vítima, sem enriquecê-la ilicitamente.
Nesse contexto, considerando a situação das partes, a demora e a dificuldade na solução da controvérsia, bem como a idade da vítima, vislumbro consentâneo, na esteira da jurisprudência sobre o tema, arbitrar a indenização em R$ 6.000,00 (seis mil reais).
Por fim, consigno que a providência solicitada pelo requerente junto ao Ministério Público deve ser por ele diretamente adotada, não cabendo a este Juízo direcionar as peças dos autos.
Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pedido inicial para:
I – condenar a CEF a restituir à parte autora o valor de R$ 44.999,98 (quarenta e quatro mil, novecentos e noventa e oito reais e noventa e oito centavos), com correção monetária, a partir da data do dano (19.10.2023), e juros de mora a partir da citação, na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal vigente;
II - pagar danos morais à parte autora, fixados, com base nos critérios acima apontados, em R$ 6.000,00 (seis mil reais), acrescidos da taxa SELIC, que já embute os juros e a correção monetária, incidindo a partir da data desta sentença (art. 406, CC, e Súmula 362 do STJ).
Em consequência, julgo extinto o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Defiro a tutela de urgência, nos termos do art. 300 do CPC, para determinar que a CEF, no prazo de 10 (dez) dias, sob pena de fixação de multa, proceda à exclusão do apontamento dos bancos de dados de órgãos proteção ao crédito e de seu sistema interno, caso alterada a situação demonstrada no Id 321188980.
Concedo os benefícios da justiça gratuita em favor do autor (arts. 98 e ss. do CPC).
Sem condenação em custas e honorários nesta Instância.
Sentença registrada eletronicamente. Publique-se. Intimem-se.”
3. Recurso da CEF: afirma que, no dia dos fatos, o saldo positivo na conta do recorrido era de R$ 3.207,70 e não de R$ 24.499,99 pois a diferença de R$19.292,29 se refere ao uso do limite de cheque especial. Portanto os R$19.292,29 que foram objeto das transacoes pertenciam ao banco e não ao recorrido. No mais a r. sentenca menciona a condenacao em danos materiais correspondentes a R$ 44.999,98, acreditando-se que houvera um erro de digitacao pois o valor dos danos materiais e bem inferior. Requer a reforma da sentença, condenando a devolutiva do valor que se encontrava em conta na data dos fatos (saldo positivo) com as devidas correcoes bem como declarar inexigivel qualquer cobranca que ultrapassou o limite da conta alem da exclusao de restricoes junto aos órgãos de protecao ao credito.
4. Outrossim, consta dos autos os documentos: - Extratos apontando as movimentações contestadas efetivadas em 19/10/2023 na conta CEF n. 000596891047-6, ag. 0612, em nome de Wilson Roberto de Moraes: ENVIO TEV de R$ 14.999,99, R$ 7.000,00 e ENVIO PIX de R$ 500,00, vem como, movimentações não efetivadas em 19/10/2023 R$ 11.792,01 e R$ 5.000,00 (ID 31051395) - Boletim de Ocorrência n. NX6768-2/2023, lavrado em 20/10/2023 (ID 31053929). - Contestação Administrativa datada de 20/10/2023, do valor total de R$ 22.499,99, rejeitada (ID 310513930). - Print apontando ligação recebida em 19/10/2023, da Caixa Gg.brooklin (ID 310513933).
5. Posto isso, a jurisprudência do STJ era pacífica no sentido de que a pretendida devolução em dobro (art. 940, CC, e 42, CDC) exigia demonstração concreta de má-fé do credor. Nesse sentido, registro as seguintes ementas:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. CONTRATOS BANCÁRIOS. JUROS REMUNERATÓRIOS. TARIFA DE ABERTURA DE CRÉDITO. MORA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME. SÚMULA Nº 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL INCIDÊNCIA DA MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO NCPC. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Aplicabilidade do NCPC a este recurso ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3 aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.
2. A decisão agravada consignou expressamente que a jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que a devolução em dobro dos valores pagos só é cabível em caso de demonstração de má-fé do credor, o que não foi comprovado nos autos em apreço.
3. Decisão em consonância com a atual jurisprudência desta Corte quanto ao tema da impossibilidade da restituição em dobro, nos termos do art. 42 do CDC, se não for comprovada a má-fé do fornecedor.
4. A impugnação deve indicar precedentes contemporâneos ou supervenientes aos mencionados na decisão combatida, demonstrando-se que outro é o entendimento jurisprudencial desta Corte, o que não se verifica no presente caso, pois os precedentes indicados já se encontram superados.
5. Não sendo a linha argumentativa apresentada capaz de evidenciar a inadequação dos fundamentos invocados pela decisão agravada, o presente agravo não se revela apto a alterar o conteúdo do julgado impugnado, devendo ele ser integralmente mantido em seus próprios termos.
6. Em razão da improcedência do presente recurso, e da anterior advertência em relação à aplicabilidade do NCPC, incide ao caso a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do NCPC, no percentual de 1% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º daquele artigo de lei.
7. Agravo interno não provido, com imposição de multa.
(AgInt nos EDcl no AREsp 599.347/PR, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 10/04/2017, grifei)
AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO (ART. 544 DO CPC/73) - AÇÃO DE CONDENATÓRIA - REPETIÇÃO DE INDÉBITO - DEVOLUÇÃO SIMPLES - AUSÊNCIA DE DANO MORAL - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. INSURGÊNCIA DO CONSUMIDOR.
1. A jurisprudência do STJ firmou-se no sentido de que a devolução em dobro dos valores cobrados somente pode ser determinada na hipótese de pagamento indevido em decorrência de comprovada má-fé, o que não ocorreu no caso, consoante afirmado pelas instâncias ordinárias. Incidência da Súmula 83/STJ.
2. "A cobrança indevida de serviço de telefonia, quando não há inscrição em cadastro de inadimplentes, não gera presunção de dano moral, sendo imprescindível a sua comprovação" (AgRg no REsp N.
1.537.146/RS, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/10/2015, DJe 3/11/2015).
2.1 O Tribunal de origem, após análise das provas dos autos, decidiu pela inexistência de prejuízo de ordem extrapatrimonial, depreendendo-se que a situação não ultrapassou a razoabilidade, o incômodo e o dissabor decorrentes da normalidade cotidiana.
Incidência da Súmula 7/STJ.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no AREsp 605.634/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 17/11/2016, DJe 25/11/2016, grifei)
6. Todavia, ao analisar a questão no TEMA 929, o STJ decidiu que a repetição em dobro prevista no parágrafo único do artigo 42 do CDC é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa fé objetiva, devendo ocorrer independentemente de eventual má fé. Destarte, para que seja cabível a restituição em dobro, são necessários: (i) a existência de uma relação de consumo; (ii) a ocorrência de uma cobrança indevida; (iii) o pagamento efetivo pelo consumidor do valor indevido; e (iv) ausência de engano justificável por parte do fornecedor.
7. Neste passo, no caso em tela, não se verifica hipótese de restituição em dobro. Isso porque a devolução em dobro depende, segundo o Código Civil, de ter havido o ajuizamento de demanda judicial para a cobrança de dívida já paga ou ainda não vencida (artigos 939 e 940, do Código Civil). Já a previsão do Código de Defesa do Consumidor (art. 42) pressupõe que tenha havido cobrança de quantia indevida e pagamento em excesso. Nenhuma dessas hipóteses legais é compatível com o caso em tela, em que houve operações financeiras fraudulentas realizadas por terceiros. Portanto, não há que se falar em restituição em dobro, mas somente do valor simples de R$ 22.499,99. Por outro lado, não procede o argumento da ré para o ressarcimento apenas de R$ 3.207,70, em razão da utilização do limite de cheque especial no valor de R$19.292,29, já que o total efetivamente debitado da conta do autor foi de R$ 22.499,99, referente a: “ENVIO TEV de R$ 14.999,99, R$ 7.000,00 e ENVIO PIX de R$ 500,00 (ID 31051395) ”, sendo, pois, esse o valor a restituir.
8. Ante o exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA CEF para reformar em parte a sentença e fixar o valor da indenização por danos materiais em R$ 22.499,99. Mantenho, no mais, a sentença.
9. Sem honorários advocatícios porque não há recorrente vencido (artigo 55 da Lei 9.099/1995).