APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001080-37.2024.4.03.6115
RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA
APELANTE: CLAUDIO JOSE DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: LEOMAR GONCALVES PINHEIRO - SP144349-A
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001080-37.2024.4.03.6115 RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA APELANTE: CLAUDIO JOSE DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: LEOMAR GONCALVES PINHEIRO - SP144349-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (RELATOR): Trata-se de ação anulatória de consolidação de propriedade de imóvel e de leilões extrajudiciais c/c tutela provisória de urgência proposta por CLÁUDIO JOSÉ DA SILVA em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL — CEF (ID 314835167). Aduz a parte autora que firmou contrato de financiamento imobiliário com cláusula de alienação fiduciária em 21/11/2017 (contrato n.º 8.7877.0214438-3), cujo inadimplemento resultou em procedimento de execução extrajudicial, nos termos da Lei n.º 9.514/97. Entretanto, como não foi pessoalmente notificado para purgação da mora, tal como previsto na referida legislação, houve a consolidação da propriedade em nome da ré, com a consequente designação de leilões extrajudiciais para sua alienação. Devido a todo o exposto, postula a anulação dos atos expropriatórios. Liminarmente, foi deferida tutela provisória e determinada a suspensão dos leilões extrajudiciais designados pela ré (ID 314835348). Após regular trâmite processual, foi prolatada sentença julgando improcedente o pedido, com fulcro no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, e revogando a liminar deferida (ID 314835380). A parte autora ainda foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atualizado da causa, cuja exigibilidade restou suspensa devido à concessão do benefício da gratuidade de justiça, conforme teor do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil. Em face da r. sentença, o autor interpôs recurso de apelação (ID 314835432). Em suas razões, sustentou, em síntese, que o MM. Juízo a quo baseou-se na presunção de regularidade do procedimento adotado pela apelada e não considerou a obrigatoriedade da notificação pessoal do devedor fiduciante para purgação a mora, em que pese tal previsão esteja estampada no art. 26, § 3º, da Lei n.º 9.514/97. Ademais, alegou que a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL não se desincumbiu do ônus de comprovação da regularidade de sua notificação pessoal. Em razão disso, pleiteou: "(...) 1. O recebimento e processamento da presente apelação, com a concessão de efeito suspensivo, para que seja mantida a suspensão do leilão do imóvel até o julgamento final do recurso; 2. A reforma integral da sentença, com a declaração de nulidade da consolidação da propriedade e dos atos subsequentes, determinando a reanálise do caso e possibilitando ao Apelante a purgação da mora; 3. Caso Vossa Excelência entenda pela manutenção da consolidação, que seja designada nova audiência de conciliação para possibilitar um acordo entre as partes, visando a quitação das parcelas vencidas e a manutenção do contrato de financiamento; 4. A condenação da Apelada ao pagamento de honorários recursais, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. (...)" A apelada apresentou contrarrazões ao recurso (ID 314835433). Em suma, sustentou a legalidade do procedimento de consolidação da propriedade e pleiteou a manutenção da r. sentença tal como lançada. Vieram os autos conclusos. É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5001080-37.2024.4.03.6115 RELATOR: Gab. 04 - DES. FED. ALESSANDRO DIAFERIA APELANTE: CLAUDIO JOSE DA SILVA Advogado do(a) APELANTE: LEOMAR GONCALVES PINHEIRO - SP144349-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALESSANDRO DIAFERIA (RELATOR): Cinge-se a discussão à análise da regularidade da notificação do apelante para purgação da mora decorrente de contrato de financiamento com pacto adjeto de alienação fiduciária, nos termos do procedimento extrajudicial previsto pela Lei nº 9.514/97. Inicialmente, importa mencionar que a constitucionalidade do procedimento de alienação fiduciária de bem imóvel, previsto na Lei nº 9.514/1997, é matéria pacificada, conforme entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, que, no deslinde do Tema 982, firmou a seguinte tese: “É constitucional o procedimento da Lei nº 9.514/1997 para a execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia, haja vista sua compatibilidade com as garantias processuais previstas na Constituição Federal”. Consequentemente, denota-se que o referido procedimento tampouco viola os princípios de acesso à justiça, do devido processo legal e demais direitos processuais previstos na Constituição Federal. Conforme disposto nos art. 26 e 27, ambos da Lei nº 9.514 /97, a impontualidade do pagamento das prestações estabelecidas por ocasião da pactuação contratual enseja o vencimento antecipado da dívida. Vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida, constitui-se em mora o fiduciante e consolida-se a propriedade do imóvel em nome do fiduciário, o qual efetuará a execução da garantia, alienando-a com a realização de leilão público. Previamente à consolidação da propriedade em nome do fiduciante, contudo, prevê a legislação que haja a intimação pessoal do devedor para purgação da mora, nos seguintes termos: "(...) Art. 26. Vencida e não paga a dívida, no todo ou em parte, e constituídos em mora o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante, será consolidada, nos termos deste artigo, a propriedade do imóvel em nome do fiduciário. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023) § 1º Para fins do disposto neste artigo, o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante serão intimados, a requerimento do fiduciário, pelo oficial do registro de imóveis competente, a satisfazer, no prazo de 15 (quinze) dias, a prestação vencida e aquelas que vencerem até a data do pagamento, os juros convencionais, as penalidades e os demais encargos contratuais, os encargos legais, inclusive os tributos, as contribuições condominiais imputáveis ao imóvel e as despesas de cobrança e de intimação. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023) § 1º-A Na hipótese de haver imóveis localizados em mais de uma circunscrição imobiliária em garantia da mesma dívida, a intimação para purgação da mora poderá ser requerida a qualquer um dos registradores competentes e, uma vez realizada, importa em cumprimento do requisito de intimação em todos os procedimentos de excussão, desde que informe a totalidade da dívida e dos imóveis passíveis de consolidação de propriedade. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023) § 2º O contrato poderá estabelecer o prazo de carência, após o qual será expedida a intimação. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023) § 2º-A Quando não for estabelecido o prazo de carência no contrato de que trata o § 2º deste artigo, este será de 15 (quinze) dias. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023) § 3º A intimação será feita pessoalmente ao devedor e, se for o caso, ao terceiro fiduciante, que por esse ato serão cientificados de que, se a mora não for purgada no prazo legal, a propriedade será consolidada no patrimônio do credor e o imóvel será levado a leilão nos termos dos arts. 26-A, 27 e 27-A desta Lei, conforme o caso, hipótese em que a intimação poderá ser promovida por solicitação do oficial do registro de imóveis, por oficial de registro de títulos e documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento, situação em que se aplica, no que couber, o disposto no art. 160 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 (Lei de Registros Públicos). (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023) § 3o-A. Quando, por duas vezes, o oficial de registro de imóveis ou de registro de títulos e documentos ou o serventuário por eles credenciado houver procurado o intimando em seu domicílio ou residência sem o encontrar, deverá, havendo suspeita motivada de ocultação, intimar qualquer pessoa da família ou, em sua falta, qualquer vizinho de que, no dia útil imediato, retornará ao imóvel, a fim de efetuar a intimação, na hora que designar, aplicando-se subsidiariamente o disposto nos arts. 252, 253 e 254 da Lei no 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017) § 3o-B. Nos condomínios edilícios ou outras espécies de conjuntos imobiliários com controle de acesso, a intimação de que trata o § 3o-A poderá ser feita ao funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017) § 4º Quando o devedor ou, se for o caso, o terceiro fiduciante, o cessionário, o representante legal ou o procurador regularmente constituído encontrar-se em local ignorado, incerto ou inacessível, o fato será certificado pelo serventuário encarregado da diligência e informado ao oficial de registro de imóveis, que, à vista da certidão, promoverá a intimação por edital publicado pelo período mínimo de 3 (três) dias em jornal de maior circulação local ou em jornal de comarca de fácil acesso, se o local não dispuser de imprensa diária, contado o prazo para purgação da mora da data da última publicação do edital. (Redação dada pela Lei nº 14.711, de 2023) § 4º-A É responsabilidade do devedor e, se for o caso, do terceiro fiduciante informar ao credor fiduciário sobre a alteração de seu domicílio. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023) § 4º-B Presume-se que o devedor e, se for o caso, o terceiro fiduciante encontram-se em lugar ignorado quando não forem encontrados no local do imóvel dado em garantia nem no endereço que tenham fornecido por último, observado que, na hipótese de o devedor ter fornecido contato eletrônico no contrato, é imprescindível o envio da intimação por essa via com, no mínimo, 15 (quinze) dias de antecedência da realização de intimação edilícia. (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023) § 4º-C Para fins do disposto no § 4º deste artigo, considera-se lugar inacessível: (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023) I - aquele em que o funcionário responsável pelo recebimento de correspondência se recuse a atender a pessoa encarregada pela intimação; ou (Incluído pela Lei nº 14.711, de 2023) II - aquele em que não haja funcionário responsável pelo recebimento de correspondência para atender a pessoa encarregada pela intimação." - Grifos acrescidos. Através da documentação juntada aos autos pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL (ID 336774585), verifica-se que o devedor foi intimado pessoalmente, em 15/12/2023, pelo oficial do registro de imóveis competente, para purgar a mora no prazo de 15 (quinze) dias, conforme previsão legal. É sabido que os registros públicos gozam de presunção relativa de veracidade (juris tantum), admitindo prova em contrário. Ademais, o ordenamento jurídico brasileiro fortaleceu a validade, a eficácia e o valor probante do documento público lavrado de forma legítima por notário, tabelião e oficial de registro, conferindo-lhe fé pública por previsão do art. 3º da Lei n. 8.935/1994. O recorrente não trouxe aos autos qualquer evidência de irregularidade na referida notificação, sendo imperioso concluir, portanto, ausente qualquer vício no procedimento. Ausentes demonstrações de quaisquer irregularidades, considera-se a consolidação da propriedade do imóvel em nome da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF regular e válida, autorizando-se a continuação do procedimento de execução extrajudicial, com designação de leilões para alienação do bem imóvel. Subsidiariamente, pleiteia o recorrente: "(...) 3. Caso Vossa Excelência entenda pela manutenção da consolidação, que seja designada nova audiência de conciliação para possibilitar um acordo entre as partes, visando a quitação das parcelas vencidas e a manutenção do contrato de financiamento; (...)" Não obstante, inviável o acolhimento da aludida pretensão. Nesse sentido, necessário que se esclareça brevemente a evolução legislativa que envolve a purgação da mora no âmbito da Lei nº 9.514/97. A redação original do art. 39, inciso II, do mencionado diploma legal, previa a aplicabilidade do Decreto-Lei nº 70/1966 ao tema. Sendo assim, era possível que o fiduciante purgasse a mora nos 15 (quinze) dias após sua intimação pessoal (art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/97) ou até a assinatura do ato de arrematação do bem imóvel em leilão extrajudicial (art. 34 do DL nº 70/1996). A Lei nº 13.465/2017, publicada em 12/07/2017, modificou o art. 39, inciso II, da Lei nº 9.514/97 e restou prescrito que as disposições do DL nº 70/1996 passariam a ser aplicáveis tão somente aos procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca, os quais se diferem da alienação fiduciária. Ademais, a referida lei ainda acrescentou os arts. 26-A e 27, § 2º-B, à Lei nº 9.514-97, os quais, à época, tinham a seguinte redação: "Art. 26-A. Os procedimentos de cobrança, purgação de mora e consolidação da propriedade fiduciária relativos às operações de financiamento habitacional, inclusive as operações do Programa Minha Casa, Minha Vida, instituído pela Lei no 11.977, de 7 de julho de 2009, com recursos advindos da integralização de cotas no Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), sujeitam-se às normas especiais estabelecidas neste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017) (...) Art. 27. § 2o-B. Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário e até a data da realização do segundo leilão, é assegurado ao devedor fiduciante o direito de preferência para adquirir o imóvel por preço correspondente ao valor da dívida, somado aos encargos e despesas de que trata o § 2o deste artigo, aos valores correspondentes ao imposto sobre transmissão inter vivos e ao laudêmio, se for o caso, pagos para efeito de consolidação da propriedade fiduciária no patrimônio do credor fiduciário, e às despesas inerentes ao procedimento de cobrança e leilão, incumbindo, também, ao devedor fiduciante o pagamento dos encargos tributários e despesas exigíveis para a nova aquisição do imóvel, de que trata este parágrafo, inclusive custas e emolumentos. (Incluído pela Lei nº 13.465, de 2017) (...)" Desta forma, após o advento da Lei nº 13.465/2017, a purgação da mora pelo devedor tornou-se possível nos 15 (quinze) dias após sua notificação pessoal (art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/97) ou até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária em favor do credor (art. 26-A da Lei nº 9.514/97). Depois da consolidação, o devedor possui o direito de preferência para adquirir o imóvel em leilão, desde que efetue o pagamento do valor integral do contrato e das demais despesas decorrentes da consolidação da propriedade (art. 2, § 2º-B, da Lei 9.514/97). Em síntese: em um primeiro momento, antes do advento da Lei nº 13.465/2017, o devedor-fiduciário poderia purgar a mora até o momento da assinatura do ato de arrematação do bem imóvel em leilão extrajudicial. Após o marco legislativo, apenas pode realizá-lo até a data da averbação da consolidação da propriedade fiduciária em favor do credor. Posteriormente, possui apenas o direito de preferência para adquirir o imóvel até o segundo leilão extrajudicial, desde que cumpra as exigências legais para tanto. A C. 2ª Turma, a qual componho neste E. Tribunal, filia-se ao entendimento que, para análise acerca da legislação aplicável ao caso concreto, deve ser considerada a data de manifestação de vontade do fiduciante em purgar a mora. Nesta toada, colaciono precedentes: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL. LEI Nº 9.514/1997. PURGAÇÃO DA MORA. LAPSO TEMPORAL. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. - Sobre o lapso temporal para purgação da mora, a interpretação inicialmente firmada considerou a redação original do art. 39, II, da Lei nº 9.514/1997, que previa a aplicação subsidiária do art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966. Assim, o devedor-fiduciante podia purgar a mora em 15 dias após a intimação pessoal (art. 26, § 1º, dessa Lei nº 9.514/1997, ou até a assinatura do auto de arrematação do bem imóvel em leilão (art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966), conforme orientação jurisprudencial do E.STJ. - Da nova redação do art. 39, II, da Lei nº 9.514/1997 (dada pela Lei nº 13.465/2017), ficou claro que contratos firmados com cláusula de alienação fiduciária de coisa imóvel em garantia não são alcançados pelo significado de “procedimentos de execução de créditos garantidos por hipoteca”, encerrando a aplicação subsidiária do Decreto-Lei nº 70/1966. Ao mesmo tempo, essa Lei nº 13.465/2017 introduziu o §2º-B no art. 27 da Lei nº 9.514/1997, de tal modo que a purgação da mora deve se dar em 15 dias após a intimação pessoal, ou até a averbação da consolidação da propriedade, após o que restará ao devedor-fiduciante o exercício do direito de preferência (até da data do segundo leilão). - Segundo orientação do E. TRF da 3ª Região, se a manifestação de vontade do devedor-fiduciário foi feita durante a vigência da aplicação subsidiária do art. 34 do Decreto-Lei nº 70/1966, o prazo para purgar a mora (pelo valor das parcelas em atraso, com acréscimos) é até o dia da lavratura do auto de arrematação; se essa manifestação de vontade foi feita já no período de eficácia jurídica da Lei nº 13.465/2017, o prazo para purgar a mora é até o dia da averbação da consolidação da propriedade. - O devedor-fiduciante ajuizou ação judicial em primeira instância depois da publicação da Lei nº 13.465/2017 (DOU de 12/07/2017) - Em razão da alteração promovida pela Lei nº 13.465/2017, impossível a purgação da mora após a averbação da consolidação da propriedade. - Agravo de instrumento não provido.' (Agravo de Instrumento nº 5025302-81.2024.4.03.0000, 2ª Turma do TRF - 3ª Região, Relator: Desembargador Federal José Carlos Francisco, Data de Julgamento: 31/01/2025, DJE data: 06/02/2025) - Grifos acrescidos. "APELAÇÃO. SFH. AÇÃO ANULATÓRIA. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INADIMPLEMENTO. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE. NOTIFICAÇÃO ACERCA DA REALIZAÇÃO DOS LEILÕES. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DOS LEILÕES. DESNECESSIDADE. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO PROCEDIMENTO. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. 1. Na forma prevista nos art. 26 e 27, da Lei 9.514 /97, vencida e não paga, no todo ou em parte, a dívida e constituído em mora o fiduciante, consolidar-se-á a propriedade do imóvel em nome do fiduciário, bem como efetuar a execução da garantia, alienando-a com a realização de leilão público. 2. Não há inconstitucionalidade na execução extrajudicial, prevista pela Lei n. 9.514/97, a qual não ofende a ordem a constitucional, a semelhança do que ocorre com a execução extrajudicial de que trata o Decreto-lei 70/66, nada impedindo que o fiduciante submeta a apreciação do Poder Judiciário o descumprimento de cláusulas contratuais. 3. Sendo assim, somente obsta o prosseguimento do procedimento o depósito tanto da parte controvertida das prestações vencidas, como da parte incontroversa, com encargos legais e contratuais, arcando o devedor com as despesas decorrentes, até a data limite para purgação da mora, a qual pode se dar mesmo depois da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, ou seja, até a data de realização do último leilão. 4. In casu, não restou demonstrado quaisquer vícios na notificação pessoal do apelante para purgar a mora, visto que o mesmo foi intimado pessoalmente por intermédio do Oficial do Cartório de Registros de Imóveis. 5. É pertinente ressalvar que apenas o depósito, acaso realizado no seu montante integral e atualizado da dívida vencida, teria o condão de suspender os procedimentos de execução extrajudicial do imóvel, não havendo que se rechaçar essa possibilidade, em atenção não só ao princípio da função social dos contratos, mas também para assegurar o direito social à moradia. 6. Observo, no entanto, que com a alteração legislativa trazida pela Lei nº 13.465/2017 de 11/07/2017 (em vigor na data de sua publicação), que modificou a redação do art. 39, II da Lei nº 9.514/97, a aplicação das disposições dos arts. 29 a 41 do DL nº 70/66 se dará apenas aos procedimentos de execução garantidos por hipoteca. 7. Destarte, em se tratando de alienação fiduciária, como é o caso dos autos, em homenagem ao princípio tempus regit actum, considero plausível assegurar ao devedor a possibilidade de purgação da mora nos moldes da fundamentação acima, apenas aqueles que manifestaram sua vontade em purgar a mora até a data de vigência da nova lei, ou seja, aos executados que pleitearam a possibilidade de purgação da mora perante a instituição financeira ou perante o Judiciário até a data de 11/07/2017. 8. No que tange à notificação pessoal para o leilão, verifico que a parte apelante ajuizou a presente demanda em 12.07.2022, requerendo a suspensão dos leilões designados para 11.07.2022 (1ª Praça) e 26.07.2022 (2ª Praça), o que demonstra que possuía ciência inequívoca quanto à realização das hastas públicas. 9. Apelação não provida, com majoração da verba honorária." (Apelação Cível nº 5016784-09.2022.4.03.6100, 2ª Turma do TRF - 3ª Região, Relator: Desembargador Federal Luiz Paulo Cotrim Guimarães, Data de Julgamento: 18/10/2023, DJE data: 20/10/2023) - Grifos acrescidos. No mesmo sentido é a jurisprudência sedimentada do C. STJ: "RECURSOS ESPECIAIS. IMÓVEL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. GARANTIA. LEI Nº 9.514/1997. MORA PURGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE APÓS CONSOLIDAÇÃO. PROPRIEDADE. CREDOR FIDUCIANTE. VIGÊNCIA. LEI Nº 13.465/2017. ALTERAÇÕES INCORPORADAS. DIREITO DE PREFERÊNCIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. NULIDADE. ACÓRDÃO. AFASTAMENTO. (Recurso Especial nº 1942898 / SP, Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, Relator: Ministro Ricardo Villas Bôas Cuevas, Data do Julgamento: 23/08/2023, DJE data: 13/09/2023). - Grifos acrescidos. No caso sub judice, verifico que o contrato de financiamento foi firmado entre as partes em 21/11/2017 (ID 314835343), portanto, após a publicação da Lei nº 13.465/2017. Sendo assim, inviável a pretensão de purgação da mora neste momento processual ou manutenção do contrato de financiamento, eis que a propriedade já foi consolidada em nome da CEF, de modo regular e válido, conforme anteriormente exposto. Assim sendo, ao devedor-fiduciário, ora recorrente, cabe tão somente o exercício do direito de preferência. Outrossim, tendo em vista o julgamento do mérito recursal, considero prejudicada a análise de concessão de efeito suspensivo ao recurso. Por fim, considerando o trabalho adicional realizado em grau recursal, majoro 1% (um por cento) o percentual dos honorários advocatícios fixados na sentença, totalizando 11% (onze por cento) sobre o valor atualizado do proveito econômico obtido ou não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, nos termos do artigo 85, § § 2º e 11, do Código de Processo Civil. Ressalto, contudo, que sua exigibilidade deve permanecer suspensa, nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil. Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação, nos termos da fundamentação. É o voto.
1. O propósito recursal cinge-se a definir a possibilidade de purgação da mora, nos contratos de mútuo imobiliário com pacto adjeto de alienação fiduciária, submetidos à Lei nº 9.514/1997 com a redação dada pela Lei nº 13.465/2017, nas hipóteses em que a consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário ocorreu na vigência da nova lei.
2. Não se reconhece a negativa de prestação jurisdicional ventilada quando o Tribunal de origem analisa todas as questões relevantes para a solução da lide, de forma fundamentada.
3. Após a edição da Lei nº 13.465, de 11/7/2017, que introduziu no art. 27 da Lei nº 9.514/1997 o § 2º-B, não se cogita mais da aplicação subsidiária do Decreto-Lei nº 70/1966, visto que, consolidada a propriedade fiduciária em nome do credor fiduciário, descabe ao devedor fiduciante a purgação da mora, sendo-lhe garantido apenas o exercício do direito de preferência na aquisição do bem imóvel objeto de propriedade fiduciária. Precedentes.
4. Recurso especial adesivo da ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE MUTUÁRIOS - ABM não conhecido. Parcialmente conhecidos e, na parte conhecida, providos os demais recursos especiais interpostos.'
Autos: | APELAÇÃO CÍVEL - 5001080-37.2024.4.03.6115 |
Requerente: | CLAUDIO JOSE DA SILVA |
Requerido: | CAIXA ECONÔMICA FEDERAL |
EMENTA: DIREITO CIVIL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. NOTIFICAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR. REGULARIDADE DO PROCEDIMENTO. RECURSO DESPROVIDO.
I. Caso em exame
Trata-se de apelação interposta contra decisão que reconheceu a regularidade da notificação do apelante para purgação da mora decorrente de contrato de financiamento com alienação fiduciária, nos termos do procedimento extrajudicial previsto pela Lei nº 9.514/97.
II. Questão em discussão
A questão em discussão consiste em verificar a validade da notificação realizada pelo oficial do registro de imóveis competente, conforme exigência do art. 26, § 1º, da Lei nº 9.514/97, e a possibilidade de purgação da mora após a consolidação da propriedade fiduciária em nome do credor.
III. Razões de decidir
O procedimento de alienação fiduciária previsto na Lei nº 9.514/97 é constitucional e compatível com as garantias processuais previstas na Constituição Federal, conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 982.
Nos termos dos arts. 26 e 27 da Lei nº 9.514/97, a intimação do devedor para purgar a mora deve ser realizada pessoalmente pelo oficial do registro de imóveis competente. No caso concreto, restou comprovado nos autos que a intimação foi realizada de forma regular, em conformidade com a legislação aplicável.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 3ª Região é pacífica no sentido de que, após a publicação da Lei nº 13.465/2017, não é mais possível a purgação da mora após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária, cabendo ao devedor apenas o direito de preferência para aquisição do imóvel até a data do segundo leilão.
O recorrente não apresentou qualquer prova que infirmasse a presunção de veracidade do ato notarial e registral, motivo pelo qual deve ser mantida a decisão recorrida.
IV. Dispositivo e tese
Recurso desprovido.
Tese de julgamento: "1. A intimação pessoal do devedor para purgação da mora, realizada pelo oficial do registro de imóveis competente, nos termos do art. 26 da Lei nº 9.514/97, é suficiente para viabilizar a consolidação da propriedade em favor do credor fiduciário. 2. Após a averbação da consolidação da propriedade fiduciária, o devedor-fiduciário não pode mais purgar a mora, possuindo apenas o direito de preferência para aquisição do imóvel antes da realização do segundo leilão."
Dispositivos relevantes citados: Lei nº 9.514/1997, arts. 26 e 27.
Jurisprudência relevante citada: STF, Tema 982; STJ, REsp 1.942.898/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 2ª Seção, j. 23/08/2023; TRF-3, Apelação Cível 5016784-09.2022.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Luiz Paulo Cotrim Guimarães, j. 18/10/2023.