Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013630-31.2023.4.03.6105

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: AUTO POSTO VARGAS DE INDAIA LTDA

Advogado do(a) APELANTE: MICHEL OLIVEIRA DOMINGOS - SP301354-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM CAMPINAS//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5013630-31.2023.4.03.6105

RELATOR: Gab. 10 - DES. FED. CONSUELO YOSHIDA

APELANTE: AUTO POSTO VARGAS DE INDAIA LTDA

Advogado do(a) APELANTE: MICHEL OLIVEIRA DOMINGOS - SP301354-A

APELADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM CAMPINAS//SP, UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de apelação interposta pelo impetrante contra sentença que julgou improcedente o pedido e denegou a segurança em mandado de segurança impetrado com o objetivo de obter provimento judicial que lhe assegure o direito ao aproveitamento de créditos do PIS e da COFINS incidentes sobre o custo de aquisição dos combustíveis óleo diesel, até 90 (noventa) dias após a publicação da Lei Complementar n. 194/2022, nos termos do texto original do art. 9º da Lei Complementar 192/2022, bem como do § 2º, introduzido pela MPV 1.118/2022.

 Não houve condenação em honorários advocatícios, consoante legislação de regência do mandado de segurança.

Em suas razões recursais, a apelante, alega, em síntese, que: a) "ainda que por um período predeterminado – até 31/12/2022 – o legislador complementar optou por suspender o regime monofásico aplicado à cadeia de circulação do óleo diesel/GLP para implementar, em seu lugar, a sistemática da alíquota zero, sendo inviável, portanto, aplicar às incidências deste período regulamentação atinente ao regime monofásico de PIS e COFINS sobre tais produtos, dentre elas aquela prevista no artigo 3º, I, “b” das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003"; b) "pode-se utilizar o art. 17 da Lei 11.093/2004 para o caso em comento, conforme exposto na Solução de Consulta nº 66 - Cosit com data de 29 de março de 2021"; c) "Exatamente pelo fato de que o art. 17 da Lei nº 11.033/04 já assegurava a manutenção pelo vendedor, dos créditos vinculados às vendas efetuadas com alíquota zero de PIS/COFINS é que a referência da parte final do art. 9º da LC nº 192/2022, em sua redação original, não poderia ser outro senão aos créditos decorrentes das aquisições dos produtos lá mencionados. Não fosse assim, não haveria razão para a lei complementar apenas reproduzir de forma desnecessária, regra já existente no ordenamento jurídico. Aplica-se aqui o brocardo hermenêutico-jurídico segundo o qual a lei não contém palavras inúteis (“verba cum effectu sun accipienda”)"; d) " o fato de os arts. 3º, §2º, II, das Leis nº 10.637/2002 e 10.833/2003 vedarem o surgimento de créditos de PIS/COFINS decorrentes de operações não sujeitas ao pagamento das contribuições não impede que norma legal de idêntica hierarquia venha a dispor em sentido contrário. Isso se deve ao fato de que o regramento da não cumulatividade do PIS e da COFINS foi delegado pela Constituição ao legislador ordinário"; e) "A análise de todo este complexo panorama normativo demonstra que a maneira aparentemente açodada e pouco técnica com que as inovações legislativas se sucederam contribuíram para um cenário de insegurança jurídica e obscuridade normativa que prejudicou não apenas os contribuintes, mas o próprio Poder Público no planejamento da política fiscal. De fato, em um período de pouco mais de três meses, três diplomas legais (LC nº 192/2022, MP nº 1.118/2022 e LC nº 194/2022) trataram de uma mesma questão de formas diferentes. Isso se soma a toda a dificuldade de interpretação da legislação tributária pátria, com sucessivas remissões de dispositivos legais uns pelos outros, que demandam um esforço interpretativo que sequer seria razoável de exigir dos contribuintes"; f) " pela aplicação da regra do artigo 111 do CTN, não há que se falar em outra significação para autorização inicialmente prevista na parte final do caput do artigo 9º, da Lei Complementar 192/2022, além daquela que decorre da leitura fria e literal de seu texto, que permitiu, sem margem para interrogações, a manutenção dos créditos vinculados às operações de aquisição de óleo diesel/GLP sujeito à alíquota zero das contribuições ao PIS e a COFINS para todos os personagens da cadeia de circulação do produto"; g) "por alterarem a relação jurídica entre o Fisco e os revendedores de óleo diesel/GLP, tolhendo o direito destes ao creditamento inicialmente previsto no artigo 9º, caput, última parte, da Lei 192/2022, em clara desconstituição de direito até então legalmente assegurado, a MP 1.118/2022 e a LC 194/2022 não podem ser tidas como atos meramente interpretativos, vedada a retroação de seus efeitos"; h) "com base no princípio da anterioridade nonagesimal, segurança jurídica e da não surpresa, os efeitos da MP 1.118/22 quanto à vedação de descontos de créditos sobre as aquisições de óleo diesel/GLP tributadas à alíquota zero por todos os integrantes da cadeia de circulação do bem, podem ter eficácia jurídica e, portanto, aplicabilidade no mundo fenomênico, apenas 90 dias após a sua vigência, e com a publicação da LC 194/2022, somente em 21/09/2022".

A apelada apresentou contrarrazões.

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo regular prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


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V O T O

 

 

A apelação não deve ser provida. 

O caso dos autos versa sobre mandado de segurança impetrado por revendedora de combustíveis, em que se pleiteia provimento jurisdicional que autorize a impetrante a apropriar-se de créditos de PIS/Pasep e Cofins na aquisição de óleo diesel e suas correntes; biodiesel e gás liquefeito de petróleo (GLP); derivado de petróleo e gás natural; e querosene de aviação desde a entrada em vigor da Lei Complementar n.º 192, em 11 de março de 2022, até o decurso do prazo de 90 dias contados da publicação da Lei Complementar n.º 194/2022, que ocorreu em 21/09/2022, em atenção ao princípio da anterioridade nonagesimal previsto nos arts. 150, III, “c” e 195, § 6º, da Constituição Federal/88.

A impetrante alega, em suma, que a LC 192/2022 criou regime de crédito do custo de aquisição dos combustíveis previstos por ela, como o diesel, para todos os elos da cadeia e que a MP 1118/2022, por retirar benefício fiscal e importar em aumento indireto de tributo, precisa respeitar a anterioridade nonagesimal imposta pelo art. 195, § 6º da CF.

A pretensão da impetrante esbarra na irrefutável impossibilidade de creditamento das revendedoras, em relação aos produtos submetidos à incidência concentrada da tributação (monofasia) - combustíveis, decorrente da lógica do próprio regime de tributação.

Conforme o art. 150, § 6º da Constituição Federal, a concessão de benefícios fiscais somente pode ser feita mediante lei específica:

 

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

[...]

§ 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

 

A Emenda Constitucional 42/2003, ao acrescentar o § 12 ao art. 195 da Constituição Federal, estabeleceu que a lei definirá os setores da atividade econômica em que as contribuições sociais serão não-cumulativas:

 

[...]

§ 12. A lei definirá os setores de atividade econômica para os quais as contribuições incidentes na forma dos incisos I, b; e IV do caput, serão não-cumulativas.

 

As limitações impostas pelo legislador constitucional exigem que as questões relativas aos benefícios ficais sejam tratadas com rigor legal, não permitindo interpretações ampliativas, alargamentos, a fim de que não haja concessão de benefícios sem lei específica.

A impetrante se submete à tributação da contribuição ao PIS e da COFINS não cumulativas.

A legislação de regência da matéria não prevê os incentivos fiscais pretendidos nesta demanda, o que obsta o acolhimento da pretensão.

Como visto, o comércio de combustíveis para veículos automotores, quanto ao PIS e à COFINS, sujeita-se ao regime de tributação monofásico instituído pela Lei 10.147/2000.

A tributação de PIS/COFINS na venda de combustíveis, tem-se no ordenamento jurídico atual, a incidência apenas sobre as receitas dessa atividade, por produtor ou importador, por meio de alíquotas específicas e definidas em lei.

O PIS/COFINS incidente sobre combustíveis devem ser calculados com a aplicação de alíquotas diferenciadas, sobre a receita bruta, auferida com a venda destes produtos. Contudo, a alíquota é reduzida a zero, quando for aplicada sobre a receita auferida com as vendas efetuadas pelos distribuidores e comerciantes varejistas.

Sendo assim, as receitas de revenda desse combustível, por aquele que compra de produtor ou importador, não irão integrar a base de cálculo de PIS/COFINS incidentes sobre as receitas totais do revendedor, justamente em razão do sistema monofásico.

Dessa forma, as receitas de revenda atinentes à mercadoria sujeita ao regime monofásico não receberão a referida tributação.

O inciso II do § 2º do artigo 3º das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003 proíbe o direito a crédito de PIS e COFINS na aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, como ocorre no caso dos produtos cuja alíquota seja zero:

 

Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:

(...)

§ 2o Não dará direito a crédito o valor:     

 (...)

II - da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição.          

 

Art. 3o Do valor apurado na forma do art. 2o a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a: 

(...)

§ 2o Não dará direito a crédito o valor:    

(...)         

II - da aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, inclusive no caso de isenção, esse último quando revendidos ou utilizados como insumo em produtos ou serviços sujeitos à alíquota 0 (zero), isentos ou não alcançados pela contribuição.  (destaque nosso)

 

A expressão "não sujeitos ao pagamento dessas contribuições" abrange, obviamente, os produtos adquiridos tributados à alíquota zero, pois nessa hipótese também não há pagamento das referidas contribuições.

O ordenamento jurídico deixa claro que o revendedor de combustíveis não poderá ter crédito de PIS/COFINS sobre as aquisições dessas mercadorias. Isso ocorre pela simples razão de que a compra não foi onerada com as contribuições. Sendo zero a alíquota, nada foi pago a título de PIS/COFINS pelo vendedor, não agravando o custo de aquisição para o comprador. Se a aquisição não foi onerada pelas contribuições, não existe conteúdo econômico capaz de gerar os créditos. Não há lei que outorgue o crédito nas aquisições de insumos com alíquota zero.

Afasta-se a ideia de incidência de contribuição com efeito "cascata", pois, se não houve recolhimento da contribuição em operações anteriores, não existe valor a ser creditado na operação seguinte. Inexiste superposição de incidência. Para existir direito a creditamento, é imprescindível que tenha havido cobrança e pagamento anteriores.

O Superior Tribunal de Justiça já firmou compreensão no sentido contrário à pretensão de creditamento, na revenda, de produtos sujeitos à tributação monofásica, conforme julgamento em recurso repetitivo (Tema Repetitivo 1093):

 

RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC/2015. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3. RECURSO REPETITIVO. TRIBUTÁRIO. PIS/PASEP E COFINS. TRIBUTAÇÃO MONOFÁSICA. CREDITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE PARA AS SITUAÇÕES DE MONOFASIA. RATIO DECIDENDI DO STF NO TEMA DE REPERCUSSÃO GERAL N. 844 E NA SÚMULA VINCULANTE N. 58/STF. VIGÊNCIA DOS ARTS. 3º, I, "B", DAS LEIS N. N. 10.637/2002 E 10.833/2003 (COM A REDAÇÃO DADA PELOS ARTS. 4º E 5º, DA LEI N. 11.787/2008) FRENTE AO ART. 17 DA LEI 11.033/2004 COMPROVADA PELOS CRITÉRIOS CRONOLÓGICO, DA ESPECIALIDADE E SISTEMÁTICO. ART. 20, DA LINDB. CONSEQUÊNCIAS PRÁTICAS INDESEJÁVEIS DA CONCESSÃO DO CREDITAMENTO.
[...]
10. Teses propostas para efeito de repetitivo:
10.1. É vedada a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre os componentes do custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica (arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003).
10.2. O benefício instituído no art. 17, da Lei 11.033/2004, não se restringe somente às empresas que se encontram inseridas no regime específico de tributação denominado REPORTO.
10.3. O art. 17, da Lei 11.033/2004, diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação em vigor, portanto não permite a constituição de créditos da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica, já que vedada pelos arts. 3º, I, "b" da Lei n. 10.637/2002 e da Lei n. 10.833/2003.
10.4. Apesar de não constituir créditos, a incidência monofásica da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS não é incompatível com a técnica do creditamento, visto que se prende aos bens e não à pessoa jurídica que os comercializa que pode adquirir e revender conjuntamente bens sujeitos à não cumulatividade em incidência plurifásica, os quais podem lhe gerar créditos.
10.5. O art. 17, da Lei 11.033/2004, apenas autoriza que os créditos gerados na aquisição de bens sujeitos à não cumulatividade (incidência plurifásica) não sejam estornados (sejam mantidos) quando as respectivas vendas forem efetuadas com suspensão, isenção, alíquota 0 (zero) ou não incidência da Contribuição para o PIS/PASEP e da COFINS, não autorizando a constituição de créditos sobre o custo de aquisição (art. 13, do Decreto-Lei n. 1.598/77) de bens sujeitos à tributação monofásica.
11. Recurso especial não provido.
(REsp n. 1.894.741/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, julgado em 27/4/2022, DJe de 5/5/2022. Tema 1.093)                        

 

A argumentação de que as normas impeditivas do creditamento teriam sido revogadas pela LC 192, de 2022, se assemelha à superada controvérsia de que essas mesmas normas teriam sido revogadas pelo art. 17 da Lei 11.033, de 2004,  questão, como visto, dirimida pelo julgamento do Tema 1.093 de Recursos Repetitivos do STJ. 

No julgamento do Tema 1.093 de Recursos Repetitivos do STJ, discutia-se se o art. 17 da Lei 11.033, de 2004 havia revogado as vedações legais ao creditamento do revendedor.

A Corte Superior concluiu que as vedações legais, naquele caso, são da essência do regime de tributação concentrada em uma única fase. A expressão que assegurava que o sujeito mantivesse os créditos existentes, não se comunicava com a vedação à obtenção de créditos referentes aos produtos de tributação monofásica.

Cabe destacar, por oportuno, que o art. 9º da Lei Complementar n. 192/2022, em sua redação original (Art. 9º As alíquotas da Contribuição para os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Contribuição para o PIS/Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) de que tratam os incisos II e III do caput do art. 4º da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1998, o art. 2º da Lei nº 10.560, de 13 de novembro de 2002, os incisos IIIII e IV do caput do art. 23 da Lei nº 10.865, de 30 de abril de 2004, e os arts. 3º e 4º da Lei nº 11.116, de 18 de maio de 2005, ficam reduzidas a 0 (zero) até 31 de dezembro de 2022, garantida às pessoas jurídicas da cadeia, incluído o adquirente final, a manutenção dos créditos vinculados.), ao reduzir a zero as alíquotas de PIS e COFINS incidentes sobre as aquisições de combustíveis, não instituiu qualquer espécie de crédito presumido.

A disposição "garantida às pessoas jurídicas da cadeia, incluído o adquirente final, a manutenção dos créditos vinculados.", constante da parte final do caput, não assegura a possibilidade de apropriação de créditos de PIS e COFINS em operações sujeitas à alíquota zero. A finalidade dessa norma é tão-somente garantir aos adquirentes de combustíveis como insumos, em operações pretéritas, realizadas com alíquota positiva,  a manutenção dos créditos que já haviam apurado antes da LC 192, de 2022.

Nessa linha de intelecção, considerando que a LC 192/2022, em sua redação original, não instituiu qualquer crédito presumido de PIS ou COFINS, não há falar em supressão da possibilidade de apropriação de créditos pela MP 1.118/2022 e a LC 194/2022, já que o pretenso direito não existia.

Por via de consequência, a decisão proferida pelo STF na ADI 7181 MC, para determinar que "a Medida Provisória nº 1.118, de 17 de maio de 2022, somente produza efeitos após decorridos noventa dias da data de sua publicação.", nada interfere na conclusão de que a impetrante não possui direito a creditamento de PIS e COFINS nas aquisições de combustíveis destinados à revenda que sejam sujeitas à alíquota zero.

A respeito, o e. TRF da 4ª Região na Apelação Cível n. 5000715-83.2021.4.04.7206 (SEGUNDA TURMA, Relator RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 23/11/2022):

 

Acresce que o julgado embargado ressaltou que o art. 9º, caput, da Lei Complementar nº 192, de 2022, não confere à impetrante, ora embargante, o direito de deduzir crédito de PIS e COFINS dos combustíveis sujeitos à alíquota zero das contribuições. Conforme constou no acórdão, não há como extrair do art. 9º, caput, da Lei Complementar nº 192, de 2022, a interpretação de que todas as pessoas jurídicas integrantes da cadeia econômica dos combustíveis a que se refere o dispositivo (p.ex., óleo diesel e suas correntes, querosene de aviação, biodiesel etc.) têm garantida a "manutenção dos créditos vinculados". Isso porque os dispositivos legais mencionados pelo art. 9º, caput, tratam exclusivamente da contribuição ao PIS e da COFINS devidas pelos produtores/fabricantes e importadores daqueles combustíveis, os quais, antes da Lei Complementar nº 192, de 2022, eram onerados pela incidência das contribuições e, atualmente, se beneficiam da redução a zero das alíquotas (até 31 de dezembro de 2022). Por seu turno, os atacadistas e varejistas de combustíveis (caso da impetrante), antes mesmo dessa alteração legislativa, já se valiam da alíquota zero das contribuições, de modo que as modificações trazidas pela Lei Complementar nº 192, de 2022, não lhes dizem respeito. Nem mesmo o fato de o art. 9º, caput, dizer que fica garantida aos adquirentes finais a manutenção dos créditos vinculados aproveita à impetrante, pois "adquirentes finais" são os consumidores finais, e não as pessoas jurídicas atacadistas/varejistas que atuam na comercialização do produto

Também não assiste razão à embargante quando sustenta omissão no acórdão quanto à "expressa previsão do § 2º do art. 9º da Lei Complementar nº 192/2022 (incluído pela MP nº 1.118/2022) citado pela embargante na petição protocolada no evento nº 14, que assegurou o direito à manutenção de créditos pelas revendedoras de combustíveis, tal como a embargante". O citado dispositivo, quando do protocolo da petição do evento nº 14, dispunha que "Aplica-se às pessoas jurídicas produtoras ou revendedoras dos produtos de que trata o caput o disposto no art. 17 da Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004" (redação dada pela Medida Provisória nº 1.118, de 2022). Ocorre que o fato de se aplicar às revendedoras dos combustíveis de que trata o art. 9º, caput, da Lei Complementar nº 192, de 2022 (tal como a impetrante), o disposto no art. 17 da Lei nº 11.033, de 2004, não significa que a contribuinte tem direito ao creditamento postulado. Isso porque, conforme destacado no acórdão embargado, o Superior Tribunal de Justiça firmou a tese de que o art. 17 da Lei nº 11.033, de 2004, não permite a dedução de créditos de PIS e COFINS calculados em relação ao custo de aquisição de bens sujeitos à tributação monofásica (como os combustíveis). O referido artigo diz respeito apenas à manutenção de créditos cuja constituição não foi vedada pela legislação de regência, a exemplo dos gastos previstos nos incisos III a XI das Leis nºs 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003 (REsps nºs 1.894.741/RS e 1.895.255/RS - Tema Repetitivo nº 1.093). Tanto que a Lei Complementar nº 194, de 2022, alterou o §2º do art. 9ºda  Lei Complementar nº 192, de 2022, exatamente para deixar ainda mais clara essa orientação, in verbis:  

§ 2º Aplicam-se às pessoas jurídicas atuantes na cadeia econômica dos produtos de que trata o caput deste artigo: (Redação dada pela Lei Complementar nº 194, de 2022)

I - em relação à aquisição de tais produtos, as vedações estabelecidas na alínea b do inciso I do art. 3º e no inciso II do § 2º do art. 3º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e na alínea b do inciso I do art. 3º e no inciso II do § 2º do art. 3º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003; e (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022)

II - em relação aos créditos de que tratam o art. 3º da Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002, e o art. 3º da Lei nº 10.833, de 29 de dezembro de 2003, distintos do crédito referido no inciso I deste parágrafo, a autorização estabelecida pelo art. 17 da Lei nº 11.033, de 21 de dezembro de 2004. (Incluído pela Lei Complementar nº 194, de 2022)

Ademais, ao contrário do que alega a embargante, não há omissão no acórdão quanto à decisão do Supremo Tribunal Federal que concedeu a liminar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 7.181/DF, uma vez que tal decisão não guarda pertinência com o caso dos autos. É que o Supremo concedeu a liminar para determinar que a Medida Provisória nº 1.118, de 2022, no que revogou a possibilidade de as pessoas jurídicas adquirentes finais dos produtos a que se refere o caput do art. 9º da Lei Complementar nº 192, de 2022, manterem os créditos vinculados, somente produza efeitos após decorridos noventa dias da data da sua publicação, em observância à anterioridade nonagesimal (ADI nº 7181 MC-REF/DF, Relator Ministro Dias Toffoli, DJe 08/08/2022). Contudo, conforme já referido na presente fundamentação, o termo "adquirente final" corresponde apenas ao consumidor final, não englobando as pessoas jurídicas varejistas/atacadistas que atuam na comercialização dos combustíveis (caso da impetrante). (destaque nosso)

 

Esse também é o entendimento desta e. Terceira Turma: 

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO. LEI COMPLEMENTAR 194/2022. PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO DOS CRÉDITOS DE PIS E COFINS DOS COMBUSTÍVEIS ADQUIRIDOS PARA REVENDA ATÉ 20.09.2022 (OBSERVÂNCIA DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL). PROBABILIDADE DO DIREITO E PERIGO NA DEMORA NÃO CARACTERIZADOS.
1. O agravante, na qualidade de Sindicato Nacional do Comércio Transportador,-Revendedor Retalhista de Combustíveis – SINDTRR, impetrou mandado de segurança coletivo no qual objetiva, em síntese, provimento jurisdicional que determine que a Lei Complementar 194/2022 observe o princípio da anterioridade nonagesimal, produzindo efeitos somente a partir de 21.09.2022, de modo que seja preservado o direito de seus substituídos no presente mandamus à manutenção dos créditos de PIS e COFINS para revenda, reconhecidos na redação original do art. 9º Lei Complementar 192/2022, até a data de 20.09.2022.
2. O recorrente sustenta que a situação discutida nos autos da ADI 7.181, no bojo da qual foi concedida em parte a liminar para determinar que a Medida Provisória 1.118, de 17 de maio de 2022, somente produza efeitos após decorridos noventa dias da data de sua publicação, é equivalente à discussão travada na ação originária (mandado de segurança coletivo 5023112-52.2022.4.03.6100), já que os revendedores de combustíveis tiveram revogado seu direito de aproveitar os créditos de PIS e COFINS dos combustíveis adquiridos para revenda, havendo majoração indireta dessas contribuições pela Lei Complementar 194/2022.
3. O d. Juízo pautou-se, em suma, no entendimento de que a finalidade da LC 192/2022 foi desonerar os combustíveis submetidos ao regime monofásico durante o ano de 2022, o que não pode ser entendido como nova disciplina à impossibilidade de creditamento na aquisição para revenda, tanto que não foram revogados os arts. 3º, I, “b”, das Leis 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003, que proíbe a obtenção de crédito na aquisição de bens ou serviços submetidos à alíquota zero de PIS e COFINS.
4. Além dos fundamentos apresentados na decisão agravada, cumpre observar também que a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, em sede cautelar, nos autos da ADI 7.181, tratou de inovação legislativa diversa (a MP 1.118/2022) e não se refere ao creditamento nas hipóteses de aquisição de bens para revenda (em discussão na presente hipótese), mas especificamente à tomada de créditos pelas pessoas jurídicas que adquirem combustíveis para uso próprio.
5. Considerando também a via processual escolhida pelo contribuinte, entendo que igualmente não está demonstrado o perigo na demora, concernente a eventual ineficácia da medida caso venha a ser concedida somente em sede de cognição exauriente (art. 7º, III, da Lei 12.016/2009).
6. Em síntese, não se identifica, nesta cognição sumária, a existência de probabilidade do direito, além de não ter sido demonstrada a existência de perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
7. Agravo de instrumento improvido.
(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5027644-36.2022.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 16/02/2023, Intimação via sistema DATA: 27/02/2023)

 

Dessa forma, inexiste previsão legal ou constitucional que ampare o pedido da parte impetrante, não havendo falar em afronta aos princípios constitucionais da não cumulatividade, do direito adquirido, da legalidade, da irretroatividade das leis e da segurança jurídica.

Em face de todo o exposto, nego provimento à apelação, nos termos da fundamentação acima.

É como voto.

 



E M E N T A

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LEI COMPLEMENTAR 194/2022. PRETENSÃO DE MANUTENÇÃO DOS CRÉDITOS DE PIS E COFINS DOS COMBUSTÍVEIS ADQUIRIDOS PARA REVENDA ATÉ 21.09.2022. OBSERVÂNCIA DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. VÍCIO INEXISTENTE. REVENDEDORA DE COMBUSTÍVEIS. CREDITAMENTO. AUSÊNCIA DO DIREITO. REGIME MONOFÁSICO DE TRIBUTAÇÃO. 

1. A pretensão da impetrante esbarra na irrefutável impossibilidade de creditamento das revendedoras, em relação aos produtos submetidos à incidência concentrada da tributação (monofasia) - combustíveis, decorrente da lógica do próprio regime de tributação.

2. As limitações impostas pelo legislador constitucional exigem que as questões relativas aos benefícios ficais sejam tratadas com rigor legal, não permitindo interpretações ampliativas, alargamentos, a fim de que não haja concessão de benefícios sem lei específica.

3. A impetrante se submete à tributação da contribuição ao PIS e da COFINS não cumulativas.

4. O comércio de combustíveis para veículos automotores, quanto ao PIS e à COFINS, sujeita-se ao regime de tributação monofásico instituído pela Lei 10.147/2000.

5. O PIS/COFINS incidente sobre combustíveis devem ser calculados com a aplicação de alíquotas diferenciadas, sobre a receita bruta, auferida com a venda destes produtos. Contudo, a alíquota é reduzida a zero, quando for aplicada sobre a receita auferida com as vendas efetuadas pelos distribuidores e comerciantes varejistas.

6. O inciso II do § 2º do artigo 3º das Leis nºs 10.637/2002 e 10.833/2003 proíbe o direito a crédito de PIS e COFINS na aquisição de bens ou serviços não sujeitos ao pagamento da contribuição, como ocorre no caso dos produtos cuja alíquota seja zero.

7. As receitas de revenda atinentes à mercadoria sujeita ao regime monofásico não receberão a referida tributação.

8. O ordenamento jurídico deixa claro que o revendedor de combustíveis não poderá ter crédito de PIS/COFINS sobre as aquisições dessas mercadorias. Isso ocorre pela simples razão de que a compra não foi onerada com as contribuições. Sendo zero a alíquota, nada foi pago a título de PIS/COFINS pelo vendedor, não agravando o custo de aquisição para o comprador. Se a aquisição não foi onerada pelas contribuições, não existe conteúdo econômico capaz de gerar os créditos. Não há lei que outorgue o crédito nas aquisições de insumos com alíquota zero.

9. Afasta-se a ideia de incidência de contribuição com efeito "cascata", pois, se não houve recolhimento da contribuição em operações anteriores, não existe valor a ser creditado na operação seguinte. Inexiste superposição de incidência. Para existir direito a creditamento, é imprescindível que tenha havido cobrança e pagamento anteriores.

10. O Superior Tribunal de Justiça já firmou compreensão no sentido contrário à pretensão de creditamento, na revenda, de produtos sujeitos à tributação monofásica, conforme julgamento em recurso repetitivo (Tema Repetitivo 1093). 

11. A Corte Superior concluiu que as vedações legais, naquele caso, são da essência do regime de tributação concentrada em uma única fase. A expressão que assegurava que o sujeito mantivesse os créditos existentes, não se comunicava com a vedação à obtenção de créditos referentes aos produtos de tributação monofásica.

12. O art. 9º da Lei Complementar n. 192/2022, em sua redação original, ao reduzir a zero as alíquotas de PIS e COFINS incidentes sobre as aquisições de combustíveis, não instituiu qualquer espécie de crédito presumido.

13. A disposição "garantida às pessoas jurídicas da cadeia, incluído o adquirente final, a manutenção dos créditos vinculados.", constante da parte final do caput, não assegura a possibilidade de apropriação de créditos de PIS e COFINS em operações sujeitas à alíquota zero. A finalidade dessa norma é tão-somente garantir aos adquirentes de combustíveis como insumos, em operações pretéritas, realizadas com alíquota positiva,  a manutenção dos créditos que já haviam apurado antes da LC 192, de 2022.

14. Considerando que a LC 192/2022, em sua redação original, não instituiu qualquer crédito presumido de PIS ou COFINS, não há falar em supressão da possibilidade de apropriação de créditos pela MP 1.118/2022 e a LC 194/2022, já que o pretenso direito não existia.

15. A decisão proferida pelo STF na ADI 7181 MC, para determinar que "a Medida Provisória nº 1.118, de 17 de maio de 2022, somente produza efeitos após decorridos noventa dias da data de sua publicação.", nada interfere na conclusão de que a impetrante não possui direito a creditamento de PIS e COFINS nas aquisições de combustíveis destinados à revenda que sejam sujeitas à alíquota zero. Precedente.

16. Não existe previsão legal ou constitucional que ampare o pedido da parte impetrante, não havendo falar em afronta aos princípios constitucionais da não cumulatividade, do direito adquirido, da legalidade, da irretroatividade das leis e da segurança jurídica.

17. Apelação não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
CONSUELO YOSHIDA
Desembargadora Federal