APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000469-90.2024.4.03.6113
RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE
APELANTE: JOSE EURIPEDES MENDES & SILVA REPRESENTACOES LTDA
Advogados do(a) APELANTE: CHRISTIAN GUSTAVO FULBER - RS106868-A, SAMUEL HELMUTH BEHLING - RS110321-A
APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000469-90.2024.4.03.6113 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: JOSE EURIPEDES MENDES & SILVA REPRESENTACOES LTDA Advogados do(a) APELANTE: CHRISTIAN GUSTAVO FULBER - RS106868-A, SAMUEL HELMUTH BEHLING - RS110321-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Trata-se de recurso de apelação interposto por José Eurípedes Mendes & Silva Representações Ltda. contra sentença que, em procedimento comum, nos termos do artigo 487, inciso I, do CPC, julgou improcedente o pedido de afastamento da obrigação de recolher o imposto de renda sobre verbas indenizatórias recebidas em razão da rescisão do contrato de representação comercial. Ao final, condenou a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios arbitrados em 10% sobre o valor atribuído à causa. O recorrente defende, em síntese, que todos os valores recebidos no ato da rescisão do contrato de representação comercial (ID. 316232555) têm natureza indenizatória, conforme previsto na Lei n. 4.886/1965. Dessa forma, afirma que, nos termos do artigo 70 da Lei n. 9.430/1996, deve ser afastada a incidência do imposto de renda sobre tais valores. Sustenta que o fato de a rescisão ter ocorrido de forma bilateral não afasta o direito alegado, conforme jurisprudência pacífica sobre o tema. Observa que, no caso concreto, o contrato foi rescindido sem justa causa, o que reforça a inexigibilidade da tributação. Nas contrarrazões, a União argumenta que, em caso de rescisão contratual bilateral, é devida a incidência do imposto de renda. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000469-90.2024.4.03.6113 RELATOR: Gab. 13 - DES. FED. MONICA NOBRE APELANTE: JOSE EURIPEDES MENDES & SILVA REPRESENTACOES LTDA Advogados do(a) APELANTE: CHRISTIAN GUSTAVO FULBER - RS106868-A, SAMUEL HELMUTH BEHLING - RS110321-A APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A parte apelante pretende obter o reconhecimento da inexigibilidade do imposto de renda sobre verba indenizatória decorrente da rescisão do contrato de representação comercial, prevista no artigo 27, alínea "j", da Lei n. 4.886/1965. Pois bem. Dispõe o art. 27, alínea "j", da Lei n. 4.886/1965 sobre a indenização devida ao representante pela rescisão contratual antecipada fora das hipóteses do art. 35, fixando um valor mínimo correspondente a 1/12 da remuneração total recebida durante o período da representação. A controvérsia requer análise conjunta com os artigos 34 e 35 da Lei n. 4.886/1965, que tratam da forma e das hipóteses autorizadoras da rescisão contratual: Art . 34. A denúncia, por qualquer das partes, sem causa justificada, do contrato de representação, ajustado por tempo indeterminado e que haja vigorado por mais de seis meses, obriga o denunciante, salvo outra garantia prevista no contrato, à concessão de pré-aviso, com antecedência mínima de trinta dias, ou ao pagamento de importância igual a um têrço (1/3) das comissões auferidas pelo representante, nos três meses anteriores. Art . 35. Constituem motivos justos para rescisão do contrato de representação comercial, pelo representado: a) a desídia do representante no cumprimento das obrigações decorrentes do contrato; b) a prática de atos que importem em descrédito comercial do representado; c) a falta de cumprimento de quaisquer obrigações inerentes ao contrato de representação comercial; d) a condenação definitiva por crime considerado infamante; e) força maior." Por sua vez, a Lei n. 9.430/1996, em seu art. 70, §5º, prevê que as indenizações pagas em conformidade com a legislação trabalhista ou destinadas a reparar danos patrimoniais estão excluídas da incidência do imposto de renda. No caso concreto, a apelante celebrou contrato de representação comercial com a empresa CALÇADOS PEGADA NORDESTE LTDA. em 01/10/2007, cuja rescisão ocorreu consensualmente, mediante pagamento de indenização no valor bruto de R$ 485.211,38, descontando-se R$ 72.781,71 a título de imposto de renda, resultando num valor líquido de R$ 412.429,67. O montante incluiu diversas verbas de caráter indenizatório previstas explicitamente na escritura pública. Como demonstrado, a rescisão ocorreu sem justa causa (consensual) e não correspondeu a nenhuma das hipóteses previstas no artigo 35 da Lei n. 4.886/1965, devendo, portanto, ser afastada a incidência do imposto de renda, conforme entendimento jurisprudencial consolidado. Nesse sentido, destaco trecho da decisão monocrática do Ministro Sérgio Kukina no REsp n. 2.061.727, DJE de 18/02/2025, que reafirma a natureza indenizatória das verbas pagas mesmo em caso de rescisão bilateral: “… Sanando o vício, tem-se que, ainda que a tenha havido uma rescisão bilateral do contrato de representação comercial, não se afasta a natureza indenizatória da verba, porquanto o art. 27, "j", da Lei nº 4.886/65 não fez tal distinção. Veja-se que o distrato não se enquadra em nenhuma das hipóteses elencadas no art. 35 da Lei nº 4.886/65. O STJ já teve a oportunidade de se manifestar em situação semelhante, deixando de realizar a distinção pretendida pela Fazenda Nacional. (REsp 1.996.731/RS, Relator Ministro Gurgel de Faria, DJe de 30/08/2022). Assim, conforme também delineado no parecer ministerial, o recurso especial não impugnou fundamentos basilares que amparam o acórdão recorrido, no sentido de que "as convenções particulares não são oponíveis ao Fisco (art. 123 do CTN)" e que "ainda que a tenha havido uma rescisão bilateral do contrato de representação comercial, não se afasta a natureza indenizatória da verba", esbarrando, pois, no obstáculo da Súmula 283/STF, que assim dispõe: "É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles". A respeito do tema: AgInt no REsp 1.711.262/SE, Rel. Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 17/2/2021; AgInt no AREsp 1.679.006/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, DJe 23/2/2021. ANTE O EXPOSTO, não conheço do recurso especial. …" Igualmente, a jurisprudência da Quarta Turma: TRIBUTÁRIO E CONSTITUCIONAL. APELAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. RESCISÃO DE CONTRATO DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. NÃO INCIDÊNCIA. VERBA INDENIZATÓRIA. APELAÇÃO DESPROVIDA. - De acordo com o disposto no artigo 70, §5º, da Lei nº 9.430/96, o montante pago em razão de rescisão contratual está sujeito à tributação pelo imposto de renda na alíquota de 15% (quinze por cento), excetuadas as indenizações e as verbas trabalhistas. Dessa forma, deve-se perquirir se os valores pagos em decorrência de rescisão de contrato de representação contratual têm natureza de indenização a afastar a incidência da exação. - No caso dos autos, a parte autora celebrou contrato de representação comercial. No momento da rescisão foram pagos indenização e aviso prévio. - Quanto à indenização fixada se amolda ao previsto no artigo 27, alínea "j", da Lei nº 4.886/65, sobre a qual, segundo entendimento da corte especial, não deve incidir o imposto de renda. Descabida, portanto, a incidência do imposto de renda, nos termos do artigo 70, § 5º, da Lei nº 9.430/1996. - Apelação desprovida. (TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5009461-21.2020.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal ANDRE NABARRETE NETO, julgado em 25/06/2024, DJEN DATA: 01/07/2024) Ante o exposto, dou provimento à apelação para reformar integralmente a sentença recorrida. É como voto.
E M E N T A
1. Apelação cível objetivando o reconhecimento da inexigibilidade do imposto de renda sobre verba indenizatória recebida pela parte apelante em razão da rescisão do contrato de representação comercial celebrado com a empresa CALÇADOS PEGADA NORDESTE LTDA., em 01/10/2007. A rescisão ocorreu consensualmente, com o pagamento de indenização no valor bruto de R$ 485.211,38, dos quais foram descontados R$ 72.781,71 a título de imposto de renda, resultando em um valor líquido de R$ 412.429,67.
2. A questão em discussão consiste em saber se a verba indenizatória prevista no artigo 27, alínea "j", da Lei n. 4.886/1965, paga em decorrência de rescisão contratual consensual (sem justa causa), deve ser submetida à incidência do imposto de renda.
3. A verba paga por rescisão contratual consensual está amparada pelo artigo 27, alínea "j", da Lei n. 4.886/1965, que prevê indenização mínima correspondente a 1/12 da remuneração total recebida durante o período da representação.
4. A jurisprudência consolidada do STJ reconhece a natureza indenizatória das verbas pagas por rescisão consensual e sem justa causa (art. 34 e 35, da Lei n. 4.886/1965).
5. De acordo com o artigo 70, § 5º, da Lei n. 9.430/1996, indenizações destinadas a reparar danos patrimoniais são excluídas da incidência do imposto de renda.
6. Apelação provida para reformar integralmente a sentença recorrida. Reconhecimento da inexigibilidade do imposto de renda sobre a verba indenizatória recebida.
Tese de julgamento:
"1. Não incide imposto de renda sobre verba indenizatória prevista no artigo 27, alínea 'j', da Lei n. 4.886/1965, paga em razão de rescisão contratual consensual que não se enquadra nas hipóteses do artigo 35 da referida lei."
Dispositivos relevantes citados:
Lei n. 4.886/1965, art. 27, alínea "j"; art. 34; art. 35; Lei n. 9.430/1996, art. 70, § 5º.
Jurisprudência relevante citada:
STJ, REsp n. 2.061.727, Rel. Min. Sérgio Kukina, DJE de 18/02/2025; STJ, REsp n. 1.996.731/RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJE de 30/08/2022.