APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002115-92.2020.4.03.6108
RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO
APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
APELADO: CONDOMINIO RESIDENCIAL INDEPENDENCIA
Advogado do(a) APELADO: FREDERICO TOCANTINS RODRIGUES IVO - SP320435-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002115-92.2020.4.03.6108 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: CONDOMINIO RESIDENCIAL INDEPENDENCIA Advogado do(a) APELADO: FREDERICO TOCANTINS RODRIGUES IVO - SP320435-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): Cuida-se de apelação interposta pela Caixa Econômica Federal (CEF) contra sentença que julgou improcedentes embargos à execução para cobrança de taxas condominiais, ajuizada pelo Condomínio Residencial Independência. Alega a apelante, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva para a causa. No mérito, defende a responsabilidade do arrendatário pelas despesas condominiais. Pugna pela reforma da sentença. Com contrarrazões, subiram os autos a este E. Tribunal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5002115-92.2020.4.03.6108 RELATOR: Gab. 06 - DES. FED. CARLOS FRANCISCO APELANTE: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL APELADO: CONDOMINIO RESIDENCIAL INDEPENDENCIA Advogado do(a) APELADO: FREDERICO TOCANTINS RODRIGUES IVO - SP320435-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO (Relator): No caso dos autos, o CONDOMINIO RESIDENCIAL INDEPENDENCIA ajuizou, em face da CEF, ação de execução de título extrajudicial, tendo por objeto a cobrança de taxas condominiais do apartamento nº 34-I, do mencionado Condomínio. A CEF apresentou embargos à execução, alegando sua ilegitimidade passiva, uma vez que o imóvel foi vendido a Silas Camargo e Maria Neide Garcia Camargo, sendo estes os responsáveis pelo pagamento da dívida. Juntou contrato de arrendamento residencial com opção de compra no âmbito do PAR (ID 311458986), referente ao apartamento nº 34-I. A sentença, contudo, julgou improcedentes os embargos à execução. Verifica-se, da matrícula do imóvel (ID 27651395 dos autos de origem), que o imóvel pertence ao Fundo de Arrendamento Residencial – FAR. Portanto, não se trata de imóvel ofertado em alienação fiduciária em garantia, mas sim de imóvel de propriedade do FAR. O Programa de Arrendamento Residencial – PAR foi instituído pela Lei nº 10.188/2001, com o objetivo de atender à necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra, cabendo à CEF a operacionalização dessa política pública (art. 1º, §1º), bem como a gestão do Fundo de Arrendamento Residencial (art. 2º, §8º). E o art. 4º dessa Lei nº 10.188/2001, indica as seguintes competências da CEF: Art. 4o Compete à CEF: I - criar o fundo financeiro a que se refere o art. 2º; II - alocar os recursos previstos no art. 3o, inciso II, responsabilizando-se pelo retorno dos recursos ao FGTS, na forma do § 1o do art. 9o da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990; III - expedir os atos necessários à operacionalização do Programa; IV - definir os critérios técnicos a serem observados na aquisição, alienação e no arrendamento com opção de compra dos imóveis destinados ao Programa; (Redação dada pela Lei nº 11.474, de 2007) V - assegurar que os resultados das aplicações sejam revertidos para o fundo e que as operações de aquisição de imóveis sujeitar-se-ão aos critérios técnicos definidos para o Programa; VI - representar o arrendador ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente; VII - promover, em nome do arrendador, o registro dos imóveis adquiridos. VIII - observar as restrições a pessoas jurídicas e físicas, no que se refere a impedimentos à atuação em programas habitacionais, subsidiando a atualização dos cadastros existentes, inclusive os do Sistema Financeiro da Habitação - SFH. (Redação dada pela Lei nº 11.474, de 2007) Parágrafo único. As operações de aquisição, construção, recuperação, arrendamento e venda de imóveis obedecerão aos critérios estabelecidos pela CEF, respeitados os princípios da legalidade, finalidade, razoabilidade, moralidade administrativa, interesse público e eficiência, ficando dispensada da observância das disposições específicas da lei geral de licitação. As taxas condominiais constituem obrigação propter rem, ou seja, acompanham o bem imóvel, sendo seu cumprimento de responsabilidade do proprietário do bem. Portanto, a CEF é parte legítima para figurar na demanda e responder pelo pagamento das taxas condominiais, na qualidade de gestora do FAR e representante do arrendador. Assim vem decidindo o C. STJ, como se pode verificar das seguintes decisões monocráticas, cujos trechos ora colaciono, verbis: “Com efeito, o Tribunal de origem considerou a CEF como parte legítima para responder pelos débitos condominiais, na presente hipótese, por ser a representante do FAR – Fundo de Arrendamento Residencial, que é o proprietário dos imóveis arrendados, asseverando, ainda, que no Programa de Arrendamento Residencial – PAR, regido pela Lei 10.188/2001, os arrendatários são mantidos como meros possuidores diretos dos imóveis, cuja propriedade permanecerá com o arrendador (FAR, representado pela CEF), até que sejam cumpridas todas as obrigações contratuais e se verifique a opção pela compra do imóvel ao final do prazo. Confira-se (e-STJ, fl. 203-204): No mais, o Programa de Arrendamento Residencial - PAR foi instituído pela Lei nº 10.188/2001, tendo o Ministério das Cidades como gestor, a CEF como executora e o Fundo de Arrendamento Residencial - FAR como financiador e arrendador. Compete à CEF operacionalizar o programa, utilizando-se do patrimônio imobiliário e dos recursos financeiros do FAR, expedir os atos necessários à administração do PAR, representar o arrendador ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente e definir critérios técnicos a serem observados na aquisição, alienação e no arrendamento dos imóveis (artigo 1º, § 1º, artigo 2º, caput, e artigo 4º, todos da Lei nº 10.188/2001). Nesse programa, os arrendatários são mantidos como meros possuidores diretos dos imóveis, cuja propriedade permanecerá com o arrendador (FAR, representado pela CEF), até que sejam cumpridas todas as obrigações contratuais e se verifique a opção pela compra do imóvel ao final do prazo. Assim, há duas relações jurídicas distintas no âmbito do programa, a mantida entre a CEF (representando o FAR, proprietário) e o condomínio, de natureza estatutária, fundada na convenção condominial, e aquela mantida entre a CEF (representando o FAR, arrendador) e os arrendatários, de natureza legal e contratual, fundada tanto no contrato de arrendamento residencial quanto, para o caso das obrigações de pagar as cotas, no artigo 27, § 8º, da Lei 9514. Pagar as cotas condominiais constitui obrigação propter rem e é ao proprietário do bem (condômino) que a lei atribui o dever primário e imediato de adimplir essas despesas (artigo 1.336, inciso I, do CC). Dessa forma, quem deve a taxa condominial ao condomínio edilício é a CEF, que, na relação contratual de arrendamento, pactuou com os arrendatários que caberia a eles o pagamento, sob pena de rescisão. E o artigo 27, § 8º, da Lei 9514 apenas confirma essa obrigação, mas não impede que o Condomínio cobre do arrendador. Relações obrigacionais entre o condômino e terceiros não são oponíveis ao condomínio. O Condomínio poderia, por força da lei, agir contra arrendatário ou arrendador. Quis acionar a CEF, e ela que resolva seus problemas com os devedores fiduciantes, caso a caso, se estiverem efetivamente ocupando o imóvel. Pode tudo deles cobrar, mas não opor essa relação contra a coletividade dos condôminos, representada pelo Condomínio Valdariosa III. Ao cobrar a cota condominial dos arrendatários, a CEF não o faz em nome do condomínio, mas em nome próprio, na condição de representante do FAR (proprietário dos imóveis) e em virtude de uma obrigação contratual, livremente pactuada entre as partes. Portanto, a CEF não apenas tem legitimidade para efetuar a cobrança da cota condominial dos arrendatários, como o faz rotineiramente nas ações possessórias que propõe, como também, na condição de condômino, tem a obrigação de repassar o valor ao condomínio. Dessa forma, na ausência de pagamento das cotas condominiais pelos arrendatários, e nem sequer comprovada a posse destes sobre as unidades, ou mesmo a comunicação de tais negócios inter partes ao condomínio, a CEF deve sim arcar diretamente com os valores devidos (...) Conforme demonstram as certidões do registro de imóveis (fls. 09/64), o FAR, representado pela CEF, é o proprietário dos imóveis e, de tal sorte, tem a obrigação legal de arcar com sua cota nos débitos condominiais. A convenção do condomínio foi apresentada tão somente nos autos da execução, pois a CEF deixou de instruir os embargos com as peças essenciais à compreensão da controvérsia, e obriga o condômino ao pagamento das suas parcelas. A responsabilidade de cada ocupante das unidades, repise-se, é matéria a ser discutida entre eles a CEF, e não é oponível ao Condomínio”. (STJ, AgInt no AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1843106 – RJ, Rel. Min. MARCO BUZZI, 30.06.2021). “Segundo preceitua o art. 12 da Lei n. 4.591/64, 'cada condômino concorrerá nas despesas do condomínio, recolhendo, nos prazos previstos na Convenção, a quota-parte que lhe couber em rateio.' No mesmo sentido, 'são deveres do condômino [...] contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção.' A obrigação de contribuir com o custeio das despesas condominiais é, a princípio, do proprietário de cada unidade, pelo só fato de ostentar tal condição, porquanto 'a taxa de condomínio possui natureza de obrigação propter rem, ou seja, o proprietário do bem responde pela dívida em razão do domínio, e esta responsabilidade alcança, inclusive, as parcelas anteriores à aquisição (Cf. AC 1997.38.00.060397-8/MG). Com efeito, a jurisprudência de nossos tribunais é uníssona no sentido de que se tratam as dívidas condominiais de espécies de obrigações propter rem, as quais acompanham o imóvel, sendo devidas pelo proprietário, ainda que referente s a períodos anteriores à transferência do domínio a este, conforme já destacado acima.' No caso concreto, ainda que os imóveis que se encontram em débito para com o autor em relação às respectivas cotas condominiais tenham sido alienados a terceiros, não há como afastar a responsabilidade da CEF pelo respectivo pagamento. A uma, porque os imóveis em questão encontram-se registrados, perante o respectivo Ofício do Registro de Imóveis, em nome do Fundo de Arrendamento Residencial - FAR, cuja gestão foi legalmente atribuída à CEF (Lei n. 10.188/01, art. 2º, §8º), a quem compete, ainda, 'representar o arrendador ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente' (idem, art. 4º, inc. VI). A duas, porque a CEF sequer levou os contratos de transferência a registro, obrigação que lhe competia, nos termos da cláusula trigésima dos respectivos instrumentos. E, a três, porque tais imóveis teriam sido abandonados por seus ocupantes, encontrando-se desocupados nos dias atuais. Portanto, a responsabilidade do proprietário pela satisfação das cotas condominiais vencidas e vincendas, no caso concreto, é principal, e não subsidiária, como quer fazer crer a parte ré, o que leva à procedência da pretensão formulada na petição inicial, nesse ponto (fls. 1.464-1.466 e-STJ)". (STJ, RECURSO ESPECIAL Nº 1.567.938 – SC, Rel. Min. RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, 05.05.2020). Confira-se, ainda, o seguinte julgado desta E. Corte: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO. ERRO MATERIAL. OBRIGAÇÕES PROPTER REM. LEGITIMIDADE DA CEF ENQUANTO REPRESENTANTE DO FAR. EMBARGOS ACOLHIDOS EM PARTE COM EFEITOS INFRINGENTES. PROVIMENTO DO APELO. NULIDADE DA SENTENÇA. 1.Os presentes embargos de declaração foram opostos na vigência do novo Código de Processo Civil de 2015, que dispõe, em seu artigo 1.022, sobre as hipóteses de cabimento dos aclaratórios: a existência, na decisão judicial, de obscuridade, contradição, omissão ou ainda erro material a serem sanados pelo Juízo. 2. No presente caso, contudo, não se mostra possível identificar a efetiva aquisição dos imóveis pelos supostos arrendatários e atuais ocupantes dos imóveis, de modo a lhes imputar a responsabilidade pelo pagamento dos encargos condominiais. 3. Nos termos da Lei nº 10.188/2001, os arrendatários das unidades habitacionais não são proprietários das unidades, conforme estatui o próprio contrato de arrendamento residencial com opção de compra, segundo a qual a própria arrendadora, no caso a CEF, é a possuidora e a proprietária exclusiva em nome do Fundo de Arrendamento Residencial, de modo a viabilizar a operacionalização do programa. 4. A CEF, na condição de representante do FAR, é responsável solidária pelo adimplemento das cotas condominiais ora cobradas. 5. Precedentes. 6. Possuindo a CEF, enquanto representante do FAR, por força do artigo 8º, art. 2º, inciso VI, do artigo 4º da Lei 10.188/2001, a propriedade resolúvel e a posse indireta do bem sobre o qual recai a cobrança de despesas condominiais, a Instituição Financeira apresenta legitimidade para figurar no polo passivo da ação, sendo responsável pelo pagamento por todo período. 7. Ademais, sendo a obrigação propter rem, nenhuns dos agentes responsáveis pelo pagamento (sobretudo o proprietário do bem), poderá se furtar a essa obrigação, sem prejuízo de reaver de quem de direito (obrigação contratual regressiva), valores despendidos em prol do condomínio-administrador do bem. 8. A disposição legal de "desobrigação" aparente do agente financeiro pelas despesas condominiais tem efeito exclusivo entre os contratantes, não atingindo direito de terceiros, em especial, como no caso concreto, o do Condomínio, pelas despesas com manutenção e preservação do imóvel. 9. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos em parte, com atribuição de efeitos modificativos, para dar provimento ao recurso e reconhecer a legitimidade passiva ad causam da Caixa Econômica Federal. Determinado, por conseguinte, o retorno dos autos à instância de origem para o devido processamento do feito. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003328-71.2018.4.03.6119, Rel. Desembargador Federal WILSON ZAUHY FILHO, julgado em 30/08/2021, DJEN DATA: 08/09/2021). Acrescente-se que, diante da ausência de responsabilidade dos arrendatários, não há que se falar em sua denunciação à lide. Pelas razões expostas, NEGO PROVIMENTO à apelação da CEF. Considerando o insucesso do recurso interposto, com a manutenção da decisão recorrida, aplica-se a regra da sucumbência recursal estabelecida no art. 85, § 11, do CPC, pelo que majoro em 10% os honorários advocatícios fixados na sentença, atualizados até a data de seu efetivo pagamento, nos termos das Resolução nº 267/2013 do CJF. É o voto.
E M E N T A
APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. TAXAS CONDOMINIAIS. FUNDO DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL. LEGITIMIDADE DA CEF.
- A execução de título extrajudicial tem por objeto a cobrança de cotas condominiais de imóvel cujo proprietário é o Fundo de Arrendamento Residencial – FAR.
- O Programa de Arrendamento Residencial – PAR foi instituído pela Lei nº 10.188/2001, com o objetivo de atender à necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra, cabendo à CEF a operacionalização dessa política pública (art. 1º, §1º), bem como a gestão do Fundo de Arrendamento Residencial (art. 2º, §8º).
- As taxas condominiais constituem obrigação propter rem, ou seja, acompanham o bem imóvel, sendo seu cumprimento de responsabilidade do proprietário do bem.
- A CEF é parte legítima para figurar na demanda e responder pelo pagamento das taxas condominiais, na qualidade de gestora do FAR e representante do arrendador.
- Apelação não provida.