Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008763-49.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA

APELANTE: SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE LTDA., PEACH TREE PARTICIPACOES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS E RURAIS LTDA.

Advogados do(a) APELANTE: RICARDO PIEDADE NOVAES - SP196356-A, RUI MEDEIROS TAVARES DE LIMA - SP301551-A
Advogados do(a) APELANTE: ANDRE ALVES DE MELO - RJ145859-A, MAURICIO BARROS - SP183724-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5008763-49.2019.4.03.6100

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA

APELANTE: SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE LTDA., PEACH TREE PARTICIPACOES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS E RURAIS LTDA.

Advogados do(a) APELANTE: RICARDO PIEDADE NOVAES - SP196356-A, RUI MEDEIROS TAVARES DE LIMA - SP301551-A
Advogados do(a) APELANTE: ANDRE ALVES DE MELO - RJ145859-A, MAURICIO BARROS - SP183724-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

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R E L A T Ó R I O

 

A Desembargadora Federal Giselle França:

Trata-se de ação pelo procedimento comum com o objetivo de anular auto de infração. Valor da causa em 20/05/2019: R$ 16.825.302,43 (fls. 135, ID 261464092).

A r. sentença (ID 261464798), integrada em embargos de declaração (ID 261464807), julgou o pedido inicial improcedente. Condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de 10% do valor dado à causa.

Apelação da SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE EIRELI (ID 261464813), na qual reitera que a “questão fática de fundo é incontroversa nos autos: a atividade da autora envolve a mera comercialização/revenda de licença de uso de programas de computador do tipo não personalizado (software de prateleira). A ausência de transferência de tecnologia foi reconhecida já na fase administrativa (CARF) e não é discutida nestes autos”. Frisa que, na esfera administrativa, foi afastada a exigência da CIDE com fundamento no artigo 2º, § 1º, da Lei Federal nº. 10.168/00.

Defende que as remessas ao exterior a título de licença de comercialização não envolvem conhecimentos tecnológicos nem tampouco transferência de tecnologia ou royalties, de sorte que estão excluídas da incidência da CIDE. Isso porque o fato gerador da CIDE é o conhecimento tecnológico (artigo 2º da Lei Federal nº. 10.168/00).

Pontua que a “aquisição para revenda de um produto “fechado e acabado” – de prateleira – jamais pode ser tida como se transferência de conhecimento tecnológico fosse”. Sustenta, com base na legislação de regência e sua regulamentação, que a tributação apenas ocorre com efetiva transferência de tecnologia.

Aduz que o artigo 20 da Lei Federal nº. 11.452/07 explicitou que a hipótese é de não-incidência tributária. Afirma que se trata de norma interpretativa, que apenas expõe o que já se podia concluir a partir da legislação vigente. Sendo interpretativa, aplica-se a fatos pretéritos por força do artigo 106, inciso I, do Código Tributário Nacional.

Anota que a União desistiu de recurso em caso idêntico em trâmite perante o Superior Tribunal de Justiça: REsp nº. 1.641.775. Assim, a adoção de conduta diversa implica ofensa ao princípio da igualdade tributária. Cita, aqui, precedentes favoráveis desta Corte Regional.

Suscita a inconstitucionalidade da exigência da CIDE em hipóteses nas quais não ocorra efetiva transferência de tecnologia por ofensa ao princípio da referibilidade, constante do artigo 149 da Constituição.

Pugna pelo sobrestamento do feito em decorrência do reconhecimento da repercussão geral no Tema nº. 914-STF.

Aponta a nulidade de autuação por modificação do enquadramento legal. Isso porque no auto de infração se anota ser devida a tributação sobre “royalties decorrentes de licença de uso de conhecimentos tecnológicos” enquanto as decisões administrativas referem a incidência tributária sobre “licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programas de computador”.

Subsidiariamente, pugna pelo afastamento da multa, na medida que a decisão administrativa foi dada por maioria a partir do voto de qualidade do Presidente nos termos do artigo 25 do Decreto nº. 70.235/72.

Ainda subsidiariamente, requer a exclusão do IRRF da base de cálculo da CIDE.

Por fim, pugna pela redução da verba honorária com fundamento no princípio da equidade.

Apelação da PEACH TREE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E RURAIS LTDA. (terceira interessada – ID 261464817), na qual aponta contradição da r. sentença face os precedentes em sentido contrário citados durante a instrução, nos quais se reconhece a inviabilidade da incidência da CIDE sobre contratos de licença de uso.

Também aponta contradição ao artigo 21 da Lei Federal nº. 11.452/07, que determina que as alterações realizadas na Lei Federal nº. 10.168/00 apenas vigem a partir de janeiro/2006. Aqui, refere que o auto de infração diz com fatos geradores ocorridos em 2004 e 2005, de sorte que não poderia estar submetidos à nova Lei.

Reitera que o CARF reconheceu que a atividade exercida pela autora é de comercialização e distribuição de softwares, sem transferência de tecnologia.

Argumenta com a nulidade dos autos de infração por alteração de fundamentação jurídica.

Contrarrazões (ID 261464827), sem preliminares.

Nesta Corte Regional, foi indeferido o pedido de levantamento parcial dos depósitos judiciais (ID 285317707).

SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMÉRCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE LTDA. interpôs agravo interno (ID 294446615), no qual reitera que apresentou Pedido de Revisão de Dívida Inscrita (PRDI), o qual foi provido pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional para excluir as multas, dado que o julgamento no CARF se deu por voto de qualidade. Defende que, com a redução da imputação mediante retificação da CDA, deve ocorrer a necessária equalização dos depósitos judiciais, com a liberação do quanto excede o necessário para a garantia do débito atual.

Resposta ao agravo interno (ID 295493345).

Em 13/05/2025 foi apresentada Sustentação Oral em vídeo (ID 324273280).

É o relatório.

 

 

 

 

 

 


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V O T O

 

 

A Desembargadora Federal Giselle França:

1) Preliminar – sobrestamento.

O Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral da matéria nos seguintes termos:

“Tema 914 - Constitucionalidade da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE sobre remessas ao exterior, instituída pela Lei 10.168/2000, posteriormente alterada pela Lei 10.332/2001”.

Não foi determinado o sobrestamento de julgamentos, de sorte que é regular o prosseguimento com o julgamento da matéria.

2) Preliminar – voto de qualidade – perda superveniente de objeto.

Com a edição da Lei Federal nº. 14.689/23, foi incluído o § 9º-A ao artigo 25 do Decreto nº. 70.235/72, com determinação da exclusão de multas nas hipóteses de julgamento administrativo por maioria com voto de qualidade do Presidente. Veja-se:

Art. 25. O julgamento do processo de exigência de tributos ou contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal compete:

(...)

§ 9º. Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-Presidente, por representantes dos contribuintes. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

§ 9º-A. Ficam excluídas as multas e cancelada a representação fiscal para os fins penais de que trata o art. 83 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, na hipótese de julgamento de processo administrativo fiscal resolvido favoravelmente à Fazenda Pública pelo voto de qualidade previsto no § 9º deste artigo.   (Incluído pela Lei nº 14.689, de 2023)

Consoante artigo 15 da Lei Federal nº. 14.689/23, a exclusão das multas se aplica inclusive a julgamentos pretéritos:

Art. 15. O disposto no § 9º-A do art. 25 do Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972, aplica-se inclusive aos casos já julgados pelo Carf e ainda pendentes de apreciação do mérito pelo Tribunal Regional Federal competente na data da publicação desta Lei. 

No caso concreto, a União informou a exclusão administrativa da multa na forma do artigo 15 da Lei Federal nº. 14.689/23 (artigo1/2, ID 285027632), verbis:

“Em consulta ao PA nº 10882.001259/2009-90, verifica-se que, de fato, nele consta o DESPACHO/PGFN/PRFN3/DIDAU, proferido em 13 de dezembro de 2023, por meio do qual a Divisão da Dívida Ativa da União na 3ª Região deferiu o requerimento de reanálise de débitos inscritos em dívida ativa para adequar a inscrição nº 80 6 19 209146-89 ao novel artigo 15 da Lei nº 14.689/2023, excluindo os débitos que apresentem natureza de “multa ex-officio”. Consultando-se o Sistema da Dívida Ativa da PGFN, é possível verificar que, em 08/01/2024, procedeu-se à exclusão dos referidos débitos, constando atualmente o valor de R$ 13.444.542,49 (em 02/02/2024, conforme documento anexo)”.

Nesse quadro, diante do acolhimento administrativo da pretensão, ocorreu a perda superveniente deste capítulo da irresignação da apelante SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE EIRELI.

3) Mérito – arguição de inconstitucionalidade.

De acordo com entendimento do Supremo Tribunal Federal, a contribuição instituída pela Lei Federal nº. 10.168/00 possui natureza jurídica de CIDE, sendo possível a sua instituição por meio de legislação ordinária e sendo inexigível referibilidade:

EMENTA DIREITO TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. LEI Nº 10.168/2000. DESNECESSIDADE DE VINCULAÇÃO DIRETA ENTRE O CONTRIBUINTE E O BENEFÍCIO PROPORCIONADO PELAS RECEITAS ARRECADADAS. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO 16.8.2006. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal consolidou-se no sentido de que a Lei nº 10.168/2000 instituiu contribuição de intervenção no domínio econômico (CIDE). Afigura-se, pois, desnecessária a edição de lei complementar para sua criação, assim como é prescindível, nos termos da jurisprudência desta Excelsa Corte, a existência de vinculação direta entre o contribuinte e o benefício proporcionado pelas receitas tributárias arrecadadas. Agravo regimental conhecido e não provido.

(STF, 1ª Turma, RE 632832 AgR, j. 12-08-2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-167  DIVULG 28-08-2014  PUBLIC 29-08-2014, Rel. Min. ROSA WEBER).

EMENTA Agravo regimental nos embargos de declaração no agravo de instrumento. Negativa de prestação jurisdicional. CIDE. Lei nº 10.168/2000. Dispensa de LC. Precedentes.

1. Não houve negativa de prestação jurisdicional ou inexistência de motivação no decisum, uma vez que a jurisdição foi prestada, no caso, mediante decisão suficientemente fundamentada, não obstante contrária à pretensão da agravante.

2. A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal assentou que é constitucional a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico instituída pela Lei nº 10.168/2000, em razão de ser dispensável a edição de lei complementar para a instituição dessa espécie tributária e a vinculação direta entre os benefícios dela decorrentes e o contribuinte.

3. Agravo regimental não provido.

(STF, 1ª Turma, AI 737858 ED-AgR, j. 06-11-2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-240 DIVULG 06-12-2012 PUBLIC 07-12-2012, Rel. Min. DIAS TOFFOLI).

DIREITO TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR E VINCULAÇÃO À ATIVIDADE ECONÔMICA: DESNECESSIDADE. ARTS. 5º, XXXV, LIV e LV, e 93, IX, DA CF/88: OFENSA INDIRETA.

1. O Supremo Tribunal Federal entende que é constitucional a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico instituída pela Lei 10.168/2000 em razão de ser dispensável a edição de lei complementar para a instituição dessa espécie tributária, e desnecessária a vinculação direta entre os benefícios dela decorrentes e o contribuinte. Precedentes.

2. A jurisprudência desta Corte está sedimentada no sentido de que as alegações de ofensa a incisos do artigo 5º da Constituição Federal – legalidade, prestação jurisdicional, direito adquirido, ato jurídico perfeito, limites da coisa julgada, devido processo legal, contraditório e ampla defesa – podem configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, circunstância essa que impede a utilização do recurso extraordinário.

3. O fato de a decisão ter sido contrária aos interesses da parte não configura ofensa ao art. 93, IX, da Constituição Federal.

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STF, 2ª Turma, RE 492353 AgR, j. 22-02-2011, DJe-048 DIVULG 14-03-2011 PUBLIC 15-03-2011 EMENT VOL-02481-01 PP-00169 RJTJRS v. 46, n. 280, 2011, p. 37-40, Rel. Min. ELLEN GRACIE).

Portanto, rejeita-se a arguição de inconstitucionalidade.

4) Mérito – hipótese de incidência tributária.

A Lei Federal nº. 10.168/00 assim determina:

Art. 1º. Fica instituído o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação, cujo objetivo principal é estimular o desenvolvimento tecnológico brasileiro, mediante programas de pesquisa científica e tecnológica cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo.

Art. 2º. Para fins de atendimento ao Programa de que trata o artigo anterior, fica instituída contribuição de intervenção no domínio econômico, devida pela pessoa jurídica detentora de licença de uso ou adquirente de conhecimentos tecnológicos, bem como aquela signatária de contratos que impliquem transferência de tecnologia, firmados com residentes ou domiciliados no exterior. (Vide Decreto nº 6.233, de 2007) (Vide Medida Provisória nº 510, de 2010)

§ 1º. Consideram-se, para fins desta Lei, contratos de transferência de tecnologia os relativos à exploração de patentes ou de uso de marcas e os de fornecimento de tecnologia e prestação de assistência técnica.

§ 1º-A. A contribuição de que trata este artigo não incide sobre a remuneração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador, salvo quando envolverem a transferência da correspondente tecnologia. (Incluído pela Lei nº 11.452, de 2007)

§ 2º. A partir de 1º de janeiro de 2002, a contribuição de que trata o caput deste artigo passa a ser devida também pelas pessoas jurídicas signatárias de contratos que tenham por objeto serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes a serem prestados por residentes ou domiciliados no exterior, bem assim pelas pessoas jurídicas que pagarem, creditarem, entregarem, empregarem ou remeterem royalties, a qualquer título, a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior. (Redação da pela Lei nº 10.332, de 2001)

§ 3º. A contribuição incidirá sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, a cada mês, a residentes ou domiciliados no exterior, a título de remuneração decorrente das obrigações indicadas no caput e no § 2º deste artigo. (Redação da pela Lei nº 10.332, de 2001)

§ 4º. A alíquota da contribuição será de 10% (dez por cento). (Redação da pela Lei nº 10.332, de 2001)

§ 5º. O pagamento da contribuição será efetuado até o último dia útil da quinzena subseqüente ao mês de ocorrência do fato gerador. (Incluído pela Lei nº 10.332, de 2001).

Por primeiro, é importante consignar que a definição do fato gerador é dado pela legislação tributária, que não pode desnaturar institutos de direito privado conforme artigo 110 do Código Tributário Nacional.

O fato gerador da CIDE-Tecnologia está explicitado no artigo 2º da Lei Federal nº. 10.168/01, o qual não foi objeto de alteração legislativa. Abrange: (1) licença de uso de conhecimento tecnológico; (2) aquisição de conhecimento tecnológico; (3) assinatura de contratos que impliquem transferência de tecnologia.

Ao definir o fato gerador tributário, a Lei Federal nº. 10.168/01 não se utilizou de definições privadas, mas apenas fez referência a contratos firmados entre particulares. Não há conflito de leis, mas, sim aplicação complementar.

Paralelamente, com a edição da Lei Federal nº. 11.452/07, inseriu-se o § 1º-A no artigo 2º da Lei Federal nº. 10.168/01, de sorte a excluir da tributação a “remuneração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador, salvo quando envolverem a transferência da correspondente tecnologia”.

O artigo 2º, § 1º-A da Lei Federal nº. 10.168/01 é norma de exclusão do crédito tributário que, nos termos do artigo 111 do Código Tributário Nacional, deve ser interpretada de forma literal. Sendo assim, considerando que a vigência da alteração legislativa se deu em 28/02/2007, data de publicação da Lei Federal nº. 11.452/07 (artigo 21), apenas abrange os fatos geradores ocorridos posteriormente.

Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 2. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC/1973. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA N. 284/STF. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282/STF. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO. CIDE - REMESSAS. ART. 2º, CAPUT E §1º, DA LEI N. 10.168/2000 E ART. 10, I, DO DECRETO N. 4.195/2002. INCIDÊNCIA SOBRE O PAGAMENTO A BENEFICIÁRIO NO EXTERIOR PELA EXPLORAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS RELATIVOS A PROGRAMAS DE COMPUTADOR (SOFTWARE) AINDA QUE DESACOMPANHADOS DA "TRANSFERÊNCIA DA CORRESPONDENTE TECNOLOGIA". ISENÇÃO APENAS PARA OS FATOS GERADORES POSTERIORES A 31.12.2005. ART. 20, DA LEI N. 11.452/2007. SIGNIFICADOS DAS EXPRESSÕES: "TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA", "TRANSFERÊNCIA DA CORRESPONDENTE TECNOLOGIA", "FORNECIMENTO DE TECNOLOGIA" E "ABSORÇÃO DE TECNOLOGIA".

1. Não merece conhecimento o recurso especial que aponta violação ao art. 535, do CPC, sem, na própria peça, individualizar o erro, a obscuridade, a contradição ou a omissão ocorridas no acórdão proferido pela Corte de Origem, bem como sua relevância para a solução da controvérsia apresentada nos autos. Incidência da Súmula n. 284/STF: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia".

2. Ausente o prequestionamento dos seguintes dispositivos legais: arts. 6º e 10, da Lei n. 9.279/96. Incidência da Súmula n. 282/STF quanto ao ponto: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada".

3. Também afastado o conhecimento do especial com relação aos temas constitucionais, a saber: a inexistência do fundo respectivo consoante o procedimento previsto no ADCT da CF/88, a caracterização da CIDE como imposto e demais inconstitucionalidades apontadas daí derivadas. Nesse sentido, os precedentes: AgRg no REsp 1496436 / RS, Primeira Turma, Rel. Min. Sérgio Kukina, julgado em 28.04.2015; AgRg no Ag 1294641 / MG, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 19.10.2010; REsp 1121302 / RS, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 20.04.2010.

4. O fato gerador da CIDE - Remessas é haver pagamento a residente ou domiciliado no exterior a fim de remunerar (art. 2º, caput e §§2º e 3º, da Lei n. 10.168/2000): a) a detenção da licença de uso de conhecimentos tecnológicos (art. 2º, caput, da Lei n. 10.168/2000); b) a aquisição de conhecimentos tecnológicos (art. 2º, caput, da Lei n. 10.168/2000); c) a "transferência de tecnologia" (art. 2º, caput, da Lei n. 10.168/2000) que, para este exclusivo fim, compreende c.1) a exploração de patentes (art. 2º, §1º, primeira parte, da Lei n. 10.168/2000); ou c.2) o uso de marcas (art. 2º, §1º, primeira parte, da Lei n. 10.168/2000); ou c.3) o "fornecimento de tecnologia" (art. 2º, §1º, segunda parte, da Lei n. 10.168/2000); ou c.4) a prestação de assistência técnica (art. 2º, §1º, terceira parte, da Lei n. 10.168/2000); d) a prestação de serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes (art. 2º, §2º, da Lei n. 10.168/2000); ou e) royalties, a qualquer título (art. 2º, §2º, da Lei n. 10.168/2000).

5. Por especialidade (expressão "para fins desta Lei" contida no art. 2º, §1º, da Lei n. 10.168/2000 - Lei da CIDE - Remessas), o conceito de "transferência de tecnologia" previsto no art. 2º, caput, da Lei n. 10.168/2000 não coincide com aquele adotado pelo art. 11 e parágrafo único, da Lei n. 9.609/98 ("Lei do software"). O primeiro não exige a "absorção da tecnologia", já o segundo, sim.

6. Desse modo, exclusivamente para os fins da incidência da CIDE - Remessas, o art. 2º, §1º, da Lei n. 10.168/2000 expressamente não exigiu a entrega dos dados técnicos necessários à "absorção da tecnologia" para caracterizar o fato gerador da exação, contentando-se com a existência do mero "fornecimento de tecnologia" em suas mais variadas formas.

7. Nessa linha, o "fornecimento de tecnologia" de que fala o art. 2º, §1º, da Lei n. 10.168/2000 também engloba a aquisição dos direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador, isto porque para ser comercializada a tecnologia precisa primeiramente ser de algum modo fornecida a quem a comercializará. Não há aqui, por especialidade, a necessidade de "absorção da tecnologia" (exigência apenas do art. 11 e parágrafo único, da Lei n. 9.609/98).

8. Consoante o art. 2º, §5º, da Lei n. 9.609/98, os direitos de autor abrangem qualquer forma de transferência da cópia do programa (software). O que há, portanto, nos contratos de distribuição de software proveniente do estrangeiro, é uma remuneração pela exploração de direitos autorais, seja diretamente ao autor, seja a terceiro a título de royalties, o que se enquadra no conceito de "fornecimento de tecnologia" previsto no art. 2º, §1º, da Lei n. 10.168/2000, pois há o fornecimento a adquirente no Brasil da cópia do programa pelo autor ou por terceiro que explora os direitos autorais no estrangeiro. Em suma: o fornecimento de cópia do programa (software) é "fornecimento de tecnologia", ainda que não haja a "absorção da tecnologia" (acesso ao código fonte) por quem a recebe.

9. A isenção para a remessa ao exterior da remuneração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador (software) desacompanhada da "transferência da correspondente tecnologia" ("absorção da tecnologia") somente adveio a partir de 1º de janeiro de 2006, com o art. 20, da Lei n. 11.452/2007, ao adicionar o §1º-A ao art. 2º, da Lei n. 10.168/2000.

10. Não há qualquer contradição deste raciocínio com as finalidades da Lei n. 10.168/2000 de incentivar o desenvolvimento tecnológico nacional, visto que a contribuição CIDE - Remessas onera a importação da tecnologia estrangeira nas mais variadas formas. O objetivo então é fazer com que a tecnologia (nas várias vertentes: licença, conhecimento/comercialização, transferência) seja adquirida no mercado nacional e não no exterior, evitando-se as remessas de remuneração ou royalties. Tal a intervenção no domínio econômico. Precedente: REsp 1.186.160-SP, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 26.08.2010.

11. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.

(STJ, 2ª Turma REsp n. 1.642.249/SP, j. 15/08/2017, DJe de 23/10/2017, rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).

Esse também é o atual entendimento desta Corte Regional:

PROCESSUAL CIVIL, DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO - AGRAVO INTERNO - CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO - CIDE - REMESSA DE VALORES AO EXTERIOR - REMUNERAÇÃO DE LICENÇA POR USO DE OBRA INTELECTUAL (PROGRAMA DE COMPUTADOR - "SOFTWARE") - PRESTAÇÃO DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E ADMINISTRATIVA - CRITÉRIOS PREVISTOS NAS LEIS NºS. 10.168/2000 e 10.332/2001 - REFERIBILIDADE - DESNECESSIDADE - VIOLAÇÃO AO GATT E GATS NÃO VERIFICADA - RECURSO NÃO PROVIDO.

1. A instituição da CIDE prescinde de Lei Complementar. Inteligência dos arts. 149 e 146, caput e inciso III, da Constituição Federal.

2. A exação tem natureza de intervenção do Estado no domínio econômico, que por sua própria natureza incide, igualmente, no desenvolvimento social.

3. In casu, afirmam as próprias impetrantes que “realizam regularmente remessas internacionais para o pagamento de valores previstos em contratos de licenciamento do uso de marcas, prestação de serviços técnicos específicos e de prestação de serviços de assistência técnica/administrativa, entre outros previstos na legislação, sendo que em determinados contratos há a transferência de tecnologia e em outros não há, nos termos da legislação de regência de direito privado”.

4. Portanto, a atividade desenvolvida pelas contribuintes configura a hipótese de incidência tributária. Com efeito, a Lei nº 10.168/2000, com a redação que lhe deu a Lei nº 10.332/2001, não se refere exclusivamente ao pagamento de "royalties", mas também à simples prestação de assistência técnica e administrativa, conforme decidido em reiterados julgados. Ademais, é firme a jurisprudência desta C. Corte, no sentido de que a CIDE-remessas não se limita às hipóteses de transferência de tecnologia propriamente dita.

5. Por consequência, não é possível se basear no art. 11 da Lei nº 9.609/98 (Lei do Software), para definir os critérios de configuração da “transferência de tecnologia”. Precedentes do C. STJ.

6. No que respeita à referibilidade, equivocam-se as impetrantes quando alegam não se beneficiarem da intervenção estatal no setor econômico em que opera e, mesmo que não se beneficiassem, diretamente, ainda assim, estariam sujeitas ao recolhimento da exação.

7. A Lei nº 10.168/2000, com a redação dada pela Lei nº 10.332/2001, em estrita obediência aos ditames constitucionais do art. 149, dispõe sobre as finalidades e a destinação dos recursos da CIDE, e define o fato gerador da contribuição, razão pela qual não se há falar em ilegalidade ou ofensa a princípios constitucionais.

8. É pacífico na jurisprudência desta C. Corte o entendimento de não haver violação aos acordos internacionais citados pela impetrante (GATT e GATS).

9. Agravo interno não provido.                                   

(TRF-3, 6ª Turma, ApCiv 5004768-23.2022.4.03.6100, j. 03/02/2025, Intimação via sistema DATA: 12/02/2025, Rel. Des. Fed. MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR).

DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMÍNIO ECONÔMICO (CIDE). LEI Nº 10.168/2000. DESNECESSIDADE DE LEI COMPLEMENTAR E DE VINCULAÇÃO DIRETA ENTRE O CONTRIBUINTE E O BENEFÍCIO PROPORCIONADO PELAS RECEITAS ARRECADADAS. REFERIBILIDADE. RELAÇÃO INDIRETA.

1. A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico – CIDE tem previsão no artigo 149 da Constituição Federal. Foi instituída pela Lei nº 10.168/2000 com o objetivo de financiar o Programa de Estímulo à Interação Universidade-Empresa para o Apoio à Inovação e, em especial, conforme previsto em seu artigo 1º, “estimular o desenvolvimento tecnológico brasileiro, mediante programas de pesquisa científica e tecnológica cooperativa entre universidades, centros de pesquisa e o setor produtivo”.

2. Consoante o disposto no artigo 2º da Lei nº 10.168/2000, é “devida pela pessoa jurídica detentora de licença de uso ou adquirente de conhecimentos tecnológicos, bem como aquela signatária de contratos que impliquem transferência de tecnologia, firmados com residentes ou domiciliados no exterior”.

3. A partir da edição da Lei nº 10.332/2001 a CIDE passou “a ser devida também pelas pessoas jurídicas signatárias de contratos que tenham por objeto serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes a serem prestados por residentes ou domiciliados no exterior, bem assim pelas pessoas jurídicas que pagarem, creditarem, entregarem, empregarem ou remeterem royalties, a qualquer título, a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior”. Portanto, a incidência da CIDE não está limitada às hipóteses em que há a transferência de tecnologia. Referida ampliação é legítima, pois coaduna-se com a finalidade da CIDE de desestimular a contratação com o exterior.

4. De fato, “a contribuição CIDE - Remessas onera a importação da tecnologia estrangeira nas mais variadas formas. O objetivo então é fazer com que a tecnologia (nas várias vertentes: licença, conhecimento/comercialização, transferência) seja adquirida no mercado nacional e não no exterior, evitando-se as remessas de remuneração ou royalties. Tal a intervenção no domínio econômico” (REsp n. 1.642.249/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 15/8/2017, DJe de 23/10/2017).

5. A previsão contida no parágrafo 1º-A do artigo 2º da Lei nº 10.168/2000 é norma isentiva. Disso decorre que não pode ser aplicada a fatos pretéritos. Destarte, “A isenção para a remessa ao exterior da remuneração pela licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador (software) desacompanhada da ‘transferência da correspondente tecnologia’ (‘absorção da tecnologia’) somente adveio a partir de 1º de janeiro de 2006, com o art. 20, da Lei n. 11.452/2007, ao adicionar o §1º-A ao art. 2º, da Lei n. 10.168/2000” (REsp n. 1.642.249/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 15/8/2017, DJe de 23/10/2017).

6. A CIDE possui natureza de tributo vinculado com destinação específica. Distingue-se do Imposto de Renda, donde não há cogitar em “bis in idem”. “A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) e o Imposto de Renda são tributos com hipótese de incidência e sujeito passivo diversos”. (TRF 3ª Região, 6ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5023600-08.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES, julgado em 10/10/2022, DJEN DATA: 13/10/2022). Embora tenham fatos geradores e sujeitos passivos diversos, a CIDE e o Imposto de Renda incidem de forma simultânea quando do pagamento, incumbindo ao adquirente, na qualidade de contribuinte, recolher a CIDE e, na qualidade de responsável tributário, reter o imposto de renda, tomando-se por base de cálculo de ambos o pagamento efetuado.

7. Especificamente acerca da Lei nº 10.168/2000, o c. Supremo Tribunal Federal entendeu “ser dispensável a edição de lei complementar para a instituição dessa espécie tributária”. Também entendeu que “é prescindível (...) a existência de vinculação direta entre o contribuinte e o benefício proporcionado pelas receitas tributárias arrecadadas”. Decidiu ainda que “Não descaracteriza a exação o fato de o sujeito passivo não se beneficiar diretamente da arrecadação, pois a Corte considera que a inexistência de referibilidade direta não desnatura as CIDE, estando, sua instituição ‘jungida aos princípios gerais da atividade econômica’”.

8. Assim, “É válida a cobrança do tributo independentemente de contraprestação direta em favor do contribuinte” (RE 635682, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-098 DIVULG 23-05-2013 PUBLIC 24-05-2013), pois “Ainda que a parte recorrente não usufrua diretamente dos reflexos da arrecadação da aludida contribuição e dos programas que com os recursos alcançados serão desenvolvidos, a sua condição de contribuinte se justifica pelo simples fato de ser, como toda sociedade, beneficiária do desenvolvimento econômico e tecnológico nacional” (TRF 3ª Região, 4ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5004678-45.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal MONICA AUTRAN MACHADO NOBRE, julgado em 22/05/2023, Intimação via sistema DATA: 24/05/2023).

9. Dada a natureza constitucional e extrafiscal da CIDE, não há falar em mero intuito arrecadatório. Muito menos em ofensa ao princípio da isonomia (diante de suposto tratamento tributário diferenciado entre as operações nacionais e internacionais), haja vista que todos os contribuintes (que realizem importação de serviços) estarão submetidos à idêntica regra de incidência tributária.

10. Não há cogitar em desrespeito aos acordos internacionais, porquanto em matéria tributária os acordos não prevalecem sobre disposição de natureza constitucional.

11. Uma vez caracterizada a efetiva atividade interventiva no domínio econômico, tampouco merece recepção a tese de desvio de finalidade. Além disso, conforme exegese do artigo 4º, inciso II, do CTN, a destinação financeira do recurso não é relevante para efeito de análise formal material da criação do tributo. Ainda que assim não fosse, o exame da questão depende da produção de prova, inviável na estreita via processual do mandado de segurança. Eventual deturpação dos recursos destinados ao fundo insere-se em tema financeiro-orçamentário e não tem o condão de afastar a obrigação do recolhimento da contribuição.

12. Apelação desprovida.

(TRF-3, 4ª Turma, ApCiv 5011487-21.2022.4.03.6100, j. 07/02/2025, Intimação via sistema DATA: 11/02/2025, Rel. Des. Fed. WILSON ZAUHY FILHO).

No caso concreto, questiona-se a exigência de CIDE sobre remunerações decorrentes de contratos de uso de tecnologia, nos anos de 2004 e 2005, antes da inclusão do § 1º no artigo 2º da Lei Federal nº. 10.168/01 pela Lei Federal nº. 11.452/07.

Nesse ponto, cumpre também anotar que a conduta da União em outro processo não tem o condão de prejudicar a análise aqui realizada. O Magistrado tem liberdade de apreciação das provas e inexiste precedente vinculante a respeito da matéria.

Conclui-se, portanto, pela regularidade da exigência fiscal.

5) Mérito – regularidade do processamento administrativo.

A autuação fiscal se presume válida. Trata-se, à evidência, de presunção relativa, que pode ser afastada pelo interessado mediante prova.

Nesse campo, tem-se que o Judiciário não pode substituir o administrador na análise do mérito administrativo, porém nada impede que afira a legalidade da edição do ato, considerada a legislação vigente. Esse é o entendimento vinculante constante da Súmula nº. 473 do Supremo Tribunal Federal.

Analisado o processado, não se identifica qualquer irregularidade. Não há divergência de fundamentação, mas desenvolvimento de argumentos de forma concatenada.

Importante consignar que desde o início da fiscalização o contribuinte teve ciência do objeto da autuação e pode se defender, tanto na esfera administrativa e judicial.

Não procedem, portanto, as arguições de nulidade.

6) Mérito – exclusão do IRRF da base de cálculo da CIDE.

A base de cálculo da CIDE é o total da operação decorrente do contrato, nos estritos termos do artigo 2º, § 3º, da Lei Federal nº. 10.168/01.

Por decorrência, o IRRF da operação está incluído na incidência tributária. Cito, nesse sentido, precedentes desta Corte Regional:

APELAÇÃO TRIBUTÁRIA. CIDE. INCIDÊNCIA DO IRPJ NA BASE DE CÁLCULO. IMPOSSIBILIDADE DE EXCLUSÃO DO IRPF. LEGALIDADE DA MULTA DE OFÍCIO. RECURSO NÃO PROVIDO. 

I - Caso em exame:   

1.Trata-se de apelação interposta por ARCOS DOURADOS COMÉRCIO DE ALIMENTOS LTDA contra a r. sentença que julgou improcedentes os embargos à execução, reconhecendo a higidez da Certidão de Dívida Ativa (CDA) e a inclusão do Imposto de Renda sobre Pessoa Jurídica (IRPJ) na base de cálculo da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) nas remessas de valores ao exterior. 

 II - Questão em exame:   

2. Cinge-se a discussão em determinar a devida inclusão do IRPJ na base de cálculo da CIDE e a legalidade da multa de ofício aplicada, considerando a incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) nas remessas ao exterior. 

 III - Razões de decidir:   

3.Observa-se que as remessas de valores ao exterior, referentes ao pagamento de contratos de prestação de serviços técnicos e de assistência técnica, implicam em transferência de tecnologia, sujeitando-se à incidência da CIDE, conforme disposto no art. 2º da Lei nº 10.168/2000.  

4.O artigo 760 do Regulamento do Imposto de Renda (Decreto 9.580/2018) estabelece a incidência do IRRF sobre essas remessas.  

5.A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido da pertinência da tributação concomitante pelo IRRF e pela CIDE.

6. Trata-se de incidência tributária simultânea, que envolve sujeitos passivos diversos, de modo que a base de cálculo da CIDE será o valor total da operação, não comportando acolhimento a pretensão de excluir de sua base de cálculo o montante relativo ao IRRF.

7.A Certidão de Dívida Ativa apresenta a presunção de certeza e liquidez, sendo ônus do contribuinte demonstrar a nulidade da mesma, o que não foi comprovado.  

8. Em relação à multa de ofício, verifica-se que a penalidade foi aplicada de acordo com a legislação vigente à época dos fatos, respeitando os limites legais e não configurando confisco. 

 IV – Dispositivo: 

9. Apelação improvida.  

(TRF-3, 3ª Turma, ApCiv 5001066-34.2022.4.03.6144, j. 30/01/2025, DJEN DATA: 04/02/2025, Rel. Des. Fed. NERY DA COSTA JUNIOR).

TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. PRELIMINAR. DECISÃO MONOCRÁTICA. POSSIBILIDADE. CIDE-REMESSA. LEI COMPLEMENTAR. DESNECESSIDADE. REFERIBILIDADE. VÍNCULO CARACTERIZADO. INTERESSE DA ORDEM ECONÔMICA. LEGITIMIDADE DA CIDE. TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA. DESNECESSIDADE. GATS. NÃO DISCRIMINAÇÃO DO AGENTE ECONÔMICO ESTRANGEIRO. FIM EXTRAFISCAL DA CONTRIBUIÇÃO. IRRF. COMPOSIÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DA CIDE. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. (...)

7. A teor do art. 2º, §3º, da Lei 10.168/2000, a CIDE incide sobre o valor total da operação, isto é, a totalidade dos valores pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos ao domiciliado no estrangeiro. E, porque as agravantes recolhem o IRRF na qualidade de responsáveis tributários, em antecipação ao valor devido por aquele outro, ambos os tributos devem ter por base de cálculo o valor do pagamento efetuado.

8. Negado provimento ao agravo interno.                                   

(TRF-3, 6ª Turma, ApCiv 5026369-22.2021.4.03.6100, j. 18/11/2024, Intimação via sistema DATA: 02/12/2024, Rel. Des. Fed. SAMUEL DE CASTRO BARBOSA MELO).

Neste ponto, portanto, a pretensão é improcedente.

7) Mérito – verba honorária.

O Código de Processo Civil alterou a forma de fixação da verba honorária, adotando um sistema escalonado a partir do valor atribuído à causa ou do benefício econômico pretendido com a demanda, verbis:

Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.

§ 1º. São devidos honorários advocatícios na reconvenção, no cumprimento de sentença, provisório ou definitivo, na execução, resistida ou não, e nos recursos interpostos, cumulativamente.

§ 2º. Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:

I - o grau de zelo do profissional;

II - o lugar de prestação do serviço;

III - a natureza e a importância da causa;

IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.

§ 3º. Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, a fixação dos honorários observará os critérios estabelecidos nos incisos I a IV do § 2º e os seguintes percentuais:

I - mínimo de dez e máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido até 200 (duzentos) salários-mínimos;

II - mínimo de oito e máximo de dez por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 (duzentos) salários-mínimos até 2.000 (dois mil) salários-mínimos;

III - mínimo de cinco e máximo de oito por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 2.000 (dois mil) salários-mínimos até 20.000 (vinte mil) salários-mínimos;

IV - mínimo de três e máximo de cinco por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 20.000 (vinte mil) salários-mínimos até 100.000 (cem mil) salários-mínimos;

V - mínimo de um e máximo de três por cento sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 100.000 (cem mil) salários-mínimos.

(...)

§ 5º. Quando, conforme o caso, a condenação contra a Fazenda Pública ou o benefício econômico obtido pelo vencedor ou o valor da causa for superior ao valor previsto no inciso I do § 3º, a fixação do percentual de honorários deve observar a faixa inicial e, naquilo que a exceder, a faixa subsequente, e assim sucessivamente.

§ 8º. Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do § 2º.

Não se descura que o Superior Tribunal de Justiça analisou a legislação em sede de repetitividade, tendo firmado orientação no sentido de afastar a fixação equitativa nas causas de valor elevado, verbis:

"i) A fixação dos honorários por apreciação equitativa não é permitida quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem elevados. É obrigatória nesses casos a observância dos percentuais previstos nos §§ 2º ou 3º do artigo 85 do CPC - a depender da presença da Fazenda Pública na lide -, os quais serão subsequentemente calculados sobre o valor: (a) da condenação; ou (b) do proveito econômico obtido; ou (c) do valor atualizado da causa. ii) Apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou (b) o valor da causa for muito baixo".

(Tema nº. 1.076 - STJ, Corte Especial, REsp n. 1.850.512/SP, j. 16/03/2022, DJe de 31/05/2022, rel. Min. OG FERNANDES).

Todavia, o Supremo Tribunal Federal tem entendido viável a fixação equitativa no atual regime processual com fundamento nos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. Veja-se:

Direito Processual Civil. Embargos de declaração em ação cível originária. Honorários advocatícios.

1. Embargos de declaração opostos contra acórdão que julgou parcialmente procedente o pedido com fixação de honorários em percentual sobre o valor da causa.

2. Fixação dos honorários que gera à parte sucumbente condenação desproporcional e injusta. Processo que tratou de questão exclusivamente de direito.

3. Revisão do valor dos honorários para arbitrá-los por equidade, conforme art. 85, § 8º, do CPC. Precedentes.

4. Embargos de declaração parcialmente providos para fixar os honorários advocatícios por apreciação equitativa.”

(STF, Tribunal Pleno, ACO 2988 ED, j. 21/02/2022, Publicação: 11/03/2022, Rel. Min. ROBERTO BARROSO).

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO EM AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. PROCESSUAL CIVIL. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. OMISSÃO.

1. Incide em omissão o acórdão que deixa de arbitrar honorários de sucumbência.

2. Embargos de declaração providos, para, suprindo-se a omissão, condenar-se a União ao pagamento dos honorários sucumbenciais, desde logo fixados, mediante apreciação equitativa, em R$ 5.000 (cinco mil reais), nos termos do art. 20, §§ 3º, “a” e “c”, e 4º, do Código de Processo Civil de 1973.

(STF, Tribunal Pleno, ACO 1562 AgR-ED, j. 18-10-2022, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-227  DIVULG 10-11-2022  PUBLIC 11-11-2022, Rel. Min. NUNES MARQUES).

SEGUNDO AGRAVO INTERNO EM AÇÃO CIVIL ORIGINÁRIA. EMISSÃO DE CERTIFICADO DE REGULARIDADE PREVIDENCIÁRIA. AÇÃO PROVIDA. VALOR ECONÔMICO AFERÍVEL. INEXISTÊNCIA. FIXAÇÃO DOS HONORÁRIOS. APRECIAÇÃO EQUITATIVA. ARTIGO 85, § 8º, DO CPC. AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

(STF, Tribunal Pleno, ACO 2634 AgR-segundo, j. 31-05-2019, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127  DIVULG 11-06-2019  PUBLIC 12-06-2019, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES).

Mais recentemente, em julgamento concluído no Plenário Virtual de 09/08/2023, reforçando a natureza constitucional do debate, a Corte Constitucional reconheceu a repercussão geral da matéria (RE 1.412.069, Rel. Min. ANDRÉ MENDONÇA):

Tema 1255 - Possibilidade da fixação dos honorários por apreciação equitativa (artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil) quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem exorbitantes.

A partir do reconhecimento da repercussão geral, o Superior Tribunal de Justiça tem determinado o retorno à origem dos recursos especiais nos quais se postula a aplicação do Tema nº. 1.076/STJ, para observância do quanto vier a ser decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema nº. 1.255/STF. Veja-se:

PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. REQUISITOS. TEMA COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. SOBRESTAMENTO.

1. Visando racionalizar o exercício de sua atribuição constitucional de uniformizar a interpretação e a aplicação da lei federal, esta Corte Superior, em caráter excepcional, vem admitindo o acolhimento de embargos de declaração, com efeitos modificativos, para que seja observado o procedimento próprio para julgamento de questões afetadas à sistemática da repercussão geral e dos recursos repetitivos, com a determinação de devolução dos autos para que oportunamente o Tribunal de origem proceda ao respectivo juízo de conformação.

2. O Supremo Tribunal Federal, considerando a questão relativa à "possível ofensa à isonomia (art. 5º, caput, da CF), ao devido processo legal (art. 5º, XXXIV, da CF) e aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade", afetou à sistemática da repercussão geral o Tema 1.255, nos seguintes termos: "Possibilidade da fixação dos honorários por apreciação equitativa (art. 85, § 8º, do Código de Processo Civil) quando os valores da condenação, da causa ou o proveito econômico da demanda forem exorbitantes" (RE 1.412.069 RG, Relatora MINISTRA PRESIDENTE, Tribunal Pleno, julgado em 09/08/2023).

3. Embargos acolhidos a fim de tornar sem efeito as decisões anteriores e determinar a devolução dos autos à origem para aguardar o julgamento do Tema 1255 do STF.

(STJ, 1ª Turma, EDcl no AgInt nos EDcl no REsp n. 2.051.095/SP, j. 13/11/2023, DJe de 17/11/2023, rel. Min. GURGEL DE FARIA).

E, ainda, decisões monocráticas recentes dos Ministros nos seguintes feitos: REsp n. 2.125.355, DJe de 05/03/2024, Min. SÉRGIO KUKINA; EDcl no REsp n. 2.105.727, DJe de 01/03/2024, Min. MAURO CAMPBELL MARQUES; EDcl no REsp n. 2.045.895, DJe de 05/03/2024, Min. REGINA HELENA COSTA.

É nesse sentido a orientação da 6ª Turma desta Corte Regional:

PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ART. 1040, II, DO CPC. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS FIXADOS COM BASE NA APRECIAÇÃO EQUITATIVA, ART.85, § 8º, DO CPC. JUÍZO DE RETRATAÇÃO NÃO EXERCIDO. ACÓRDÃO MANTIDO.

1. Em que pese a tese fixada pelo C. STJ no julgamento do Tema 1.076, respeitada por este relator, possível a aplicação do disposto no § 8º do art. 85 do CPC nas hipóteses em que a aplicação dos percentuais previstos nos §§ 2º e 3º do art. 85 resultar em verba honorária excessiva e desproporcional ao trabalho realizado, em evidente enriquecimento sem causa e ônus excessivo à parte adversa.

2. Os honorários advocatícios devem ser arbitrados de modo a remunerar justa e dignamente o trabalho desenvolvido nos autos, levando-se em conta, ainda, a complexidade da causa.

3. Consigne demandar, ainda, o arbitramento de honorários advocatícios, nos processos em que o valor da causa/condenação seja alto, atenção ao equilíbrio que deve existir entre as partes do processo, não podendo implicar evidente ônus desmedido à parte sucumbente, seja pelo prejuízo financeiro imposto ao particular ou pelo gasto de recursos públicos, nos casos nos quais a parte adversa seja a Fazenda Pública.

4. Nesse mesmo sentido, recente julgado do plenário do C. STF, ao examinar embargos de declaração opostos na ACO 2988. 5. Juízo de retratação negativo.

(TRF-3, 6ª Turma, ApCiv 0007359-18.2016.4.03.6144, Intimação via sistema DATA: 16/10/2023, Rel. Des. Fed. MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR).

JUÍZO DE RETRATAÇÃO. TEMA 1.076 DO STJ. HONORÁRIOS E APRECIAÇÃO EQUITATIVA. POSSIBILIDADE. RETRATAÇÃO NÃO EXERCIDA.

1. Os honorários advocatícios devem remunerar condignamente o trabalho do advogado, considerando que um dos fundamentos do nosso Estado Democrático de Direito consiste no valor social do trabalho (artigo 1º, IV, da Constituição Federal). Mas não se pode olvidar da necessária proporcionalidade que deve existir entre a remuneração e o trabalho visível feito pelo advogado. Inexistindo proporcionalidade, deve-se invocar o § 8º do artigo 85 do CPC de 2015: "Nas causas em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo, o juiz fixará o valor dos honorários por apreciação equitativa, observando o disposto nos incisos do parágrafo 2º", mesmo que isso seja feito para o fim de reduzir os honorários, levando-se em conta que o empobrecimento sem justa causa do adverso que é vencido na demanda significa uma penalidade, e é certo que ninguém será privado de seus bens sem o devido processo legal, vale dizer, sem justa causa. Nesse âmbito, a fixação exagerada de verba honorária - se comparada com o montante do trabalho prestado pelo advogado - é enriquecimento sem justa causa, proscrito pelo nosso Direito e pela própria Constituição polifacética, a qual prestigia os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

2. Caso em que a equidade há de ser observada para que não ocorra, na espécie, comprometimento de recursos públicos em situação de enriquecimento sem causa.

3. O plenário do Supremo Tribunal Federal acolhe o mesmo entendimento aqui manifestado, como se vê do recente julgamento (18 de fevereiro de 2022) dos ED na ACO no 2.988/DF, quando aplicou o § 8º do artigo 85 do CPC para o fim de, aplicando a equidade, reduzir os honorários fixados em desfavor da Fazenda Pública. Outros precedentes plenários da Suprema Corte: ACO 637 ED, Rel. Min. Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno - ACO 1.650-AgR, Rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno.

4. Juízo de retratação não exercido.

(TRF-3, 6ª Turma, ApCiv 0001639-48.2019.4.03.6182, j. 24/03/2023, Intimação via sistema DATA: 28/03/2023, Rel. Des. Fed. LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO).

PROCESSO CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. VALOR EXORBITANTE. ARBITRAMENTO POR EQUIDADE. ARTIGO 1.040, INC. II, DO NCPC NÃO EXERCIDO.

- O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema 1.076 dos recursos repetitivos fixou teses no sentido da inviabilidade da fixação de honorários de sucumbência por apreciação equitativa quando o valor da condenação ou o proveito econômico forem elevados.

- Não obstante a aludida orientação, se faz plenamente aplicável o disposto no § 8º do art. 85 do CPC nos casos em que a verba honorária se revelar extremamente elevada, comportando a norma interpretação extensiva, de modo a evitar que o advogado seja remunerado de forma incompatível com o trabalho desenvolvido nos autos, em atenção aos princípios constitucionais da proporcionalidade/razoabilidade que se sobrepõem à previsão do código processual e que devem ser observados a despeito da falta de previsão constitucional expressa.

- Juízo de Retratação negativo.

(TRF-3, 6ª Turma, ApCiv 0037000-39.2013.4.03.6182, j. 10/03/2023, Intimação via sistema DATA: 15/03/2023, Rel. Des. Fed. LUIZ ALBERTO DE SOUZA RIBEIRO).

Na hipótese, foi atribuído à causa o valor de R$ 16.825.302,43 em 20/05/2019 (fls. 135, ID 261464092) e o feito transcorreu sem incidentes.

Considerando que a demanda possui natureza jurídica, o montante fixado afigura-se desproporcional, sendo razoável a fixação equitativa em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), nos termos do artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil.

8) Levantamento do Depósito.

A teor da LC nº. 151/15, o destino dos depósitos judiciais é aferido a partir da sucumbência na demanda, verbis:

Art. 8º. Encerrado o processo litigioso com ganho de causa para o depositante, mediante ordem judicial ou administrativa, o valor do depósito efetuado nos termos desta Lei Complementar acrescido da remuneração que lhe foi originalmente atribuída será colocado à disposição do depositante pela instituição financeira responsável, no prazo de 3 (três) dias úteis, observada a seguinte composição:

Art. 10. Encerrado o processo litigioso com ganho de causa para o ente federado, ser-lhe-á transferida a parcela do depósito mantida na instituição financeira nos termos do § 3º do art. 3º acrescida da remuneração que lhe foi originalmente atribuída. 

De fato, segundo orientação do Superior Tribunal de Justiça, “Desde a época da vigência da Lei n. 10.482/2002 (art. 5º), que dispunha sobre os depósitos judiciais referentes a tributos no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, revogada pela Lei n. 11.429/20006 (arts. 4º e 6º), revogada pela Lei Complementar n. 151/2015 (arts. 8º e 10), o destino dos depósitos judiciais ou administrativos depende da sorte e do encerramento do processo litigioso judicial ou administrativo(STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp n. 2.293.510/RS, j. 21/08/2023, DJe de 23/08/2023, rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES).

Assim, e considerada a oposição da União (ID 285027632), não é possível o levantamento antes do trânsito em julgado.

Ante o exposto, conheço em parte da apelação da SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE EIRELI para, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento para fixar a verba honorária equitativamente. Nego provimento à apelação de PEACH TREE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E RURAIS LTDA. Nego provimento ao agravo interno.

É o voto.

 

 

 



E M E N T A

 

PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. AÇÃO ANULATÓRIA. CIDE TECNOLOGIA. LEI FEDERAL Nº. 10.168/00. CONSTITUCIONALIDADE DA EXAÇÃO. CONTRATO DE COMERCIALIZAÇÃO DE USO. INCIDÊNCIA ATÉ A EDIÇÃO DA LEI FEDERAL Nº. 11.452/07, QUE INCLUIU O §1º-A NO ARTIGO 5º DA LEI FEDERAL Nº. 10.168/00. INCLUSÃO DO IRRF NA BASE DE CÁLCULO DA CONTRIBUIÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. EQUIDADE. DEPOSITO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DO LEVANTAMENTO.

I- CASO EM EXAME. 1. Apelação interposta contra r. sentença de improcedência.

II- QUESTÃO EM EXAME. 2. Questiona-se: a constitucionalidade da CIDE e a regularidade da sua incidência sobre contratos de uso sem transferência de tecnologia. 3. Também se aponta irregularidade na fundamentação administrativa e na exigência de multa no julgamento por maioria com voto de qualidade. 3. Pretende-se afastar o IRRF da base de cálculo da CIDE. 4. A final, impugna-se a verba honorária fixada, pugnando-se pelo arbitramento por equidade.

III- RAZÕES DE DECIDIR. 5. Houve reconhecimento da repercussão geral da matéria no Tema nº. 914-STF, sem a determinação de sobrestamento, de sorte que é regular o prosseguimento com o julgamento da matéria. 6. No caso concreto, a União informou a exclusão administrativa da multa na forma do artigo 15 da Lei Federal nº. 14.689/23, tendo ocorrido a perda superveniente deste capítulo da irresignação da apelante SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE EIRELI. 7. De acordo com entendimento do Supremo Tribunal Federal, a contribuição instituída pela Lei Federal nº. 10.168/00 possui natureza jurídica de CIDE, sendo possível a sua instituição por meio de legislação ordinária e sendo inexigível referibilidade. 8. O fato gerador da CIDE-Tecnologia está explicitado no artigo 2º da Lei Federal nº. 10.168/01, o qual não foi objeto de alteração legislativa. Ao definir o fato gerador tributário, a Lei Federal nº. 10.168/01 não se utilizou de definições privadas, mas apenas fez referência a contratos firmados entre particulares. Não há conflito de leis, mas, sim aplicação complementar. 9. O artigo 2º, § 1º-A da Lei Federal nº. 10.168/01 é norma de exclusão do crédito tributário que, nos termos do artigo 111 do Código Tributário Nacional, deve ser interpretada de forma literal. Sendo assim, considerando que a vigência da alteração legislativa se deu em 28/02/2007, data de publicação da Lei Federal nº. 11.452/07 (artigo 21), apenas abrange os fatos geradores ocorridos posteriormente. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte Regional. 10. Quanto à arguição de nulidade no processamento administrativo, não merece acolhida. Não há divergência de fundamentação, mas desenvolvimento de argumentos de forma concatenada. Importante consignar que desde o início da fiscalização o contribuinte teve ciência do objeto da autuação e pode se defender, tanto na esfera administrativa e judicial. 11. A base de cálculo da CIDE é o total da operação decorrente do contrato, nos estritos termos do artigo 2º, § 3º, da Lei Federal nº. 10.168/01. Por decorrência, o IRRF da operação está incluído na incidência tributária. Precedentes desta Corte Regional. 12. O Supremo Tribunal Federal tem entendido viável a fixação equitativa no atual regime processual com fundamento nos princípios constitucionais da razoabilidade e da proporcionalidade. Mais recentemente, em julgamento concluído no Plenário Virtual de 09/08/2023, reforçando a natureza constitucional do debate, a Corte Constitucional reconheceu a repercussão geral da matéria (Tema nº. 1255 - RE 1.412.069, Rel. Min. ANDRÉ MENDONÇA). 13. A partir do reconhecimento da repercussão geral, o Superior Tribunal de Justiça tem determinado o retorno à origem dos recursos especiais nos quais se postula a aplicação do Tema nº. 1.076/STJ, para observância do quanto vier a ser decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema nº. 1.255/STF. Por sua vez, a 6ª Turma desta Corte Regional tem entendido viável a aplicação da equidade na fixação da verba honorária no regime do CPC/15. 14. Considerando que a demanda possui natureza jurídica, o montante fixado afigura-se desproporcional, sendo razoável a fixação equitativa em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), nos termos do artigo 85, § 8º, do Código de Processo Civil. 15. A teor da LC nº. 151/15, o destino dos depósitos judiciais é aferido a partir da sucumbência na demanda, não sendo possível o levantamento antes do trânsito em julgado.

IV. DISPOSITIVO E TESE. 16. Apelação da SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE EIRELI conhecida em parte e provida em parte para fixar a verba honorária por equidade. Apelação da PEACH TREE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E RURAIS LTDA. desprovida. Agravo interno desprovido. 17. Teses: 17.1. Regularidade da incidência da CIDE-Tecnologia sobre licença de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programa de computador antes do início da vigência do artigo 2º, § 1º-A da Lei Federal 10.168/00. 17.2. Regularidade da incidência da CIDE sobre o IRRF. 17.3. Viabilidade da fixação de verba honorária por equidade no regime do CPC/15.

 

Dispositivos relevantes citados: artigos 2º da Lei 10.168/00; artigo 111, CTN; artigo 85, CPC, artigo 8º, LC 151/15.

 

Jurisprudência relevante citada: STF, 1ª Turma, RE 632832 AgR, j. 12-08-2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-167  DIVULG 28-08-2014  PUBLIC 29-08-2014, Rel. Min. ROSA WEBER; STF, 1ª Turma, AI 737858 ED-AgR, j. 06-11-2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-240 DIVULG 06-12-2012 PUBLIC 07-12-2012, Rel. Min. DIAS TOFFOLI; STF, 2ª Turma, RE 492353 AgR, j. 22-02-2011, DJe-048 DIVULG 14-03-2011 PUBLIC 15-03-2011 EMENT VOL-02481-01 PP-00169 RJTJRS v. 46, n. 280, 2011, p. 37-40, Rel. Min. ELLEN GRACIE; STJ, 2ª Turma REsp n. 1.642.249/SP, j. 15/08/2017, DJe de 23/10/2017, rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, conheceu em parte da apelação da SOFTLINE INTERNATIONAL BRASIL COMERCIO E LICENCIAMENTO DE SOFTWARE EIRELI para, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento para fixar a verba honorária equitativamente; negou provimento à apelação de PEACH TREE PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS IMOBILIÁRIOS E RURAIS LTDA; negou provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
GISELLE FRANÇA
Desembargadora Federal