Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001286-80.2021.4.03.6107

RELATOR: 7º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: LUIZ MONTEIRO

Advogado do(a) RECORRENTE: GRACIELLE RAMOS REGAGNAN - SP257654-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001286-80.2021.4.03.6107

RELATOR: 7º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: LUIZ MONTEIRO

Advogado do(a) RECORRENTE: GRACIELLE RAMOS REGAGNAN - SP257654-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de ação de conhecimento pela qual LUIZ MONTEIRO moveu ação revisional de contrato de financiamento em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, alegando abusividade na cobrança de juros.

Na petição inicial (id 312114047, pag. 1-30), o autor alega que firmou, em 01/08/2017, uma Cédula de Crédito Bancário com a instituição financeira ré para aquisição de veículo automotor da marca Ford, modelo Fiesta, ano 2015/2016, placa FBH-4491. O contrato previa o pagamento de 48 prestações mensais de R$ 1.246,47, totalizando R$ 59.830,56. O autor afirma que havia quitado 33 parcelas até o momento do ajuizamento, mas identificou ilegalidades que estariam sendo praticadas pela instituição financeira.

Entre as supostas irregularidades, aponta: taxa de juros abusiva, capitalização mensal de juros sem pactuação expressa, juros compostos (anatocismo) e outras práticas que considerava ilegais. Sustenta que o valor financiado foi de R$ 40.000,00, com taxa de juros informada de 1,60% a.m., mas que na realidade estaria pagando juros reais de 2,72% ao mês, totalizando 32,59% ao ano. Aponta ainda diferenças entre os juros cobrados contratualmente e os juros reais aplicados, bem como capitalização em período inferior a um ano sem previsão contratual.

O autor requer o reconhecimento da nulidade das cláusulas abusivas, revisão da taxa de juros, proibição de capitalização mensal, limitação dos juros a 12% ao ano, entre outros pedidos. Solicita também que seja autorizado o depósito de R$ 426,40 para as parcelas restantes, como forma de alcançar o equilíbrio contratual.

Em contestação (id 312114055, pag. 1-13), a Caixa Econômica Federal defendeu a validade do contrato, argumentando que as taxas de juros foram livremente pactuadas entre as partes, com base no princípio da autonomia da vontade. Sustentou a legalidade da capitalização de juros em período inferior a um ano para as instituições financeiras, com amparo na MP 2.170-36/2001. Alegou ainda que os contratos bancários não estão sujeitos à limitação de juros em 12% ao ano, conforme entendimento consolidado no STF e STJ.

Na sentença (id 312114058, pag. 1-4), o juiz julgou improcedentes os pedidos do autor, fundamentando sua decisão nos seguintes pontos: i) inaplicabilidade da limitação de juros a 12% ao ano às instituições financeiras, conforme Súmula 596 do STF; ii) legalidade da capitalização mensal de juros nos contratos celebrados após 31/03/2000, desde que expressamente pactuada, com base na MP 2.170-36/2001 e jurisprudência pacificada; iii) possibilidade de cumulação de juros moratórios com juros remuneratórios, por possuírem naturezas distintas.

Inconformado, o autor interpôs recurso inominado (id 312114059, pag. 1-19), requerendo a reforma da sentença e alegando cerceamento de defesa pela impossibilidade de produção de prova pericial. No mérito, insistiu na tese de que os juros cobrados seriam abusivos e deveriam ser limitados a 12% ao ano, invocando o CDC e o princípio da função social do contrato (art. 421 do CC).

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5001286-80.2021.4.03.6107

RELATOR: 7º Juiz Federal da 3ª TR SP

RECORRENTE: LUIZ MONTEIRO

Advogado do(a) RECORRENTE: GRACIELLE RAMOS REGAGNAN - SP257654-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O recurso não comporta provimento.

Inicialmente, não há elementos para acolher a preliminar de cerceamento de defesa pela ausência de prova pericial. Os fatos foram comprovados pela prova documental apresentada nos autos, não havendo necessidade de dilação probatória para que seja realizada prova pericial.

No mérito, todos os temas em discussão foram devidamente analisados em sentença, razão pela qual adoto seus fundamentos como razão de decidir, conforme autoriza o art. 46 da Lei n. 9099/95. Transcrevo a sentença:

 

I – Contrato:

O contrato firmado entre as partes (Cédula de Crédito Bancário – Crédito AUTO CAIXA) está anexado aos autos (ID 118028290), de modo que neste documento podem ser verificadas e conhecidas todas as cláusulas livremente estipuladas entre as partes.

 

II – Juros acima de 12% ao ano:

As instituições financeiras não se submetem à fixação de juros em 12% a.a, como suscita a parte autora, conforme estabelecido na Súmula 596 do STF: “As disposições do Decreto 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional.”

A tese foi reafirmada no julgamento do Tema 33 (RE 592.377), em que se considerou que é constitucional o artigo 5º da Medida Provisória 2.170-36/2001. O STJ faz coro ao editar a Súmula 382, em que estabelece que “a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”.

Nota-se, assim, que a tese da parte autora deve ser rechaçada, pois contrária ao entendimento firmado em instâncias superiores.

 

III – Capitalização superior à mensal e utilização da tabela PRICE:

O artigo 5º da Medida Provisória 2.170-36/2001, com constitucionalidade afirmada pelo STF no RE 592.377, indica que “nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, é admissível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano”.

O STJ faz coro na Súmula 539: “É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31.03.2000 (MP 1.963-17/00, reeditada como MP 2.170-36/01), desde que expressamente pactuada”.

Ressalte-se que o próprio STJ, no RE 973.827/RS, estabeleceu a tese vinculante de que “a capitalização de juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao deodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada”.

A questão acerca da adoção da tabela Price como método de capitalização superior à mensal é, portanto, irrelevante, dado que tal capitalização, ainda que tenha ocorrido, é válida. Ressalte-se que o método linear de Gauss, que o autor pretende ver aplicado ao seu contrato de financiamento, não foi desenvolvido para amortização financeira, de modo que também não lhe assiste razão em tal afirmação.

 

IV – Cumulação de juros de mora com juros remuneratórios:

Conforme estabelece a Súmula 379 do STJ, “nos contratos bancários não regidos por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês”.

Os juros moratórios, naturalmente, são incidentes sobre os juros remuneratórios, dado que os juros remuneratórios são a contraprestação natural pelo empréstimo do dinheiro, e os juros moratórios representam penalidade pela impontualidade. A ideia de que a instituição financeira tem que optar por um por outro é irreal, dado que haveria verdadeira premiação da inadimplência nesta hipótese, pois ou a parte pagaria apenas os juros remuneratórios estipulados – o que tornaria indiferente inadimplir – ou apenas os juros moratórios – que tornaria financeiramente vantajoso a inadimplência.

Portanto, sem razão a parte também em relação a este tema.

 

Por fim, diante de tudo quanto foi exposto, percebe-se que nenhuma das teses revisionais suscitadas pela parte autora podem ser acolhidas, pois contrariam a jurisprudência pacífica sobre os temas.

Se não bastasse isso, não é demais lembrar que a parte autora tinha livre arbítrio para não se submeter às cláusulas contratuais que lhe foram apresentadas pela CEF e, mesmo assim, optou por celebrar o contrato, receber o dinheiro, aplica-lo na compra do carro e agora – mais de quatro anos depois da pactuação (considerando-se a data de ajuizamento da ação) – pretende discutir e impugnar as cláusulas com as quais concordou.

Vale lembrar aqui, por ser muito oportuno, que o simples fato de um determinado contrato ser de adesão não basta, por si só, para que a avença seja considerada abusiva ou leonina, devendo o interessado comprovar a efetiva existência de cláusulas ilegais ou abusivas, fato que não se deu, neste processo. Assim, tratando-se de contrato que preenche os requisitos de validade e com cláusulas que não foram reconhecidas como abusivas, ele deve ser integralmente cumprido.

Ante todo o exposto, sem necessidade de mais perquirir, julgo IMPROCEDENTES OS PEDIDOS nos termos da fundamentação e extingo o processo com resolução de mérito, com fulcro no art. 487, I, CPC.

 

Assim sendo, não observo qualquer razão para a revisão da sentença recorrida, nesta oportunidade.

 

Face ao exposto, nego provimento ao recurso da parte autora.

Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, com limitação a 6 salários-mínimos (montante correspondente a 10% do teto de competência dos Juizados Especiais Federais - art. 3º, “caput”, da Lei 10.259/2001); todavia, em razão do deferimento da gratuidade da justiça, deverá ser observado o disposto no § 3º do artigo 98 do CPC/2015, que prevê a suspensão das obrigações decorrentes da sucumbência.

É o voto.

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

DIREITO CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO INOMINADO. REVISÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. ALEGAÇÃO DE ABUSIVIDADE DE JUROS E CAPITALIZAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO.

I. Caso em exame

1. Recurso inominado contra sentença que julgou improcedente o pedido de revisão de Cédula de Crédito Bancário para financiamento de veículo, em que o autor alegava abusividade na cobrança de juros, capitalização mensal sem pactuação expressa, anatocismo e outras práticas que considerava ilegais.

 

II. Questão em discussão

2. A questão em discussão consiste em saber se: (i) há abusividade na taxa de juros contratada em contrato bancário de financiamento de veículo, com necessidade de limitação a 12% ao ano; (ii) é válida a capitalização de juros em período inferior a um ano; e (iii) se é possível a cumulação de juros moratórios com juros remuneratórios.

 

III. Razões de decidir

3. As instituições financeiras não se submetem à limitação de juros em 12% ao ano, conforme Súmula 596 do STF e Súmula 382 do STJ.

4. É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/03/2000, desde que expressamente pactuada, conforme MP 2.170-36/2001 e Súmula 539 do STJ.

5. É válida a cumulação de juros remuneratórios com juros moratórios, por possuírem naturezas distintas, sendo os primeiros a contraprestação pelo uso do capital e os segundos a penalidade pela impontualidade no pagamento.

 

IV. Dispositivo

6. Recurso desprovido.

 

Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 421 e 487, I; MP 2.170-36/2001, art. 5º.

Jurisprudência relevante citada: STF, Súmula 596; STJ, Súmulas 382, 539 e 379; STF, RE 592.377 (Tema 33); STJ, RE 973.827/RS.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
LEONARDO JOSE CORREA GUARDA
Juiz Federal