AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5026969-05.2024.4.03.0000
RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. AUDREY GASPARINI
AGRAVANTE: UNIÃO FEDERAL
AGRAVADO: NEYDE DA MOTTA SANTOS SIQUEIRA
Advogado do(a) AGRAVADO: RONALDO FERREIRA SANTOS - SP357450
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5026969-05.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. AUDREY GASPARINI AGRAVANTE: UNIÃO FEDERAL AGRAVADO: NEYDE DA MOTTA SANTOS SIQUEIRA Advogado do(a) AGRAVADO: RONALDO FERREIRA SANTOS - SP357450 OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto por UNIÃO FEDERAL, em face da decisão do Juízo da 4ª Vara Federal de Santos/SP, que deferiu a antecipação da tutela para reinclusão da pensionista de militar como beneficiária da assistência médico-hospitalar custeada pelo FUSEX. Alega a parte agravante que a pensionista não faz jus ao benefício, baseando-se na ausência de dependência econômica em relação ao militar falecido, com fundamento na Lei nº 6.880/1980 e normas regulamentares vigentes. Em juízo sumário de cognição (ID 307344969) foi indeferido o pedido de concessão de efeito suspensivo. Não houve resposta ao recurso. É o relatório.
AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 5026969-05.2024.4.03.0000 RELATOR: Gab. 05 - DES. FED. AUDREY GASPARINI AGRAVANTE: UNIÃO FEDERAL AGRAVADO: NEYDE DA MOTTA SANTOS SIQUEIRA Advogado do(a) AGRAVADO: RONALDO FERREIRA SANTOS - SP357450 OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Sob os seguintes fundamentos, decidiu o juiz de primeiro grau: Cuida-se de ação de procedimento comum ajuizada por NEYDE DA MOTTA SANTOS SIQUEIRA, originalmente em face do FUSEX – Fundo de Saúde do Exército, visando obter provimento jurisdicional que determine, inclusive a título de tutela de urgência, o imediato restabelecimento de seu acesso à assistência médico-hospitalar do Exército Brasileiro - FUSEx, vez que é considerada dependente pela legislação vigente à época do óbito do instituidor. Segundo narrado na peça inicial, a autora, atualmente com 64 anos de idade, sempre foi beneficiária da assistência médico-hospitalar (AMH), como dependente de seu pai, o Tenente do Exército Brasileiro, Sr. Benedito da Motta Siqueira, falecido em 2010. Aduziu que, em fevereiro de 2022, após o falecimento de sua genitora, foi até o quartel do Exército em São Vicente para se habilitar como beneficiária da pensão, quando restou surpreendida pelo recolhimento de sua carteira do FUSEX e pelo aviso do cancelamento de seu acesso à assistência médico-hospitalar, sem qualquer justificativa plausível. Relatou que, apenas meses depois, quando precisou realizar um exame médico, teve força emocional suficiente para tentar resolver a situação administrativamente, mas foi então informada que, devido a uma alteração legislativa ocorrida em 2019, perdera a condição de dependente de seu pai e, consequentemente, a assistência médico-hospitalar vinculada ao FUSEx. Fundamentou seu pedido na Lei nº 6.880/ 80 e no artigo 23 da Lei nº 13.954/2019, tendo argumentado ainda que o cancelamento do plano de saúde sem motivo justificado fere diretamente os princípios da continuidade e da segurança jurídica e viola os direitos fundamentais de acesso à saúde e assistência. Afirmou que, em conjunto com a deterioração da saúde da autora, a privação da assistência médica essencial pode resultar em danos irreversíveis, comprometendo não só sua saúde física, mas também seu bem-estar emocional. Com a inicial, juntou documentos. Emendou a petição inicial para requerer a alteração do polo passivo da demanda, com a substituição do FUSEx pela UNIÃO FEDERAL (petição id. 327912781). Esclareceu ainda que: “foi usuária do Fundo de Saúde do Exército (FUSEx), desde o seu nascimento em 08/07/1959, como dependente do seu pai, Militar do Exército Brasileiro (Identidade Militar Anexa), até seu casamento em 09/12/1982. Durante o casamento a Autora permaneceu usando o fundo de saúde como dependente de seu ex esposo, que também era Militar do Exército Brasileiro. Quando em 1995, conforme (Certidão de Casamento/Divórcio anexa), a Autora se divorciou, o seu pai novamente a incluiu como sua dependente para uso do FUSEx. Conforme comprova a Carteira do FUSEx (vencida em 2017), a autora, mesmo depois do falecimento do seu pai em 2010, continuou usando o fundo de saúde, como sua dependente.” Recebida a petição id. 327912781 como emenda à inicial, postergou-se o exame da tutela de urgência para após a vinda da contestação (despacho id. 328298378). A União contestou (id. 333020214), sustentando, em resumo, que, considerando as normas aplicáveis à espécie (Portarias nº 1.742/ 22, nº 430/ 22 e nº 372/ 22) a autora não se enquadra na condição de dependente que pode manter o direito ao FUSEx. Argumentou não poder ser admitida a tutela de urgência pretendida porquanto sua concessão esgotaria, no todo ou em parte, o objeto da ação. É o relatório. Decido. Segundo o artigo 294 do Código de Processo Civil, a Tutela Provisória, que se opõe à final e definitiva, pode fundar-se na urgência (perigo e plausibilidade) ou na evidência (plausibilidade). Nos termos do artigo 300 do novo estatuto processual civil, a tutela de urgência será deferida quando forem demonstrados elementos que evidenciem a plausibilidade do direito, bem como o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Tenho que estão presentes os requisitos autorizadores para a concessão da tutela pretendida; senão, vejamos. No caso, a autora da ação, filha de militar falecido, pretende, em suma, sua reinclusão na assistência médico-hospitalar (AMH) fornecida pelo Exército Brasileiro, custeada pelo FUSEx. No caso concreto, inicialmente verifico que a União admite, em sua contestação, ter sido concedida à autora, após requerimento administrativo, pensão militar em reversão, na condição de filha do 2º Ten Refm Benedito da Mota Siqueira (o instituidor), conforme Título de Pensão Militar nº 041-CR/2022-SSIP/2, de 19 de maio de 2022, após o falecimento da Srª Maria Aparecida Santos Siqueira, sua genitora, quem originalmente se habilitara à pensão militar. Ainda, em que pese não haver a ré trazido aos autos o processo administrativo que culminou com a exclusão da autora do Fundo de Saúde do Exército, de se notar, na peça resistiva e nas informações provenientes da Brigada de Infantaria Aeromóvel do Exército Brasileiro (id. 333020217), que a regra legal utilizada para a negativa do direito foi o artigo 7º da Portaria C Ex nº 1.742/ 22, que aprovou as instruções gerais para o FUSEx (EB10-IG-02.32, 2ª Edição, 2022). Importante salientar, neste passo, que a autora recebe pensão do seu genitor, em reversão, levando-se em conta a condição de dependente do militar instituidor, reconhecida por ocasião da morte de sua genitora, e contra a qual não se opõe a ré. Assim, constatado que a autora é titular de pensão e que a condição de dependente do instituidor constituiu requisito para a sua concessão, forçoso concluir que ela mantém a condição de dependência para fins de continuar como beneficiária do FUSEx. A propósito, colho os seguintes julgados: “E M E N T A ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. FILHA MAIOR PENSIONISTA MILITAR. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR DO FUSEX. CONDIÇÃO DE DEPENDENTE. NORMAS VIGENTES AO TEMPO DO ÓBITO DO MILITAR INSTITUIDOR. LEI Nº 13.954/2019. CUSTEIO DO FUNDO. - São beneficiários da assistência médico-hospitalar os militares da ativa ou na inatividade, bem como seus respectivos dependentes definidos no Estatuto dos Militares. Há distinção, no entanto, em relação aos beneficiários dos Fundos de Saúde: são beneficiários da assistência médico-hospitalar aqueles que contribuem para os Fundos de Saúde, bem como os dependentes dos militares que, a critério de cada Força, sejam enquadrados nos regulamentos dos respectivos Fundos. - O conceito de "dependente" foi inicialmente delimitado pelo art. 50, §§2º a 4º da Lei nº 6.880/1980. Porém, a Lei nº 13.954 (DOU de 17/12/2019) fez substancial redução na lista de dependentes do art. 50, §§2º e 3º da Lei nº 6.880/1980, além de revogar o §4º e introduzir o §5º nesse mesmo preceito legal. Em reforço às modificações feitas no art. 50 da Lei nº 6.880/1980, a mesma Lei nº 13.954/2019 introduziu o art. 10-A na Lei nº 3.765/1960, cuidando de pensionistas da assistência médico-hospitalar. - Os critérios jurídicos a serem observados na concessão de benefícios são aqueles vigentes ao tempo do cumprimento de todos os requisitos impostos pelo ordenamento (no caso de pensão, são as regras vigentes ao tempo do óbito, conforme orientação do E.STF, MS 21707/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, Pleno, m.v., DJ 22/09/1995). Assim, é a data do falecimento do militar que define a regência normativa para fins de caracterização da dependência para acesso ao FUSEx, e não quando o interessado busca a assistência médico-hospitalar, razão pelo qual as alterações feitas pela Lei nº 13.954/2019 no art. 50 da Lei nº 6.880/1980 e no art. 10-A da Lei nº 3.765/1960 são aplicáveis apenas a óbitos ocorridos após o início de sua eficácia jurídica, em respeito ao primado tempus regit actum e às garantias de irretroatividade. - Por outro lado, são aplicáveis ao pensionista-dependente as exigências de custeio introduzidas pela Lei nº 13.954/2019 na Lei nº 3.765/1960 (notadamente o art. 3º-B, II e III, o art. 3º-C e o art. 3º-D), porque as novas disposições legais alcançam eventos de trato sucessivo derivados de ato ou fato jurídico passado, sem ofensa à segurança jurídica e as garantias da irretroatividade. Essa conclusão também é escorada na isonomia e na equidade no custeio do FUSEx (quando comparados pensionistas-dependentes anteriores e posteriores à Lei nº 13.954/2019), bem como na solidariedade que dá estruturação jurídica a fundos com múltiplos titulares, a exemplo do que ocorre com revisões de custeio de sistemas públicos e privados de saúde e de previdência que se prolongam. - No caso dos autos, Ildara Gislaine Barreto Moralles, nascida em 06/04/1959, sustenta, na petição inicial, que é "dona de casa" e pensionista de militar em razão do óbito de seu pai, Ildo Melo Moralles, falecido em 1992, conforme título de pensão militar. Afirma que, em 2017, após o falecimento de sua genitora, passou a receber (por reversão) metade da pensão (que é dividida com a sua irmã) e, por conseguinte, tornou-se beneficiária do FUSEx, sendo o valor para custeio do plano de saúde descontado de seus proventos mensais. - Em que pese a alegação da União de que a agravada não possui nem possuía dependência econômica, seja do pai ou da mãe, com base no extrato previdenciário colacionado ao feito, uma vez que ele é beneficiária de aposentadoria do INSS por idade, a desafiar a sua condição de dependente do instituidor da pensão, há nos autos o Título de Pensão Militar nº 065/17 - SSIP/9, cujo benefício foi concedido justamente levando-se em conta a condição de dependente da agravada do militar instituidor, e contra o qual não se insurge a agravante. - Agravo parcialmente provido. (TRF-3 – AI 5022430-98.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, Intimação via sistema DATA: 01/05/2022) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR. FUNDO DE SAÚDE DA MARINHA - FUSMA. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL/2015, DO ART. 50, §§ 2º, 3º E 5º, DA LEI 6.880/1980 E DO ART. 1º DO DECRETO 92.512/1986. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. FUNDAMENTO INSUFICIENTEMENTE ATACADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 283 DO STF. 1. A matéria objeto do presente recurso não se confunde com a questão afetada pelo Superior Tribunal de Justiça à sistemática dos Recursos Especiais Repetitivos (REsps 1.880.238/RJ, 1.880.241/RJ, 1.880.246/RJ e 1.871.942/PE). 2. Não se conhece de Recurso Especial em relação à ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil/2015, ao art. 50, §§ 2º, 3º e 5º, da Lei 6.880/1980 e ao art. 1º do Decreto 92.512/1986 quando a parte não aponta, de forma clara, o vício em que teria incorrido o acórdão impugnado. Aplica-se, por analogia, a Súmula 284/STF. 3. Hipótese em que o Tribunal de origem consignou: "O art. 50, IV, 'e', da Lei 6.880/1980 assegura aos seus dependentes e ao militar assistência médico-hospitalar. Na hipótese, uma vez constatado que a autora é titular de pensão e que a condição de dependente do instituidor constituiu requisito para a sua concessão, forçoso concluir que ela ainda mantém a condição de dependência para fins de continuar como beneficiária do FUSMA. (...) Apelação desprovida. (...) É como voto" (fls. 127-128, e-STJ). 4. A insurgente não ataca a fundamentação transcrita. Dessa maneira, em se tratando de fundamentos aptos, por si sós, para manter o decisum combatido, aplica-se na espécie, por analogia, o óbice da Súmula 283/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles." 5. Agravo Interno não provido. (STJ - AgInt no AREsp 1789762/RN – Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN - DJe 01/07/2021). Ora, nessa análise inicial, o que se pode constatar é que, antes da alteração legislativa trazida pela Lei nº 13.954/ 2019 e da edição das Portarias nº 1.742/2022, nº 430/ 2022 e nº 372/ 2022, a autora detinha o direito à assistência médico-hospitalar, razão pela qual não pode ser atingido o seu direito adquirido. A condição de idosa da demandante faz pressupor sua vulnerabilidade e denota a urgência da medida. Nessa esteira, afigura-se prudente a reinclusão da autora no FUSEx, até ulterior deliberação do juízo, porque, se, de um lado, milita em favor da Administração a presunção de legitimidade de seus atos; de outro, a concessão de tutela de urgência, essencialmente reversível para assegurar, em caráter precário, a permanência da autora na condição de beneficiária da Assistência Médico-Hospitalar é medida de cautela que visa a garantir a utilidade da prestação jurisdicional. Por tais motivos, defiro o pedido de tutela de urgência para determinar que a parte ré reinclua a autora NEYDE DA MOTTA SANTOS SIQUEIRA no Cadastro de Beneficiários do Fundo de Saúde do Exército (FUSEx), restabelecendo imediatamente a assistência médico-hospitalar (AMH) disponibilizada pelo Exército Brasileiro, em seu favor, até o julgamento final da demanda. Oficie-se, com urgência, à Diretoria de Pessoal do Exército - Comando da 2ª Região Militar. Manifeste-se a autora sobre a contestação. Sem prejuízo, especifiquem as partes as provas que pretendem produzir, justificando-as, ou digam se concordam com o julgamento antecipado do mérito. Cumpra-se e int. com urgência.” Em juízo sumário de cognição (ID 307344969) foi indeferida a tutela recursal, nos seguintes termos: “Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que deferiu a tutela antecipada para determinar a reinclusão da autora como beneficiária do FUSEX. Afirma a União Federal que a agravada não detém a qualidade de dependente do militar falecido e que, portanto, não pode se beneficiar da sua manutenção no FUSEX. Pugna pela concessão da tutela recursal. É o relatório. Decido. A concessão da tutela recursal depende da presença do risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso, conforme previsão contida no artigo 995, parágrafo único do Código de Processo Civil. A decisão agravada foi assim proferida: (...) Pelo que se depreende dos autos, o óbito do instituidor da pensão se deu em 2010. As condições para o recebimento da pensão ou manutenção dos dependentes devem ser aquelas previstas na legislação da época do óbito. Considerando que a agravada tem se beneficiado do FUSEX desde 1959 e que seu pai, instituidor da pensão por morte a ela revertida, faleceu em 2010, não vejo perigo de dano irreparável ou de difícil reparação a justificar a imediata suspensão da decisão liminar que determinou a sua reinclusão no plano de saúde. Ante o exposto, indefiro a tutela recursal. Encaminhe-se cópia desta decisão ao juízo recorrido. Dê vista à parte agravada, caso haja advogado constituído, nos termos do artigo 1.019, II, do Código de Processo Civil. Tendo em vista a apreciação do pedido de liminar, proceda a secretaria à retificação da autuação, certificando nos autos. Intime-se. Cumpra-se.” Cinge-se a controvérsia sobre o enquadramento como dependente de filha maior, pensionista de militar, e assim ter direito à assistência médico-hospitalar do Fundo de Saúde do Exército – FUSEX. Segundo o artigo 50 do Estatuto dos Militares, Lei nº 6.880/80, com redação anterior à Lei n. 13.954/2019: Art. 50. São direitos dos militares: (...) IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas: (...) e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários.” § 2° São considerados dependentes do militar: (...) III - a filha solteira, desde que não receba remuneração; § 3º São, ainda, considerados dependentes do militar, desde que vivam sob sua dependência econômica, sob o mesmo teto, e quando expressamente declarados na organização militar competente: a) a filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não recebam remuneração; O Decreto 92.512/1986, por sua vez, regulamenta a matéria, dispondo que: “Art. 1º O militar da Marinha, do Exército e da Aeronáutica e seus dependentes têm direito à assistência médico-hospitalar, sob a forma ambulatorial ou hospitalar, conforme as condições estabelecidas neste decreto e nas regulamentações específicas das Forças Singulares.” Da leitura dos dispositivos acima, extrai-se a conclusão de que a assistência médico-hospitalar é assegurada aos dependentes, não havendo qualquer distinção. É nesse sentido a jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça: “AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. EFEITO SUSPENSIVO DO RECURSO ESPECIAL. JUÍZO DE COGNIÇÃO SUMÁRIA. VIABILIDADE. 1. Caso em que estão presentes os requisitos necessários à atribuição de efeito suspensivo ao recurso especial, pois, ao menos em juízo de cognição sumária, o apelo se mostra viável, isto é, aparentemente, os pressupostos de admissibilidade foram atendidos. Por outro lado, afigura-se revestida de plausibilidade jurídica a tese da requerente. Isso porque, em linha de princípio, a alegação segundo a qual, de acordo com a legislação de regência, não haveria fundamento legal para diferenciação entre a dependência para fins de assistência médico-hospitalar e a dependência para fins de pensão militar por morte, condição que se manteria mesmo após o falecimento do militar instituidor do benefício, mostra-se, ao menos, razoável, merecendo ser melhor avaliada por este Superior Tribunal. 2. Agravo interno a que se nega provimento.” (AIRESP - AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - 1629936 2016.02.47776-9, SÉRGIO KUKINA, STJ - PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:23/08/2018 ..DTPB:.); “ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO AO ART. 535, II, DO CPC. INOCORRÊNCIA. FUNDO DE SAÚDE DO EXÉRCITO - FUSEX. EX-ESPOSA DE MILITAR. DIREITO À PENSÃO ALIMENTÍCIA FIXADO EM SENTENÇA TRANSITADA EM JULGADO. DEPENDENTE. ART. 50, IV, "e", c/c o § 2º, VIII, da LEI 6.880/80. CONDIÇÃO DE BENEFICIÁRIA DA ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR. RECONHECIMENTO. 1. A Corte de origem dirimiu a controvérsia de forma clara e fundamentada, embora de maneira desfavorável à pretensão da recorrente. Não é possível se falar, assim, em maltrato ao art. 535, II, do Código de Processo Civil. 2. Nos termos da legislação de regência, a ex-esposa de militar, com direito à pensão alimentícia fixado em sentença transitada em julgado, enquanto não contrair outro matrimônio, é considerada sua dependente, fazendo jus à assistência médico-hospitalar na condição de beneficiária do Fundo de Saúde do Exército - FUSEX, para o qual o ex-cônjuge contribui. 3. Recurso especial não provido.” (RESP - RECURSO ESPECIAL - 1267053 2011.01.69160-1, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:20/11/2013 ..DTPB:.)". No mesmo sentido, trago jurisprudência desta Corte: “APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO MILITAR. EX-CÔNJUGE. DEPENDENTE. ART. 50, §2º, VIII, LEI Nº 6.880/80. FUSEX. Pelo art. 50, §2º, VIII, da Lei nº 6.880/80, é dependente, para todos os efeitos, do militar a ex-esposa que tenha direito ao recebimento de pensão alimentícia reconhecido em sentença judicial transitada em julgado. In casu, ficou suficientemente demonstrada essa condição. Como dependente, há direito a assistência médico-hospitalar, vide art. 50, IV, "e", da mesma lei. Sendo dependente, tem igual direito a ser incluída no FUSEX. É despiciendo que conste expressamente de sentença que ponha a termo a sociedade conjugal a inclusão no FUSEX. Trata-se de exigência que transcende parâmetros de razoabilidade. Se o ex-cônjuge do militar for considerado dependente e se o militar é contribuinte do FUSEX, então o dependente faz jus a receber assistência médico-hospitalar desse fundo. Apelação a que se nega provimento.” (TRF 3ª Região, SEGUNDA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1850138 - 0013973-30.2009.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL COTRIM GUIMARÃES, julgado em 17/05/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:24/05/2016); APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. DEPENDENTES DE MILITAR. ASSISTÊNCIA MÉDICA. ART. 7º, II, DA LEI Nº 3.765/60, ART. 76, DA LEI Nº 5787/72 E ART. 50, DA LEI Nº 6.880/80. I - A Administração Pública militar está obrigada, do ponto de vista legal, a prestar assistência médica aos militares e a seus dependentes. Autora se enquadra no art. 7º, II, da Lei nº 3.765/60, art. 76, da Lei 5.787/72 e art. 50, da Lei nº 6.880/90. II - A requerente vinha pagando e utilizando a Assistência Médico-Hospitalar no Sistema de Saúde da Aeronáutica há muitos anos e a sua supressão fere o princípio da confiança legítima e da estrita legalidade. III - Apelação e remessa necessária improvidas. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001285-78.2019.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal JOSE CARLOS FRANCISCO, julgado em 06/03/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/03/2020); CIVIL. PROCESSO CIVIL. APELAÇÃO. MILITAR. MANUTENÇÃO DE DEPENDENTE NO FUNSA. PENSIONISTA. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. A matéria tratada nos autos diz respeito ao dever da Administração Pública Militar prestar assistência médica aos militares e aos seus dependentes. 2. Conforme se depreende da Lei nº 6.880/80, é direito dos militares: Art. 50. São direitos dos militares: (...) IV - nas condições ou nas limitações impostas na legislação e regulamentação específicas: (...) e) a assistência médico-hospitalar para si e seus dependentes, assim entendida como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção, conservação ou recuperação da saúde, abrangendo serviços profissionais médicos, farmacêuticos e odontológicos, bem como o fornecimento, a aplicação de meios e os cuidados e demais atos médicos e paramédicos necessários. 3. Tal direito é reforçado pelo Decreto nº 92.512/86, que estabelece: Art. 1º O militar da Marinha, do Exército e da Aeronáutica e seus dependentes têm direito à assistência médico-hospitalar, sob a forma ambulatorial ou hospitalar, conforme as condições estabelecidas neste decreto e nas regulamentações específicas das Forças Singulares. 4. Assim, ao contrário do quanto alegado pela União, verifica-se que há legislação suficiente que assegura aos militares e seus dependentes o direito à assistência médico-hospitalar. 5. Conforme se depreende dos autos, a autora é pensionista da Aeronáutica, em virtude do falecimento de seu genitor, Sr. Ubirajara Pereira de Araújo, ocorrido em 26.05.2006. Verifica-se, ainda, que a autora era beneficiária do FUNSA, vertendo contribuição mensal ao fundo para poder usufruir dos serviços médico-hospitalares, segundo consta dos holerites juntados aos autos. 6. Sendo assim, em consonância como disposto no art. 50, §2º, da Lei nº 6.880/80, conclui-se que a autora é dependente de militar, sendo que a ela é assegurado por lei o direito à assistência médico-hospitalar. 7. Vale ressaltar que não há que se considerar a ausência de dependência em virtude do óbito do militar, vez que foi exatamente esta a razão pela qual a autora passou a ser pensionista. Tampouco pode-se considerar que a pensão militar recebida seja remuneração, como argumenta a apelante, nos termos do art. 50, §4º, da Lei nº 6.880/82. 8. Assim, não merece reforma a sentença recorrida. 9. Apelação não provida.” (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5008315-76.2019.4.03.6100, Rel. Juiz Federal Convocado NOEMI MARTINS DE OLIVEIRA, julgado em 26/03/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 31/03/2020); PENSÃO. MILITAR. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR. DEPENDENTES. 1. Dependente beneficiário de pensão por morte que possui direito à assistência médico-hospitalar devida aos servidores militares. Precedentes. 2. Apelação desprovida, com majoração da verba honorária. Remessa oficial desprovida. (TRF 3ª Região, 2ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5008427-36.2019.4.03.6103, Rel. Desembargador Federal OTAVIO PEIXOTO JUNIOR, julgado em 05/04/2021, DJEN DATA: 19/04/2021)". O reconhecimento da condição de dependente da requerente não foi revogado pela Administração Militar, tendo em vista que continua recebendo a respectiva pensão por morte. Segundo se depreende dos autos principais, a agravante foi excluída do FusEx com base em norma infralegal lastreada na Lei n. 13.954/2019. Como já dito, a pensão foi concedida antes da alteração promovida pela referida lei e deve se reger pelas regras anteriores. Prosseguindo, o Superior Tribunal de Justiça, no Tema 1.080, fixou as seguintes teses: "1. Não há direito adquirido a regime jurídico relativo à Assistência Médico-Hospitalar própria das Forças Armadas - benefício condicional, de natureza não previdenciária, diverso da pensão por morte e não vinculado a esta -, aos pensionistas ou dependentes de militares falecidos antes ou depois da vigência da Lei 13.954/2019; 2. A definição legal de "rendimentos do trabalho assalariado", referida no § 4º do art. 50 da Lei 6880/1980, na sua redação original, inclui as "pensões, civis ou militares de qualquer natureza", conforme expressamente estabelecido no art. 16, inciso XI, da Lei 4506/1964; 3. A Administração Militar tem o poder-dever de realizar a fiscalização e verificação periódica da manutenção dos requisitos à Assistência MédicoHospitalar, nos termos da legislação e do regulamento, respeitado o devido processo legal, não se aplicando o prazo decadencial do artigo 54 da Lei 9784/1999, ante a contrariedade à lei e afronta direta aos princípios da legalidade, moralidade e eficiência, previstos no art. 37, caput, bem como o princípio da probidade administrativa previsto no § 4º, além do art. 5º, II, da Constituição da República; 4) Para aferição da dependência econômica, em aplicação analógica do art. 198 do Estatuto dos Servidores Públicos (Lei 8.112/1990): não se configura a dependência econômica para fins de Assistência Médico-Hospitalar, quando o pretenso usuário perceber rendimento do trabalho ou de qualquer outra fonte, inclusive pensão ou provento da aposentadoria, em valor igual ou superior ao salário-mínimo". Sendo assim, é de se reconhecer o direito da requerente à manutenção da qualidade de dependente, mantida a decisão que determinou sua reinclusão no sistema de assistência médico-hospitalar dos militares, devendo ser observado, contudo, a previsão contida no referido Tema 1.080. Assim, a Administração pode verificar a manutenção da dependência econômica da agravante para fins de manutenção no FusEx. Diante do exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. É como voto.
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS FRANCISCO: Peço vênia para divergir da eminente relatora.
O art. 142, §3º, X, da Constituição, delimitou o âmbito da reserva absoluta de lei (ou estrita legalidade) aplicável aos militares, e recepcionou vários diplomas normativos, dentre eles a Lei nº 4.375/1964 (Lei do Serviço Militar), a Lei nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), e a Lei nº 6.391/1976 (Lei do Pessoal do Exército), com os correspondentes regulamentos.
O art. 50, IV, “e”, da Lei nº 6.880/1980 prevê que, são direitos dos militares (nas condições ou nas limitações impostas por legislação e regulamentação específicas), a assistência médico-hospitalar. Nesse contexto, a Portaria Ministerial nº 3.055/1978 instituiu o Fundo de Saúde do Exército (FUSEx), destinado a constituir parte dos recursos financeiros necessários ao funcionamento do Sistema de Assistência Médico-Hospitalar aos Militares do Exército e seus dependentes, sendo composto pela contribuição mensal incidente sobre o soldo dos militares ou o soldo que serve de base para o cálculo dos proventos ou pensões dos inativos e pensionistas.
Regulamentando a assistência médico-hospitalar ao militar e seus dependentes, sob a forma ambulatorial ou hospitalar, o art. 2º do Decreto nº 92.512/1986 estabelece que a referida assistência será proporcionada pelas seguintes organizações de saúde: (i) dos Ministérios Militares; (ii) Hospital das Forças Armadas; (iii) de Assistência Social dos Ministérios Militares, quando existentes; (iv) do meio civil, especializadas ou não, oficiais ou particulares, mediante convênio ou contrato; (v) do exterior, especializadas ou não. A prioridade para a utilização das organizações será estabelecida em cada Ministério Militar, e os serviços médicos em residência serão prestados somente quando, a critério médico, houver impossibilidade ou inconveniência da remoção para uma organização de saúde. O Decreto nº 92.512/1986 conceitua assistência médico-hospitalar como o conjunto de atividades relacionadas com a prevenção de doenças, com a conservação ou recuperação da saúde e com a reabilitação dos pacientes, abrangendo os serviços profissionais médicos, odontológicos e farmacêuticos, o fornecimento e a aplicação de meios, os cuidados e os demais atos médicos e paramédicos necessários.
Nas localidades onde não houver organização de saúde de seu Ministério, o militar e seus dependentes terão assistência médico-hospitalar proporcionada por organização congênere de outra Força Singular, quando encaminhados por autoridade competente. Aplica-se a mesma disposição normativa aos casos em que, mesmo havendo organização de saúde de seu Ministério, existam razões especiais, relativas à carência de recursos médico-hospitalares ou a situações de urgência, que justifiquem o atendimento em organização de saúde que não a da própria Força.
Os Ministérios Militares, através de seus órgãos competentes, poderão celebrar convênios ou contratos com entidades públicas, com pessoas jurídicas de direito privado ou com particulares, respectivamente, para: (i) prestar assistência médico-hospitalar aos seus beneficiários nas localidades onde não existam organizações de saúde das Forças Armadas; (ii) complementar os serviços especializados de suas organizações militares de saúde; (iii) outros fins, a critério dos respectivos Ministérios.
A jurisprudência é no sentido da ampla cobertura desse atendimento, em favor do direito à saúde, como se nota nos seguintes julgados do E.STJ e desta E.Corte Regional:
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE. LIMITAÇÕES POR AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE. MILITAR. FUNDO DE SAÚDE DO EXÉRCITO. DECRETO N. 92.512/86. TRATAMENTO DE SAÚDE EM ESTABELECIMENTO DE SAÚDE ESTRANHO ÀS FORÇAS ARMADAS. SITUAÇÃO DE URGÊNCIA RECONHECIDA. POSSIBILIDADE. RESSARCIMENTO DE PARTE DAS DESPESAS MÉDICAS. CABIMENTO. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE.
(...)
II - O direito a saúde, constitucionalmente assegurado, reflexo dos direitos de personalidade inatos à condição humana, não pode sofrer limitações por autoridades administrativas, que lhe reduzam ou embaracem o acesso. Precedentes.
III - A doutrina médica distingue a situação de emergência, daquela de urgência. O Decreto n. 92.512/86, no art. 3º, incisos XVI e XXXIII, conceitua a emergência como "situação crítica ou perigosa, de surgimento imprevisto e súbito, como manifestação de enfermidade ou traumatismo, que obriga ao atendimento de urgência", enquanto a urgência é definida como "o atendimento que se deve fazer imediatamente, por imperiosa necessidade, para que se evitem males ou perdas consequentes de maiores delongas ou protelações".
IV - O mesmo diploma normativo assegura aos Militares ativos e inativos, assistidos pelo FUSEX, internações de emergência em estabelecimentos de saúde estranhos às Forças Armadas, sem prévia autorização do comandante, diretor ou chefe, ou autoridade militar designada, nos casos de urgência.
V - Da exegese desses dispositivos, depreende-se que a lei autoriza o atendimento médico em organizações alheias à estrutura das Forças Armadas em situações de urgência, circunstância que estaria abrangida pelos casos de emergência VI - Reconhecida no acórdão recorrido a urgência da circunstância que levou o Recorrente a buscar sua cirurgia cardíaca em hospital particular, bem como sendo ele beneficiário do FUSEX, mostra-se devido o ressarcimento, pela União, de parte das despesas efetuadas em seu tratamento de saúde.
IV - Recurso Especial provido.
(STJ, REsp 1608019/CE, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/11/2017, DJe 27/11/2017)
SERVIDOR PÚBLICO. MILITAR. TUTELA DE URGÊNCIA. ASSISTÊNCIA MÉDICA DOMICILIAR. DEFERIMENTO.
- Conforme esclareceu a parte agravada em contraminuta, o "Autor apresenta em anexo 06 (seis) atestados de médicos que realizam o seu atendimento e acompanhamento de saúde (doc. 20), nos quais estão descritas a efetiva necessidade do atendimento “Home Care” da enfermagem por 24 (vinte e quatro) horas e o fornecimento dos medicamentos de uso contínuo (doc. 19) e fraldas geriátricas, sob o risco de vida no caso de corte." Preenchidos os requisitos para a concessão da tutela de urgência.
- Agravo de instrumento da União desprovido.
(TRF 3ª Região, 2ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5008029-65.2019.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 05/03/2020, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/03/2020)
APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MILITAR. FUSEX. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. ADEQUAÇÃO E NECESSIDADE DEMONSTRADAS. PREVISÃO LEGAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA (ASTREINTES). RECURSO PROVIDO.
(...)
2- A Constituição da República consagra a saúde como direito fundamental, ao prevê-la, em seu artigo 6º, como direito social. O art. 196, por sua vez, estabelece ser a saúde direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas, que visem à redução do risco de doenças e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
3- Tratando-se o direito à saúde de direito público subjetivo indisponível - qualificado como direito fundamental e consequência constitucional indissociável do direito à vida -, sempre deverá lhe ser conferida a interpretação que se mostre mais favorável ao indivíduo (interpretação pro homine), impondo-se a prevalência da norma que mais promova a dignidade da pessoa humana.
4- A Lei 6.880/90 (Estatuto dos Militares) dispõe que a assistência médico-hospitalar é direito do militar e seus dependentes. O militar da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, bem como seus dependentes, têm direito à assistência médico-hospitalar, sob a forma ambulatorial ou hospitalar, através das respectivas organizações de saúde. O fornecimento de medicamento de custo elevado para tratamento prolongado aos beneficiários do Fundo de Saúde do Exército (FUSEx) encontra-se disciplinado pela Portaria nº 281-DGP/2007.
5- No caso, o custo de aquisição dos medicamentos que compõem os meios terapêuticos utilizados para tratamento da Doença de Alzheimer foi apurado em R$ 3.079,92 (três mil e setenta e nove reais e noventa e dois centavos), excedendo o montante correspondente a 30% (trinta por cento) do soldo percebido pela Impetrante, cujo valor é de R$ 6.156,00 (seis mil, cento e cinquenta e seis reais).
6 - Dado provimento ao recurso de apelação para conceder a segurança e determinar à autoridade impetrada o imediato restabelecimento do fornecimento da medicação de alto custo especificada na inicial, em favor da Impetrante, nos moldes previstos pela Portaria nº 281-DGP/2007, sob pena de multa diária de R$ 500,00 (quinhentos reais), em caso de descumprimento.
(TRF 3ª Região, PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 319569 - 0012069-97.2008.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 05/09/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/09/2017)
São beneficiários da assistência médico-hospitalar os militares da ativa ou na inatividade, bem como seus respectivos dependentes definidos no Estatuto dos Militares. Há distinção, no entanto, em relação aos beneficiários dos Fundos de Saúde: são beneficiários da assistência médico-hospitalar aqueles que contribuem para os Fundos de Saúde, bem como os dependentes dos militares que, a critério de cada Força, sejam enquadrados nos regulamentos dos respectivos Fundos.
De todo modo, o conceito de “dependente” foi inicialmente delimitado pelo art. 50, §§2º a 4º da Lei nº 6.880/1980, com a seguinte redação:
Art. 50. São direitos dos militares:
(...)
§ 2° São considerados dependentes do militar:
I - a esposa;
II - o filho menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou interdito;
III - a filha solteira, desde que não receba remuneração;
IV - o filho estudante, menor de 24 (vinte e quatro) anos, desde que não receba remuneração;
V - a mãe viúva, desde que não receba remuneração;
VI - o enteado, o filho adotivo e o tutelado, nas mesmas condições dos itens II, III e IV;
VII - a viúva do militar, enquanto permanecer neste estado, e os demais dependentes mencionados nos itens II, III, IV, V e VI deste parágrafo, desde que vivam sob a responsabilidade da viúva;
VIII - a ex-esposa com direito à pensão alimentícia estabelecida por sentença transitada em julgado, enquanto não contrair novo matrimônio.
§ 3º São, ainda, considerados dependentes do militar, desde que vivam sob sua dependência econômica, sob o mesmo teto, e quando expressamente declarados na organização militar competente:
a) a filha, a enteada e a tutelada, nas condições de viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não recebam remuneração;
b) a mãe solteira, a madrasta viúva, a sogra viúva ou solteira, bem como separadas judicialmente ou divorciadas, desde que, em qualquer dessas situações, não recebam remuneração;
c) os avós e os pais, quando inválidos ou interditos, e respectivos cônjuges, estes desde que não recebam remuneração;
d) o pai maior de 60 (sessenta) anos e seu respectivo cônjuge, desde que ambos não recebam remuneração;
e) o irmão, o cunhado e o sobrinho, quando menores ou inválidos ou interditos, sem outro arrimo;
f) a irmã, a cunhada e a sobrinha, solteiras, viúvas, separadas judicialmente ou divorciadas, desde que não recebam remuneração;
g) o neto, órfão, menor inválido ou interdito;
h) a pessoa que viva, no mínimo há 5 (cinco) anos, sob a sua exclusiva dependência econômica, comprovada mediante justificação judicial;
i) a companheira, desde que viva em sua companhia há mais de 5 (cinco) anos, comprovada por justificação judicial; e
j) o menor que esteja sob sua guarda, sustento e responsabilidade, mediante autorização judicial.
§ 4º Para efeito do disposto nos §§ 2º e 3º deste artigo, não serão considerados como remuneração os rendimentos não-provenientes de trabalho assalariado, ainda que recebidos dos cofres públicos, ou a remuneração que, mesmo resultante de relação de trabalho, não enseje ao dependente do militar qualquer direito à assistência previdenciária oficial.
Porém, a Lei nº 13.954 (DOU de 17/12/2019) fez substancial redução na lista de dependentes do art. 50, §§2º e 3º da Lei nº 6.880/1980, além de revogar o §4º e introduzir o §5º nesse mesmo preceito legal:
Art. 50. São direitos dos militares:
(...)
§ 2º São considerados dependentes do militar, desde que assim declarados por ele na organização militar competente:
I - o cônjuge ou o companheiro com quem viva em união estável, na constância do vínculo;
II - o filho ou o enteado:
a) menor de 21 (vinte e um) anos de idade;
b) inválido;
§ 3º Podem, ainda, ser considerados dependentes do militar, desde que não recebam rendimentos e sejam declarados por ele na organização militar competente:
I - o filho ou o enteado estudante menor de 24 (vinte e quatro) anos de idade;
II - o pai e a mãe
III - o tutelado ou o curatelado inválido ou menor de 18 (dezoito) anos de idade que viva sob a sua guarda por decisão judicial
§ 4º (revogado)
§ 5º Após o falecimento do militar, manterão os direitos previstos nas alíneas “e”, “f” e “s” do inciso IV do caput deste artigo, enquanto conservarem os requisitos de dependência, mediante participação nos custos e no pagamento das contribuições devidas, conforme estabelecidos em regulamento
I - o viúvo, enquanto não contrair matrimônio ou constituir união estável
II - o filho ou o enteado menor de 21 (vinte e um) anos de idade ou inválido
III - o filho ou o enteado estudante menor de 24 (vinte e quatro) anos de idade;
IV - os dependentes a que se refere o § 3º deste artigo, por ocasião do óbito do militar.
Em reforço às modificações feitas no art. 50 da Lei nº 6.880/1980, a mesma Lei nº 13.954/2019 introduziu no art. 10-A na Lei nº 3.765/1960, cuidando de pensionistas da assistência médico-hospitalar:
Art. 10-A. Após o falecimento do militar, apenas os pensionistas que atenderem ao disposto no § 5º do art. 50 da Lei nº 6.880, de 9 de dezembro de 1980 (Estatuto dos Militares), terão direito à assistência médico-hospitalar e social das Forças Armadas, conforme as condições estabelecidas em regulamento.
Ao julgar o tema repetitivo nº 1080 o c. STJ fixou a seguinte tese, em acórdão publicado em 13/02/2025:
1. Não há direito adquirido a regime jurídico relativo à Assistência Médico-Hospitalar própria das Forças Armadas - benefício condicional, de natureza não previdenciária, diverso da pensão por morte e não vinculado a esta -, aos pensionistas ou dependentes de militares falecidos antes ou depois da vigência da Lei 13.954/2019;
2. A definição legal de "rendimentos do trabalho assalariado", referida no § 4º do art. 50 da Lei 6880/1980, na sua redação original, inclui as "pensões, civis ou militares de qualquer natureza", conforme expressamente estabelecido no art. 16, inciso XI, da Lei 4506/1964;
3. A Administração Militar tem o poder-dever de realizar a fiscalização e verificação periódica da manutenção dos requisitos à Assistência Médico Hospitalar, nos termos da legislação e do regulamento, respeitado o devido processo legal, não se aplicando o prazo decadencial do artigo 54 da Lei 9784/1999, ante a contrariedade à lei e afronta direta aos princípios da legalidade, moralidade e eficiência, previstos no art. 37, caput, bem como o princípio da probidade administrativa previsto no § 4º, além do art. 5º, II, da Constituição da República;
4. Para aferição da dependência econômica, em aplicação analógica do art. 198 do Estatuto dos Servidores Públicos (Lei 8.112/1990): não se configura a dependência econômica para fins de Assistência Médico-Hospitalar, quando o pretenso usuário perceber rendimento do trabalho ou de qualquer outra fonte, inclusive pensão ou provento da aposentadoria, em valor igual ou superior ao salário-mínimo.
No caso dos autos, a autora, ora agravada, narra ser filha pensionista do Tenente do Exército Brasileiro Benedito da Motta Siqueira, falecido em 2010. Afirma sempre ter sido beneficiária do FUSEX como dependente de seu pai. Alega que em fevereiro de 2022, após o falecimento de sua mãe, ao habilitar-se como beneficiária da pensão militar foi surpreendida com o aviso do cancelamento ilegal e arbitrário de seu acesso à assistência médica. Pleiteia, portanto, o reconhecimento do seu direito de usufruir dos benefícios do FUSEX.
Com feito, não obstante o entendimento exarado pela eminente Relatora esteja de acordo com a jurisprudência deste TRF, deve-se ponderar que o C. STJ, quando do julgamento do Tema 1080, estabeleceu entendimento em sentido diverso, na medida em que restou decidido pela inexistência de direito adquirido a regime jurídico relativo à assistência médica-hospitalar por parte dos pensionistas de militares, ao se considerar a natureza condicional e não previdenciária do instituto.
Desse modo, conforme se extrai do voto-vista proferido pelo Ministro Francisco Falcão, não se pode falar em lei vigente à época do falecimento do militar instituidor para fins de percepção de assistência médica como dependente, tendo em vista que não há prévia contribuição para gozo posterior que possa gerar a aquisição do direito, bem como porque o direito à assistência só se verifica enquanto preenchidos os requisitos legais, os quais não são perenes.
Desse modo, denota-se que o novo e reduzido rol trazido pela Lei nº 13.954/2019, o qual deve ser aplicado ao presente caso, não mais prevê o direito de a filha solteira ou divorciada ser considerada dependente de militar (caso da agravada, filha de militar nascida em 1959).
Nessa linha, ainda que assim não fosse, quanto a questão da dependência econômica, restou estabelecido que caso o usuário do fundo receba pensão militar em valor igual ou superior ao salário-mínimo, este perde a sua condição de dependente. Assim, considerando que, no presente caso, a agravada percebe pensão militar na quantia de R$ 15.335,70 (id. 333020220 dos autos subjacentes), também por esse motivo, não se verificaria a sua condição de dependente.
Destarte, considerando a inexistência de direito adquirido a regime jurídico relativo à assistência médica-hospitalar por parte dos pensionistas de militares, bem como a ausência do preenchimento dos requisitos configuradores da dependência econômica, devem ser acolhidas as alegações trazidas pela UNIÃO FEDERAL com a consequente concessão do efeito suspensivo pleiteado, presentes os seus requisitos autorizadores.
Diante de todo o exposto, divirjo da eminente relatora dar provimento ao agravo de instrumento, concedendo o efeito suspensivo pleiteado.
Ressalte-se, em atenção a modulação de efeitos determinada pelo C. STJ, que a UNIÃO FEDERAL não deve proceder a exclusão da agravada caso tenha iniciado o procedimento de autorização, ou se encontre em tratamento, até que obtenha alta médica.
É o voto.
Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ASSISTÊNCIA MÉDICO-HOSPITALAR MILITAR. PENSIONISTA FILHA MAIOR. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA. REGIME JURÍDICO APLICÁVEL. REINCLUSÃO NO FUSEx. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
III. RAZÕES DE DECIDIR
IV. DISPOSITIVO E TESE
Tese de julgamento:
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 6.880/1980, art. 50, §§ 2º e 3º; Lei nº 13.954/2019, art. 23; Decreto nº 92.512/1986, art. 1º; CPC, arts. 294, 300, 995, parágrafo único.
Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1789762/RN, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 01.07.2021; TRF-3, AI 5022430-98.2021.4.03.0000, Rel. Des. Fed. José Carlos Francisco, Intimação em 01.05.2022; STJ, REsp 1267053, Rel. Min. Eliana Calmon, DJe 20.11.2013; Tema 1.080/STJ.