Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002176-95.2016.4.03.6005

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: INTEGRACAO TRANSPORTES LTDA - ME

Advogado do(a) APELADO: SERGIO ANTONIO DE OLIVEIRA - MT9225-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002176-95.2016.4.03.6005

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: INTEGRAÇÃO TRANSPORTES LTDA - ME

Advogado do(a) APELADO: SERGIO ANTONIO DE OLIVEIRA - MT9225-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PÚBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): Trata-se de recurso de apelação interposto pela UNIÃO FEDERAL em face de sentença que concedeu a segurança postulada pela parte impetrante, nos autos do mandamus em epígrafe, e que anulou o ato administrativo que decretou o perdimento do veículo, determinando a restituição desse. No r. pronunciamento apelado (fls. 11/14 do ID 128716865), consignou o juízo de origem que, da obrigação celebrada entre a empresa impetrante e Jarbas de Farias Alves, demonstra que a entidade comercial, no exercício regular da atividade de locação de veículos, alugou o automóvel apreendido, sem que haja indícios de participação no ilícito. Ademais, a decretação da pena de perdimento seria desproporcional, uma vez que as mercadorias foram avaliadas em R$ 7.000,00 e a camioneta em aproximadamente R$ 90.000,00.

Alega a FAZENDA NACIONAL (fls. 25/41 do ID 128716865), em síntese, que: (i) o veículo da empresa locadora de automóveis foi apreendido em procedimento de vistoria realizada pelo Departamento de Operações de Fronteira, quando era conduzido por Jarbas de Faria Alves, acompanhado de Lucas de Faria Alves com grande quantidade de mercadoria introduzida irregularmente no Brasil; (ii) a sociedade empresária demandante não pode se resguardar por cláusulas contratuais que a isentam de responsabilidade, uma vez que o veículo locado foi usado para fins ilícitos e deve receber a aplicação da pena de perdimento, conforme arts. 673, 674, 688 do Regulamento Aduaneiro; (iii) a parte impetrante não foi diligente e formalizou contrato de arrendamento sem as devidas cautelas, sobretudo, sem registro público e sem formalizar boletim de ocorrência após a não devolução do bem, obstando a aplicação de seus efeitos perante terceiros; (iv) por força dos dispositivos legais, é o arrendador quem assume os riscos pela perda e pela deterioração anormal da coisa até o adimplemento integral do contrato; (v) o entendimento da necessária proporção entre o valor dos introduzidos em território nacional e o preço de avaliação do veículo transportador, esposado em alguns respeitáveis julgados, infringe o pressuposto da razoabilidade e não pode servir como salvo-conduto para a reincidência de infrações. Por fim, pugna pelo provimento do recurso de apelação para reformar a sentença recorrida e declarar válida a pena de perdimento aplicada.

Apesar de intimada, a parte impetrante não apresentou contrarrazões ao recurso de apelação cível (fl. 75 do ID 128716865).

Honorários advocatícios não arbitrados em primeiro grau (art. 25 da Lei 12.016/2019). Custas “ex lege”.

Subiram os autos a este Tribunal.

O Ministério Público Federal apresentou parecer opinando pelo desprovimento da remessa necessária e pela manutenção do inteiro teor da r. sentença em seus termos (ID 131051375).

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
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3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0002176-95.2016.4.03.6005

RELATOR: Gab. 46 - DES. FED. RUBENS CALIXTO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: INTEGRACAO TRANSPORTES LTDA - ME

Advogado do(a) APELADO: SERGIO ANTONIO DE OLIVEIRA - MT9225-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CALIXTO (Relator): A ação constitucional do Mandado de Segurança constitui garantia que protege direito líquido e certo, não amparado por Habeas Corpus ou Habeas Data. Referido instrumento mandamental, como se sabe, é cabível na presença de ilegalidade ou abuso de poder, atual ou iminente, no ato emanado por autoridade pública ou equiparada que comprometa o respectivo direito de pessoa física ou jurídica. O art. 5º, inciso LXIX, da CF/88, que encontra correspondência categórica no art. 1º da Lei nº 12.016/09, tem a seguinte disposição:

 

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;”

 

No presente caso, a sociedade empresarial locadora, proprietária do automóvel apreendido, impetrou o presente mandado de segurança, objetivando a anulação do ato administrativo que determinou a aplicação da pena de perdimento ao seu veículo locado por terceiro contratante. No momento da abordagem realizada pelas autoridades brasileiras, tal bem automotor estava sendo usado por terceiro locatário para importar mercadorias de origem estrangeira em desacordo com a determinação legal.

Na r. sentença apelada, em síntese, o C. Juízo de Origem concedeu a segurança pleiteada, uma vez que a entidade comercial impetrante, no exercício regular da atividade de locação de veículos, alugou o automóvel apreendido, sem que haja indícios de participação no ilícito. Ademais, considerou que a decretação da pena de perdimento seria desproporcional, uma vez que as mercadorias introduzidas irregularmente em território nacional foram avaliadas em R$ 7.000,00 e a camioneta em aproximadamente R$ 90.000,00.

Em face da r. decisão, a UNIÃO FEDERAL interpôs recurso de apelação, requerendo, em síntese, a reforma da sentença recorrida e a manutenção da pena de perdimento do veículo aplicada pela Administração Aduaneira.

Registre-se, por oportuno, que o presente recurso foi inicialmente sobrestado em razão de afetação ao Tema Repetitivo n. 1.041 do E. STJ, cuja controvérsia discutia a possibilidade de aplicação da pena de perdimento do veículo de transporte, seja de passageiros ou de carga, ao transportador, proprietário ou possuidor - em decorrência de ilícitos praticados por terceiros.

Todavia, a Primeira Seção daquela Corte Superior cancelou o referido tema por ausência de amostras recursais com aderência às teses propostas, cessando os fundamentos que justificavam a suspensão do presente feito, razão pela qual foi levantado o sobrestamento anteriormente determinado, retomando-se o regular prosseguimento do processo em epígrafe.

Passa-se ao exame do mérito do apelo fazendário.

Sempre controvertida a questão da possibilidade de revisão judicial de ato administrativo.

Em se tratando de ato de natureza vinculada, incumbe ao administrador observar fielmente os requisitos legais para a sua prática, sem espaço para deliberação individual sobre a sua conveniência e oportunidade, atuação sempre sujeita ao controle jurisdicional.

Todavia, em se tratando de ato administrativo de natureza discricionária – portanto, que comporta margem de avaliação pela Administração sobre o seu conteúdo –, não cabe ao Poder Judiciário, a princípio, substituir a avaliação do administrador público sobre as medidas que julgar adequadas, desde que seu ato esteja devidamente motivado, cumpra a sua finalidade e não ultrapasse os limites impostos pelas leis ou atos regulamentares.

Importante ressaltar que a motivação exige pertinência fática e jurídica com o ato praticado pelo administrador, não podendo subsistir quando ficar evidente a dissociação com um ou outro, circunstância que converteria a discricionariedade administrativa em arbitrariedade estatal.

Em outras palavras, são passíveis de revisão ou anulação judicial os atos administrativos que falhem em sua motivação, se desviem da sua finalidade ou ultrapassem os limites legais.

O que não cabe ao Poder Judiciário é substituir a avaliação do administrador quanto à conveniência e oportunidade de atuar, segundo os critérios que entender razoáveis, estando o ato devidamente motivado e cumprindo a sua finalidade, dentro dos limites estabelecidos em lei.

Não merece prosperar a pretensão da FAZENDA NACIONAL.

Do boletim de ocorrência (fls. 71/81 do ID 128716862), consta que, durante o bloqueio Policial pela Rodovia MS - 164 - Trevo do Copo Sujo, município de, Ponta Porã/MS, tendo como motorista do veículo VW AMAROK de cor, PRATA e placa OBQ-2912 de Cuiaba/MT, a Sra. MARIA ALVES LEITE, acompanhada do seu filho PEDRO NOLASCO DE SOUZA NETO, que trafegava sentido Ponta, a qual transportava 12 (doze) volumes de brinquedos, 15 (quinze) adaptadores de rede, 04 (quatro) ubiquiti ap. mind. 24, 01 (um) TP LINK hb switch 48p, 01 (um) projetor DLP Projector LG, 04 (quatro) toughs witch. Mol ts-5-pde, 10 (dez) routers board sxt 5nd, 01 (um) par street runner, e 03 (três) Radios comunicadores vertex standard VX 22-DO-50, sem possuir a documentação aduaneira necessária do Órgão Competente, adquiridos na cidade de Pedro Juan Caballero/Paraguai, e seriam comercializadas na cidade de Cuiaba/MT.

A presente controvérsia consiste em verificar se a aplicação da pena de perdimento do veículo pertencente à sociedade empresarial do ramo de locação de veículos, usado por terceiro locatário para importar ilegalmente mercadorias estrangeiras, é ilegítima.

A obrigação constituída de locação de veículo apreendido entre a entidade autora e o condutor abordado, que tentou introduzir irregularmente mercadorias no território nacional, foi devidamente comprovada mediante tais documentos: (i) anúncio de locação do automotor (ID 132544384); (ii) termo contratual de arrendamento mercantil (ID 132544385); (iii) narrativa dos fatos reduzidas a termo perante a Polícia Federal (IDs 132544386, 132544387 e 132544388).

Nas razões de apelação, a União Federal alega que a entidade empresarial incorreu na prática da infração tipificada nos arts. 673 e 674 do Decreto nº 6.759/09 (Regulamento Aduaneiro) sujeita às penalidades dispostas no seu art. 675, as quais devem ser aplicadas separada ou cumulativamente, e de forma graduada, a teor dos arts. 677 e 678 do decreto mencionado. Disposições semelhantes são observadas nos arts. 95, 96 e 104 do Decreto-Lei 37/66. Citam-se as referidas redações:

 

“(...)

Art. 673.  Constitui infração toda ação ou omissão, voluntária ou involuntária, que importe inobservância, por parte de pessoa física ou jurídica, de norma estabelecida ou disciplinada neste Decreto ou em ato administrativo de caráter normativo destinado a completá-lo (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 94, caput).

Parágrafo único.  Salvo disposição expressa em contrário, a responsabilidade por infração independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, da natureza e da extensão dos efeitos do ato (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 94, § 2º).

Art. 674.  Respondem pela infração (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95):

I - conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática ou dela se beneficie;

II - conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorra do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes;

III - o comandante ou o condutor de veículo, nos casos do inciso II, quando o veículo proceder do exterior sem estar consignado a pessoa física ou jurídica estabelecida no ponto de destino;

IV - a pessoa física ou jurídica, em razão do despacho que promova, de qualquer mercadoria;

V - conjunta ou isoladamente, o importador e o adquirente de mercadoria de procedência estrangeira, no caso de importação realizada por conta e ordem deste, por intermédio de pessoa jurídica importadora (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95, inciso V, com a redação dada pela Medida Provisória no 2.158-35, de 2001, art. 78); e

VI - conjunta ou isoladamente, o importador e o encomendante predeterminado que adquire mercadoria de procedência estrangeira de pessoa jurídica importadora (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 95, inciso VI, com a redação dada pela Lei no 11.281, de 2006, art. 12).

Parágrafo único.  Para fins de aplicação do disposto no inciso V, presume-se por conta e ordem de terceiro a operação de comércio exterior realizada mediante utilização de recursos deste, ou em desacordo com os requisitos e condições estabelecidos na forma da alínea “b” do inciso I do § 1o do art. 106 (Lei nº 10.637, de 2002, art. 27; e Lei nº 11.281, de 2006, art. 11, § 2º).

Art. 675.  As infrações estão sujeitas às seguintes penalidades, aplicáveis separada ou cumulativamente (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 96; Decreto-Lei nº 1.455, de 1976, arts. 23, § 1º, com a redação dada pela Lei nº 10.637, de 2002, art. 59, e 24; Lei no 9.069, de 1995, art. 65, § 3o; e Lei nº 10.833, de 2003, art. 76):

I - perdimento do veículo;

II - perdimento da mercadoria;

III - perdimento de moeda;

IV - multa; e

V - sanção administrativa.

Art. 676.  A aplicação das penalidades a que se refere o art. 675 será proposta por Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil. (Redação dada pelo Decreto nº 7.213, de 2010).

Art. 677.  Compete à autoridade julgadora (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 97):

I - determinar a pena ou as penas aplicáveis ao infrator ou a quem deva responder pela infração; e

II - fixar a quantidade da pena, respeitados os limites legais.

(...)

Art. 680.  Se do processo se apurar responsabilidade de duas ou mais pessoas, será imposta a cada uma delas a pena relativa à infração que houver cometido (Decreto-Lei nº 37, de 1966, art. 100).

(...)”

 

“Decreto-Lei 37/1966

(...)

Art.95 - Respondem pela infração: 

I - conjunta ou isoladamente, quem quer que, de qualquer forma, concorra para sua prática, ou dela se beneficie; 

II - conjunta ou isoladamente, o proprietário e o consignatário do veículo, quanto à que decorrer do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes; 

Art. 96. As infrações estão sujeitas às seguintes penas, aplicáveis separada ou cumulativamente: 

I - perda do veículo transportador; 

II - perda da mercadoria; 

III - multa; 

IV - proibição de transacionar com repartição pública ou autárquica federal, empresa pública e sociedade de economia mista. 

 (...)

Art.104 - Aplica-se a pena de perda do veículo nos seguintes casos: 

(...) 

V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção; 

 

Da leitura dos dispositivos citados, depreende-se, a partir de uma interpretação literal, que o proprietário do veículo deve responder pela infração que decorra do exercício de atividade própria do veículo, ou de ação ou omissão de seus tripulantes, e que a responsabilidade pela infração independe da intenção do agente ou do responsável e da efetividade, da natureza e da extensão dos efeitos do ato.

Ao analisar a possibilidade de aplicação do perdimento do veículo usado na prática de ilícito fiscal, o E. STJ conferiu interpretação aos dispositivos supracitados, reduzindo o alcance desses, de modo a considerar necessária a demonstração da responsabilidade do proprietário do automóvel, a qual, por sua vez, permite o afastamento da presunção da boa-fé desse.

Tal entendimento perseguiu a mesma orientação hermenêutica da súmula 138 do extinto Tribunal Federal de Recursos “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito". Esse posicionamento também tem sido perseguido por esta C. 3ª Turma do TRF-3. Confiram-se precedentes no sentido esposado:

 

“TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. PENA DE PERDIMENTO. COMPROVAÇÃO DE QUE O VEÍCULO UTILIZADO É DE PROPRIEDADE DO CONDUTOR. SÚMULA 7/STJ. PROVIMENTO NEGADO.

1. É legítima a decretação da pena de perda de veículo apreendido em fiscalização aduaneira em razão da introdução irregular de mercadoria estrangeira no território nacional, na hipótese em que for configurada a participação direta do proprietário do veículo na consumação do ilícito fiscal. Precedentes.

2. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem reconheceu que o veículo apreendido pelo transporte de mercadorias irregularmente internalizadas no Brasil era conduzido por seu proprietário de fato, pois, apesar de o veículo encontrar-se registrado no Departamento de Trânsito (DETRAN) em nome de seu irmão, ora recorrente, há provas de que o veículo foi cedido ao condutor e da reiteração na prática infracional. Entendimento diverso, conforme pretendido, implicaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, circunstância que redundaria na formação de novo juízo acerca de fatos e provas.
Incidência no presente caso da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

3. Agravo interno a que se nega provimento.”

(AgInt no REsp n. 1.775.536/SC, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 20/5/2024); (negritei)

 

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. PENA DE PERDIMENTO. VEÍCULO TRANSPORTADOR. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO. ACÓRDÃO EM SINTONIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. ART. 535 DO CPC/1973) NÃO CONFIGURADA.

1. Trata-se de ação que busca desconstituir acórdão que afastou a pena de perdimento de veículo transportador de mercadorias estrangeiras desacompanhadas de documentação legal.

2. Não configurada a ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada.

3. Não se vislumbra, nos presentes autos, nenhum indício de que a empresa Viação Canindé Ltda. tenha alguma responsabilidade sobre as mercadorias trazidas pelos diversos passageiros, cujo ônibus, foi regularmente fretado por terceiro.

4. A Jurisprudência do STJ está assentada na impossibilidade de aplicação da pena de perdimento do veículo transportador quando não comprovada a responsabilidade e a má-fé do proprietário do veículo.

5. Dessume-se que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento deste Tribunal Superior, razão pela qual não merece prosperar a irresignação. Incide, in casu, o princípio estabelecido na Súmula 83/STJ.

6. Recurso Especial não provido.”

(REsp n. 1.637.846/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/12/2016, DJe de 19/12/2016); (negritei)

 

"DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. POSSIBILIDADE. PRINCIPIO DA PROPORCIONALIDADE. NECESSIDADE DE CONJUGAÇÃO COM AS DEMAIS CIRCUNSTÂNCIAS DA APREENSÃO. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1.  A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da pena de perdimento do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal.

2. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal deve levar em conta, na análise do caso concreto, a eventual reincidência na conduta infracional a justificar o afastamento da presunção de boa-fé do proprietário, assim como a gravidade do fato e proporcionalidade entre o valor da mercadoria e do veículo apreendidos.

3. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

4. É no mesmo sentido a jurisprudência do STJ e desta C. Turma (AgInt no AREsp 863.425/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 27/05/2019, DJe 30/05/2019 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000367-92.2019.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 04/03/2021, Intimação via sistema DATA: 09/03/2021 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000280-61.2018.4.03.6004, Rel. Desembargador Federal NELTON AGNALDO MORAES DOS SANTOS, julgado em 02/06/2020, Intimação via sistema DATA: 05/06/2020).

5. Nos termos da jurisprudência citada, o princípio da proporcionalidade não é absoluto e deve ser conjugado com as demais circunstâncias específicas de cada apreensão.

6. No caso vertente, não há dúvida que o veículo em questão transportava a mercadoria apreendida e era conduzido por Paulo Cezar dos Santos, empregado da pessoa jurídica A.A.P. Marcato, titularizada pelo filho dos impetrantes — Anderson Paolo Pardo Marcato — e administrada pelos ora apelantes. Como bem observado pelo Juízo a quo, o fisco demonstrou de forma suficiente para infirmar a presunção de boa-fé dos proprietários que estes atuam há tempos e de forma organizada no ramo do transporte rodoviário, tendo se envolvido mais de uma vez com infrações semelhantes. Nesse sentido, os documentos ID 310207795 e ID 310207796 esmiuçam as ligações entre os familiares, seus veículos e processos administrativos anteriores. Restam afastadas, portanto, a presunção de boa-fé e a incidência do princípio da proporcionalidade.

7. Apelação desprovida. Majorados para 11% os honorários advocatícios de sucumbência fixados na sentença, mantida a base de cálculo."

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000933-52.2021.4.03.6006, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 24/03/2025, DJEN DATA: 27/03/2025); (negritei)

 

“PROCESSUAL CIVIL. ADUANEIRO. TRIBUTÁRIO. AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM. PERDIMENTO DE VEÍCULO. TEMA 1.041/STJ. NÃO APLICAÇÃO AO CASO CONCRETO. EMPRESA LOCADORA PROPRIETÁRIA DO VEÍCULO APREENDIDO. RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO NÃO DEMONSTRADA. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ. ATO ADMINISTRATIVO DE PERDIMENTO DE VEÍCULO. ANULAÇÃO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. INVERSÃO DO ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. 

1. Cinge-se a controvérsia dos autos no cabimento da pena de perdimento de veículo automotor, de propriedade de locadora de veículos, utilizado para o cometimento de ilícito aduaneiro.   

2. Considerando que a presente ação objetiva a anulação de ato administrativo de perdimento de veículo e fora ajuizada por empresa com atividade preponderante voltada à locação desse tipo de bem móvel, o Tema nº 1.041/STJ não se aplica ao caso em análise.

3. A pena de perdimento de veículo, prevista na legislação aduaneira e aplicada pela Receita Federal do Brasil, constitui uma sanção decorrente de condenação em processo administrativo-fiscal, pela prática de ilícitos graves, como contrabando e descaminho, dentre outros, que geram danos ao erário.

4. A aplicação da pena de perdimento de veículo está disciplinada no inciso V do artigo 104 do Decreto-Lei nº 37/66, nos artigos 23, 24 e 27 do Decreto-Lei nº 1.455/1976 e no inciso V do artigo 688 do Decreto-Lei nº 6.759/2009. Por sua vez, os agentes do crime e sua responsabilização estão especificados nos artigos 94 e 95 do Decreto-Lei nº 37/66 e no artigo 674 do Decreto-Lei nº 6.759/2009.

5. No que tange à responsabilidade do proprietário do veículo automotor utilizado na prática do ato ilícito aduaneiro foi editada a súmula nº 138 do extinto Tribunal Federal de Recursos: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito".

6. No caso concreto, depreende-se dos documentos acostados aos autos que no dia 15 de março de 2021, a parte autora, pessoa jurídica, proprietária do veículo da marca RENAULT, modelo Logan Zen16CVT, cor branca, Placa QXG0849, Chassi nº 93Y4SRZHXLJ067834, celebrou um contrato de locação nº 10840401 deste veículo com a pessoa física, Sr. Rodrigo da Silva, que indicou o Sr. Filipe Graciano, como motorista adicional, com data prevista de término, em 17 de março de 2021 (ID 263422133). Relata a parte autora, na inicial, que na data do término do contrato de locação, referido veículo, de sua propriedade, não foi devolvido à sua posse direta, na data e local definidos nos termos do contrato, e que foi surpreendida com a notícia da apreensão deste. Do auto de infração e apreensão de veículo juntado ao presente feito, nº 0810500-84798/2021, lavrado em 05 de julho de 2021 (ID 263422137), verifica-se que, no dia 16 de março de 2021, foi feita a apreensão do veículo em questão, na posse do motorista indicado como adicional, Sr. Filipe Graciano, que o utilizou para a prática do ilícito fiscal de transporte mercadorias de origem estrangeira, desacompanhadas de documentação comprobatória de sua importação regular no país. Consequentemente, foi aplicada pela Receita Federal do Brasil a pena de perdimento do veículo apreendido, de propriedade da parte autora, conforme o Despacho Decisório nº 052/GAB/DRF/PPE, de 12 de novembro de 2021 (ID 263422138).

7. Cumpre analisar, no presente feito, a responsabilidade da parte autora, locadora de veículos, no cometimento da citada infração aduaneira. De acordo com o §2º do artigo 688 do Decreto nº 6.759/2009: “Para efeitos de aplicação do perdimento do veículo, na hipótese do inciso V, deverá ser demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do proprietário do veículo na prática do ilícito”. (g.n.)

8. Trata-se a parte autora de empresa que tem como atividade preponderante a locação de veículos automotores, atuando, de forma regular e com fins lucrativos, em diversas cidades brasileiras.

9. Relevante, por certo, que a parte autora já esteve envolvida em outros ilícitos semelhantes, em razão de sua atividade desenvolvida, sendo notória a grande quantidade de registros de infrações fiscais dessa natureza, com esse modus operandi. Ou seja, um agente criminoso usufruindo de um bem alheio para o cometimento de delito. Nessa circunstância, não se pode afastar, desde logo, a boa-fé da parte autora no negócio jurídico celebrado, de modo que o fato desta não ter realizado prévia consulta ao sistema de Comunicação e Protocolo - COMPROT, para averiguar o histórico de antecedentes criminais dos seus consumidores, antes de efetivar o negócio jurídico, não permite que lhe seja estendida a responsabilidade pelo ilícito fiscal, por ausência de previsão legal. Ademais, a recusa do aluguel do veículo ao consumidor, em caso de localização de antecedente criminal, configuraria prática abusiva, vedada pelo Código de Defesa do Consumidor (art. 39 CDC).

10. Do conjunto probatório carreado aos autos, depreende-se que a parte autora, em que pese ser proprietária do veículo apreendido, estava exercendo suas atividades de forma regular, não restando comprovada a sua atuação no ilícito aduaneiro de internalização de mercadorias estrangeiras desprovidas de documentação fiscal, nem mesmo restou demonstrado o seu conhecimento sobre a possibilidade de uso ilegal do veículo pelo condutor-locatário, que foi flagrado na posse das mercadorias apreendidas.

11. Não restando comprovada a responsabilidade da parte autora, proprietária do veículo apreendido, na prática do ilícito aduaneiro, deve ser anulado o ato administrativo de perdimento do veículo de marca RENAULT, modelo Logan Zen16CVT, cor branca, Placa QXG0849, Chassi nº 93Y4SRZHXLJ067834, aplicado no auto de infração e apreensão de veículo nº 0810500-84798/2021 (ID 263422137). Cumpre observar que não há notícia nos autos de que o veículo apreendido foi leiloado pela Autoridade Fazendária no curso do presente feito.

12. Invertido o ônus sucumbencial e arbitrado os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o escalonamento de seus incisos, que deverá incidir sobre o valor da causa, devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido do Manual de Cálculos e Procedimentos para as dívidas civis, até sua efetiva requisição (juros) e pagamento (correção).

13. Apelação da parte autora provida.”

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5001040-35.2022.4.03.6112, Rel. Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO, julgado em 20/05/2024, DJEN DATA: 23/05/2024); (negritei)

 

No que tange à atuação de empresas dedicadas à atividade de locação de veículos, é firme a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a presunção de boa-fé objetiva não pode ser afastada com fundamento no risco inerente ao exercício da atividade empresarial, consistente na possibilidade de que veículos locados venham a ser utilizados por terceiros na prática de ilícitos fiscais.

Não se mostra razoável exigir que a empresa locadora promova investigação prévia ou análise do histórico de seus clientes, com o intuito de prevenir o uso indevido do bem móvel por parte do locatário, sob pena de violação aos princípios que regem as relações de consumo, especialmente os insculpidos no art. 39, incisos II e IX, do Código de Defesa do Consumidor, os quais vedam práticas discriminatórias na oferta e na contratação de produtos e serviços.

Tal posicionamento tem sido adotado por esta C. 3ª Turma do TRF-3 e pelo STJ em casos análogos. Confiram-se julgados elucidativos:

 

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AUTO DE INFRAÇÃO. MULTA. PERDIMENTO. VEÍCULO LOCADO TRANSPORTANDO MERCADORIAS DE FORMA CLANDESTINA. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA.

I - Na origem, trata-se de ação em que se pleiteia a anulação de multa aduaneira e da pena de perdimento aplicada ao veículo Nissan Sentra 2.0 SV, ano 2014, placa AZN-0813, de propriedade da empresa autora. Na sentença, o pedido foi julgado improcedente. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida.

II - A responsabilidade da empresa locadora, proprietária de veículo utilizado por locatário para cometimento de ilícito, somente existe quando concorre ativamente para a prática do ato ilícito. Nesse sentido: REsp n. 1.817.179/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/9/2019, DJe de 2/10/2019.

III - Embora não se possa exigir da empresa exploradora da atividade de locação atuação extrema quanto ao locatário, como a investigação de antecedentes criminais, é esperado conduta mínima de cautela documental ensejadora de contribuição com o Estado caso seja observada conduta ilícita praticada com o bem locado.

IV - No caso ora em apreço, além de não existir dados mínimos que possibilitem a identificação e o contato do locatário, também houve inércia da recorrente quanto à comunicação oficial acerca da não devolução (e, portanto, possível furto) do automóvel locado.

V - A agravante, ao deixar de providenciar registro individualizado dos contratantes de locação, com informações mínimas a respeito da identidade e de contato, contribui, ainda que indiretamente, com a prática do ato ilícito que, não fosse o bem locado, poderia não ter ocorrido.

VI - Quanto à alegada violação ao art. 85, §2º, do CPC/2015, verifica-se que, no acórdão proferido pelo Tribunal de origem não foi analisado o conteúdo dos dispositivos legais, nem foram opostos embargos de declaração para tal fim, pelo que carece o recurso do indispensável requisito do prequestionamento. Ressalte-se que, inclusive, na petição dos embargos de declaração opostos pelo recorrente, às fls. 228-231, não há qualquer remissão ao referido dispositivo tampouco da matéria.

VII - Esta Corte somente pode conhecer da matéria objeto de julgamento no Tribunal de origem. Ausente o prequestionamento da matéria alegadamente violada, não é possível o conhecimento do recurso especial. Nesse sentido, o enunciado n. 211 da Súmula do STJ: "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo Tribunal a quo"; e, por analogia, os enunciados n. 282 e 356 da Súmula do STF.

VIII - Conforme entendimento desta Corte, não há incompatibilidade entre a inexistência de ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015 e a ausência de prequestionamento, com a incidência do enunciado n. 211 da Súmula do STJ quanto às teses invocadas pela parte recorrente, que, entretanto, não são debatidas pelo tribunal local, por entender suficientes para a solução da controvérsia outros argumentos utilizados pelo colegiado. Nesse sentido: AgInt no AREsp 1.234.093/RJ, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 24/4/2018, DJe 3/5/2018; AgInt no AREsp 1.173.531/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 20/3/2018, DJe 26/3/2018.

IX - Agravo interno improvido."

(AgInt no REsp n. 1.812.698/PR, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 26/6/2023, DJe de 29/6/2023); (negritei)

 

"ADMINISTRATIVO. MERCADORIAS ESTRANGEIRAS. INTERNAÇÃO IRREGULAR. DESCAMINHO OU CONTRABANDO. VEÍCULO TRANSPORTADOR. LOCADORA DE VEÍCULOS. PROPRIEDADE. PARTICIPAÇÃO NO ILÍCITO. INEXISTÊNCIA. PENA DE PERDIMENTO. ILEGALIDADE.

1. Só a lei pode prever a responsabilidade pela prática de atos ilícitos e estipular a competente penalidade para as hipóteses que determinar, ao mesmo tempo em que ninguém pode ser privado de seus bens sem a observância do devido processo legal.

2. À luz dos arts. 95 e 104 do DL n. 37/1966 e do art. 668 do Decreto n. 6.759/2009, a pena de perdimento do veículo só pode ser aplicada ao proprietário do bem quando, com dolo, proceder à internalização irregular de sua própria mercadoria.

3. A pessoa jurídica, proprietária do veículo, que exerce a regular atividade de locação, com fim lucrativo, não pode sofrer a pena de perdimento em razão de ilícito praticado pelo condutor-locatário, salvo se tiver participação no ato ilícito para internalização de mercadoria própria, exceção que, à míngua de previsão legal, não pode ser equiparada à não investigação dos "antecedentes" do cliente.

4. Hipótese em que o delineamento fático-probatório contido no acórdão recorrido não induz à conclusão de exercício irregular da atividade de locação, de participação da pessoa jurídica no ato ilícito, nem de algum potencial proveito econômico da locadora com as mercadorias internalizadas.

5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido."

(REsp n. 1.817.179/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 17/9/2019, DJe de 2/10/2019); (negritei)

 

"DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE MULTA APLICADA AO PROPRIETÁRIO DO VEÍCULO. CONTRATO DE LOCAÇÃO. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DA LOCADORA. APELAÇÃO DESPROVIDA. 

I. Caso em exame

1. Apelação interposta em face da r. sentença que julgou procedente o pedido para declarar a nulidade da multa aplicada em Processo Administrativo Fiscal.

II. Questão em discussão

2. A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da aplicação de pena de multa ao proprietário do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal.   

III. Razões de decidir

3. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (art. 95, I e II) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (art. 674) que são responsáveis pelo ilícito aqueles que concorrem para sua prática ou que dela se beneficiam, bem como as pessoas designadas por lei.

4. No caso vertente, trata-se de empresa que atua na locação de veículos com abrangência territorial nacional, cuja boa-fé não pode ser afastada pelo simples risco comercial de operar em região de fronteira, assumindo a possibilidade de que um de seus veículos seja utilizado para a prática de ilícitos fiscais.  

5. A empresa apelada, cuja legitimidade para suportar a pena de perdimento de veículo, em razão dos mesmos fatos aqui expostos, foi objeto da ação n° 0000085-13.2017.403.6000, sagrou-se vencedora a locadora, conforme decisão desta e. Terceira Turma, que afastou a pena de perdimento do veículo de sua propriedade. 

6. Não se pode exigir que as locadoras façam uma análise prévia do histórico do locatário a fim de evitar eventuais cometimentos de ilícitos mediante a utilização do bem móvel locado. O estabelecimento de critérios ou padrões nesse sentido esbarraria em disposições antidiscriminatórias do Código de Defesa do Consumidor. 

7. Ante a imprevisibilidade da ocorrência, a responsabilidade por eventuais ilícitos praticados pelo terceiro, em cuja posse se encontra o automóvel locado, não pode ser imputada à locadora. Ademais, não restou comprovado que a apelada tenha participado ou auferido qualquer benefício em razão do ato contrário à lei.  

8. Apelação desprovida.  

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000005-27.2018.4.03.6000, Rel. Desembargadora Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 28/04/2025, DJEN DATA: 05/05/2025); (negritei)

 

"DIREITO ADUANEIRO E TRIBUTÁRIO. INTRODUÇÃO IRREGULAR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA. PENA DE PERDIMENTO DO VEÍCULO TRANSPORTADOR. CONTRATO DE LOCAÇÃO. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO PROPRIETÁRIO. APELAÇÃO DESPROVIDA. 

1.  A questão devolvida a esta E. Corte diz respeito ao cabimento da pena de perdimento do veículo automotor utilizado na prática de ilícito fiscal. 

2. Extrai-se da análise do Decreto-Lei 37/1966 (arts. 95, 96 e 104), do Decreto-Lei 1.455/1976 (art. 24) e do Decreto-Lei 6.759/2009 (arts. 674 e 688) que a aplicação da pena de perdimento em razão do cometimento de ilícito fiscal deve levar em conta, na análise do caso concreto, a eventual reincidência na conduta infracional a justificar o afastamento da presunção de boa-fé do proprietário, assim como a gravidade do fato e proporcionalidade entre o valor da mercadoria e do veículo apreendidos.  

3. Semelhante interpretação foi conferida pelo extinto Tribunal Federal de Recursos na edição da Súmula 138: “A pena de perdimento de veículo, utilizado em contrabando ou descaminho, somente se justifica se demonstrada, em procedimento regular, a responsabilidade do seu proprietário na prática do ilícito". 

4. No caso vertente, trata-se de empresa que atua na locação de veículos com abrangência territorial nacional e cuja boa-fé não pode ser afastada pelo simples argumento de que, ao operar em região de fronteira, assume os riscos de ter seus veículos utilizados para a prática de ilícitos fiscais.  

5. Se, como alegado pelo fisco, é sabido que os muitos infratores utilizam veículos alugados para não se sujeitar à pena de perdimento, a solução não parece ser punir indistintamente o locador, mas intensificar a fiscalização desses veículos, que geralmente possuem elementos de fácil identificação visual, como adesivos próprios e, atualmente, as próprias placas em letras vermelhas. 

6. Exigir que as locadoras façam uma análise prévia do histórico do locatário no COMPROT, por exemplo, além de não ter respaldo na legislação, esbarra em disposições antidiscriminatórias do Código de Defesa do Consumidor, a saber, art. 39, II e IX.  

7. Precedentes (REsp 1817179/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 02/10/2019 / TRF 3ª Região, 4ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000785-78.2020.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal MARLI MARQUES FERREIRA, julgado em 07/01/2022, DJEN DATA: 03/02/2022 / TRF 3ª Região, 6ª Turma, ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA - 5001514-41.2019.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 20/12/2021, Intimação via sistema DATA: 21/01/2022 / TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0010819-91.2015.4.03.6000, Rel. Desembargador Federal LUIS CARLOS HIROKI MUTA, julgado em 23/04/2021, DJEN DATA: 04/05/2021). 

8. Apelação desprovida. Majorados para 11% os honorários advocatícios de sucumbência fixados na sentença, mantida a base de cálculo."

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5002497-35.2022.4.03.6005, Rel. Desembargador Federal CONSUELO YATSUDA MOROMIZATO YOSHIDA, julgado em 25/11/2024, DJEN DATA: 28/11/2024); (negritei)

 

No caso concreto, não há qualquer indício de que a empresa locadora tenha concorrido para a prática da infração aduaneira investigada, a qual foi cometida por terceiro condutor locatário. Também não foi demonstrada a responsabilidade da entidade comercial na tentativa de introdução das mercadorias estrangeiras no mercado nacional, razão pela qual resta impossibilitada a aplicação da pena de perdimento ao veículo locado.

In casu, a ausência de responsabilidade da empresa decorre de entendimento jurisprudencial pacificado pelo E. STJ, acerca da aplicação da legislação de regência, o que respalda a eficácia das cláusulas contratuais que isentam a locadora de responsabilidade pelas condutas cometidas tão-somente pelo locatário infrator no exercício regular da locação de veículo.

Como se depreende da leitura da jurisprudência citada, não se faz necessário o registro público do contrato firmado entre as partes para ratificar a ausência de responsabilidade da empresa locadora contratada, apesar da Fazenda Nacional defender a necessidade do respectivo registro para que este seja considerado no momento do afastamento da imputação de eventual penalidade de perdimento. Por conseguinte, demonstrada a impossibilidade de aplicação da sanção ao ente proprietário do automotor, resta prejudicada a discussão sobre a eventual presença da proporcionalidade da pena cuja aplicação a União Federal defende.

Assim, merece ser mantida a conclusão de ausência de responsabilidade da entidade comercial locadora, tomada pelo C. Juízo de Origem. Por conseguinte, a apelação fazendária não deve ser provida e deve ser mantido o afastamento da aplicação da pena de perdimento do veículo, porquanto ilegítima.

Ante o exposto, nego provimento ao apelo fazendário.

É como voto.



E M E N T A

 

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. ADUANEIRO. APELAÇÃO FAZENDÁRIA. IMPORTAÇÃO CLANDESTINA DE GRANDE QUANTIDADE DE MERCADORIAS. APREENSÃO DOS BENS E DO VEÍCULO. ART. 674, II, DO DECRETO Nº 6.759/09. RESPONSABILIDADE DA EMPRESA LOCADORA DO VEÍCULO. ENTE QUE NÃO CONCORREU PARA A PRÁTICA DE INFRAÇÃO. PRESUNÇÃO DA BOA-FÉ AFASTAMENTO DA PENA DE PERDIMENTO DO AUTOMÓVEL. PENALIDADE ILEGÍTIMA.

- Sentença que concedeu a segurança pleiteada pela empresa locadora para determinar a restituição do seu automóvel apreendido pela Receita Federal, por ser usado por terceiro locatário para importar mercadorias estrangeiras clandestinamente. A controvérsia reside em verificar se a parte proprietária do veículo pode ser responsabilizada mediante a aplicação do perdimento do veículo.

- O E. STJ, ao analisar a possibilidade de aplicação do perdimento do veículo usado na prática de ilícito fiscal, considerou ser necessária a demonstração da responsabilidade do proprietário do automóvel e o afastamento da boa-fé desse. Tal entendimento persegue a orientação da súmula 138 do extinto Tribunal Federal de Recursos e tem sido adotado pela C. 3ª Turma do TRF-3 em casos semelhantes.

- É firme a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, no que tange à atuação de empresas dedicadas à atividade de locação de veículos, a presunção de boa-fé objetiva não pode ser afastada com fundamento no risco inerente ao exercício da atividade empresarial, consistente na possibilidade de que veículos locados venham a ser utilizados por terceiros na prática de ilícitos fiscais.

- Não se mostra razoável exigir que a empresa locadora promova investigação prévia ou análise do histórico de seus clientes, com o intuito de prevenir o uso indevido do bem móvel por parte do locatário, sob pena de violação aos princípios que regem as relações de consumo, especialmente os insculpidos no art. 39, incisos II e IX, do Código de Defesa do Consumidor, os quais vedam práticas discriminatórias na oferta e na contratação de produtos e serviços.

- No caso concreto, não há qualquer indício de que a empresa locadora tenha concorrido para a prática da infração aduaneira investigada, a qual foi cometida por terceiro condutor locatário. Também não foi demonstrada a responsabilidade da entidade comercial na tentativa de introdução das mercadorias estrangeiras no mercado nacional, razão pela qual resta impossibilitada a aplicação da pena de perdimento ao veículo locado.

- Apelação fazendária não provida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo fazendário, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
RUBENS CALIXTO
Desembargador Federal