Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5008305-56.2024.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, DELEGADO DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO EM SÃO PAULO

APELADO: SERENA GERACAO S.A

Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE LAURIA DUTRA - SP157840-A

OUTROS PARTICIPANTES:

JUIZO RECORRENTE: SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO/SP - 9ª VARA FEDERAL CÍVEL
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5008305-56.2024.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, DELEGADO DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO EM SÃO PAULO

APELADO: SERENA GERACAO S.A

Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE LAURIA DUTRA - SP157840-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL em face da sentença que concedeu a ordem em mandado de segurança impetrado por SERENA GERAÇÃO S.A., desobrigar a impetrante de divulgar o relatório de transparência salarial pela impetrante, sem a concessão prévia do devido contraditório e ampla defesa pelo Ministério do Trabalho e Emprego, bem como determinar ao impetrado que se abstenha de exigir da impetrante qualquer das obrigações previstas no Decreto n° 11.795/2023 e na Portaria MTE n° 3.714/2023, inclusive de impor qualquer penalidade administrativa, multas, exposição pública de nome e/ou reputação, bem como de exigir a elaboração de Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens, por eventual descumprimento dos regulamentos ora questionados, confirmando-se a liminar anteriormente deferida.

Sustenta a apelante, preliminarmente, a incompetência da Justiça Federal, pugnando pela remessa dos autos à Justiça do Trabalho. No mérito, alega, em síntese, que a Lei 14.611/2023 estabelece a obrigatoriedade da igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de exercício de mesma função. Afirma que a necessidade de elaboração e implementação de Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens decorre de lei. Aduz que não se verifica violação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), pois os dados são apresentados de maneira agregada, impedindo a identificação de informações individuais dos empregados.

Foram apresentadas contrarrazões.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo parcial provimento do recurso.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5008305-56.2024.4.03.6100

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL, DELEGADO DA SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO TRABALHO EM SÃO PAULO

APELADO: SERENA GERACAO S.A

Advogado do(a) APELADO: ALEXANDRE LAURIA DUTRA - SP157840-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

V O T O

 

 

 O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Pretende a parte recorrente fazer valer, no caso concreto, as obrigações previstas no artigo 2º, §§ 3º e 4º, artigo 3º §§ 1º a 3º e artigo 4º, I, “b” e II, do Decreto 11.795/2023 e nos artigos 4º, 5º, 6º e 7º da Portaria MTE 3.714/2023.

Acerca da preliminar suscitada de incompetência da Justiça Federal, sendo matéria de ordem pública, passo a me manifestar.

Na hipótese, penso que a matéria não se inscreve nas atribuições jurisdicionais insculpidas no art. 114 da Constituição Federal, uma vez que a presente impugnação não tem relação direta com emprego ou trabalho, mas com encargos de índole administrativa perante órgãos da Administração Pública Federal ou em razão de exigências feitas por eles.

As honrosas competências da Justiça do Trabalho nascem de pretensões objetivas de direitos trabalhistas e assemelhados, que não se confundem com ônus, encargos e tributos de índole social das empresas e outros jurisdicionados, a serem satisfeitos perante a Administração Federal.

Portanto, o caso dos autos se inscreve na competência da Justiça Federal, conforme os ditames do art. 109, I e VIII, da nossa Carga Magna:

Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar:

(...)

VIII - os mandados de segurança e os habeas data contra ato de autoridade federal, excetuados os casos de competência dos tribunais federais;

 

Com efeito, a competência para a análise do mandado de segurança, na espécie, é da Justiça Federal, uma vez indicado como autoridade coatora o Superintendente Regional do Trabalho de São Paulo, cargo no âmbito da Administração Pública Federal.

Rejeito, portanto, a preliminar de incompetência da Justiça Federal.

No mérito, vinha manifestando meu entendimento quanto à matéria, em síntese, no sentido de vislumbrar que alguns dispositivos da portaria e do decreto regulamentar extrapolaram as normas fixadas pela Lei 14.611/2023, tais como a obrigação de publicação do relatório de transparência nos sites das próprias empregadoras ou em suas redes sociais (art. 2º, §3º do Decreto 11.795/23) e o depósito de uma cópia do plano de ação para mitigar a desigualdade na entidade sindical (art. 7º, §4º da Portaria MTE 3.714/23), entre outras questões. 

Porém, revejo o posicionamento até então adotado, passando a decidir de forma diversa, em homenagem ao princípio da colegialidade.

Pois bem.

A questão aqui discutida trata da determinação legislativa do dever de publicação semestral dos relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, consoante previsão expressa do art. 5º da Lei n. 14.611/2023.

A Lei 14.611, de 03 de julho de 2023, que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre homens e mulheres, estabeleceu as seguintes obrigações:

 

“Art. 5º Fica determinada a publicação semestral de relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios pelas pessoas jurídicas de direito privado com 100 (cem) ou mais empregados, observada a proteção de dados pessoais de que trata a Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais).

§ 1º Os relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios conterão dados anonimizados e informações que permitam a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos de direção, gerência e chefia preenchidos por mulheres e homens, acompanhados de informações que possam fornecer dados estatísticos sobre outras possíveis desigualdades decorrentes de raça, etnia, nacionalidade e idade, observada a legislação de proteção de dados pessoais e regulamento específico.

§ 2º Nas hipóteses em que for identificada desigualdade salarial ou de critérios remuneratórios, independentemente do descumprimento do disposto no art. 461 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, a pessoa jurídica de direito privado apresentará e implementará plano de ação para mitigar a desigualdade, com metas e prazos, garantida a participação de representantes das entidades sindicais e de representantes dos empregados nos locais de trabalho.

§ 3º Na hipótese de descumprimento do disposto no caput deste artigo, será aplicada multa administrativa cujo valor corresponderá a até 3% (três por cento) da folha de salários do empregador, limitado a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das sanções aplicáveis aos casos de discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens.

§ 4º O Poder Executivo federal disponibilizará de forma unificada, em plataforma digital de acesso público, observada a proteção de dados pessoais de que trata a Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), além das informações previstas no § 1º deste artigo, indicadores atualizados periodicamente sobre mercado de trabalho e renda desagregados por sexo, inclusive indicadores de violência contra a mulher, de vagas em creches públicas, de acesso à formação técnica e superior e de serviços de saúde, bem como demais dados públicos que impactem o acesso ao emprego e à renda pelas mulheres e que possam orientar a elaboração de políticas públicas.

 

Ato seguinte, foi publicado o Decreto 11.795/2023, regulamentando a lei de igualdade salarial:

Art. 2º  O Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios de que trata o inciso I do caput do art. 1º tem por finalidade a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos e deve contemplar, no mínimo, as seguintes informações:

(...)

§ 1º  Ato do Ministério do Trabalho e Emprego estabelecerá as informações que deverão constar do Relatório de que trata o caput e disporá sobre o formato e o procedimento para o seu envio.

(...)

§ 3º  O Relatório de que trata o caput deverá ser publicado nos sítios eletrônicos das próprias empresas, nas redes sociais ou em instrumentos similares, garantida a ampla divulgação para seus empregados, colaboradores e público em geral.

§ 4º  A publicação dos Relatórios deverá ocorrer nos meses de março e setembro, conforme detalhado em ato do Ministério do Trabalho e Emprego.

§ 5º  Para fins de fiscalização ou averiguação cadastral, o Ministério do Trabalho e Emprego poderá solicitar às empresas informações complementares às contidas no Relatório.

Art. 3º  Verificada a desigualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens pelo Ministério do Trabalho e Emprego, as empresas com cem ou mais empregados deverão elaborar e implementar Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens, que deverá estabelecer:

(...)

§ 1º  Na elaboração e na implementação do Plano de Ação de que trata o caput, deverá ser garantida a participação de representantes das entidades sindicais e dos empregados, preferencialmente, na forma definida em norma coletiva de trabalho. 

§ 2º  Na ausência de previsão específica em norma coletiva de trabalho, a participação referida no § 1º se dará, preferencialmente, por meio da comissão de empregados estabelecida nos termos dos art. 510-A a art. 510-D da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943.

§ 3º  Na hipótese do § 2º, a empresa que tiver entre cem e duzentos empregados poderá promover procedimento eleitoral específico para instituir uma comissão que garanta a participação efetiva de representantes dos empregados. 

Art. 4º  Compete ao Ministério do Trabalho e Emprego:

I - disponibilizar ferramenta informatizada para:

a) o envio dos Relatórios de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios pelas empresas; e

b) a divulgação  dos Relatórios e de outros dados e informações sobre o acesso ao emprego e à renda pelas mulheres;

II - notificar, quando verificada desigualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, por meio da Auditoria-Fiscal do Trabalho, as empresas para que elaborem, no prazo de noventa dias, o Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens;

 

Por fim, a Portaria MTE 3.714/2023, no intuito de regulamentar o Decreto 11.795/2023, foi editada com a seguinte redação: 

 

Art. 4º A publicação do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios deverá ser feita pelos empregadores em seus sítios eletrônicos, em suas redes sociais ou em instrumentos similares, sempre em local visível, garantida a ampla divulgação para seus empregados, trabalhadores e público em geral.

Art. 5º O Ministério do Trabalho e Emprego coletará os dados inseridos no eSocial pelos empregadores, bem como as informações complementares por eles prestadas e publicará o Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, nos meses de março e setembro de cada ano, na plataforma do Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho.

Parágrafo único. As informações complementares a que se refere o caput serão prestadas pelos empregadores, em ferramenta informatizada disponibilizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, nos meses de fevereiro e agosto de cada ano, relativas ao primeiro e ao segundo semestres, respectivamente.

Art. 6º A publicação do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será obrigatória após a disponibilização da aba Igualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios a ser implementada na área do empregador do Portal Emprega Brasil.

(...)

Art. 7º Após a publicação do Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios, nos termos do Decreto nº 11.795, de 2023, verificada a desigualdade salarial e de critérios de remuneração, os empregadores serão notificados, pela Auditoria-Fiscal do Trabalho, para que elaborem, no prazo de noventa dias, o Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens.

(...)

§ 4º Uma cópia do Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens deverá ser depositada na entidade sindical representativa da categoria profissional.” 

 

Não há, portanto, que se falar em ilegalidade no Decreto n. 11.795/2023 e na Portaria MTE n. 3.714/2023, dado que tais normas não extrapolaram as normas fixadas pela Lei 14.611/2023, sendo certo que os deveres de publicidade e de igualdade de gênero decorrem da lei e da Constituição Federal, de modo que se mostra devida a observância da transparência na situação em questão.

Registre-se, ainda, que os atos normativos em questão revelam que os dados utilizados para a elaboração do relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios por parte do MTE serão obtidos a partir de informações prestadas pelos próprios empregadores.

Por fim, não há que se falar em violação ao disposto na Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), uma vez que o próprio diploma legal autoriza o tratamento de dados pessoais pela Administração Pública, na hipótese em que “necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em contratos, convênios ou instrumentos congêneres” (art. 7º, III). 

Confira-se julgados desta e. C. Regional acerca do tema:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. DECRETO N. 11.795/2023 E NA PORTARIA MTE N. 3.714/2023. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. REGULAMENTAÇÃO DA LEI N. 14.611/2023. RECURSO DESPROVIDO. 

1 - A controvérsia gira em torno, fundamentalmente, das alegadas ilegalidade e inconstitucionalidade das exigências constantes no Decreto n. 11.795/2023 e na Portaria MTE n. 3.714/2023, que versam sobre questões de igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens, com impactos em possíveis e eventuais autuações e multas em inspeções por Auditores-Fiscais do Trabalho. 

2 - Com efeito, trata-se de determinação legislativa o dever de publicação semestral dos relatórios de transparência salarial e de critérios remuneratórios, consoante previsão expressa do art. 5º da Lei n. 14.611/2023. Nesse sentido, o Decreto n. 11.795/2023 sobreveio com intuito de regulamentar o texto legislativo. Por sua vez, sobreveio a Portaria MTE n. 3.714/2023. 

3 - Destarte, não há que se falar em ilegalidade no Decreto n. 11.795/2023 e na Portaria MTE n. 3.714/2023, dado que tais normas não extrapolam o poder regulamentar decorrente de lei. 

4 - Ademais, cumpre ressaltar que os deveres de publicidade e de igualdade de gênero decorrem tanto do diploma legal citado quanto do próprio texto constitucional, tornando devida a observância da transparência na situação em exame. 

5 - No que tange ao questionamento acerca da aplicabilidade da Lei n. 14.611/2023, tal somente poderia ocorrer em decorrência de alegação de interpretação divergente – que não se faz presente no caso em apreço – ou por inconstitucionalidade, a qual, no entanto, não pode ser analisada por decisão monocrática, diante da existência de cláusula de reserva de plenário em relação a essa questão, consoante o disposto na Súmula vinculante n. 10 do Supremo Tribunal Federal. 

6 - Impende, contudo, salientar que é descabida a alegação de inobservância dos princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa por parte do texto legal mencionado e de seus respectivos decreto e portaria regulamentadores, dado que os dados utilizados para a elaboração do relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios por parte Ministério do Trabalho e Emprego serão extraídos das informações prestadas pelos próprios empregadores. 

7 - Por fim, não há que se falar em violação ao disposto na Lei n. 13.709/2018, dado que a própria Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais mencionada autoriza o tratamento de dados pessoais pela administração pública. 

8 - Recurso desprovido.  

(TRF3, 3ª Turma, AI 5009856-38.2024.4.03.0000, Rel. Des. Fed. CARLOS DELGADO, j. 26/08/2024, DJEN DATA: 29/08/2024) 

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE CONHECIMENTO - PUBLICAÇÃO DE RELATÓRIO DE TRANSPARÊNCIA SALARIAL - PODER REGULAMENTAR - RECURSO NÃO PROVIDO. 

1 - Previsão legal garantindo a publicação de relatório de transparência, observada a anonimidade dos dados, conforme protocolo de fiscalização contra discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre homens e mulheres estabelecido em Ato do Poder Executivo, respeitando-se, a um só tempo, os ditames da LGPD, bem como o postulado da igualdade material em matéria de percepção de contraprestação salarial entre homens e mulheres, razão pela qual não se vislumbra, neste juízo de cognição sumária, afronta aos direitos fundamentais à privacidade e à intimidade dos empregados vinculados às empresas representadas pela agravante. 

2 - Os atos administrativos atacados não proibiram as pessoas jurídicas de procederem a eventual diferenciação salarial porventura existente entre os seus empregados e colaboradores nos veículos apropriados (mídia, redes sociais e congêneres), significando que a sua realização consiste em faculdade colocada à disposição da empresa, caso seja do seu interesse. 

3 - Os atos infralegais apenas estabeleceram a moldura necessária para o cumprimento das prescrições legais, afastando-se a alegação de excesso de poder, abuso de poder ou desvio de finalidade na sua elaboração e aplicação. 

4 - Agravo interno prejudicado. Agravo de instrumento não provido. 

(TRF3, 6ª Turma, AI 5011059-35.2024.4.03.0000, Rel. Des. Fed. MAIRAN MAIA, j. 29/11/2024, DJEN DATA: 11/12/2024) 

 

Também não antevejo ilegalidade na obrigação de apresentação do plano de ação para mitigar a desigualdade, pois devidamente previsto no art. 5º, §2º, da Lei 14.611/23 e aparentemente coerente com o objetivo da norma.

Ante o exposto, rejeito a preliminar de incompetência da Justiça Federal e dou provimento à remessa necessária e à apelação.

É o voto.

 



E M E N T A

 

 

MANDADO DE SEGURANÇA. APELAÇÃO. REEXAME NECESSÁRIO. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RELATÓRIO DE TRANSPARÊNCIA SALARIAL. LEI 14.611/23. DECRETO 11.795/23 E PORTARIA MTE 3.714/23. PODER REGULAMENTAR QUE NÃO EXTRAPOLA AS BALIZAS DA LEI. EMESSA OFICIAL E APELAÇÃO PROVIDAS.

- A matéria não se inscreve nas atribuições jurisdicionais insculpidas no art. 114 da Constituição Federal, uma vez que a presente impugnação não tem relação direta com emprego ou trabalho, mas com encargos de índole administrativa perante órgãos da Administração Pública Federal ou em razão de exigências feitas por eles.

- As honrosas competências da Justiça do Trabalho nascem de pretensões objetivas de direitos trabalhistas e assemelhados, que não se confundem com ônus, encargos e tributos de índole social das empresas e outros jurisdicionados, a serem satisfeitos perante a Administração Federal.

- Com efeito, a competência para a análise do mandado de segurança, na espécie, é da Justiça Federal, uma vez indicado como autoridade coatora o Superintendente Regional do Trabalho de São Paulo, cargo no âmbito da Administração Pública Federal.

- Pretende a parte recorrente fazer valer, no caso concreto, as obrigações previstas no artigo 2º, §§ 3º e 4º, artigo 3º §§ 1º a 3º e artigo 4º, I, “b” e II, do Decreto 11.795/2023 e nos artigos 4º, 5º, 6º e 7º da Portaria MTE 3.714/2023.

- Não há que se falar em ilegalidade no Decreto n. 11.795/2023 e na Portaria MTE n. 3.714/2023, dado que tais normas não extrapolaram as normas fixadas pela Lei 14.611/2023, sendo certo que os deveres de publicidade e de igualdade de gênero decorrem da lei e da Constituição Federal, de modo que se mostra devida a observância da transparência na situação em questão.

- De se registrar, ainda, que os atos normativos em questão revelam que os dados utilizados para a elaboração do relatório de transparência salarial e de critérios remuneratórios por parte do MTE serão obtidos a partir de informações prestadas pelos próprios empregadores.

- Não há que se falar em violação ao disposto na Lei 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), uma vez que o próprio diploma legal autoriza o tratamento de dados pessoais pela Administração Pública, na hipótese em que “necessários à execução de políticas públicas previstas em leis e regulamentos ou respaldadas em contratos, convênios ou instrumentos congêneres” (art. 7º, III). 

- Não se antevê ilegalidade na obrigação de apresentação do plano de ação para mitigar a desigualdade, pois devidamente previsto no art. 5º, §2º, da Lei 14.611/23 e aparentemente coerente com o objetivo da norma.

- Preliminar de incompetência da Justiça Federal rejeitada.

- Remessa oficial e apelação providas. 

 

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, rejeitou a preliminar de incompetência e deu provimento à remessa oficial e à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
Desembargador Federal