APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003140-07.2023.4.03.6183
RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA
APELANTE: SILVIO CAMILO VIRGILIO
Advogado do(a) APELANTE: VICTOR RODRIGUES SETTANNI - SP286907-A
APELADO: (GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM SÃO PAULO/SP - CENTRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GERENTE EXECUTIVO DA AGENCIA DA PREVIDENCIA SOCIAL SÃO PAULO - VILA MARIANA - SÃO PAULO - SP
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003140-07.2023.4.03.6183 RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA APELANTE: SILVIO CAMILO VIRGILIO Advogado do(a) APELANTE: VICTOR RODRIGUES SETTANNI - SP286907-A APELADO: (GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM SÃO PAULO/SP - CENTRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GERENTE EXECUTIVO DA AGENCIA DA PREVIDENCIA SOCIAL SÃO PAULO - VILA MARIANA - SÃO PAULO - SP OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de liminar, que objetiva a concessão de provimento jurisdicional que determine o restabelecimento de benefício previdenciário e a cessação dos descontos indevidos. No ID 285194452 foi parcialmente deferida a liminar para determinar que a autoridade impetrada se abstenha de efetuar a cobrança dos valores recebidos da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/155.713.164-0. A r. sentença, proferida em 01/09/2023, denegou a segurança. Não houve condenação em honorários advocatícios. Inconformada, apela a parte impetrante, aduzindo irregularidade no procedimento de auditoria, vez que o AR foi enviado ao seu antigo endereço, sendo que nas declarações de IRPF consta o novo endereço desde 2014, o que corrobora a violação aos princípios do contraditório e ampla defesa. Sustenta ser patente a ilegalidade do ato administrativo, considerando que não houve a prévia intimação do segurado. Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte. Em seu parecer, o MPF opinou pelo regular processamento. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003140-07.2023.4.03.6183 RELATOR: Gab. 23 - DES. FED. MARCELO VIEIRA APELANTE: SILVIO CAMILO VIRGILIO Advogado do(a) APELANTE: VICTOR RODRIGUES SETTANNI - SP286907-A APELADO: (GERENTE EXECUTIVO DO INSS EM SÃO PAULO/SP - CENTRO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, GERENTE EXECUTIVO DA AGENCIA DA PREVIDENCIA SOCIAL SÃO PAULO - VILA MARIANA - SÃO PAULO - SP OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO VIEIRA, RELATOR: Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso de apelação. De início, entendo relevante tecer um breve resumo dos fatos: Conforme se verifica dos documentos constantes dos autos, que o impetrante, após requerimento administrativo, obteve a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/155.713.164-0 com DIB em 10/03/2011. Ocorre que, em 02/10/2021, o INSS instaurou auditoria interna para apuração de irregularidades na concessão (ID 285194448), notadamente quanto ao reconhecimento das atividades especiais no período de 01/09/78 a 20/08/82; 13/09/82 a 07/02/83; e de 02/07/84 a 20/02/91 e de 08/03/93 a 23/05/95 na função de impressor em razão de supostas irregularidades formais nas assinaturas dos formulários SB40 e, neste contexto, a auditoria concluiu pela cessação do benefício e cobrança dos valores desde a DER. Pois bem: A Constituição de 1988, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 19/98, estabelece alguns princípios a que se submete a administração pública, tais como os princípios da legalidade, da supremacia do interesse público, da impessoalidade, da presunção de legitimidade, da moralidade administrativa, da publicidade, da motivação. Dentre estes, a observância aos princípios da eficiência, do devido processo legal e da publicidade dos atos é dever que se impõe a todo agente público ao realizar suas atribuições com presteza e rendimento funcional. A inobservância destes princípios remete ao exercício do controle dos atos da Administração, seja pela aplicação do princípio da autotutela com a revisão dos seus próprios atos, revogando-os quando inconvenientes ou anulando-os quando ilegais, seja pela via judicial. O Ministério da Previdência Social e o INSS mantêm um programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes, previsto no art. 11 da Lei n° 10.666/03 e regulamentado pelo artigo 179, §1° do Decreto n° 3.048/99. A possibilidade de revisão interna dos atos administrativos, contudo, não pode conduzir a abusos e desrespeito aos direitos e garantias constitucionais. Neste contexto, alega a impetrante a ilegalidade do ato administrativo de cessação do benefício, ante a violação dos princípios da ampla defesa e do contraditório, tendo em vista que o AR, notificando-o do procedimento de apuração de irregularidades, foi emitido para endereço diverso daquele em que reside. Verifica-se dos autos que o AR, noticiando a instauração do procedimento administrativo, foi endereçado à Rua João Antonio da Fonseca, 606 – casa 04 - Taboão da Serra – CEP 06766-190, endereço esse cadastrado junto ao INSS para correspondência conforme se constata do ID 285194448 p. 8. É dever do segurado manter seu endereço atualizado junto ao INSS, descabendo a alegação de que não lhe compete atualizar seu endereço junto aos órgãos públicos. Não obstante o avanço da tecnologia, não há integração de dados entre os diversos órgãos e autarquias da Administração Pública, de modo que é inócuo o argumento de que a entrega da declaração de IRPF perante a RFB, teria o condão de comunicar os demais órgãos quanto a mudança de endereço. Portanto, não prospera o argumento e, quanto ao ponto alegado pela impetrante, não há qualquer ilegalidade no procedimento administrativo. Contudo, verificando as datas de concessão de benefícios e instauração do procedimento de cessação do benefício e cobrança de valores, impende aferir a hipótese de decadência para o INSS rever o ato de concessão, considerando que a decadência é matéria de ordem pública, devendo ser apreciada, inclusive de ofício, a qualquer tempo e grau de jurisdição. Dispõe o artigo 103 da Lei 8.213/91: “Art.103-A.O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados,salvo comprovada má-fé.(Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004) §1ºNo caso deefeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.” (Incluído pela Lei nº 10.839, de 2004) Ademais, consoante tese firmada no julgamento do tema 214/STJ, fixou-se em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários, nos termos do art. 103-A da Lei 8.213/91, acrescentado pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004. No caso dos autos, a aposentadoria por tempo de contribuição NB 42/155.713.164-0 teve a DIB fixada em 10/03/2011 e conforme se constata do ID 285194447 p. 112 o segurado recebeu na mesma data da DIB, de modo que é possível concluir que o início do pagamento se deu no mês seguinte, ou seja, em abril de 2011. Ocorre que a auditoria interna da apuração de irregularidades foi instaurada em 02/10/2021(ID 285194448) e o procedimento técnico de cessação do benefício se deu a partir de 13/01/2023 (ID 285194449), após o decurso do prazo decenal estabelecido no Tema 214/STJ, de modo que operou-se a decadência para o INSS rever a concessão do benefício. Necessário esclarecer que, in casu, não se constata a existência de má-fé, que justificaria o afastamento da hipótese de decadência. Da detida análise dos autos, constata-se que, embora a apuração de irregularidades tenha sido iniciado a partir de IPL nº 0288/2016-5 DELEPREV/SR/PF/SP, relativa a denúncia cadastrada no Sistema de Gerenciamento de Assessoramento de Pesquisa Estratégica e Gerenciamento de Risco – APEGR (SISGAP), relacionada às investigações feitas na Operação Ostrich e Operação Gerocômio.2, não há nos autos qualquer dado que indique a existência de fraude ou prática de falsificação pelo autor. Consta dos dados do CNIS que o autor tem longo histórico laboral, com períodos razoavelmente longos em diversas empresas e apresentou farta documentação laboral na DER, inclusive documentos regulares que atestam que sempre trabalhou na área de estamparia gráfica. Não obstante a discussão verse sobre a regularidade formal dos formulários fornecidos para os 01/09/78 a 20/08/82; 13/09/82 a 07/02/83; e de 02/07/84 a 20/02/91 e de 08/03/93 a 28/04/95, o fato é que tais períodos poderiam ser enquadrados por mera categoria profissional nos termos do código 2.5.5 do Decreto nº 53.831/64 e no item 2.5.8 do Decreto nº 83.080/79 (labor em tipografia, linotipia, estereotipia, eletrotipia, litografia e off set, fotogravura, encadernação e impressão - indústria gráfica). Assim, não há qualquer elemento que conduza à conclusão de que o impetrante tenha agido de má-fé ou participou de esquema fraudulento ou mesmo de falsificação. Portanto, de ofício, reconheço a ocorrência de decadência, apta a tornar nulo o ato administrativo de cessação do benefício e cobrança dos valores supostamente indevidos. O benefício deve ser prontamente restabelecido e eventuais descontos devem ser devolvidos. Ante o exposto, de ofício, reconheço a hipótese de decadência para o INSS rever o ato de concessão da aposentadoria, declarando a nulidade do ato administrativo, restando prejudicada a apelação. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. DECADÊNCIA PARA O INSS REVER O ATO DE CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. DECLARAÇÃO DE NULIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO. INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO. BOA FÉ DO SEGURADO.
1. Dispõe o artigo 103 da Lei 8.213/91: “Art.103-A.O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados,salvo comprovada má-fé. §1ºNo caso deefeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.”
2. Consoante tese firmada no julgamento do tema 214/STJ, fixou-se em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários, nos termos do art. 103-A da Lei 8.213/91, acrescentado pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004
3. A aposentadoria por tempo de contribuição teve a DIB fixada em 10/03/2011 e o início do pagamento se deu no mês seguinte, ou seja, em abril de 2011, sendo que a auditoria interna da apuração de irregularidades foi instaurada em 02/10/2021e o procedimento técnico de cessação do benefício se deu a partir de 13/01/2023, após o decurso do prazo decenal estabelecido no Tema 214/STJ, de modo que operou-se a decadência para o INSS rever a concessão do benefício.
4. Não obstante a discussão verse sobre a regularidade formal dos formulários fornecidos para os 01/09/78 a 20/08/82; 13/09/82 a 07/02/83; e de 02/07/84 a 20/02/91 e de 08/03/93 a 28/04/95, o fato é que tais períodos poderiam ser enquadrados por mera categoria profissional nos termos do código 2.5.5 do Decreto nº 53.831/64 e no item 2.5.8 do Decreto nº 83.080/79 (labor em tipografia, linotipia, estereotipia, eletrotipia, litografia e off set, fotogravura, encadernação e impressão - indústria gráfica).
5. Não há qualquer elemento que conduza à conclusão de que o impetrante tenha agido de má-fé ou participou de esquema fraudulento ou mesmo de falsificação.
6. Decadência reconhecida de ofício decadência por se tratar de matéria de ordem pública, devendo ser apreciada a qualquer tempo e grau de jurisdição.
7. Ato administrativo declarado nulo. Apelação prejudicada.