APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5175755-69.2021.4.03.9999
RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP
APELANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA BRITO MARINHO
Advogado do(a) APELANTE: ESTEVAN TOSO FERRAZ - SP230862-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5175755-69.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP APELANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA BRITO MARINHO Advogado do(a) APELANTE: ESTEVAN TOSO FERRAZ - SP230862-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP (RELATOR): Trata-se de apelação interposta por MARIA APARECIDA DE SOUZA BRITO MARINHO, em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade híbrida. A r. sentença (ID 220694472) julgou parcialmente procedente o pedido e condenou o INSS a reconhecer os períodos rurais de 18/05/1971 a 13/08/1978. Condenado o réu ao pagamento de metade das custas e despesas processuais, de honorários advocatícios fixados em 10% sobre a metade do valor da causa, assim como condenou a parte autora ao pagamento de metade das custas e despesas processuais, de honorários advocatícios fixados em 10% sobre a metade do valor da causa, observada a gratuidade de justiça deferida. Em razões recursais de ID 220694479, a parte autora pugna pela reforma da sentença, para que seja julgado procedente o pedido, sustentando que faz jus ao reconhecimento da atividade rural de 18/05/1971 a 29/06/1993 e do lapso de 15/06/2010 a 11/12/2012, no qual a autora gozou de auxílio-doença, bem como à concessão da aposentadoria por idade híbrida, na forma do artigo 48, §§ 3º e 4º, da Lei 8.213/91, desde a DER, com os consectários legais. A autarquia não apresentou contrarrazões. Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5175755-69.2021.4.03.9999 RELATOR: Gab. 49 - DES. FED. ERIK GRAMSTRUP APELANTE: MARIA APARECIDA DE SOUZA BRITO MARINHO Advogado do(a) APELANTE: ESTEVAN TOSO FERRAZ - SP230862-N APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ERIK GRAMSTRUP (RELATOR): Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso. DA APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA Postula a parte autora a concessão de aposentadoria por idade, na forma híbrida (ou mista), prevista no artigo 48, §§3º e 4º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe: "Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (...) § 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008) § 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)" O texto legal não faz distinção acerca da natureza da atividade a ser exercida pelo segurado no momento imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou ao requerimento administrativo. Nesse contexto, o Eg. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp nº 1.407.613, sob a sistemática dos recursos repetitivos, adotou o entendimento no sentido de que o segurado pode somar ou mesclar os tempos para fins de obtenção do benefício de aposentadoria por idade híbrida (STJ, Segunda Turma, Recurso Especial - 1407613, Rel. Herman Benjamin, j. em 14.10.2014, DJE Data:28.11.2014). Quanto ao trabalho rural remoto, exercido anteriormente à Lei nº 8.213/91, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos, fixou a seguinte tese, com trânsito em julgado em 05/04/2021 (Tema 1007): “O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo.” Insta salientar, ainda, que em se tratando de aposentadoria por idade híbrida, não se exige a simultaneidade entre o implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja esta urbana ou rural. Nesse sentido: “PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. ART. 48, "CAPUT", E § 3º DA LEI 8.213/91. ATIVIDADE RURAL E URBANA COMPROVADAS. CONCOMITANTE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA OU RURAL COM O IMPLEMENTO DO REQUISITO ETÁRIO. INEXIGIBILIDADE. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. (...) 6. Em se tratando de aposentadoria por idade híbrida, não se exige a simultaneidade entre o implemento do requisito etário e o exercício da atividade laborativa, seja esta urbana ou rural. Precedentes do STJ e desta Corte. 7. Comprovadas as atividades rurais e urbanas pela carência exigida, e preenchida a idade necessária à concessão do benefício, faz jus a parte autora ao recebimento da aposentadoria por idade. 8. Apelação da parte autora provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.” (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5076844-17.2024.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 14/08/2024, DJEN DATA: 20/08/2024) Conclui-se, portanto, que o segurado que exerceu atividade rural e urbana poderá se aposentar por idade, na forma híbrida, desde que preenchidos os requisitos etário (65 anos para homem e 60 anos para mulher) e de carência, na forma do decidido no Tema Repetitivo 1007. CARÊNCIA Para o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social até 24/07/91, a carência deve observar a tabela progressiva do artigo 142 da Lei Federal nº. 8.213/91. Para os que ingressaram posteriormente à edição da Lei de Benefícios ou implementaram o requisito etário após 31/12/2.010, a carência será de 180 meses, a teor do que dispõe o artigo 25, inciso II, da Lei n.º 8.213/1991. Vale ressaltar, ainda, que a lei deu tratamento diferenciado ao trabalhador rural, dispensando-o do recolhimento das contribuições previdenciárias, bastando, tão-somente, a comprovação do exercício da atividade rural pelo número de meses equivalente à carência. Neste sentido, trago à colação a ementa dos seguintes julgados: “PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. TRABALHADOR RURAL. ATIVIDADE CAMPESINA COMPROVADA. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE CONTRIBUIÇÃO. ACÓRDÃO EM CONFLITO COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE. RECURSO ESPECIAL DO PARTICULAR PROVIDO. 1. No caso dos autos, a Corte de origem reformou a sentença, afirmando a necessidade de recolhimento de contribuição para o reconhecimento da aposentadoria rural, ao fundamento de que o autor preencheu o requisito etário após ter passado o prazo de 15 (quinze) anos estabelecido na norma transitória do art. 143 da Lei 8.213/1991, com a redação dada pela Lei 11.718/2008. 2. Tal entendimento, contraria, contudo a jurisprudência desta Corte que é uníssona ao reconhecer que os rurícolas foram dispensados do recolhimento das contribuições relativas ao exercício do trabalho no campo, substituindo a carência pela comprovação do efetivo desempenho do labor agrícola (arts. 26, III e 39, I da Lei 8.213/1991). 3. A norma transitória do art. 143 da Lei 8.213/1991 não prejudica os Segurados Especiais, para os quais há previsão legal específica nos termos do artigo 39, inciso I, da Lei 8.213/1991, que assegura a concessão do benefício de aposentadoria por idade no valor de um salário mínimo sem que seja exigido o recolhimento das contribuições, bastando a comprovação da atividade campesina. 4. No caso dos autos, a autora completou o requisito etário e o período de labor rural exigido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício da aposentadoria por idade, conforme reconhecido na sentença, impondo-se, assim, a concessão do benefício. 5. Recurso Especial do Particular provido para restaurar a sentença concessiva em todos os seus termos.” (REsp n. 1.558.242/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 13/12/2018, DJe de 4/2/2019.). “PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. TRABALHADOR RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. (...) - Em relação às contribuições previdenciárias, é assente o entendimento de serem desnecessárias, sendo suficiente a comprovação do efetivo exercício de atividade no meio rural. Precedentes do STJ. - Conjunto probatório suficiente à comprovação de atividade rural no período juridicamente relevante. Benefício devido. - Fica mantida a condenação do INSS a pagar honorários de advogado, cujo percentual majoro para 12% (doze por cento) sobre a condenação, excluindo-se as prestações vencidas após a data da sentença, consoante Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça e critérios do artigo 85, §§ 1º, 2º, 3º, I, e 11, do CPC. - Apelação desprovida.” (TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003384-31.2023.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Daldice Maria Santana de Almeida, julgado em 31/08/2023, DJEN DATA: 06/09/2023). SEGURADO ESPECIAL Dispõe a Lei n.º 8.213/91 acerca do tema que: “Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeirooutorgados,comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: 1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; 2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos doinciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a ebdeste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo.” DIARISTA BOIA-FRIA Segundo entendimento sedimentado pelo C. STJ quanto aos requisitos necessários à obtenção dos benefícios previdenciários, tem-se que o diarista boia-fria equipara-se ao segurado especial. É o que se vê do precedente abaixo citado: “PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENQUADRAMENTO DO TRABALHADOR BÓIA-FRIA. EQUIPARAÇÃO AO SEGURADO ESPECIAL. ART. 11, VII DA LEI 8.213/1991. DESNECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÕES. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Esta Corte consolidou a orientação de que o Trabalhador Rural, na condição de bóia-fria, equipara-se ao Segurado Especial de que trata o inciso VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, no que tange aos requisitos necessários para a obtenção de benefícios previdenciários. 2. Exigindo-se, tão somente, a apresentação de prova material, ainda que diminuta, desta que corroborada por robusta prova testemunhal, não havendo que se falar em necessidade de comprovação de recolhimentos previdenciários para fins de concessão de aposentadoria rural (REsp. 1.321.493/PR, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 19.12.2012). 3. É inegável que o trabalhador bóia-fria exerce sua atividade em flagrante desproteção, sem qualquer formalização e com o recebimento de valores ínfimos, o que demonstra a total falta de razoabilidade em se exigir que deveriam recolher contribuições previdenciárias. 4. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento.” (STJ, REsp - Recurso Especial - 1762211 2018.02.18104-5, Relator Ministro Napoleão Nunes Mais Filho - Primeira Turma, DJE DATA:07/12/2018). REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR A definição de regime de economia familiar encontra respaldo no art. 11, §1º, da Lei de Benefícios, o qual estabelece que: “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”. Extrai-se do normativo legal ser possível a utilização, pelo segurado especial, de empregados contratados, sendo certo que o §7º do mesmo artigo, limita a sua contratação a prazo determinado. No mesmo sentido, o §8º elenca as atividades que não descaracterizam a condição de segurado especial e, por fim, o §9º dispõe acerca dos rendimentos que podem ser auferidos pelos membros do grupo familiar, sem que reste descaracterizado o regime de subsistência. REGRA DE TRANSIÇÃO – EC 103/2019 A Emenda Constitucional 103/2013 traz, no seu artigo 18, regra de transição para a concessão da aposentadoria por idade aos segurados filiados ao RGPS até a data da sua entrada em vigor, em 13/12/2019. Respeitado o direito adquirido, na forma do § 1º do referido dispositivo legal, a idade mínima exigida das mulheres será acrescida de 6 (seis) meses a cada ano, aplicando-se o primeiro acréscimo a partir de janeiro de 2020, até que se atinja 62 (sessenta e dois) anos. INÍCIO DE PROVA MATERIAL Conforme art. 55, §3º, da Lei de benefícios e, nos termos da Súmula de nº 149 do STJ, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental: "A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário". A comprovação do exercício da atividade campesina pelo período correspondente ao da carência exigida deve obedecer ao disposto no art. 106, e suas alterações, da Lei nº 8.213/91. Entretanto, o rol inserto no referido artigo não é exaustivo (STJ, AgInt no AREsp n. 1.372.590/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 21/3/2019, DJe de 28/3/2019), cabendo ao Juízo, com respaldo no princípio do livre convencimento motivado, valer-se de documentos para além dos ali elencados. Ademais, considerando as precárias condições de trabalho dos lavradores, bem como as dificuldade na obtenção das provas materiais de seu labor, o C. STJ, quando do julgamento do REsp. 1.321.493/PR (Tema nº 554), realizado sob a sistemática dos recursos repetitivos, amenizou a exigência da prova, admitindo-se o início de prova material sobre parte do lapso temporal requerido, desde que corroborado por prova testemunhal robusta. Impende observar, ainda, que não se exige que a prova material se estenda por todo o período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em que foi constituído o documento (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5003274-32.2023.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Inês Virginia Prado Soares, julgado em 10/08/2023, DJEN DATA: 17/08/2023). No mesmo sentido, os documentos considerados como início de prova material devem ser contemporâneos ao lapso que se pretende ver reconhecido, vale dizer, devem ter sido produzidos de forma espontânea, no passado. Destaco, também, que o C. STJ, no julgamento do REsp n.º 1.348.633/SP, do REsp n.º 1.348.130/SP e do REsp n.º1.348.382/SP, submetidos ao regime dos recursos repetitivos (Tema n.º 638), firmou a seguinte tese: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob contraditório.”. Neste sentido é a ementa do julgado (REsp n.º 1.348.633/SP): “PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/91. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. RECONHECIMENTO A PARTIR DO DOCUMENTO MAIS ANTIGO. DESNECESSIDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONJUGADO COM PROVA TESTEMUNHAL. PERÍODO DE ATIVIDADE RURAL COINCIDENTE COM INÍCIO DE ATIVIDADE URBANA REGISTRADA EM CTPS. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A controvérsia cinge-se em saber sobre a possibilidade, ou não, de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material. 2. De acordo com o art. 400 do Código de Processo Civil "a prova testemunhal é sempre admissível, não dispondo a lei de modo diverso". Por sua vez, a Lei de Benefícios, ao disciplinar a aposentadoria por tempo de serviço, expressamente estabelece no § 3º do art. 55 que a comprovação do tempo de serviço só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, "não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento" (Súmula 149/STJ). 3. No âmbito desta Corte, é pacífico o entendimento de ser possível o reconhecimento do tempo de serviço mediante apresentação de um início de prova material, desde que corroborado por testemunhos idôneos. Precedentes. 4. A Lei de Benefícios, ao exigir um "início de prova material", teve por pressuposto assegurar o direito à contagem do tempo de atividade exercida por trabalhador rural em período anterior ao advento da Lei 8.213/91 levando em conta as dificuldades deste, notadamente hipossuficiente. 5. Ainda que inexista prova documental do período antecedente ao casamento do segurado, ocorrido em 1974, os testemunhos colhidos em juízo, conforme reconhecido pelas instâncias ordinárias, corroboraram a alegação da inicial e confirmaram o trabalho do autor desde 1967. 6. No caso concreto, mostra-se necessário decotar, dos períodos reconhecidos na sentença, alguns poucos meses em função de os autos evidenciarem os registros de contratos de trabalho urbano em datas que coincidem com o termo final dos interregnos de labor como rurícola, não impedindo, contudo, o reconhecimento do direito à aposentadoria por tempo de serviço, mormente por estar incontroversa a circunstância de que o autor cumpriu a carência devida no exercício de atividade urbana, conforme exige o inc. II do art. 25 da Lei 8.213/91. 7. Os juros de mora devem incidir em 1% ao mês, a partir da citação válida, nos termos da Súmula n. 204/STJ, por se tratar de matéria previdenciária. E, a partir do advento da Lei 11.960/09, no percentual estabelecido para caderneta de poupança. Acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do Código de Processo Civil.” (REsp n. 1.348.633/SP, relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, julgado em 28/8/2013, DJe de 5/12/2014.) Assim, possível o reconhecimento da atividade campesina do segurado anteriormente ao documento mais antigo, desde que devidamente amparado por prova oral convincente. Vale dizer, ainda, que a jurisprudência desta E. Corte é firme no sentido de ser possível o reconhecimento da atividade rural a partir dos 12 anos de idade, conforme se verifica da ementa do seguinte julgado: “PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. CONCESSÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. DESDE OS 12 ANOS DE IDADE. (...) - À comprovação da atividade rural exige-se início de prova material corroborado por robusta prova testemunhal. - É possível o reconhecimento do tempo rural comprovado desde os 12 (doze) anos de idade. (...) - Conjunto probatório suficiente para demonstrar o labor rural desde os 12 (doze) anos de idade da parte autora, independentemente do recolhimento de contribuições, exceto para fins de carência e contagem recíproca (artigo 55, § 2º, e artigo 96, inciso IV, ambos da Lei n. 8.213/1991). - Matéria preliminar rejeitada. - Apelação do INSS parcialmente provida.” (9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5081318-36.2021.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Daldice Maria Santana de Almeida, julgado em 22/07/2021, DJEN DATA: 29/07/2021) No tocante à certidão de casamento ou outros assentamentos civis em que restar consignado a profissão de agricultor ou lavrador da parte autora ou de seu cônjuge, tenho que constituem início de prova material da referida atividade rural. Por sua vez, no que tange à extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou convivente, bem como da filha solteira residente na casa paterna, é pacífico o entendimento dos Tribunais no sentido de sua aceitação, dada a vulnerabilidade e as difíceis condições enfrentadas pelo trabalhador rural. Essa extensão da qualificação, atenta à dificuldade ao que as seguradas tinham para obter documentação e comprovar sua qualidade no contexto social vigente à época dos fatos está, ademais, de acordo com o protocolo de julgamento com perspectiva de gênero editado pelo Conselho Nacional de Justiça (Resolução CNJ n. 364/2021). Neste sentido, trago a ementa do julgado proferido por esta Turma: “PREVIDENCIÁRIO: APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. ARTIGO 48, §§1º E 2º DA LEI Nº 8.213/91. REQUISITOS SATISFEITOS. COMPROVAÇÃO. (...) 8. Dúvidas não subsistem sobre a possibilidade de extensão da qualificação de lavrador de um cônjuge ao outro constante de documento apresentado, para fins de comprovação da atividade campesina, que indique, por exemplo, o marido como trabalhador rural (STJ, 3ª Seção, EREsp 1171565, relator Ministro Nefi Cordeiro, DJe 05.03.2015), especialmente quando houver documentos em seu nome que atestem sua condição de rurícola, caso em que se deve considerar todo o acervo probatório. (...) 16. Recurso desprovido, condenando o INSS ao pagamento de honorários recursais, na forma delineada. De ofício, alterados os critérios de juros de mora e correção monetária.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001786-76.2022.4.03.9999, Rel. Desembargadora Federal Inês Virginia Prado Soares, julgado em 27/04/2022, Intimação via sistema DATA: 06/05/2022) CTPS. MERAS IRREGULARIDADES. No que se refere às anotações efetuadas em CTPS, ainda que ausentes do CNIS, ressalto que constituem prova do período nela anotado e que gozam de presunção de veracidade relativa, cabendo ao INSS demonstrar eventual irregularidades para desconsiderá-las. Vale dizer que, compete à Autarquia, ante qualquer dúvida acerca da validade da anotação, produzir prova hábil a invalidá-la, não bastando à tanto a mera alegação de irregularidade nas anotações. Nesse sentido, o precedente da Jurisprudência específica da Sétima Turma: ApCiv 5002592-77.2023.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal Marcelo Vieira de Campos, julgado em 05/07/2023, DJEN DATA: 10/07/2023) CASO CONCRETO Com essas breves considerações, passo ao exame do mérito recursal. A parte autora completou 60 anos em 18/05/2017. De acordo com o disposto no artigo 142 da Lei de Benefícios, a carência exigida corresponde a 180 meses. Verifico que o processo administrativo foi juntado junto à exordial, no entanto estão ilegíveis. Desse modo, por meio da base de dados do INSS, foi possível acessá-lo na íntegra. Para comprovar o exercício de atividade rural alegada, 18/05/1971 a 29/06/1993, juntou aos autos os seguintes documentos, os quais passo a examinar: - CTPS da autora em que constam os seguintes registros de anotações de vínculos empregatícios: de 14/08/1978 a 18/08/1979 (rurícola); de 07/05/1984 a 24/08/1984 (trabalhadora rural); de 05/09/1984 a 24/10/1984 (trabalhadora rural); de 06/05/1985 a 23/08/1985 (rurícola); de 20/05/1986 a 13/08/1986 (trabalhadora rural); de 01/09/1986 a 20/12/1986 (rurícola); de 09/02/1987 a 29/06/1987 (auxiliar de produção); de 10/08/1987 a 19/08/1987 (rurícola); de 26/08/1987 a 10/09/1987 (rurícola); de 09/11/1987 a 20/11/1987 (trabalhador rural); de 13/06/1988 a 09/07/1988 (trabalhador rural); de 08/05/1980 a 15/05/1989 (trabalhador rural); de 03/06/1990 a 28/06/1991 (trabalhador rural); de 18/05/1993 a 29/06/1993 (trabalhador rural); de 01/10/1993 a 30/11/1994 (doméstica); de 01/07/1996 a 20/11/1996 (doméstica); de 01/07/1997 a 30/06/1998 (empregada doméstica); de 02/10/2000 a 10/10/2001 (serviços gerais); de 21/10/2001 a 22/12/2001 (doméstica); - Certidão de casamento da autora, celebrado em 2004. Desta feita, no que pertine à CTPS da requerente, há presunção legal da veracidade de registros ali constantes, constituindo prova plena do labor prestado, cedendo (a presunção) mediante a produção de robusta prova em sentido contrário. Por sua vez, é apta a constituir início de prova material pelos interregnos de atividade rural alegado pela parte autora. Foi produzida prova testemunhal em audiência de instrução em 12/05/2021 (ID 220694471). Em depoimento pessoal, a parte autora relatou que começou a trabalhar na roça com seu pai por volta dos 9 anos, limpava os troncos de café para poder derrubar, porém não fazia todos os dias o trabalha, ajudava sua mãe também na lida doméstica. Disse que João Almeida era o dono da propriedade em seu pai era empregado, que lá permaneceram por cerca de 4 anos. Afirmou que com 14 anos trabalhava colhendo tomate em várias propriedades, onde ia sozinha, mas não se recorda do nome das propriedades. Disse que se casou com 15 anos, que ele trabalhava de tratorista e ela cortava cana. Relatou que fazia safra, por cerca de 6 meses, mas nas entressafras trabalhava como doméstica, atividade que permanecia até início de nova safra; citou nomes de empregadores na atividade de doméstica; asseverou que sempre entressafra trabalhava, que com 18 anos casou novamente, mas já não estava em atividade em razão de estar acometida por doenças; citou que sua última ocupação foi em um restaurante, em 1999. A testemunha GILDA APARECIDA DA SILVA relatou que conhece desde seus 16 anos, por volta de 1974. Contou que casou e passou a morar numa colônia, onde foi vizinha da postulante. Relatou que, nessa época, ela trabalhava cortando cana na Usina Colombo. Ambas permaneceram lá por 3 anos, depois foram morar na cidade, (1978/1979); na cidade moravam próximas, continuaram a cortar cana, na usina colombo, trabalhando juntas por aproximadamente 18 anos, (até 1998). Afirmou que depois a autora foi trabalhar como doméstica, que ela trabalhou com cana e laranja e que tem conhecimento que a requerente laborou na lavoura até 1993/1994. Por sua vez, a testemunha RITA DE CÁSSIA VICENTE CORBIN relatou que conhece há cerca de 32 anos, tendo tido proximidade em razão se encontrarem no ponto onde os empreiteiros pegavam para trabalhar, o que ocorreu durante 5 ou 6 anos; que ela ia trabalhar durante o ano todo cortando cana. Trabalharam por volta de 20 anos na roça, moravam próximas. Relatou que trabalhou na usina até 1995/1996, enquanto a autora continuou na roça; que a postulante trabalhava na safra e no plantio. Assim sendo, o início de prova material apresentado, corroborado por robusta e coesa prova testemunhal, comprova a atividade campesina exercida pela parte autora no período de 18/05/1971 a 13/08/1978, nos termos em que exarado na r. sentença. No que tange ao interregno de 14/08/1978 a 29/06/1993, pontuo que, em que pese o relato das testemunhas corroborar o alegado pela autora na exordial, ela própria, em depoimento pessoal, afirmou que entressafras trabalhava como doméstica, aguardando o início de nova safra. Ainda citou nomes de empregadores para os quais laborou como doméstica nesses períodos. Dessa forma, o conjunto probatório dos autos se mostra desfavorável ao pleito da postulante no ponto. Ainda, no caso dos autos, cinge-se a controvérsia à possibilidade de serem considerados, para efeito de carência, os períodos em que a parte autora esteve em gozo do benefício de auxílio-doença (15/06/2010 a 11/12/2012). Tal questão foi recentemente decidida pelo C. Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário nº 1.298.832/RS, julgado em 18/02/2021, na sistemática dos recursos repetitivos, no Tema 1125 da Repercussão Geral, nos seguintes termos: “É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa.”. Na ocasião, reafirmou-se a jurisprudência dominante da Suprema Corte sobre a matéria, no sentido de ser possível o cômputo do período de recebimento de auxílio-doença como carência, desde que intercalado com atividade laboral. Por atividade laboral, entende-se tanto a atividade desenvolvida com anotação em CTPS, quanto o recolhimento de contribuições pelo segurado, consoante disposto no art. 152, inc. VII, “a” e § 13, da Portaria DIRBEN/INSS Nº 991/2022. Nesse sentido: “PREVIDENCIÁRIO/PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CÔMPUTO DO PERÍODO EM QUE O SEGURADO ESTEVE RECEBENDO BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE (ENTRE PERÍODOS DE ATIVIDADE/CONTRIBUTIVOS). POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO CONCEDIDO. APELAÇÃO DO INSS NÃO CONHECIDA EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, IMPROVIDA. 1. Pedido formulado pelo INSS referente à impossibilidade de cômputo do tempo de atividade rural para efeito de carência não conhecido, haja vista que a r. sentença monocrática se deu no mesmo sentido da pretensão do réu. 2. A concessão da aposentadoria por tempo de serviço, hoje tempo de contribuição, está condicionada ao preenchimento dos requisitos previstos nos artigos 52 e 53 da Lei nº 8.213/91. A par do tempo de serviço/contribuição, deve também o segurado comprovar o cumprimento da carência, nos termos do artigo 25, inciso II, da Lei nº 8.213/91. 3. O ponto controverso da lide no processado se restringe à possibilidade, ou não, de serem computados, para fins de tempo de contribuição, o período no qual o segurado esteve percebendo benefício por incapacidade, quando intercalados entre períodos laborais e/ou contributivos. 4. Nesse passo, coerente com as disposições do art. 29, § 5º, e art. 55, II, ambos da Lei 8.213/1991, esclareço que os incisos III e IX do art. 60 do Decreto 3.048/1999, asseguram, até que lei específica discipline a matéria, que são contados como tempo de contribuição/carência os períodos em que o segurado esteve recebendo auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez (entre períodos de atividade), bem como o período em que o segurado percebeu benefício por incapacidade por acidente do trabalho (intercalado ou não). 5. Vale ressaltar que tem sido firme o entendimento no sentido de que as expressões "tempo intercalado" ou "entre períodos de atividade" abrangem os lapsos temporais de gozo de benefício, desde que o segurado tenha retornado ao trabalho (ou reiniciado a verter contribuições previdenciárias), ainda que por curto período, seguido de nova concessão de benefício. 6. Por sua vez, consigne-se a questão em debate foi recentemente decidida pelo C. Supremo Tribunal Federal nos autos do Recurso Extraordinário nº 1.298.832/RS, julgado em 18/2/2021, na sistemática dos recursos repetitivos, no Tema 1125 da Repercussão Geral, nos seguintes termos: “É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa.”. 7.Desse modo, computado o período percebido de benefício por incapacidade acrescidos dos períodos incontroversos, constantes do CNIS/CTPS, até a data do requerimento administrativo, perfazem-se mais de trinta e cinco anos de contribuição, o que autoriza concessão da aposentadoria por tempo de contribuição integral, na forma do artigo 53, inciso II, da Lei nº 8.213/91, correspondente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício, nos termos do art. 29 da Lei 8.213/91. 8. Apelação do INSS não conhecida de parte, e, na parte conhecida, improvida.” (TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5043906-71.2021.4.03.9999, Rel. Desembargador Federal TORU YAMAMOTO, julgado em 07/12/2022, Intimação via sistema DATA: 14/12/2022). No caso em apreço, observa-se do extrato do CNIS que os auxílios-doença percebidos pela segurada foram intercalados com períodos de recolhimento de contribuições (de 01/06/2015 a 31/05/2017) e anotações de vínculos empregatícios (02/10/2000 a 10/10/2001), razão pela qual devem ser considerados para fins de carência. A soma dos interregnos em que recebeu o auxílio por incapacidade temporária às contribuições constantes do CNIS, computadas administrativamente pela autarquia, conforme Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição, assim como os períodos de anotação em CTPS, é suficiente para o cumprimento da carência legal exigida. Presentes os requisitos legais, de rigor a concessão da aposentadoria híbrida por idade. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (06/06/2019 – ID 220694446), uma vez que implementados os requisitos necessários à sua concessão a partir de tal data. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS Ademais, em sendo a parte autora beneficiária da justiça gratuita deixo de condenar o INSS ao reembolso das custas processuais, porque nenhuma verba a esse título foi paga pela parte autora e a autarquia federal é isenta e nada há a restituir. Quanto às despesas processuais, são elas devidas, à observância do disposto no artigo 11 da Lei n.º 1060/50, observando os benefícios da assistência judiciária gratuita deferida à parte autora, ficando condicionada eventual cobrança aos requisitos legais. VERBA HONORÁRIA Assim, inverto o ônus sucumbencial e condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão, nos termos dos incisos I ou II do §3º do artigo 85, do CPC/2015, da Súmula n.º 111 e o determinado no julgamento do Tema n.º 1105 do C. STJ. De acordo com a Súmula n.º 111, do C. Superior Tribunal de Justiça, nas ações previdenciárias, o marco final da incidência da verba honorária é a data da prolação da sentença: "Súmula nº 111: Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre as prestações vencidas após a sentença. O marco temporal da incidência da referida verba nas ações previdenciária foi mantido pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do Tema Repetitivo nº 1.105, em que firmou-se a seguinte tese: "Continua eficaz e aplicável o conteúdo da Súmula 111/STJ (modificado em 2006), mesmo após a vigência do CPC/2015, no que tange à fixação de honorários advocatícios". Por oportuno, colaciono a ementa do julgado: “PREVIDENCIÁRIO. REPETITIVO. TEMA 1.105. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM AÇÃO PREVIDENCIÁRIA. SÚMULA 111/STJ. VERBETE QUE CONTINUA APLICÁVEL APÓS A VIGÊNCIA DO CPC/2015. CORTE LOCAL QUE DEIXA DE OBSERVAR SÚMULA EMANADA DO STJ. CARACTERIZAÇÃO DE OFENSA AO ART. 927, IV, DO CPC. 1. O Superior Tribunal de Justiça, por suas duas Turmas de Direito Público, mantém consolidado entendimento de que, mesmo após a vigência do Código de Processo Civil de 2015, a verba honorária, nas lides previdenciárias, deve ser fixada sobre as parcelas vencidas até a data da decisão concessiva do benefício, ou seja, em consonância com a diretriz expressa na Súmula 111/STJ (conforme redação modificada em 2006). Nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.780.291/SP, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF-5), Primeira Turma, julgado em 23/8/2021, DJe de 27/8/2021; AgInt no AREsp n. 1.939.304/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 22/8/2022, DJe de 24/8/2022; AgInt nos EDcl no REsp n. 1.913.756/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 16/8/2021, DJe de 20/8/2021; AgInt no AREsp n. 1.744.398/RS, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, julgado em 14/6/2021, DJe de 17/6/2021; e AgInt no REsp 1.888.117/SP, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 8/2/2021, DJe 17/2/2021. 2. Na espécie, ao recusar a aplicação do verbete em análise, sob o fundamento de sua revogação tácita pelo CPC/2015, a Corte de origem incorreu em frontal ofensa ao art. 927, IV, desse mesmo diploma processual, no que tal regramento impõe a juízes e tribunais a observância de enunciados sumulares do STJ e do STF. 3. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 e 256-I do RISTJ, com a fixação da seguinte TESE: "Continua eficaz e aplicável o conteúdo da Súmula 111/STJ (modificado em 2006), mesmo após a vigência do CPC/2015, no que tange à fixação de honorários advocatícios". 4. Resolução do caso concreto: hipótese em que a pretensão recursal do INSS converge com a tese acima, por isso que seu recurso especial resulta provido. (REsp n. 1.880.529/SP, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Seção, julgado em 8/3/2023, DJe de 27/3/2023.) Extrai-se, portanto, do mencionado julgado que o limite para a incidência da verba honorária restou pacificado como sendo a “data da decisão concessiva do benefício”. Assim, tratando-se de concessão do benefício previdenciário no acórdão que reforma a sentença, deve ser entendido como o marco final da incidência dos honorários advocatícios a data da decisão colegiada. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA No que tange aos critérios de atualização do débito, por tratar-se de consectários legais, revestidos de natureza de ordem pública, são passíveis de alteração de ofício, conforme precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça. Neste sentido: “AGRAVO INTERNO EM RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. ART. 1º -F DA LEI 9.494/97, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 11.960.2009. NOVO ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. TEMA 810 DO STF. APLICAÇÃO DO INPC, DE OFÍCIO. AGRAVO IMPROVIDO. (...) 2. Consoante o entendimento do STJ, a correção monetária e os juros de mora, como consectários legais da condenação principal, possuem natureza de ordem pública. 3. Agravo interno não provido. Aplicação, de ofício, do entendimento exarado no RE 870.947/SE, com repercussão geral reconhecida, quanto à correção monetária nas ações previdenciárias.” (AgRg no REsp n. 1.255.604/PR, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 9/6/2020, DJe de 18/6/2020.) Assim, as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial. Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo da parte autora para reformar a sentença, julgar parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS à averbar o período de percepção do auxílio por incapacidade temporária de 15/06/2010 a 11/12/2012 para fins de deferimento do benefício, bem como à concessão da aposentadoria por idade híbrida, a partir da data do requerimento administrativo (06/06/2019), acrescidos os valores em atraso de correção monetária e juros de mora na forma acima estabelecida, além do pagamento de verba honorária fixada em 10% (dez por cento) do valor das prestações vencidas até a data do acórdão condenatório. É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. TRABALHO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL NÃO CORROBORADO POR PROVA TESTEMUNHAL. CARÊNCIA. IDADE IMPLEMENTADA. PERÍODOS DE AUXÍLIO-DOENÇA INTERCALADOS. REQUISITOS PREENCHIDOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. VERBA HONORÁRIA RECURSAL. VERBAS ACESSÓRIAS ALTERADAS DE OFÍCIO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
- O artigo 48, §§ 3º e 4º da Lei n.º 8213, de 24 de julho de 1991 dispõe que, para a obtenção da aposentadoria por idade, é necessário que o homem tenha completado 65 anos e a mulher, 60 anos.
- O artigo 142 do mesmo diploma legal traz em seu bojo a tabela relativa à carência, considerando-se o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à concessão da benesse.
- A lei deu tratamento diferenciado ao trabalhador rural, dispensando-o do período de carência por meio do recolhimento das contribuições previdenciárias, bastando, tão-somente, a comprovação do exercício da atividade rural pelo número de meses previsto na tabela progressiva do art. 142 da Lei de Benefícios.
- O art. 11, VII, da Lei de Benefícios contempla os segurados especiais.
- A definição de regime de economia familiar encontra respaldo no §1º do mesmo artigo, o qual estabelece que: “Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”.
- No tocante aos requisitos necessários à concessão dos benefícios previdenciários, o C. STJ alicerçou entendimento no sentido de equiparar o diarista boia-fria ao segurado especial, bem como quando do julgamento do REsp nº 1.407.613, sob a sistemática dos recursos repetitivos, adotou o entendimento no sentido de que o segurado pode somar ou mesclar os tempos urbano e rural para fins de obtenção do benefício de aposentadoriapor idade híbrida (STJ, Segunda Turma, Recurso Especial - 1407613, Rel. Herman Benjamin, j. em 14.10.2014, DJE Data:28.11.2014).
- O C. STJ, em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema nº 1007), também firmou entendimento no seguinte sentido: "O tempo de serviço rural, ainda que remoto e descontínuo, anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições, nos termos do artigo 48, parágrafo 3º, da Lei 8.213/1991, seja qual for a predominância do labor misto exercido no período de carência ou o tipo de trabalho exercido no momento do implemento do requisito etário ou do requerimento administrativo".
- Assim, o segurado que exerceu atividade rural e urbana poderá se aposentar por idade, na forma híbrida, desde que preenchidos os requisitos etário (65 anos para homem e 60 anos para mulher) e de carência, na forma do decidido no Tema Repetitivo 1007.
- Para a comprovação da atividade rural, é necessário que a prova testemunhal venha acompanhada de início razoável de prova documental, conforme art. 55, §3º, da Lei de benefícios e, nos termos da Súmula de nº 149 do STJ.
- A parte autora completou 60 anos em 18/05/2017. De acordo com o disposto no artigo 142 da LB, a carência exigida corresponde a 180 meses.
- A prova documental acostada aos autos comprova o desempenho da atividade rural no período de 18/05/1971 a 13/08/1978, nos termos em que exarado na r. sentença.
- O início de prova material da atividade rural da parte autora foi corroborado por prova testemunhal coesa e harmônica.
- O Supremo Tribunal Federal, nos autos do Recurso Extraordinário nº 1.298.832/RS, julgado em 18/02/2021, na sistemática dos recursos repetitivos, no Tema 1125 da Repercussão Geral, firmou o seguinte entendimento: “É constitucional o cômputo, para fins de carência, do período no qual o segurado esteve em gozo do benefício de auxílio-doença, desde que intercalado com atividade laborativa.”.
- Por atividade laboral, entende-se tanto a atividade desenvolvida com anotação em CTPS, quanto o recolhimento de contribuições pelo segurado, consoante disposto no art. 152, inc. VII, “a” e § 13, da Portaria DIRBEN/INSS Nº 991/2022. Precedente desta Corte.
- Observa-se do extrato do CNIS que os auxílios-doença percebidos pela segurada foram intercalados com períodos de recolhimento de contribuições e anotações de vínculos empregatícios, razão pela qual devem ser considerados para fins de carência
- A soma dos interregnos em que recebeu o auxílio por incapacidade temporária às contribuições constantes do CNIS, computadas administrativamente pela autarquia, conforme Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição, assim como os períodos de anotação em CTPS, é suficiente para o cumprimento da carência legal exigida.
- Requisitos preenchidos. Benefício devido.
- O termo inicial do benefício deve ser fixado na data do requerimento administrativo (06/06/2019), uma vez que implementados os requisitos necessários à sua concessão a partir de tal data.
- No que tange aos critérios de atualização do débito, por tratar-se de consectários legais, revestidos de natureza de ordem pública, são passíveis de alteração de ofício. Precedentes do C.STJ.
- Assim, as parcelas vencidas deverão ser atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora na forma estabelecida e pelos índices previstos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, alterado pela Resolução CJF nº 784/2022, de 08 de agosto de 2022, ou daquele que estiver em vigor na data da liquidação do título executivo judicial.
- Parte autora beneficiária da justiça gratuita pelo que não há que se falar em condenação do INSS ao reembolso das custas processuais.
- Quanto às despesas processuais, são elas devidas, observando a justiça gratuita deferida à parte autora.
- Inversão do ônus sucumbencial. Condenação o INSS ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação, considerados os valores vencidos até a data deste acórdão, nos termos dos incisos I ou II do §3º do artigo 85, do CPC/2015, da Súmula n.º 111 e o determinado no julgamento do Tema n.º 1105 do C. STJ.
- Apelação da parte autora parcialmente provida.