APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000466-51.2023.4.03.6120
RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DE SAO PAULO
Advogado do(a) APELANTE: MARTA REGINA SATTO VILELA - SP106318-A
APELADO: MUNICIPIO DE RINCAO, ASSESSORARTE ASSESSORIA DE SERVICOS TECNICOS ESPECIALIZADOS LTDA
Advogado do(a) APELADO: LIVIA CRISTINA CAMPOS LEITE - SP223459-A
Advogado do(a) APELADO: VLADIMIR POLETO - SP322079-A
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000466-51.2023.4.03.6120 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DE SAO PAULO Advogado do(a) APELANTE: MARTA REGINA SATTO VILELA - SP106318-A APELADO: MUNICIPIO DE RINCAO, ASSESSORARTE ASSESSORIA DE SERVICOS TECNICOS ESPECIALIZADOS LTDA Advogado do(a) APELADO: LIVIA CRISTINA CAMPOS LEITE - SP223459-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de Ação Civil Pública pela qual o Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP) busca, em face dos réus Município de Rincão e ASSESSORARTE SERVIÇOS ESPECIALIZADOS (responsável pela organização do concurso), o seguinte: “(...) a) conceder MEDIDA LIMINAR inaudita altera parte, diante do inafastável fumus boni iuris e do periculum in mora ora existentes, para que os efeitos das inscrições sejam suspensos, bem como suspensa a execução do certame, em observância à Lei nº 3.999/61, além da Constituição Federal; b) a fixação de multa pecuniária em caso de descumprimento de eventual medida liminar concedida; c) requer seja concedida a liminar para que os efeitos das inscrições sejam suspensos, bem como suspensa a execução do certame, pelos mesmos fundamentos legais (inobservância à Constituição Federal e à Lei nº 3.999/61); d) a citação dos requeridos nos endereços mencionados para que, em querendo, apresentem defesa no prazo legal sob pena de confissão; e) a intimação do representante do Ministério Público, nos termos do artigo 5º, § 1º, da Lei 7.347/85; f) ao final, após o processamento regular do feito, julgar totalmente procedentes os pedidos, confirmando-se em definitivo a liminar, para determinar que o réu retifique o edital do concurso público para provimento de cargos de cirurgião-dentista com observância da Lei nº 3.999/61.” Após tramitação processual, sobreveio r. sentença julgando a ação improcedente. Apresentado recurso de apelação pelo CROSP, reiterando os termos da exordial. Parecer do Ministério Público Federal pelo não provimento do recurso interposto. É o relatório.
Advogado do(a) APELADO: VLADIMIR POLETO - SP322079-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000466-51.2023.4.03.6120 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE ODONTOLOGIA DE SAO PAULO Advogado do(a) APELANTE: MARTA REGINA SATTO VILELA - SP106318-A APELADO: MUNICIPIO DE RINCAO, ASSESSORARTE ASSESSORIA DE SERVICOS TECNICOS ESPECIALIZADOS LTDA Advogado do(a) APELADO: LIVIA CRISTINA CAMPOS LEITE - SP223459-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A “LEI Nº 3.999, DE 15 DE DEZEMBRO DE 1961. (...) Art. 1º O salário-mínimo dos médicos passa a vigorar nos níveis e da forma estabelecida na presente lei. (...) Art. 4º É salário-mínimo dos médicos a remuneração mínima, permitida por lei, pelos serviços profissionais prestados por médicos, com a relação de emprego, a pessoas físicas ou jurídicas de direito privado. Art. 5º Fica fixado o salário-mínimo dos médicos em quantia igual a três vezes e o dos auxiliares a duas vezes mais o salário-mínimo comum das regiões ou sub-regiões em que exercerem a profissão. (Vide ADPF 325) (...) Art. 8º A duração normal do trabalho, salvo acordo escrito que não fira de modo algum o disposto no artigo 12, será: a) para médicos, no mínimo de duas horas e no máximo de quatro horas diárias; b) para os auxiliares será de quatro horas diárias. (...). Art. 22. As disposições desta lei são extensivas aos cirurgiões dentistas, inclusive aos que trabalham em organizações sindicais. (...)” No ordenamento jurídico brasileiro, é a Lei nº 3.999/61 que estabelece o piso salarial nacional da categoria profissional dos médicos e os limites relativos à carga horária de trabalho (arts. 4º, 5º, 8º e 22). Por sua vez, o art. 22 do precitado diploma estende os efeitos da norma aos cirurgiões dentistas. Deste modo, a categoria profissional dos dentistas/odontólogos tem piso nacional equivalente a três salários-mínimos e jornada máxima de quatro horas diárias. Por sua vez, a Lei nº 11.889/2008 regula a profissão de auxiliar de saúde bucal. No caso dos autos, o Edital em questão de que trata da remuneração e carga horária dos profissionais do Município deve observar o cumprimento das Leis Federais nº 3.999/61 e 11.889/2008 quanto à fixação do piso salarial, do estabelecimento de limite da carga horária e demais condições, na publicação do Edital de concurso nº 01/2024, inclusive por força do princípio da legalidade (CF, art. 37, caput5). Não se trata, portanto, de aumento de salário de servidores imposto pelo Judiciário, mas sim do saneamento de ato administrativo praticado em desacordo à legislação. No mesmo sentido, de aplicação do piso salarial aos servidores municipais, por tratar-se de competência da União (art. 22, XVI, da CF – “XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;”), confira-se: RE 1.340.676 (Publicação DJe nº 216, em 03/11/2021, Min. Ricardo Lewandowski) e RE 1.407.713 (Publicação DJE em 17/11/2022, Min. Luiz Fux). Assim, resta claro que, submetido a regime jurídico próprio ou CLT, não deve ser afastado o limite mínimo previsto em lei federal para remuneração prevista à categoria profissional. Nesse sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. SERVIDOR MUNICIPAL. PISO SALARIAL E JORNADA DE TRABALHO. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DOS PATAMARES ESTABELECIDOS EM LEI FEDERAL. 1. A jurisprudência é firme no sentido de que compete à União legislar privativamente sobre as condições para o exercício profissional (artigo 22, inciso XVI, da Constituição Federal). 2. No provimento de cargos públicos, é obrigatória a observância do piso salarial da categoria profissional e o limite máximo da jornada de trabalho, estabelecidos por Lei Federal. 3. O fato de o trabalho ser prestado por ocupante de cargo público, submetido a regime jurídico próprio, não afasta o direito à percepção de remuneração (limite mínimo) e jornada prevista, por Lei Federal, para a respectiva categoria profissional. (TRF 4ª R.; AG 5023241- 94.2022.4.04.0000; Terceira Turma; Relª Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler; Julg. 23/08/2022; Publ. PJe 24/08/2022). ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO. CARGOS DE FISIOTERAPEUTA E TERAPEUTA OCUPACIONAL. CARÊNCIA DE AÇÃO. AFASTAMENTO EDITAL. JORNADA DE TRABALHO. LEI FEDERAL 8.856/94. RECURSO IMPROVIDO. - Não há carência de ação por perda de objeto, eis que o edital restou suspenso e alterado em momento posterior à intimação para o cumprimento da decisão que deferiu a antecipação dos efeitos da tutela (ID 101989480 - págs. 120/125). Assim, o caso concreto foi de cumprimento de decisão judicial, não de falta de interesse de agir. - A Constituição Federal disciplina que a competência para dispor sobre a organização para o exercício de profissões é de competência privativa da União, cabendo-lhe a edição de normas gerais no âmbito nacional, de observância obrigatória em todas as unidades da federação, inclusive nos Municípios. - Com tal aspecto em vista, resta claro que o apelante deve obedecer aos ditames da Lei nº 8.856/94, que estabeleceu disposições gerais a respeito da jornada de trabalho dos fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais, nos estritos termos do art. 37, caput, da Constituição Federal. - Ademais, destaco que a Lei n.º 8.856/94 determinou que a carga horária dos fisioterapeutas e terapeutas ocupacionais não pode ser superior a trinta horas semanais, não fazendo qualquer distinção entre servidores públicos e profissionais do setor privado, não podendo o Município, em princípio, criar exceções não previstas em lei federal, ou deliberar sobre elas de forma diversa. Precedentes. - Por fim, no tocante à discussão a respeito da nulidade da previsão das atribuições do profissional fisioterapeuta do Edital n° 6/2010 quanto a "proceder ao relaxamento e à aplicação de exercício e jogos com pacientes portadores de problemas psíquicos, treinando-os sistematicamente, para promover a descarga ou a liberação da agressividade e estimular a sociabilidade"; reabrindo-se o prazo das inscrições, observo que não houve insurgência do apelante a respeito da questão, pelo que a matéria não foi devolvida à esta E. Corte. - Preliminar rejeitada. Apelação improvida. (ApCiv 0004566-94.2010.4.03.6119 ..PROCESSO_ANTIGO: ..PROCESSO_ANTIGO_FORMATADO:, ..Rel. Des. Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, 4ª Turma, Intimação via sistema DATA: 20/03/2020). Desta feita, não pode o Município se esquivar de cumprir a determinação imposta por Lei Federal - competente para fixar pisos salariais de categorias profissionais, nos estritos moldes do artigo 22, inciso I, da Constituição da República – sob pena de flagrante ilegalidade, a ser, sim, corrigida pelo Poder Judiciário. Por fim, anoto que a questão é objeto do Tema 1250 de repercussão geral (“Recurso extraordinário em que se discute, à luz do art. 22, XVI, da Constituição Federal, se a administração pública deve observar, na contratação de servidores públicos, o piso salarial de categoria profissional, considerada a competência privativa da União para legislar sobre organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões, no caso aquele estabelecido pela Lei 3.999/1961, que altera o salário-mínimo dos médicos e cirurgiões dentistas.”), que aguarda julgamento, não havendo determinação de suspensão nacional dos processos relativos ao tema. Por conseguinte, é de rigor a reforma da sentença. Posto isso, dou provimento à remessa oficial e ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação. Sem condenação em honorários advocatícios (art. 18, da Lei nº 7.347/1985). É o voto.
Advogado do(a) APELADO: VLADIMIR POLETO - SP322079-A
E M E N T A
CONSTITUCIONAL – ADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – SUSPENSÃO DE CONCURSO – CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL – DEFESA DE INTERESSES DA CATEGORIA – PISO SALARIAL - LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM – EDITAL EM DESACORDO. APELAÇÃO E REMESSA OFICIAL PROVIDAS.
- A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça assevera que os conselhos de fiscalização de profissões regulamentadas têm legitimidade para a propositura de ação civil pública para a defesa do interesse coletivo da corporação, bem como para a prestação de serviços de forma eficiente à coletividade, quando o tema guarde relação com a atividade profissional exercida (v.g. AgInt no REsp 1.610.027/RJ, Rel. Min. Og Fernandes, Segunda Turma, j. 10/12/2019, DJe 13/12/2019).
No ordenamento jurídico brasileiro, é a Lei nº 3.999/61 que estabelece o piso salarial nacional da categoria profissional dos médicos e os limites relativos à carga horária de trabalho (arts. 4º, 5º, 8º e 22). Por sua vez, o art. 22 do precitado diploma estende os efeitos da norma aos cirurgiões dentistas. Deste modo, a categoria profissional dos dentistas/odontólogos tem piso nacional equivalente a três salários-mínimos e jornada máxima de quatro horas diárias. Por sua vez, a Lei nº 11.889/2008 regula a profissão de auxiliar de saúde bucal.
- A Lei nº 3.999/61 estabelece o piso salarial nacional da categoria profissional dos médicos e os limites relativos à carga horária de trabalho (arts. 4º, 5º, 8º e 22)
- O STF já se pronunciou no sentido de aplicação do piso salarial aos servidores municipais, por tratar-se de competência da União (art. 22, XVI, da CF – “XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;”). Precedentes
- Não pode o Município se esquivar de cumprir a determinação imposta por Lei Federal - competente para fixar pisos salariais de categorias profissionais, nos estritos moldes do artigo 22, inciso I, da Constituição da República – sob pena de flagrante ilegalidade, a ser, sim, corrigida pelo Poder Judiciário.
- Apelação e Remessa Oficial providas.