Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003873-56.2022.4.03.6102

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: RAIMUNDO LEMOS SA

Advogado do(a) APELANTE: ADRIANO APARECIDO NOGUEIRA DE FREITAS - SP149148-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003873-56.2022.4.03.6102

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: RAIMUNDO LEMOS SA

Advogado do(a) APELANTE: ADRIANO APARECIDO NOGUEIRA DE FREITAS - SP149148-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Trata-se de ação pelo procedimento comum ajuizada por RAIMUNDO LEMOS SÁ, em face da UNIAO FEDERAL, objetivando a anulação do PAF n. 15956.000011/2010-58, que reconheceu a sujeição passiva solidária do autor, caracterizada pela sua colaboração para a prática de sonegação fiscal, suspendendo-se o crédito tributário e as multas aplicadas.

 A sentença julgou improcedentes os pedidos e extinguiu o processo com resolução do mérito, na forma do artigo 487, inciso I, do CPC. Condenou a parte autora a pagar as custas e os honorários à União em 10% do valor da causa.

Apela o autor sustenta, em síntese, que por ser o contador autônomo estava suscetível as determinações da empresa contratante, sendo inaplicável a regra do art. 137, I do CTN. Alega que a escolha do recolhimento tributário pelo SIMPLES foi feita pela empresa, não tendo o apelante qualquer ingerência por essa opção. Aduz que sua responsabilidade, caso mantida, está limitada ao tributo devido (art.135) devendo ser afastada a multa aplicada. Reitera o argumento da nulidade do processo administrativo por erro de capitulação. Diz que a retificação da declaração e o pedido de parcelamento ocorreu antes do mandado de fiscalização, devendo ser reconhecida a denúncia espontânea. Requer os benefícios da justiça gratuita.

Com contrarrazões.

É o relatório.

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5003873-56.2022.4.03.6102

RELATOR: Gab. 48 - DES. FED. SOUZA RIBEIRO

APELANTE: RAIMUNDO LEMOS SA

Advogado do(a) APELANTE: ADRIANO APARECIDO NOGUEIRA DE FREITAS - SP149148-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

 

 

Da Justiça Gratuita

O artigo 98 e 99, do atual Código de Processo Civil dispõe acerca dos critérios de concessão da gratuidade da Justiça:

"Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.

(...)

§ 2º A concessão de gratuidade não afasta a responsabilidade do beneficiário pelas despesas processuais e pelos honorários advocatícios decorrentes de sua sucumbência.

§ 3º Vencido o beneficiário, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

Art. 99. O pedido de gratuidade da justiça pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo ou em recurso.

§ 1º Se superveniente à primeira manifestação da parte na instância, o pedido poderá ser formulado por petição simples, nos autos do próprio processo, e não suspenderá seu curso.

§ 2º O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos.

§ 3º Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.

§ 4º A assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça.

§ 5º Na hipótese do § 4º, o recurso que verse exclusivamente sobre valor de honorários de sucumbência fixados em favor do advogado de beneficiário estará sujeito a preparo, salvo se o próprio advogado demonstrar que tem direito à gratuidade.

§ 6º O direito à gratuidade da justiça é pessoal, não se estendendo a litisconsorte ou a sucessor do beneficiário, salvo requerimento e deferimento expressos.

§ 7º Requerida a concessão de gratuidade da justiça em recurso, o recorrente estará dispensado de comprovar o recolhimento do preparo, incumbindo ao relator, neste caso, apreciar o requerimento e, se indeferi-lo, fixar prazo para realização do recolhimento."

Por sua vez, o artigo 100 do mesmo Código traz a possibilidade de sua impugnação:

“Art. 100. Deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso.

Parágrafo único. Revogado o benefício, a parte arcará com as despesas processuais que tiver deixado de adiantar e pagará, em caso de má-fé, até o décuplo de seu valor a título de multa, que será revertida em benefício da Fazenda Pública estadual ou federal e poderá ser inscrita em dívida ativa.”

Logo, conforme dispõe o § 3° do art. 99 do CPC/2015, presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural. Ainda, nos termos do art. 100 do CPC/2015, se admite prova em contrário, cabendo à parte adversa provar a ausência da necessidade alegada pelo beneficiário, mediante prova bastante de que o mesmo possui condições de arcar com os custos do processo, sem prejuízo de seu sustento e o de sua família, podendo ser o benefício indeferido, desde que fundamentadamente justificado, ou mesmo revogado em qualquer fase do processo.

Nesse caso, a documentação apresentada é frágil e não foi suficiente à comprovação da ausência de recursos necessários ao custeio do processo. A juntada apenas do informe de rendimentos do benefício de aposentadoria auferido é insuficiente para demonstrar a hipossuficiência, já que o autor exerce a função de contador autônomo. Cumpre salientar que intimado para apresentar as declarações de imposto de renda, a fim de se auferir a real situação financeira, o autor efetuou o recolhimento das custas iniciais e também o preparo do recurso, ato incompatível, portanto, com a alegada hipossuficiência.

Destarte, a parte apelante não se desincumbiu do encargo de demonstrar seu estado de hipossuficiência, razão pela qual mantenho o indeferimento da gratuidade judicial.

Passo ao exame do mérito.

 

Responsabilidade tributária do preposto e sujeição passiva.

Em relação ao sujeito passivo da obrigação tributária o art. 135, do CTN prevê:

"Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

I - as pessoas referidas no artigo anterior;

II - os mandatários, prepostos e empregados;

III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado".

Em relação à responsabilidade pessoal do agente pelos atos praticados com infração à lei, o art. 137 do CTN dispõe:

Art. 137. A responsabilidade é pessoal ao agente:

I - quanto às infrações conceituadas por lei como crimes ou contravenções, salvo quando praticadas no exercício regular de administração, mandato, função, cargo ou emprego, ou no cumprimento de ordem expressa emitida por quem de direito;

O contador na qualidade de preposto da empresa, responde pessoalmente perante os preponentes, pelos atos culposos praticados; e, perante terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos, nos termos do art. 1.169 e 1.177 do Código Civil.

Confira:

Art. 1.169. O preposto não pode, sem autorização escrita, fazer-se substituir no desempenho da preposição, sob pena de responder pessoalmente pelos atos do substituto e pelas obrigações por ele contraídas.

(...)

Art. 1.177. Os assentos lançados nos livros ou fichas do preponente, por qualquer dos prepostos encarregados de sua escrituração, produzem, salvo se houver procedido de má-fé, os mesmos efeitos como se o fossem por aquele.

Parágrafo único. No exercício de suas funções, os prepostos são pessoalmente responsáveis, perante os preponentes, pelos atos culposos; e, perante terceiros, solidariamente com o preponente, pelos atos dolosos.

No caso concreto, a conduta do autor, contador da empresa fiscalizada, que ensejou a sujeição passiva solidária, pela prática de sonegação fiscal, está descrita no Termo de Verificação Fiscal, nos seguintes termos:

“Além disso, ficou igualmente comprovado que o Sr. Raimundo Lemos Sá, [...], contador da empresa fiscalizada durante o ano de 2007, procedeu aos cálculos para o recolhimento dos tributos devidos pela empresa fiscalizada no mesmo período, conforme termo de declarações e esclarecimentos, sito às fls. 122/124, sabidamente errados (reduzidos). O mesmo contador controlou, ainda, a contabilidade de todas as empresas envolvidas na “fabricação de custos e despesas”, conforme descrito no item 5.2. O mesmo contador afirmou que prestava serviços para a empresa de forma autônoma, portanto, sem relação de submissão hierárquica (fls. 122/124).

(...)

8.7 Por todo o exposto, resta caracterizada a sujeição passiva solidária, relativamente aos administradores e ao contador da fiscalizada, todos relacionados abaixo, tendo em vista os motivos ali destacados, observando que, será lavrado e entregue a estes o devido Termo de Sujeição Passiva Solidária, para que possam exercer regularmente o direito de defesa, garantido pela Constituição Federal.

[...]

Sr. Raimundo Lemos Sá, CPF 674.868.94815, contador da fiscalizada tendo em vista a sua colaboração para a prática de sonegação fiscal (por omissão de receitas em declaração de rendimentos e por aproveitar despesas e custos não comprovados – inexistentes –, a fim de reduzir no todo ou em parte o pagamento de tributos); prática contrária à lei e definida por esta como crime contra a ordem tributária, conforme rezam os artigos 135, II e 137, I, todos da Lei nº 5.172, de 1966 (Código Tributário Nacional) e tendo em vista a responsabilidade do contabilista, conforme o § único do artigo 1.177 da Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Novo Código Civil Brasileiro).”

A fiscalização, com base na análise dos documentos fiscais da empresa Metalcury Fundição Industrial Ltda. no período de 01/2004 a 06/2007, constatou que os valores constantes da escrituração fiscal elaborada pelo autor no ano 2006, continham divergências significativas de valores de receitas declaradas ao fisco estadual para fins de ICMS e para os demais tributos federais.

No âmbito fiscal o autor confessa que elaborou ambas as declarações e tinha plena ciência das divergências. Assim, ainda que tenha agido por ordem do sócio proprietário da empresa é certo que ambos tinham ciência das irregularidades praticadas e agiram em unidade de desígnios e de forma habitual e permanente ao longo de todo o ano calendário de 2007. Atuava ele como contador autônomo, sem sujeição a ordens do contratante, de forma que as infrações foram cometidas livre e conscientemente.   

Comprovada a atuação fraudulenta do contador deve ele ser responsabilizado solidariamente pela obrigação tributária (principal e encargos), não havendo qualquer irregularidade na autuação.

Importante frisar que a indicação de forma genérica dos dispositivos infringidos não acarreta a nulidade do auto de infração, eis que o autuado se defende dos fatos que lhe são imputados e não de sua classificação legal.

 

Denúncia espontânea

O art. 138, CTN tem o explícito destino de acolher ao contribuinte que, reconhecendo o ilícito no qual tenha incidido, procede ao pronto recolhimento do todo da exação implicada, anteriormente a qualquer ação fiscal.

Ou seja, em âmbito de análise dos desejados efeitos excludentes da responsabilidade infracional nos moldes do retratado artigo, deve ser destacado o pacificado entendimento segundo o qual é necessário o integral pagamento do tributo envolvido, previamente ao agir estatal.

No caso, não se afigura a hipótese da denúncia espontânea, tendo em vista o procedimento fiscal de coleta de provas, prévio ao lançamento, iniciado em 15/10/2009, tendo a pessoa jurídica retificado a sua PSJI 2007 Simples para IRPJ, e o parcelamento do débito ocorrido apenas em 16/10/2009, não se configurando, assim, a espontaneidade exigida pelo art. 138 do CTN.

Logo, não merece reparos a sentença.

A título de honorários recursais, a verba honorária fixada na sentença, deve ser majorada do valor equivalente a 1% (um por cento) do seu total.

Ante o exposto, nego provimento ao apelo, nos termos da fundamentação.

É o voto.



E M E N T A

 

DIREITO TRIBUTÁRIO. AÇÃO PELO PROCEDIMENTO COMUM. ANULAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO FISCAL. INDEFERIMENTO DA GRATUIDADE JUDICIAL. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA DO CONTADOR. NÃO CONFIGURAÇÃO DE DENÚNCIA ESPONTÂNEA. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

Trata-se de ação pelo procedimento comum ajuizada por RAIMUNDO LEMOS SÁ, em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a anulação do PAF n. 15956.000011/2010-58, que reconheceu a sujeição passiva solidária do autor, caracterizada pela sua colaboração para a prática de sonegação fiscal, suspendendo-se o crédito tributário e as multas aplicadas. A sentença julgou improcedentes os pedidos e extinguiu o processo com resolução do mérito, na forma do artigo 487, inciso I, do CPC.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

(i) Indeferimento da gratuidade judicial por falta de comprovação de hipossuficiência.

(ii) Responsabilidade tributária do contador pela prática de sonegação fiscal.

(iii) Não configuração de denúncia espontânea.

III. RAZÕES DE DECIDIR

A documentação apresentada pelo autor foi considerada frágil e insuficiente para comprovar a ausência de recursos necessários ao custeio do processo. O autor não apresentou as declarações de imposto de renda e efetuou o recolhimento das custas iniciais e o preparo do recurso, atos incompatíveis com a alegada hipossuficiência.

A responsabilidade tributária do contador está prevista no artigo 135, II e 137 do CTN, bem como nos artigos 1.169 e 1.177 do Código Civil. A conduta do autor, contador autônomo da empresa fiscalizada, ensejou a sujeição passiva solidária pela prática de sonegação fiscal.

A denúncia espontânea não se configura no caso, pois o procedimento fiscal de coleta de provas foi iniciado antes do recolhimento dos tributos.

IV. DISPOSITIVO E TESE

Ante o exposto, nego provimento ao apelo, nos termos da fundamentação.

Dispositivos relevantes citados: Artigos 98, 99, 100 do CPC; Artigos 135, 137, 138 do CTN; Artigos 1.169 e 1.177 do Código Civil.

Jurisprudência relevante citada: Não há jurisprudência citada no voto.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao apelo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
SOUZA RIBEIRO
Desembargador Federal