APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004615-07.2024.4.03.6104
RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO
APELANTE: WELLINGTON RICARDO KUDLINSKI
Advogado do(a) APELANTE: GERSON GARCIA CERVANTES - SP146169-A
APELADO: COMANDANTE DA SEGUNDA REGIÃO MILITAR, UNIÃO FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004615-07.2024.4.03.6104 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: WELLINGTON RICARDO KUDLINSKI Advogado do(a) APELANTE: GERSON GARCIA CERVANTES - SP146169-A APELADO: COMANDANTE DA SEGUNDA REGIÃO MILITAR, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de apelação interposta por WELLINGTON RICARDO KUDLINSKI (ID 317827123) contra a r. sentença (ID 317827121) que julgou improcedente pedido formulado em sede de mandado de segurança impetrado em face do COMANDANTE DA SEGUNDA REGIÃO MILITAR visando a obtenção de provimento judicial que determine a suspensão dos efeitos do Decreto nº 11.615/2023, em relação ao Certificado de Registro de Arma de Fogo –CRAF’s, junto à Polícia Federal. As contrarrazões foram apresentadas (ID 317827127). Parecer do Ministério Público Federal pugnando pela suspensão do feito, e na hipótese de prosseguimento pelo desprovimento da apelação. É o relatório.
A apelação sustenta, em apertada síntese, que: a) a licença já foi obtida pelo impetrante com data de dez anos, sendo um direito concreto, subjetivo, que já se incorporou ao patrimônio do seu titular, tendo origem em fato idôneo, na medida em que respeitou os ditames e as exigências da legislação vigente à época de sua concessão; b) o indeferimento administrativo desconsidera o direito adquirido e o ato jurídico perfeito; c) se há publicação de uma nova norma que reduz o prazo de validade para certificados emitidos a atirador desportivo, caçador, colecionador e de registro de arma de fogo, os certificados já emitidos com validade em atosnormativos anteriores, no caso de dez anos, constitui em ato jurídico perfeito e só poderá atingir fatos posteriores a sua publicação
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5004615-07.2024.4.03.6104 RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO APELANTE: WELLINGTON RICARDO KUDLINSKI Advogado do(a) APELANTE: GERSON GARCIA CERVANTES - SP146169-A APELADO: COMANDANTE DA SEGUNDA REGIÃO MILITAR, UNIÃO FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O No caso debatido nestes autos, a parte impetrante insurge-se contra determinação contida tanto no Decreto nº 11.615/2023 (art. 24, I) quanto na Portaria nº 166-COLOG/2023 (art. 16, parágrafo único), que reduziu o prazo de validade dos certificados do registro para colecionador, atirador desportivo e caçador. O certificado de registro (CR) e o Certificado de Registro de Arma de Fogo (CRAF) estão definidos no Decreto n. 11.615/2023, que regulamenta a Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento): “Art. 2º. Para fins do disposto neste Decreto, considera-se: (...) XXI - Certificado de Registro – CR - documento hábil que autoriza as pessoas físicas ou jurídicas a utilização industrial, armazenagem, comércio, exportação, importação, transporte, manutenção, recuperação e manuseio de produtos controlados pelo Comando do Exército; (...) XXIV - Certificado de Registro de Arma de Fogo - CRAF – documento comprobatório do ato administrativo de cadastro de arma de fogo, com onúmero do referido cadastro, vinculado à identificação do proprietário e à finalidade legal que motivou a aquisição da arma de fogo, concedido pela Polícia Federal ou pelo Comando do Exército, conforme o caso;” Anteriormente, o Decreto nº 9.846/2019, em seu artigo 1°, §2°, determinava que os certificados de Registro de Colecionador, Atirador e Caçador expedidos pelo Comando do Exército possuíam validade de 10 anos, a contar da data da concessão (negritos nossos): “Art. 12. Para fins de aquisição de arma de fogo de uso permitido e de emissão do Certificado de Registro de Arma de Fogo, o interessado deverá: (...) § 10. O certificado de registro concedido às pessoas jurídicas que comercializem ou produzam armas de fogo, munições e acessórios e aos clubes e às escolas de tiro, expedido pelo comando do Exército, terá validade de dez anos.” Em 2023, no entanto, o Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2023), passou a estabelecer o seguinte: “Art. 5º O Certificado de Registro de Arma de Fogo, com validade em todo o território nacional, autoriza o seu proprietário a manter a arma de fogo exclusivamente no interior de sua residência ou domicílio, ou dependência desses, ou, ainda, no seu local de trabalho, desde que seja ele o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa. § 1º O certificado de registro de arma de fogo será expedido pela Polícia Federal e será precedido de autorização do Sinarm. § 2º Os requisitos de que tratam os incisos I, II e III do art. 4o deverão ser comprovados periodicamente,em período não inferior a 3 (três) anos, na conformidade do estabelecido no regulamento desta Lei, para a renovação do Certificado de Registro de Arma de Fogo. § 3º Os registros de propriedade, expedidos pelos órgãos estaduais, realizados até a data da publicação desta Lei, deverão ser renovados mediante o pertinente registro federal no prazo máximo de 3 (três) anos.” (g.n.) Com a edição do Decreto n° 11.615/23, novas regras foram impostas para a Concessão e Renovação do Certificado de Registro de Colecionador, Atirador e Caçador, dentre elas a que se refere sobre o prazo de validade da autorização, in verbis: “Art. 24. O CRAF terá o seguinte prazo de validade: I - três anos para CRAF concedido a colecionador, atirador desportivo ou caçador excepcional; (...) § 2º Ressalvado o disposto no inciso I do caput, a validade do CRAF das armas cadastradas e exclusivamente vinculadas ao Sigma será regulamentada pelo Comando do Exército, observado o prazo mínimo de três anos para a sua renovação prevista no § 2º do art. 5º da Lei nº10.826, de 2003.” (g.n.) Referido decreto trouxe, ainda, uma regra de transição: “Art. 80. O prazo de validade estabelecido nos incisos II e III do caput do art. 24 aplica-se a todos os CRAF vigentes se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido menos da metade do tempo estabelecido no ato da concessão ou da renovação. Parágrafo único. Na hipótese de CRAF anteriormente concedido para colecionador, atirador desportivo ou caçador excepcional, incidirá o prazo de validade estabelecido no inciso I do caput do art. 24, contado da data de publicação deste Decreto.” Em ato subsequente, o Comando Logístico do Exército Brasileiro editou a Portaria nº 166, de dezembro de 2023, pormenorizando os procedimentos estabelecidos no citado Decreto Presidencial e estabelecendo regras de transição de regime: “Art. 16. O prazo de validade do registro para colecionador, atirador desportivo e caçador excepcional é de três anos, contados a partir dadata de sua concessão ou de sua última revalidação. Parágrafo único. Para os CR concedidos ou revalidados em data anterior à vigência do Decreto nº 11.615/2023, incidirá o prazo de validade estabelecido no caput, contado da data de publicação do Decreto. (...) Art. 92. O CRAF das armas dos acervos de coleção, tiro desportivo e caça excepcional terá validade de três anos (inciso I do art. 24 do Decreto nº 11.615/2023). Parágrafo único. Na hipótese de CRAF anteriormente concedido para colecionador, atirador desportivo ou caçador excepcional, incidirá o prazo de validade estabelecido no caput, contado da data de publicação do Decreto nº 11.615/2023 (parágrafo único do art. 80 do Decreto nº 11.615/2023)” (g.n.) Portanto, o prazo de validade trienal foi fixado tanto para novos certificados emitidos, renovação de certificados vincendos e para certificados válidos, sendo que nesta última hipótese o prazo de 3 anos é contado a partir de 21 de julho de 2023 (data da publicação do Decreto nº 11.615/2023) Assim sendo, a previsão em sede regulamentar do prazo de validade de 03 (três) anos do Certificado de Registro de Arma de Fogo – CARF encontra respaldo na legislação de origem dos atos regulamentares ora impugnados e, da mesma forma, o direito/dever de renovação deste. Não se sustenta a alegação de que a expedição dos certificados de registro – CR de que se trata configura ato jurídico perfeito, vez que referidos certificados de registro – CR consubstanciam mera autorização ao exercício de atividades com produtos controlados pelo Exército, ato administrativo, portanto, de natureza precária, expedido no âmbito do poder discricionário da administração e, assim, sujeitos à apreciação de conveniência e oportunidade, não havendo falar em direito subjetivo do impetrante à continuidade das autorizações pelo prazo anterior, podendo o ato ser revisado a qualquer tempo em nome do interesse público que se sobrepõe ao interesse particular. Ressalta-se que a Administração Pública pode revogar seus próprios atos, por motivo de oportunidade e conveniência, consoante o entendimento firmado na Súmula 473/STF, in verbis: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”. Nesse sentido, a consolidada jurisprudência: ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ESTATUTO DO DESARMAMENTO. LEI N. 10.826/2003, ARMEIRO. NECESSIDADE DE PREENCHIMENTO DO REQUISITO DA "EFETIVA NECESSIDADE". PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. SENTENÇA MANTIDA. Por conseguinte, é de rigor a manutenção da sentença. Posto isso, NEGO PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação acima. É como voto.
- O apelante, armeiro, apresentou o requerimento de autorização de porte de arma de fogo alegando a necessidade diante do manuseio e acondicionamento de armas.
- O Estatuto do Desarmamento, objetiva, como o próprio nome sugere, aumentar o controle estatal sobre as aquisições, registro, posse, porte e o comércio de armas de fogo e munição em território nacional, de forma que a sua interpretação deve ser restritiva e consentânea com a mens legis, que é a diminuição da circulação de armas de fogo em território nacional. Ausente o risco inerente à atividade de armeiro, exige-se do requerente a demonstração de perigo concreto e das circunstâncias que indicam que se encontra submetido a condições de insegurança mais severas e diversas das que afetam os demais profissionais cotidianamente.
- A aplicação do princípio “tempus regit actum” é incompatível com a natureza do ato que permite o porte de arma de fogo: trata-se de uma autorização e,como tal, configura ato discricionário sujeito ao juízo favorável de conveniência e oportunidade da administração pública. Não se trata de licença, e portanto, ato vinculado, como quer fazer crer o impetrante, notadamente por se tratar do porte amplo. Destarte, ainda que a autoridade policial conceda uma autorização, ela pode revogá-la a qualquer tempo, porquanto não existe direito subjetivo ao porte de arma. É o que dispõe,inclusive, o artigo 17 do Decreto nº 9.847/2019, atualmente em vigor.
- Ante a natureza discricionária da autorização para porte de armas de fogo, o controle judicial não pode imiscuir-se em seu mérito.
- Apelação desprovida.
(TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec -APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA – 5003474-72.2018.4.03.6100, Rel. Desembargadora Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 01/08/2022)
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5004615-07.2024.4.03.6104 |
Requerente: | WELLINGTON RICARDO KUDLINSKI |
Requerido: | COMANDANTE DA SEGUNDA REGIÃO MILITAR e outros |
Ementa:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CERTIFICADO DE REGISTRO ARMA DE FOGO. VALIDADE. DECRETO 11.615/2023. PODER DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. SENTENÇA MANTIDA.
- Insurgência contra determinação contida tanto no Decreto nº 11.615/2023 (art. 24, I) quanto na Portaria nº 166-COLOG/2023 (art. 16, parágrafo único), que reduziu o prazo de validade dos certificados do registro para colecionador, atirador desportivo e caçador.
- O certificado de registro (CR) e o Certificado de Registro de Arma de Fogo (CRAF) estão definidos no Decreto n. 11.615/2023, que regulamenta a Lei nº 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento).
- Anteriormente, o Decreto nº 9.846/2019, em seu artigo 1°, §2°, determinava que os certificados de Registro de Colecionador, Atirador e Caçador expedidos pelo Comando do Exército possuíam validade de 10 anos, a contar da data da concessão.
- Com a edição do Decreto n° 11.615/23, novas regras foram impostas para a Concessão e Renovação do Certificado de Registro de Colecionador, Atirador e Caçador, dentre elas a que se refere sobre o prazo de validade da autorização, in verbis: “Art. 24. O CRAF terá o seguinte prazo de validade: I - três anos para CRAF concedido a colecionador, atirador desportivo ou caçador excepcional;
- O referido decreto trouxe, ainda, uma regra de transição: “Art. 80. O prazo de validade estabelecido nos incisos II e III do caput do art. 24 aplica-se a todos os CRAF vigentes se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido menos da metade do tempo estabelecido no ato da concessão ou da renovação. Parágrafo único. Na hipótese de CRAF anteriormente concedido para colecionador, atirador desportivo ou caçador excepcional, incidirá o prazo de validade estabelecido no inciso I do caput do art. 24, contado da data de publicação deste Decreto.” Em ato subsequente, o Comando Logístico do Exército Brasileiro editou a Portaria nº 166, de dezembro de 2023, pormenorizando os procedimentos estabelecidos no citado Decreto Presidencial e estabelecendo regras de transição de regime:
“Art. 16. O prazo de validade do registro para colecionador, atirador desportivo e caçador excepcional é de três anos, contados a partir da data de sua concessão ou de sua última revalidação.
- Não se sustenta a alegação de que a expedição dos certificados de registro – CR de que se trata configura ato jurídico perfeito, vez que referidos certificados de registro – CR consubstanciam mera autorização ao exercício de atividades com produtos controlados pelo Exército, ato administrativo, portanto, de natureza precária, expedido no âmbito do poder discricionário da administração e, assim, sujeitos à apreciação de conveniência e oportunidade, não havendo falar em direito subjetivo do impetrante à continuidade das autorizações pelo prazo anterior, podendo o ato ser revisado a qualquer tempo em nome do interesse público que se sobrepõe ao interesse particular.
- A Administração Pública pode revogar seus próprios atos, por motivo de oportunidade e conveniência, consoante o entendimento firmado na Súmula 473/STF, in verbis: “A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
- Recurso Improvido.
- Jurisprudência. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApelRemNec -APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA – 5003474-72.2018.4.03.6100, Rel. Desembargadora Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 01/08/2022)