Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5025983-63.2024.4.03.6301

RELATOR: 32º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: MARIA RAIMUNDA SANTIAGO

Advogado do(a) RECORRENTE: VALERIA FERREIRA DE MELO - SP124483-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO VANDERLER DE LIMA JUNIOR - SP507204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5025983-63.2024.4.03.6301

RELATOR: 32º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: MARIA RAIMUNDA SANTIAGO

Advogado do(a) RECORRENTE: VALERIA FERREIRA DE MELO - SP124483-A

RECORRIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO VANDERLER DE LIMA JUNIOR - SP507204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

  R E L A T Ó R I O

 


Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

São Paulo, 14 de fevereiro de 2025.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5025983-63.2024.4.03.6301

RELATOR: 32º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: MARIA RAIMUNDA SANTIAGO

Advogado do(a) RECORRENTE: VALERIA FERREIRA DE MELO - SP124483-A

RECORRIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO VANDERLER DE LIMA JUNIOR - SP507204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

  V O T O


Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  

 

 

 

São Paulo, 14 de fevereiro de 2025.



 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5025983-63.2024.4.03.6301

RELATOR: 32º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: MARIA RAIMUNDA SANTIAGO

Advogado do(a) RECORRENTE: VALERIA FERREIRA DE MELO - SP124483-A

RECORRIDO: CAIXA ECONOMICA FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: ANTONIO VANDERLER DE LIMA JUNIOR - SP507204-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

EMENTA

CIVIL. DANOS MORAIS E MATERIAIS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA.

1. Pedido de indenização por danos morais e materiais decorrentes de movimentação bancária fraudulenta

2. Sentença de parcial procedência lançada nos seguintes termos:

“(...)

Concernente ao ônus probatório, a parte autora requereu a aplicação da inversão do ônus da prova, com base no art. 6º, VIII, do CDC. Sem razão, contudo, a requerente. O caso dos autos trata de situação de uso por terceiros de cartão de crédito original e da senha da vítima. Nesses casos, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça é de inaplicação da inversão do ônus probatório. Para a Corte:

Se as transações contestadas forem feitas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal, passa a ser do consumidor a incumbência de comprovar que a instituição financeira agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao efetivar a entrega de numerário a terceiros (REsp n. 2.015.732/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 20/6/2023, DJe de 26/6/2023)

Desse modo, a distribuição da carga probatória deve ser realizada nos moldes do art. 373 do Código de Processo Civil.

É incontroverso nos autos (art. 374, II, CPC/15) que foram realizadas, no dia 18/09/2023, operações bancárias de compra com uso do cartão da parte autora. Os danos materiais sofridos são de R$ 5.570,00. Este valor decorreu de quatro compras realizadas com o cartão de bandeira Elo, nos montantes de R$ 1.000,00, R$ 2.000,00, R$ 2.500,00 e R$ 70,00 (pág. 7 do ID 330709602). 

A parte promovente, contudo, não fez prova do alegado uso por terceiros do limite de R$ 2.726,99 do cartão de crédito. Consta nos autos apenas fatura “cartões Caixa”, com vencimento para 15/12/2023 e menção a um limite disponível de R$ 2.726,99 (ID 330709602 - Pág. 35)

A defesa, por sua vez, alega que o contrato de crédito consignado não foi firmado com a agência Sé, e que a parte autora não produziu provas da realização do empréstimo consignado em sua conta.

Sobre em qual agência o contrato foi realizado, consigno que é de todo irrelevante. A agência não tem personalidade jurídica e, independentemente de em qual agência tenha sido entabulado o negócio, a CEF será o sujeito da relação jurídica.

Quanto à prova da existência do empréstimo, verifico sua produção no caso. No histórico de créditos do INSS (ID 330709602 - Pág. 4) consta a realização de “consignação empréstimo bancário”, com prestações de R$ 375,97. O mesmo se diz dos documentos de ID 330709602 - Pág. 6 e 7, os quais mencionam expressamente liberação de crédito, aos 17/08/2024, de R$ 9.000,00, em 47 parcelas. Portanto, há prova da realização do empréstimo em consignação.

Ainda sobre o quadro fático, a defesa alega que a parte autora informou, em seu processo de contestação da operação bancária, que “o cartão foi perdido/roubado/ou furtado E QUE MANTINHA A SENHA ANOTADA JUNTO AO REFERIDO CARTÃO”.

Em que pese a CEF ter afirmado que a parte ré mantinha a senha anotada junto ao cartão, não produziu qualquer prova desse fato, não juntou a declaração da autora de que matinha a senha junto ao cartão, nem o processo de contestação, tampouco qualquer outro documento. Portanto, não se desincumbiu de seu ônus probatório (art. 373, II, CPC).

Quanto a esse aspecto probatório, no entanto, a parte autora declarou no boletim de ocorrência lavrado, em 28/09/2023, na Polícia Civil do Estado de São Paulo, que:

“Na rua Eng. Armando de Arruda Pereira número 989 onde dentro da galeria encontra-se uma agencia da lotérica. Efetuei o pagamento de uma conta de agua no valor de R$ 111,30 e uma conta da Tim no valor R$ 63.99, sendo esses pagamentos com o cartão de debito da caixa coloquei o cartão na maquininha e digitei a minha senha. Após feito o pagamento não me recordo de ter pego o cartão”. (destaques de agora)

Infere-se, portanto, que a parte demandante teve seu cartão extraviado, tenha sido ele perdido ou furtado. E, em razão do extravio, foram realizadas as operações bancárias contestadas neste processo.

Cinge-se, portanto, a controvérsia acerca do fato se houve fraude na movimentação, a responsabilidade dos danos materiais e morais decorrentes da referida conduta, em especial os elementos configuradores da responsabilidade civil (conduta, dano e nexo causal) da CEF. 

Com o advento do Código de Proteção e Defesa do Consumidor – CDC (Lei nº 8.078/90), passando a disciplinar as relações de consumo, todo aquele que exerce atividade no campo de fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes de sua atividade, conforme dispõem os artigos 12 e 14. 

A responsabilidade prevista no diploma legal em referência distingue-se por fato do produto e fato do serviço. A segunda vem disciplinada no art. 14 do CDC e caracteriza-se por acidentes de consumo decorrentes de defeitos no serviço. O Des. Sergio Cavalieri Filho, em sua obra "Programa de Responsabilidade Civil", Malheiros Editores, 1ª edição, 2ª tiragem, pág. 322, ao definir serviço, assevera que: 

"Entende-se por serviço qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista (art. 3º, 4 2º). O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em conta as circunstâncias relevantes, tais como o modo do seu fornecimento, o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam e a época em que foi fornecido (art. 14, § 1º). Como se vê, também aqui os defeitos podem ser de concepção, de prestação ou de comercialização (informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos)." 

Assim, não é necessário tecer maiores comentários para afirmar que o presente caso se refere a uma relação de consumo, aplicando-se o disposto no § 3º do art. 14 do CDC, que assevera que somente se demonstrar que o defeito não existiu ou que se deu por culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, poderá o fornecedor do serviço eximir-se da responsabilidade de indenizar os danos ocasionados, por ser a sua responsabilidade objetiva. Além disso, a aplicação desse diploma legal no caso em apreço é o entendimento pacífico do Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), conforme Súmula 297. 

Portanto, o réu somente se exime de sua responsabilidade se comprovar a ocorrência de uma das hipóteses contidas no artigo 14, § 3º, do CDC. 

A responsabilidade da parte autora pelas transferências indevidas não afasta a responsabilidade do banco no caso concreto, diante da teoria do risco da atividade, prevista no art. 14 do CDC e no art. 927, parágrafo único, do CC. 

Ademais, destaca-se que os réus não comprovaram excludente de sua responsabilidade, nos termos do art. 14, § 3º, do CDC, mesmo porque se trata de fato impeditivo do direito alegado na inicial (art. 373, II, do CPC), o que não restou demonstrado, em absoluto. Neste sentido o entendimento restou consolidado também na Súmula nº 479 do STJ, in verbis: “As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”. 

Se por um lado o consumidor encontra facilidade e agilidade nas movimentações financeiras, por outro o banco utiliza os serviços não presenciais e digitais como “marketing” para alavancar seus negócios angariando cada vez mais clientes. Ainda, diante da possibilidade de manter menor aparato para os trabalhos presenciais, acaba diminuindo seus gastos (gerando, portanto, maior lucro) e transferindo parte da sua atividade (a segurança das transações) ao próprio consumidor. 

Em virtude dessa lucratividade, cabe à instituição financeira criar mecanismos cada vez mais seguros para garantir que cada vez menos ocorram fraudes como a narrada nos autos. 

Uma simples análise do perfil do consumidor seria suficiente para constatar a possibilidade de fraude em relação às operações que fugirem por completo do costume do usuário, operando-se, por consequência, o bloqueio da conta fraudada. 

Em face desse contexto e à luz do disposto no art. 14 do CDC, de rigor estabelecer a responsabilidade objetiva do fornecedor “pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços” e a considerar defeituoso o serviço “quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar” (§ 1°), tendo em conta, entre outros fatores, “o modo de seu fornecimento” (inciso I). 

Desta forma, não tem a parte ré comprovado o ônus que lhe foi atribuído, a procedência do pedido é medida que se impõe, uma vez que a falta ou má prestação desses serviços vai de encontro aos direitos fundamentais, devendo o titular do direito lesionado ser indenizado. 

No que concerne à responsabilidade civil, assume a ré a obrigação de indenizar os danos sofridos (artigo 14, do CDC e artigos 186 e 927, do CC). 

Inicialmente, por se tratar de falha na prestação de serviços, entende-se que a responsabilidade é objetiva, na forma do art. 14, do CDC, consoante exposto acima. Estabelecida a natureza objetiva da responsabilidade, necessário averiguar o preenchimento dos seguintes requisitos para fins de atribuição do dever de indenizar: conduta, nexo de causalidade e dano.

De tudo o que se apurou durante a instrução probatória, não restam dúvidas de que os pressupostos da responsabilidade civil estão presentes e assiste ao réu o dever de indenizar.

O nexo causal restou igualmente bem delineado, tendo em vista o disposto no artigo 403 do CC/02 (teoria da causalidade adequada), considerando que a conduta da fraude perpetrada por terceiro se inclui no risco do empreendimento, por se tratar de fortuito interno, e que foi a causa aos prejuízos sofridos pela autora, tanto de ordem material, quanto moral.

No que concerne ao prejuízo material, verifica-se que restaram comprovados os débitos na conta corrente da autora no importe de R$ 5.570,00 (cinco mil quinhentos e setenta reais).

No que interessa ao caso concreto, os golpistas realizaram uma quantidade elevada de operações bancárias, incompatíveis com o perfil da pessoa titular da conta corrente. A parte autora, contudo, ao esquecer o seu cartão de crédito em uma agência lotérica, contribuiu para a ocorrência das operações por terceiros. Isto, destaco, mesmo que não tenha deixado a senha junto ao cartão.

O Colendo Superior Tribunal de Justiça, no REsp nº 1.995.458/SP, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, apreciou caso análogo ao dos autos, envolvendo o chamado “golpe do motoboy”, no qual a vítima também fornece o cartão e a senha para criminosos. A Corte decidiu que há condutas concorrentes/culpa concorrente:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIBILIDADE DE DÉBITO. CONSUMIDOR. GOLPE DO MOTOBOY. RESPONSABILIDADE CIVIL. USO DE CARTÃO E SENHA. DEVER DE SEGURANÇA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. 

1. Ação declaratória de inexigibilidade de débito. 

2. Recurso especial interposto em 16/08/2021. Concluso ao gabinete em 25/04/2022. 

3. O propósito recursal consiste em perquirir se existe falha na prestação do serviço bancário quando o correntista é vítima do golpe do motoboy. 

4. Ainda que produtos e serviços possam oferecer riscos, estes não podem ser excessivos ou potencializados por falhas na atividade econômica desenvolvida pelo fornecedor. 

5. Se as transações contestadas forem feitas com o cartão original e mediante uso de senha pessoal do correntista, passa a ser do consumidor a incumbência de comprovar que a instituição financeira agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao efetivar a entrega de numerário a terceiros. Precedentes. 

6. A jurisprudência deste STJ consigna que o fato de as compras terem sido realizadas no lapso existente entre o furto e a comunicação ao banco não afasta a responsabilidade da instituição financeira. Precedentes. 

7. Cabe às administradoras, em parceria com o restante da cadeia de fornecedores do serviço (proprietárias das bandeiras, adquirentes e estabelecimentos comerciais), a verificação da idoneidade das compras realizadas com cartões magnéticos, utilizando-se de meios que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, independentemente de qualquer ato do consumidor, tenha ou não ocorrido roubo ou furto.Precedentes. 

8. A vulnerabilidade do sistema bancário, que admite operações totalmente atípicas em relação ao padrão de consumo dos consumidores, viola o dever de segurança que cabe às instituições financeiras e, por conseguinte, incorre em falha da prestação de serviço. 

9. Para a ocorrência do evento danoso, isto é, o êxito do estelionato, necessária concorrência de causas: (i) por parte do consumidor, ao fornecer o cartão magnético e a senha pessoal ao estelionatário, bem como (ii) por parte do banco, ao violar o seu dever de segurança por não criar mecanismos que obstem transações bancárias com aparência de ilegalidade por destoarem do perfil de compra do consumidor. 

10. Na hipótese, contudo, verifica-se que o consumidor é pessoa idosa, razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto do Idoso e da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos dos Idosos, sempre considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável. 

11. Recurso especial provido. 

(REsp n. 1.995.458/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 9/8/2022, DJe de 18/8/2022.) (destaques não constam no original) 

Do inteiro teor do REsp n. 1.995.458/SP, extrai-se que o caso é de condutas concorrentes, e, assim, “havendo culpa concorrente, a doutrina e a jurisprudência, em consonância com o art. 495 do Código Civil, recomendam dividir a indenização, não necessariamente pela metade, mas proporcionalmente ao grau de culpabilidade de cada um dos envolvidos”. 

A similitude fática do referido precedente ao caso dos autos é inferida pela circunstância de que, no caso julgado pelo STJ, “no período de onze minutos foram efetuadas nove compras com o cartão do recorrente, que juntas superam R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais), enquanto a média mensal de compra do recorrente era cerca de R$ 500,00 (quinhentos reais)”. Ademais, o precedente também envolveu caso de pessoa idosa. 

No caso dos autos, as transferências indevidas realizadas pelos golpistas destoavam do perfil bancário da parte autora. As 4 (quatro) operações se realizaram por meio do cartão, em valores muito mais elevados que o histórico das operações realizadas, assim como no mesmo dia e de forma progressiva, como demonstrado por meio do extrato bancário em anexo (pág. 7 do ID 330709602). 

Desse modo, a parte autora demonstrou que a CEF agiu com negligência, imprudência ou imperícia ao permitir as operações bancárias por terceiros. 

Ainda na esteira do REsp nº 1.995.458/SP, verifica-se que a parte autora é pessoa idosa, razão pela qual a imputação de responsabilidade há de ser feita sob as luzes do Estatuto da Pessoa Idosa e da Convenção Interamericana sobre a Proteção do Direitos Humanos dos Idosos, considerando a sua peculiar situação de consumidor hipervulnerável. 

Nesse sentido, colaciona-se julgado da TRU, no qual foi reconhecimento o dever de restituição integral por parte da CEF em caso também envolvendo “golpe do motoboy”:

CIVIL. FURTO DE CARTÃO E MOVIMENTAÇÃO BANCÁRIA INCOMPATÍVEL COM A CONTA DO CLIENTE. APOSENTADA COM 70 ANOS NA DATA DO FATO. COMPRAS, TRANSFERÊNCIAS E PAGAMENTO DE CONTAS EM VALOR ELEVADO QUE ZERARAM A CONTA. SITUAÇÃO FÁTICA INCONTROVERSA. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CEF. ART. 14 DO CDC. SENTENÇA REFORMADA. RESTITUIÇÃO DO VALOR DAS TRANSAÇÕES BANCÁRIAS. DANO MORAL DEVIDO. RECURSO DA AUTORA PROVIDO EM PARTE PARA DETERMINAR O RESSARCIMENTO DO DANO MATERIAL E FIXAR O DANO MORAL EM R$ 5.000,00. 

(RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP 5007307-04.2023.4.03.6301. Relator(a) Juiz Federal LUCIANA JACO BRAGA. 15ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo. Data do Julgamento: 24/07/2024) 

Colhe-se do inteiro teor do precedente das Turmas Recursais da 3ª Região que, com base no REsp nº1.995.458/SP, “a orientação jurisprudencial que vem se consolidando no STJ, que em recente julgamento de hipótese na qual se analisava golpe do motoboy aplicado a consumidor idoso, entendeu que a situação de hipervulnerável do autor autorizava a restituição integral do valor subtraído de sua conta”. 

No mesmo sentido, é o entendimento do Egrégio Tribunal da Terceira Região:

DIREITO CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. GOLPE DO “MOTOBOY”. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FORNECIMENTO DE SENHA. QUEBRA DE DEVER DE CONFIANÇA PELO CLIENTE. CONSUMIDOR IDOSO. HIPERVULNERABILIDADE.

1- Tratando-se de atuação de instituição financeira face consumidor de serviços bancários, a responsabilidade do banco é objetiva a teor dos artigos 3º, §2º e 14, do CDC, e também da Súmula nº. 297 do Superior Tribunal de Justiça.

2- Em regra, nas operações bancárias realizadas mediante uso do cartão e da senha pessoais do correntista, obtidos pelo golpista mediante fraude, a quebra do dever de guarda e sigilo contratuais afasta a responsabilidade do banco com fundamento na excludente da culpa exclusiva de terceiro.

3- Contudo, nas hipóteses de golpe realizado contra idoso, nas quais seja possível identificar uma alteração relevante de padrão regular de consumo, há responsabilidade da instituição financeira por falha do dever de segurança com relação ao consumidor hipervulnerável, justificando a indenização material pretendida.

4- Apelação provida em parte.

(AC nº 5003358-67.2022.4.03.6119, Segunda Turma, Rel. Des. Federal Giselle França, j. 30/10/2023, DJEN 09/11/2023) (grifos nossos)

Levando em consideração a idade da parte autora (76 anos à época dos fatos), que está em posição de vulnerabilidade e suscetível a essa espécie de golpe. Há um incremento no dever de segurança das instituições financeiras, porquanto as pessoas idosas são mais vulneráveis aos referidos golpes. 

Mostra-se incabível a devolução em dobro (art. 42, parágrafo único, do CDC). Isto porque, no caso, não ficou demonstrada má-fé por parte da CEF. Conforme o Tema Repetitivo 622 do Superior Tribunal de Justiça, a aplicação da sanção civil do pagamento em dobro reque a demonstração de má-fé do credor. Assim, a devolução deve ocorrer na forma simples.

Com relação ao dano moral, entendo não caracterizado. 

Como já demonstrado acima, a parte autora teve participação nos fatos narrados ao esquecer seu cartão bancário na casa lotérica, seja com ou sem sua senha pessoal anotada, facilitando ou permitindo que efetuassem as transações. Por isso, não há que se falar em dano moral a ser indenizado, em face da conduta concorrente.

Assim, o pleito merece acolhimento em parte para que a condenação por danos materiais se dê no valor correspondente à integralidade dos valores subtraídos da conta indevidamente.

 

Ante o exposto, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na petição inicial, para:

  1. Condenar a parte ré (Caixa Econômica Federal) a restituir, de forma simples, o valor de R$ 5.570,00 (cinco mil quinhentos e setenta reais), a ser atualizado monetariamente de acordo, a partir do desembolso (Súmula 43 do STJ) e de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação válida deste processo (art. 405, do CC/02), nos índices na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal; e

  2. Julgar improcedente o pedido ao pagamento de indenização por dano moral. 

Considerando a natureza alimentar do benefício de aposentadoria, concedo tutela provisória de urgência (art. 300, CPC) para condenar a parte ré a ressarcir os R$ 5.570,00 (cinco mil quinhentos e setenta reais) subtraídos na conta bancária da parte autora (banco CEF, agência 235 – Sé, conta corrente nº 596195.214, titular MARIA RAIMUNDA SANTIAGO, CPF nº 921.935.288-53).

Defiro a gratuidade de justiça.

Defiro a prioridade requerida nos termos do Estatuto do Idoso, respeitando-se a ordem cronológica em relação aos jurisdicionados em mesma situação e que tenham ingressado com suas demandas antes da parte autora, por respeito ao princípio da isonomia, a ser observado em relação às pessoas em iguais condições.

Sem custas e honorários. 

(...)”.

3. Recurso da parte autora, em que alega

(...)

(...)

(...)

(...)

(...)

(...)

(...)

4. Considerando as provas produzidas nos autos, a r. sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. 

5. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

6. Condeno a recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação. Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do artigo 98, § 3º, do CPC.

 

MAÍRA FELIPE LOURENÇO

JUÍZA FEDERAL RELATORA


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, Visto, relatado e discutido este processo, em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Primeira Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso inominado, nos termos do voto do(a) juiz(íza) federal relator(a)., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MAIRA FELIPE LOURENÇO
Juíza Federal