Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005588-27.2023.4.03.6126

RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO

APELANTE: RACZ INDUSTRIA METALURGICA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: PAULO CORREA RANGEL JUNIOR - SP108142-A, VAGNER MENDES MENEZES - SP140684-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005588-27.2023.4.03.6126

RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO

APELANTE: RACZ INDUSTRIA METALURGICA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: PAULO CORREA RANGEL JUNIOR - SP108142-A, VAGNER MENDES MENEZES - SP140684-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

Trata-se de apelação da RACZ INDUSTRIA METALURGICA LTDA em face de sentença proferida em mandado de segurança objetivando reativação de transações excepcionais, junto à PGFN, que foram rescindidas em razão do inadimplemento de sua entrada e parcelas (negociações n.º6959718 e 6959787), em razão de dificuldades financeiras alegadas pela impetrante. 

Em sentença, o c. juízo a quo denegou a segurança, entendendo que, in verbis: “não cabe ao Poder Judiciário ampliar ou limitar o benefício concedido ao contribuinte, para determinar, sem previsão legal, obrigatoriedade ao Fisco de notificar o contribuinte ou possibilitar a regularização da situação a destempo. Ou seja, o contribuinte apenas tem direito ao parcelamento nos exatos limites impostos pela norma de regência, não havendo direito líquido e certo a ser amparado. ”

Em suas razões recursais, a impetrante alega que o cancelamento das transações de números de negociação 6959718, 6959787, 7979141 e 8048831, sem notificação da Recorrente para quitação das parcelas em atraso, afronta os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade, da ampla defesa e do contraditório, aduzindo haver a possibilidade de realizar nova adesão à transação excepcional.

Com contrarrazões apresentadas pela apelada, subiram os autos a este E. Tribunal Regional Federal.

O Ministério Público Federal, em segundo grau de jurisdição, manifestou-se pelo regular prosseguimento do feito.

É o relatório.

 

lps

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005588-27.2023.4.03.6126

RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO

APELANTE: RACZ INDUSTRIA METALURGICA LTDA

Advogados do(a) APELANTE: PAULO CORREA RANGEL JUNIOR - SP108142-A, VAGNER MENDES MENEZES - SP140684-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR):

O mandado de segurança é ação de cunho constitucional e possui por escopo a proteção de direito líquido e certo, lesado ou ameaçado, por ato ou omissão de autoridade pública ou de agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do poder público, nos termos do inciso LXIX do artigo 5º da CF/88, in verbis:

Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparável por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

Assim, o mandado de segurança objetiva a proteção de direitos lesados ou ameaçados por atos ou omissões de autoridades ou delegados, quando não amparados por habeas corpus ou habeas data.

No caso dos autos, narra a impetrante que não há cabimento para a exclusão da empresa dos acordos de pagamento parcelado, com a consequente anulação desses acordos, devido ao atraso no pagamento das parcelas, sem que a empresa fosse previamente avisada e tivesse a chance de regularizar a situação, configurando uma ação abusiva, destoando do artigo 4º, parágrafo 2º, da Lei 13.988/2020.

Todavia, a própria Lei nº 13.988/20, que disciplina os requisitos e condições para a realização da transação resolutiva de litígio relativo à cobrança de créditos da Fazenda Pública, de natureza tributária ou não tributária, prevê, em seu art. 4º, as seguintes hipóteses de rescisão da transação:

Art. 4º Implica a rescisão da transação:

I - o descumprimento das condições, das cláusulas ou dos compromissos assumidos;

(...)

§ 1º O devedor será notificado sobre a incidência de alguma das hipóteses de rescisão da transação e poderá impugnar o ato, na forma da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, no prazo de 30 (trinta) dias.

§ 2º Quando sanável, é admitida a regularização do vício que ensejaria a rescisão durante o prazo concedido para a impugnação, preservada a transação em todos os seus termos.

§ 3º A rescisão da transação implicará o afastamento dos benefícios concedidos e a cobrança integral das dívidas, deduzidos os valores já pagos, sem prejuízo de outras consequências previstas no edital.

§ 4º Aos contribuintes com transação rescindida é vedada, pelo prazo de 2 (dois) anos, contado da data de rescisão, a formalização de nova transação, ainda que relativa a débitos distintos.

 

O acordo ainda é regido pela Portaria PGFN nº 14.402/20, que regulamenta a transação excepcional na cobrança da dívida ativa da União em razão dos efeitos da pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19), o qual prevê o seguinte:

 

Art. 16. O optante deverá prestar as informações necessárias à consolidação da proposta de transação por adesão exclusivamente pelo portal REGULARIZE da PGFN.

§ 1º A formalização da transação excepcional fica condicionada ao pagamento de todas as parcelas da entrada e, cumulativamente, à prestação das seguintes informações:

(...)

§ 3º O não pagamento da integralidade dos valores das parcelas relativas à entrada de que trata o art. 9º, desta Portaria, acarretará o cancelamento da transação.

 

Art. 18. No ato de conclusão da adesão e após a prestação das informações de que trata o art. 16, o devedor terá conhecimento de sua capacidade de pagamento estimada pela PGFN e do grau de recuperabilidade de seus débitos, bem como das modalidades de propostas para adesão disponíveis para transação excepcional, com indicação dos prazos e/ou descontos ofertados.

(...) § 2º Não concluído o procedimento no prazo e forma previstos no art. 16 desta portaria, o pedido de adesão à proposta de transação será considerado sem efeito.

 

Art. 19. Implica rescisão da transação:

I - o descumprimento das condições, das cláusulas, das obrigações previstas nesta portaria ou dos compromissos assumidos nos termos do art. 17;

II - o não pagamento de três parcelas consecutivas ou alternadas do saldo devedor negociado nos termos da proposta de transação aceita;

III - a constatação, pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, de ato tendente ao esvaziamento patrimonial do devedor como forma de fraudar o cumprimento da transação, ainda que realizado anteriormente a sua celebração;

IV - a decretação de falência ou de extinção, pela liquidação, da pessoa jurídica transigente;

V - a inobservância de quaisquer disposições previstas na Lei de regência da transação.

Parágrafo único. Na hipótese de que trata o inciso IV, é facultado ao devedor aderir à modalidade de transação proposta pela PGFN, desde que disponível, ou apresentar nova proposta de transação individual.

 

Verifica-se, pois, que a Portaria possui disposição expressa que autoriza a rescisão da transação em caso de inobservância de quaisquer disposições previstas na Lei de regência da transação, mormente nos casos de não pagamento da integralidade dos valores das parcelas relativas à entrada (Art. 16, §1º, c/c art. 19, V, da Portaria PGFN nº 14.402/20).

Acerca da notificação prévia, conforme argumentou a PGFN, ao não realizar o pagamento integral do “pedágio”, a impetrante não preencheu os requisitos essenciais para aderir ao acordo, não havendo fase de notificação ao passo que não houve ingresso na excepcional transação. A aplicação do art. 4º, §1º da Lei nº 13.988/20 e o art. 19, da Portaria PGFN nº 14.402/20, já citados, levam em consideração o acordo já em curso, sendo, portanto, inaplicáveis ao caso em tela.

O contribuinte já tinha pleno conhecimento destas regras previamente, e com elas anuiu ao solicitar sua adesão à transação excepcional. Conceder à impetrante a reativação de sua transação importa não só em violação dos atos normativos que regulamentam o programa, como também em inadmissível ingerência do Poder Judiciário no campo de atuação administrativa, além de tratamento anti-isonômico em preterição dos outros contribuintes que se sujeitaram ao estrito cumprimento do regramento normativo aplicável às transações excepcionais. 

Desta forma já entendeu esta Primeira Turma:

ADMINISTRATIVO. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRANSAÇÃO EXCEPCIONAL. PORTARIA PGFN Nº 14.402/20. RESCISÃO. INADIMPLÊNCIA DE PARCELA DA ENTRADA. AUSÊNCIA DE ILEGALIDE OU VÍCIO. REATIVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

A Portaria PGFN nº 14.402/20, que regulamenta a transação excepcional na cobrança da dívida ativa da União em razão dos efeitos da pandemia causada pelo coronavírus (COVID-19), condiciona a formalização do acordo ao pagamento integral de todas as parcelas da entrada, sob pena de a adesão ao programa ser considerada sem efeito e a transação cancelada (art. 16, §§1º e 3º, c/c art. 18, §2º, da Portaria PGFN nº 14.402/20).

Conceder à impetrante a reativação de sua transação rescindida em razão do inadimplemento de uma das parcelas da entrada importa não só em violação dos atos normativos que regulamentam o programa, como também em inadmissível ingerência do Poder Judiciário no campo de atuação administrativo, além de tratamento anti-isonômico em preterição dos outros contribuintes que se sujeitaram ao estrito cumprimento do regramento normativo aplicável às transações excepcionais.

Não há ilegalidade ou vício no cancelamento da transação excepcional por parte da PGFN, tendo em vista o inadimplemento de uma das parcelas da entrada e a inobservância das condições às quais a parte anuiu em sua adesão ao programa. Não há margem legal para a reativação do benefício, sendo que a transação nem sequer pode ser considerada como formalizada em razão a ausência de pagamento integral da entrada (art. 16, §§1º e 3º, c/c art. 18, §2º, da Portaria PGFN nº 14.402/20).

Apelação não provida.

(Apelação Cível nº 5015264-77.2023.4.03.6100, 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região,  julgado em 15/08/2024.)

 

No mais, aponto que o programa de transação regido pela Portaria da PGFN nº 14.402/2020 é, como o próprio nome indica, excepcional, valendo-se de renúncia de créditos de juros, multas e encargos legais, com significativa onerosidade a ser suportada pelo erário público. Nessa qualidade, o programa não pode ser flexibilizado por noções particulares de razoabilidade e proporcionalidade conforme pretende a impetrante. 

Diante do inadimplemento da impetrante e da inobservância das condições da transação excepcional a qual aderiu, entendo que não há margem legal para a reativação do acordo conforme pleiteado pela parte. Ademais, não vislumbro ilegalidade ou vício no cancelamento da transação por parte da PGFN, sendo certo que, nos exatos termos da Portaria de regência, a transação nem sequer pode ser considerada como formalizada em razão da ausência de pagamento integral da entrada (art. 16, §§1º e 3º, c/c art. 18, §2º, da Portaria PGFN nº 14.402/20).

Assim, não verifico direito líquido e certo da impetrante em obter a reativação da transação excepcional rescindida por inadimplemento das parcelas da entrada, não merecendo reparos a sentença recorrida.

Dispositivo

Ante o exposto, nego provimento à apelação.

É como voto.

 



E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO E TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. TRANSAÇÃO EXCEPCIONAL. PORTARIA PGFN Nº 14.402/20. RESCISÃO POR INADIMPLÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE DE REATIVAÇÃO. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

I. Caso em exame

1.       Trata-se de apelação interposta por RACZ INDÚSTRIA METALÚRGICA LTDA contra sentença que denegou a segurança em mandado de segurança impetrado para reativar transação excepcional rescindida por inadimplemento das parcelas iniciais. Alega a recorrente que o cancelamento ocorreu sem prévia notificação, afrontando os princípios da razoabilidade, proporcionalidade, ampla defesa e contraditório.

II. Questão em discussão

2.      A questão em discussão consiste em saber se é possível a reativação de transação excepcional rescindida por inadimplemento da entrada e se há necessidade de notificação prévia ao contribuinte antes do cancelamento.

III. Razões de decidir

3.      Nos termos da Lei nº 13.988/20 e da Portaria PGFN nº 14.402/20, a transação excepcional é condicionada ao pagamento integral das parcelas iniciais. O inadimplemento implica rescisão automática, sem previsão de reativação.

4.      A exigência de notificação prévia ao contribuinte aplica-se apenas a transações já formalizadas, não se aplicando a casos em que o contribuinte não cumpriu os requisitos essenciais para adesão.

5.      A concessão do pedido implicaria violação dos atos normativos vigentes, interferência indevida do Poder Judiciário na esfera administrativa e tratamento anti-isonômico em relação a outros contribuintes que cumpriram rigorosamente os requisitos da transação excepcional.

IV. Dispositivo e tese

Apelação não provida.


Tese de julgamentoNão há ilegalidade ou vício no cancelamento da transação excepcional por parte da PGFN diante de inadimplemento das parcelas da entrada e a inobservância das condições às quais a parte anuiu em sua adesão ao programa.
Dispositivos relevantes citados: Lei 13.988/2020, art. 4º, I, §1º a §4º; Portaria PGFN nº 14.402/2020, arts. 16, §1º e §3º; 18, §2º; 19, I e V.
Jurisprudência relevante citada: TRF3, Apelação Cível nº 5015264-77.2023.4.03.6100, 1ª Turma, julgado em 15/08/2024.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
ANTONIO MORIMOTO
Desembargador Federal