Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000463-03.2018.4.03.6143

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

APELADO: MINERACAO RELVA CANDIDA LTDA.

Advogado do(a) APELADO: AUGUSTO FAUVEL DE MORAES - SP202052-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5000463-03.2018.4.03.6143

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

APELADO: MINERACAO RELVA CANDIDA LTDA.

Advogado do(a) APELADO: AUGUSTO FAUVEL DE MORAES - SP202052-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de agravo interno (art. 1.021 do CPC) interposto pela UNIÃO, contra decisão monocrática terminativa, de minha lavra, que deu parcial provimento à remessa necessária e à apelação da União para (i) denegar a segurança, nos termos do artigo 487, I, do CPC, em relação aos pedidos de não incidência de IRPJ e CSLL apurados sob o regime de lucro presumido, sobre valores a título de ICMS de não incidência das contribuições ao PIS e COFINS nas suas próprias bases de cálculo; (ii) quanto à tributação do IRPJ e CSLL sobre valores auferidos por força do aproveitamento de subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido, ou também denominado outorgado, de ICMS, restringir a concessão da segurança aos fatos geradores ocorridos no período de vigência do artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014; (iii) em relação à tributação de PIS e COFINS quanto aos valores a título de ICMS, restringir a concessão da segurança aos fatos geradores ocorridos a partir de 15.03.2017 e desde que se encontrem devidamente destacados nas notas fiscais; (iv) sobre a tributação de PIS e COFINS quanto aos valores a título de ICMS-ST na qualidade de contribuinte substituído, restringir a concessão da segurança aos fatos geradores ocorridos a partir de 15.03.2017 e desde que se encontrem devidamente destacados da base de cálculo das contribuições; (v) referente à tributação de PIS e COFINS quanto aos valores a título de ISS, restringir a concessão da segurança ao montante devidamente destacado nas notas fiscais; restando no mais, mantida a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição.

 

Em razões recursais (ID 308450080), a UNIÃO alega “que o julgamento do tema 118 de repercussão geral, no bojo do qual se discute a matéria ora tratada, iniciou-se em 14/08/2020, tendo o Ministro Relator Celso de Mello proferido voto pela exclusão do ISS da base de cálculo do PIS/COFINS. Todavia, na sequência, o Ministro Dias Toffoli pediu vista dos autos e o julgamento permanece suspenso até a presente data. Dessa forma, cumpre que se aguarde o julgamento da aludida repercussão geral para que sejam julgados os processos relacionados ao tema, ao invés de se aplicar o precedente firmado no RE 574.706, que, como visto, não se amolda ao caso. Diante do quadro apresentado, vê-se que uma interpretação em sentido contrário violaria frontalmente o disposto no art. 12, § 1º, III, e § 5º, do Decreto-Lei 1.598/77 e art. 195, I, b, da Constituição Federal. Ante todo exposto, postula a Fazenda Nacional que seja reconhecida a impossibilidade de excluir o ISSQN da base de cálculo do PIS e da COFINS”.

 

Sustenta que, “considerando a afetação do presente tema à sistemática dos recursos repetitivos (Tema 1008) pelo Superior Tribunal de Justiça e a determinação de suspensão da tramitação de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão delimitada e tramitem no território nacional, inclusive nos Juizados Especiais Federais, cumpre que seja determinada a suspensão imediata dos presentes autos, para se aguardar o julgamento dos RESPs 1767631, 1772634 e 1772470. Diante do quadro apresentado, vê-se que uma interpretação em sentido contrário violaria frontalmente o disposto nos seguintes dispositivos: art. 12 do Decreto-lei 1.598/77; arts. 15 e 20 da Lei 9.249/95; art. 25 da Lei 9.430/96; art. 42 do Decreto-lei 5844/43; arts. 224, 519 e 519 do Decreto 3.000/99 e arts. 60, III e 153, III da Constituição Federal. Portanto, deve ser reconhecida a impossibilidade de exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados no regime do lucro presumido, uma vez que o tributo estadual não a compõe.”

 

Aduz que “se acolhida a tese do contribuinte, ocorrerá grave violação do pacto federativo e consequente esvaziamento, por ato do estado-membro desprovido de amparo constitucional ou legal, da base de cálculo de tributos federais, resultando na erosão da base fiscal e das receitas tributárias da União. Diante do quadro apresentado, vê-se que interpretação em sentido contrário violaria frontalmente arts. 25, 28 e 29 da Lei 9.430/1996, e aos arts. 15 e 20 da Lei 9.249/1995, art. 43, I, do CTN, além de violar os arts. 1º, 18, 150, § 6º, e 151, III, da Constituição Federal. A tese do contribuinte não merece acolhimento, diante da ausência de qualquer previsão legal de exclusão do crédito presumido de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, apurados na sistemática do lucro presumido.”

 

Sem contraminuta.

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


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V O T O

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de agravo interno, na forma prevista no artigo 1.021 do CPC, cujo propósito é submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida.

 

Discute-se no agravo interno:

 

(i) a inclusão, na base de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, de valores relativos ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS;

 

(ii) a inclusão, na base de cálculo do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza da pessoa jurídica – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, apurados no regime de lucro presumido, de valores recebidos a título de Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, inclusive decorrentes de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais concedidos pelos respectivos entes tributantes restritos em créditos presumidos.

 

I. DAS QUESTÕES PRELIMINARES

 

I.1. Inépcia da inicial e ausência de interesse processual referente à tributação de IRPJ e CSLL sobre benefícios fiscais de ICMS

 

Não reconheço a inépcia da inicial ou ausência de interesse processual relativamente ao pleito para reconhecimento da não incidência de IRPJ e CSLL sobre benefício fiscal relativo a crédito presumido de ICMS.

 

O mandado de segurança, nos termos do artigo 5°, LXIX, da CF e artigo 1° da Lei n.° 12.016/09, é cabível para proteção de direito líquido e certo, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade.

 

Ressalta-se, nos termos do enunciado de Súmula n.º 266 do e. Supremo Tribunal Federal, que “não cabe mandado de segurança contra lei em tese”, de sorte que não se admite que a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos constitua pedido autônomo da impetração, restando a possibilidade de se deduzir no mandado de segurança a inconstitucionalidade da norma como fundamento para o pedido, diante de efeitos concretos da norma impugnada.

 

Neste sentido, há sedimentado entendimento quanto ao cabimento de mandado de segurança, inclusive de forma preventiva, visando coibir que a autoridade fazendária exija tributo tido por indevido, inclusive por força do disposto no artigo 142, parágrafo único, do CTN, que estabelece ser vinculada e obrigatória a atividade administrativa de lançamento. Confira-se:

 

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. ISS SOBRE ATIVIDADES EXERCIDAS POR AGÊNCIA DE NOTÍCIAS. ACÓRDÃO EMBARGADO FIRMADO COM BASE EM PREMISSA FÁTICA EQUIVOCADA. ACOLHIMENTO PARA AFASTAR O ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. CABIMENTO DO WRIT OF MANDAMUS NA MODALIDADE PREVENTIVA DIANTE DA EXISTÊNCIA DE LANÇAMENTOS FISCAIS REGULARMENTE INSCRITOS NA DÍVIDA ATIVA MUNICIPAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO DA CONTRIBUINTE ACOLHIDOS, COM EFEITOS INFRINGENTES, A FIM DE PROVER O RECURSO ESPECIAL, PARA, RECONHECENDO O CABIMENTO DO MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO, DETERMINAR O RETORNO DOS AUTOS AO TRIBUNAL DE ORIGEM PARA APRECIAÇÃO DAS QUESTÕES REMANESCENTES. 1. A teor do disposto no art. 1.022 do Código Fux, os Embargos de Declaração destinam-se a suprir omissão, afastar obscuridade ou eliminar contradição ou erro material existente no julgado. 2. A negativa de seguimento ao Recurso Especial de iniciativa da Contribuinte teve por fundamento o fato de que Tribunal Paulista consignou que a pretensão estampada no presente Mandado de Segurança necessita de dilação probatória. Todavia, tal entendimento resultou em manifesta alteração das premissas fáticas assentadas pela instância de origem, segundo a qual não é viável a impetração preventiva quando não comprovada a efetiva lesão ou ameaça de lesão a direito líquido e certo, sob pena de ofensa à Súmula 266 do STF. 3. De fato, a Corte de origem não considerou a necessidade de dilação probatória, mas sim ser descabida a impetração preventiva para afastar a exigência tributária, razão pela qual inaplicável o óbice da Súmula 7/STJ, por se tratar de questão unicamente de direito, referente à existência de ameaça de lesão efetiva e concreta do direito do ora embargante. 4. Assim, equivocada a premissa adotada pela decisão ora embargada, há de ser alterado o julgado, a fim de afastar o óbice da Súmula 7/STJ, e, por conseguinte, apreciar o mérito do Apelo Nobre, no qual se questiona se a hipótese dos autos versa sobre a impetração contra a lei em tese diante da ausência de autuação abusiva que estivesse na iminência de acontecer, ou se restou demonstrado o justo receio de lesão a direito subjetivo da impetrante, o que justifica a pretensão de coibir o ato coator por meio do veículo processual do Mandado de Segurança Preventivo. 5. A Lei 12.106/2009 não deixa dúvidas de que o Mandado de Segurança é instrumento destinado a proteger direito líquido e certo sempre que houver a prática de ato lesivo ou abuso de poder pela autoridade pública, estando consolidado o entendimento, tanto na doutrina como na jurisprudência, de que a via mandamental pode ser utilizada preventivamente, a fim de prevenir ou evitar lesão ou dano diante de ameaça concreta ou justo receio em desfavor do impetrante. 6. Na esfera tributária, esta Corte Superior prestigia o entendimento de que é cabível a utilização do Mandado de Segurança, ainda que sob enfoque preventivo, a fim de inibir que a autoridade coatora venha a fazer lançamento fiscal, tendo em vista o comportamento que pretende adotar frente à norma tributária capaz de produzir efeitos concretos na esfera patrimonial do Contribuinte. Precedentes: AgInt no REsp. 1.270.600/RS, Rel. Min. OG FERNANDES, DJe 13.6.2018; AgRg no AREsp. 543.226/PE, Rel. Min. SÉRGIO KUKINA, DJe 10.12.2015; AgRg no Ag 1.302.289/RJ, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 8.11.2010;REsp. 860.538/RS, Rel. Min. LUIZ FUX, DJe 16.10.2008. 7. No caso dos autos, o writ se justifica na medida em que a Contribuinte objetiva evitar que atos abusivos de cobrança venham a ocorrer, haja vista que já foi autuada reiteradamente pelo não recolhimento do tributo específico contra que se insurge, tanto que, em suas informações, a autoridade coatora defende a possibilidade de incidência do ISS sobre as atividades de produção de material de cunho jornalístico (informações, notícias e fotos) para comercialização com empresa de jornais e revistas, além de discorrer sobre a impossibilidade de se discutir a exigência tributária em Mandado de Segurança, quando os lançamentos fiscais já foram regularmente inscritos na Dívida Ativa Municipal e geraram Certidões de Dívida Ativa, que gozam de presunção de liquidez e certeza, cabendo ao impetrante se defender por meio de Embargos à Execução. 8. Logo, a ameaça de autuação do Fisco Municipal não está apenas no plano da presunção, visto que a autoridade coatora defendeu em suas informações a legitimidade da exigência tributária. Tal circunstância é suficiente a demonstrar que a fiscalização certamente autuará a impetrante se ausente o recolhimento do ISS, além de impor penalidades pela inadimplência, até porque o lançamento tributário é atividade administrativa vinculada e obrigatória, a teor do disposto no art. 142 do CTN. 9. Destarte, considerando a exigência pelo Município de São Paulo do ISS sobre as atividades de transmissão e cessão de matérias informativas, noticiosas e reportagens jornalísticas, revela-se adequado à satisfação da pretensão formulada o remédio constitucional eleito na modalidade preventiva, pois comprovado o justo receio de vir a sofrer violação a direito por ato coator iminente. 10. Embargos de Declaração da Contribuinte acolhidos, com efeitos infringentes, a fim de afastar o óbice da Súmula 7/STJ, para dar provimento ao Recurso Especial, reconhecendo cabível o Mandado de Segurança preventivo e determinando o retorno dos autos ao TJSP, para prosseguir no julgamento das questões remanescentes.” (STJ, 1ª Turma, EDcl/AgInt/AREsp 1169402, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. 24.09.2019)

 

Ainda, nos termos do enunciado de Súmula STF n.º 625 “controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de segurança”, de sorte que, a contrario sensu, a controvérsia sobre matéria de fato que exija dilação probatória implica óbice à via mandamental (confira-se: STF, 2ª Turma, AgR/RMS 34103, relator Ministro Celso de Mello, j. 06.09.2016).

 

No caso concreto, há matéria de direito controvertida, restando demonstrado o interesse processual, na modalidade adequação da via eleita, para o ajuizamento de mandado de segurança, inclusive de natureza preventiva.

 

Incabível, portanto, a exigência de documentos que comprovem o específico recebimento dos benefícios fiscais, haja vista que cumprirá à fiscalização fazendária a averiguação da correção do quanto oferecido à tributação pelo contribuinte.

 

I.2. Do interesse processual em relação à exclusão de valores de ICMS

 

A questão controvertida é objeto de tese, transitada em julgado em 09.09.2021, firmada pelo e. Supremo Tribunal Federal no Tema de Repercussão Geral n.º 69), no sentido de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins” (j. 15.03.2017), observada a modulação (j. 13.05.2021) de seus efeitos a partir de 15.03.2017, ressalvadas as ações judiciais e procedimentos administrativos protocolados até referida data.

 

Embora a tese firmada em precedente qualificado seja vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário, não possui efeito vinculante e erga omnes no que tange à Administração Pública.

 

Não obstante, na forma dos artigos 19, caput, e inciso VI, a, e 19-A, III, § 1º, da Lei n.º 10.522/2002, foi aprovado por meio do Despacho da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional n.º 246/PGFN-ME, de 24.05.2021, publicado no Diária Oficial da União em 26.05.2021, o Parecer SEI n.º 7.698/2021/PGFN-ME, que determinou a observância no âmbito da Administração Tributária da tese firmada pela Corte Suprema.

 

“APROVO, para os fins e nos termos do art. 19, caput, e inciso VI, a, c/c art. 19-A, III, e § 1º da Lei n° 10.522, de 2002, o PARECER SEI Nº 7698/2021/ME, a fim de que a Administração Tributária passe a observar, em relação a todos os seus procedimentos, e sem prejuízo de posterior observância do fluxo previsto na Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 01, de 2014, por ocasião da publicação do acórdão que julgou os Embargos Declaratórios opostos pela Fazenda Nacional no RE 574.706/PR, que: a)conforme decidido pelo Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Tema 69 da Repercussão Geral, "O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS"; b)os efeitos dessa decisão devem se dar após 15.03.2017, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até 15.03.2017; c) o ICMS que não compõe a base de cálculo das contribuições do PIS e da COFINS é o destacado nas notas fiscais. Encaminhe-se à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, consoante sugerido. Outrossim, cientifique-se a Procuradoria-Geral da Dívida Ativa da União e do FGTS e a Procuradoria-Geral Adjunta de Consultoria e Contencioso Administrativo Tributário. Brasília, 24 de maio de 2021.”

 

Ressalta-se, inclusive, que a partir da vigência, em 30.05.2023, da Lei n.º 14.592/2023, a exclusão dos valores do ICMS da base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS passou a constar expressamente dos artigos 1º, § 3º, XIV, da Lei n.º 10.637/02 e 1º, § 3º, XIII, da Lei n.º 10.833/03.

 

Nesse contexto, em princípio, afigurar-se-ia a ausência de interesse processual, na modalidade necessidade, relativa à prestação jurisdicional que se circunscreva, apenas e tão somente, ao reconhecimento de direito nos exatos termos em que decidido com repercussão geral pelo STF e já aplicado no âmbito da Administração.

 

Não obstante, esta 3ª Turma adota o entendimento de que subsiste o interesse processual do contribuinte, “pois ‘além da discussão da tese jurídica em si, supervenientemente resolvida pela Corte Suprema, subsiste a necessidade de análise dos fatos essenciais ao reconhecimento concreto do direito vindicado’, a exemplo dos parâmetros da compensação do indébito tributário e o próprio cabimento da restituição pela via administrativa” (confira-se: ApCiv 5008528-20.2022.4.03.6119, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, j. 08.05.2023).

 

Contudo, entendo que referido interesse processual se restringe às ações ajuizadas anteriormente ao trânsito em julgado do precedente qualificado do e. STF e até a publicação do referido Despacho PGFN-ME n.º 246/2021, posto que nesse período ainda se configurava resistência administrativa, situação em que imprescindível ordem judicial para fins de que o contribuinte pudesse se ressarcir dos valores recolhidos indevidamente, seja por meio de restituição ou compensação, situação em que o órgão judicial deve estabelecer os “parâmetros da compensação do indébito tributário e o próprio cabimento da restituição pela via administrativa”.

 

Cabe frisar que o e. STF jamais obrigou o contribuinte a ajuizar ação, para que pudesse ver aplicado para si a tese firmada no leading case; a Corte Suprema tão somente extraiu consequência jurídica quando já ajuizada ação cujo mérito teve que se decidir. Significa dizer que, em momento algum, adentrou-se na questão de interesse processual superveniente à tese que firmou.

 

No caso concreto, o mandado de segurança foi impetrado em 02.03.2018, quando ainda não internalizada na Administração Tributária a normatização relativa à exclusão, da base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS, dos valores a título de ICMS, devidamente destacados nas notas fiscais.

 

Assim, reconheço a existência do interesse processual.

 

I.3 Da pendência de julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 118/STF.

 

Curvo-me ao entendimento uníssono das Turmas integrantes da 2ª Seção no sentido de que não se verifica impedimento para julgamento recursal em razão da pendência de julgamento pelo e. STF do Tema de Repercussão Geral n.º 118 (“Inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS” - RE n.º 592.616), haja vista que, em que pese imperativo legal expresso no artigo 1.035, § 5º, do CPC, não houve determinação da Corte Suprema para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a questão. (confira-se: STF, Pleno, RE/RG-QO 966177, relator Ministro Luiz Fux, j. 07.06.2017: “2. A suspensão de processamento prevista no §5º do art. 1.035 do CPC não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral realizada com fulcro no caput do mesmo dispositivo, sendo da discricionariedade do relator do recurso extraordinário paradigma determiná-la ou modulá-la.”).

 

II. DO MÉRITO

 

II.1. DO IRPJ E DA CSLL

 

II.1.1. Da base de cálculo do IRPJ e da CSLL

 

Em conformidade com a autorização constitucional (artigo 153, III, da CF), o Código Tributário Nacional definiu os elementos básicos da obrigação tributária relativa ao Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (artigo 43 ss.), cujo fato gerador é aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza. Estabeleceu, ainda, que renda é o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, bem como que proventos de qualquer natureza correspondem aos acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda.

 

Ainda, nos termos do artigo 2° da Lei n.° 7.689/88, a base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL é o valor do resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, que será apurada nos termos do artigo 28 da Lei n.° 9.430/96, que remonta à base de cálculo do Imposto de Renda – Pessoa Jurídica (IRPJ), de sorte que se aplica à CSLL o mesmo entendimento quanto ao IRPJ.

 

II.1.2. Da tributação sobre os valores de ICMS, apurados no regime de lucro presumido (Tema 1008/STJ)

 

O artigo 44 do CTN dispõe que a base de cálculo do IRPJ é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis.

 

A distinção entre o regime tributável se faz relevante no caso concreto.

 

O lucro real corresponde ao lucro líquido do exercício (apurado com a observância das disposições da Lei n.º 6.404/1976) ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas pela legislação tributária (artigos 6º e 67, XI, do Decreto-Lei n.º 1.598/1977). Ainda, na forma do artigo 41 da Lei n.º 8.981/95, os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência.

 

De outro lado, no regime do lucro presumido, utiliza-se uma base de cálculo substitutiva, em que o lucro presumido é determinado pela aplicação de um determinado percentual, estabelecido em lei, sobre a receita bruta definida na forma do artigo 12 do Decreto-Lei n.º 1.598/1977, auferida no respectivo período de apuração, deduzida das devoluções e vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos (artigos 15 da Lei n.º 9.249/95 e 25, I, da Lei n.º 9.430/96).

 

É importante frisar que a tributação com base no lucro presumido consiste em opção do contribuinte (artigo 13 da Lei n.º 9.718/1998), cuja receita bruta total no ano-calendário anterior tenha sido igual ou inferior ao limite legal.

 

Há uma opção legislativa pela “presunção” do lucro de pessoas jurídicas que auferem anualmente determinada receita bruta. Ressalta-se que o lucro é “presumido”, justamente porque, se utilizada a apuração pelo regime do lucro real, poder-se-ia identificar maior ou menor lucro do que aquela base presumida; contudo, o contribuinte optante assume o “risco” de eventual tributação sob uma maior base de cálculo considerando os demais benefícios advindos da opção pela tributação simplificada.

 

Na exata medida em que o contribuinte opta pela tributação sob base presumida, abrindo mão da possibilidade de dedução de tributos, inclusive do ICMS, não há amparo legal ou constitucional para o acolhimento de sua pretensão.

 

Ressalta-se que a questão não apresenta qualquer identidade com aquela objeto do Tema de Repercussão Geral n.º 69 (“o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”), haja vista que a situação fático-jurídica se afasta daquela tratada pela Corte Suprema na exata medida em que não se está a discutir tributação incidente sobre receita e, sim, sobre lucro na modalidade presumida.

 

Registra-se, ainda, que o e. Supremo Tribunal Federal, em 18.08.2017, no julgamento do Tema n.º 957 estabeleceu, majoritariamente, que “a controvérsia relativa à inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL não possui repercussão geral, tendo em vista sua natureza infraconstitucional”. Em que pese a questão controvertida nesta demanda ser diversa, apresenta a mesma natureza infraconstitucional, posto que, se admita a tese do contribuinte, eventual ofensa à Constituição se daria apenas de forma reflexa.

 

Por seu turno, uniformizando a interpretação da legislação infraconstitucional, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo n.º 1.008 (REsp n.ºs 1.767.631/SC e 1.77.2470/RS), fixou tese no sentido de que “o ICMS compõe a base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), quando apurados na sistemática do lucro presumido”. Segue a ementa do acórdão:

 

“TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. IRPJ. CSLL. APURAÇÃO PELO LUCRO PRESUMIDO. BASE DE CÁLCULO. RECEITA. ICMS. INCLUSÃO. 1. A questão submetida ao Superior Tribunal de Justiça, sob a sistemática dos repetitivos, diz respeito à possibilidade de inclusão de valores de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas bases de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) quando apurados pela sistemática do lucro presumido. 2. No regime de tributação pelo lucro real, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL é o lucro contábil, ajustado pelas adições e deduções permitidas em lei. Na tributação pelo lucro presumido, deve-se multiplicar um dado percentual - que varia a depender da atividade desenvolvida pelo contribuinte - pela receita bruta da pessoa jurídica, que constitui apenas ponto de partida, um parâmetro, na referida sistemática de tributação. Sobre essa base de cálculo, por sua vez, incidem as alíquotas pertinentes. 3. A adoção da receita bruta como eixo da tributação pelo lucro presumido demonstra a intenção do legislador de impedir quaisquer deduções, tais como impostos, custos das mercadorias ou serviços, despesas administrativas ou financeiras, tornando bem mais simplificado o cálculo do IRPJ e da CSLL. 4. A redação conferida aos arts. 15 e 20 da Lei n. 9.249/1995 adveio com a especial finalidade de fazer expressa referência à definição de receita bruta contida no art. 12 do Decreto-Lei n. 1.598/1977, o qual, com a alteração promovida pela Lei n. 12.793/2014, contempla a adoção da classificação contábil de receita bruta, que alberga todos os ingressos financeiros decorrentes da atividade exercida pela pessoa jurídica. 5. Caso o contribuinte pretenda considerar determinados custos ou despesas, deve optar pelo regime de apuração pelo lucro real, que prevê essa possibilidade, na forma da lei. O que não se pode permitir, à luz dos dispositivos de regência, é que haja uma combinação dos dois regimes, a fim de reduzir indevidamente a base de cálculo dos tributos. 6. A tese fixada no Tema 69 da repercussão geral deve ser aplicada tão somente à Contribuição ao PIS e à COFINS, porquanto extraída exclusivamente à luz do art. 195, I, "b", da Lei Fundamental, sendo indevida a extensão indiscriminada. Basta ver que a própria Suprema Corte, ao julgar o Tema 1.048, concluiu pela constitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) - a qual inclusive é uma contribuição social, mas de caráter substitutivo, que também utiliza a receita como base de cálculo. 7. Tese fixada: O ICMS compõe a base de cálculo do IRPJ e da CSLL quando apurados na sistemática do lucro presumido. 8. Recurso especial desprovido.” (STJ, 1ª Seção, REsp 1767631, relatora Ministra Regina Helena Costa, j. 10.05.2023)

 

Ressalta-se que, nos termos do artigo 1.040 do CPC/2015, uma vez publicado o acórdão paradigma, "o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior" (inciso II); bem como “os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior” (inciso III). Não é demais relembrar, inclusive, que a teor do artigo 1.035, § 11, do CPC, a “súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no diário oficial e valerá como acórdão”. Sem ordem das Cortes superiores para tanto, incabível a suspensão da tramitação processual dos feitos cuja questão controversa se refira à tese publicada, ainda que pendente de trânsito em julgado.

 

II.1.3. Da tributação sobre incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais de ICMS

 

Considerando que a hipótese de incidência do imposto é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza, tem-se que, para que se verifique no caso concreto a referida disponibilidade, é necessária a efetiva existência de acréscimo patrimonial, ou seja, que o patrimônio resulte acrescido por um direito ou por um elemento material com natureza de renda ou de proventos.

 

Nesse contexto, questiona-se a incidência de IRPJ ou CSLL sobre incremento de receitas resultantes da não tributação, total ou parcial, nas operações de saída pelo ICMS, por força da concessão pelos respectivos entes tributantes de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais.

 

Ressalta-se que a Lei Complementar n.º 160/2017, que dispôs sobre o “convênio que permite aos Estados e ao Distrito Federal deliberar sobre a remissão dos créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais instituídos em desacordo com o disposto na referida alínea g, do inciso XII, do § 2º, do artigo 155, da Constituição Federal e a reinstituição das respectivas isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais”, promoveu alteração no então vigente artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, estabelecendo que “os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento” (g.n.).

 

Por seu turno, o referido artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014 estabelecia que “as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real, desde que seja registrada em reserva de lucros” (g.n.); ainda, em seu § 2º, dispunha que haveria tributação caso lhes fosse dada destinação diversa.

 

“Art. 30. As subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real, desde que seja registrada em reserva de lucros a que se refere o art. 195-A da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, que somente poderá ser utilizada para:

I - absorção de prejuízos, desde que anteriormente já tenham sido totalmente absorvidas as demais Reservas de Lucros, com exceção da Reserva Legal; ou

II - aumento do capital social.

§ 1º Na hipótese do inciso I do caput , a pessoa jurídica deverá recompor a reserva à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes.

§ 2º As doações e subvenções de que trata o caput serão tributadas caso não seja observado o disposto no § 1º ou seja dada destinação diversa da que está prevista no caput , inclusive nas hipóteses de:

I - capitalização do valor e posterior restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitado ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou subvenções governamentais para investimentos;

II - restituição de capital aos sócios ou ao titular, mediante redução do capital social, nos 5 (cinco) anos anteriores à data da doação ou da subvenção, com posterior capitalização do valor da doação ou da subvenção, hipótese em que a base para a incidência será o valor restituído, limitada ao valor total das exclusões decorrentes de doações ou de subvenções governamentais para investimentos; ou

III - integração à base de cálculo dos dividendos obrigatórios.

§ 3º Se, no período de apuração, a pessoa jurídica apurar prejuízo contábil ou lucro líquido contábil inferior à parcela decorrente de doações e de subvenções governamentais e, nesse caso, não puder ser constituída como parcela de lucros nos termos do caput , esta deverá ocorrer à medida que forem apurados lucros nos períodos subsequentes.

§ 4º Os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento, vedada a exigência de outros requisitos ou condições não previstos neste artigo. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017)

§ 5º O disposto no § 4º deste artigo aplica-se inclusive aos processos administrativos e judiciais ainda não definitivamente julgados. (Incluído pela Lei Complementar nº 160, de 2017)”

 

Com a vigência da Lei n.º 14.789/2023, a partir de 1º de janeiro de 2024, foi revogado o artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014.

 

A nova Lei não mais prevê a possibilidade de exclusão, para fins de determinação do lucro real, de receita decorrente da não tributação (total ou parcial) pelo ICMS em razão dos benefícios fiscais concedidos. A partir de sua vigência, o regramento legal passa a dispor que “a pessoa jurídica tributada pelo lucro real que receber subvenção da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para implantar ou expandir empreendimento econômico poderá apurar crédito fiscal de subvenção para investimento” (g.n.), que será concedido apenas a título de IRPJ (artigo 2º, III, b) e será passível de ressarcimento ou de compensação com tributos administrados pela Receita Federal do Brasil (alínea c).

 

O aproveitamento do crédito fiscal dependerá de prévia habilitação na via administrativa (artigo 3º e seguintes) e corresponderá ao produto das receitas de subvenção e da alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) relativa ao IRPJ.

 

“Art. 1º A pessoa jurídica tributada pelo lucro real que receber subvenção da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para implantar ou expandir empreendimento econômico poderá apurar crédito fiscal de subvenção para investimento, observado o disposto nesta Lei.

Art. 2º Para os fins do disposto no art. 1º desta Lei, considera-se:

I - implantação - o estabelecimento de empreendimento econômico para o desenvolvimento da atividade a ser explorada por pessoa jurídica não domiciliada na localização geográfica do ente federativo que concede a subvenção;

II - expansão - a ampliação da capacidade, a modernização ou a diversificação do comércio ou da produção de bens ou serviços do empreendimento econômico, inclusive mediante o estabelecimento de outra unidade, pela pessoa jurídica domiciliada na localização geográfica do ente federativo que concede a subvenção;

III - crédito fiscal de subvenção para investimento - o direito creditório:

a) decorrente de implantação ou expansão do empreendimento econômico subvencionado por ente federativo;

b) concedido a título de Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ); e

c) passível de ressarcimento ou de compensação com tributos administrados pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Fazenda.

Art. 3º Poderá ser beneficiária do crédito fiscal de subvenção para investimento a pessoa jurídica habilitada pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil.

Art. 4º São requisitos para a concessão da habilitação à pessoa jurídica:

I - ser beneficiária de subvenção para investimento concedida por ente federativo;

II - haver ato concessivo da subvenção editado pelo ente federativo anterior à implantação ou à expansão do empreendimento econômico; e

III - haver ato concessivo da subvenção editado pelo ente federativo que estabeleça expressamente as condições e as contrapartidas a serem observadas pela pessoa jurídica relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico.

Parágrafo único. Transcorrido o prazo de 30 (trinta) dias da apresentação do pedido de habilitação pela pessoa jurídica sem que tenha havido a manifestação pela Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil, a pessoa jurídica será considerada habilitada.

[...]

Art. 6º A pessoa jurídica habilitada poderá apurar crédito fiscal de subvenção para investimento, que corresponderá ao produto das receitas de subvenção e da alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) relativa ao IRPJ.

Parágrafo único. O crédito fiscal deverá ser apurado na Escrituração Contábil Fiscal (ECF) relativa ao período de apuração de reconhecimento das receitas de subvenção.

Art. 7º Na apuração do crédito fiscal, poderão ser computadas somente as receitas de subvenção que:

I - estejam relacionadas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico; e

II - sejam reconhecidas após o protocolo do pedido de habilitação da pessoa jurídica.

Art. 8º Na apuração do crédito fiscal, somente poderão ser computadas as receitas:

I - que sejam relacionadas às despesas de depreciação, amortização ou exaustão ou de locação ou arrendamento de bens de capital, relativas à implantação ou à expansão do empreendimento econômico; e

II - que tenham sido computadas na base de cálculo do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).

§ 1º Não poderão ser computadas na apuração do crédito fiscal:

I - a parcela das receitas que superar o valor das despesas a que se refere o inciso I do caput deste artigo;

II - a parcela das receitas que superar o valor das subvenções concedidas pelo ente federativo; e

III - as receitas decorrentes de incentivos de IRPJ e do próprio crédito fiscal de subvenção para investimento.

§ 2º Para fins do disposto nos incisos I e II do § 1º deste artigo, os valores serão considerados de forma acumulada a partir da data do ato concessivo da subvenção.

§ 3º O disposto no inciso I do caput e no inciso I do § 1º deste artigo não se aplicará na hipótese de subvenção relacionada a bem não sujeito a depreciação, amortização ou exaustão.

§ 4º As receitas de subvenção de que trata o caput deste artigo não serão computadas na base de cálculo da estimativa mensal para fins do IRPJ e da CSLL e deverão ser tributadas no ajuste anual. [...]”

 

Pois bem, ao se debruçar sobre a matéria, antes da vigência da Lei n.º 14.789/2023, portanto, no contexto das disposições do artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça conferiu soluções jurídicas distintas quanto aos créditos presumidos de ICMS outorgados no contexto de incentivo fiscal e quanto às demais espécies de benefícios fiscais relacionados ao ICMS, ainda que este julgador entenda não devesse haver diferença no seu tratamento.

 

Importante frisar que, em quaisquer dos pronunciamentos da Corte Superior, não se afastou a ocorrência de disponibilidade jurídica ou econômica de receita decorrente da não tributação (total ou parcial) pelo ICMS em razão dos benefícios fiscais concedidos, o que se ponderou foi a eventual ocorrência de violação ao pacto federativo na incursão tributária da União.

 

No julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.º 1.547.492,  uniformizando sua jurisprudência a 1ª Seção do c. STJ entendeu que o acréscimo patrimonial decorrente do aproveitamento de créditos presumidos de ICMS outorgados no contexto de incentivo fiscal não poderia sofrer a incidência de IRPJ ou CSLL, sob pena de violação ao princípio federativo. Segue a ementa do acórdão:

 

“TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015. APLICABILIDADE. ICMS. CRÉDITOS PRESUMIDOS CONCEDIDOS A TÍTULO DE INCENTIVO FISCAL. INCLUSÃO NAS BASES DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE A RENDA DA PESSOA JURÍDICA - IRPJ E DA CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. INVIABILIDADE. PRETENSÃO FUNDADA EM ATOS INFRALEGAIS. INTERFERÊNCIA DA UNIÃO NA POLÍTICA FISCAL ADOTADA POR ESTADO-MEMBRO. OFENSA AO PRINCÍPIO FEDERATIVO E À SEGURANÇA JURÍDICA. BASE DE CÁLCULO. OBSERVÂNCIA DOS ELEMENTOS QUE LHES SÃO PRÓPRIOS. RELEVÂNCIA DE ESTÍMULO FISCAL OUTORGADO POR ENTE DA FEDERAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO FEDERATIVO. ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. INCONSTITUCIONALIDADE ASSENTADA EM REPERCUSSÃO GERAL PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE N. 574.706/PR). AXIOLOGIA DA RATIO DECIDENDI APLICÁVEL À ESPÉCIE. CRÉDITOS PRESUMIDOS. PRETENSÃO DE CARACTERIZAÇÃO COMO RENDA OU LUCRO. IMPOSSIBILIDADE. I - Controverte-se acerca da possibilidade de inclusão de crédito presumido de ICMS nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL. II - O dissenso entre os acórdãos paradigma e o embargado repousa no fato de que o primeiro manifesta o entendimento de que o incentivo fiscal, por implicar redução da carga tributária, acarreta, indiretamente, aumento do lucro da empresa, insígnia essa passível de tributação pelo IRPJ e pela CSLL; já o segundo considera que o estímulo outorgado constitui incentivo fiscal, cujos valores auferidos não podem se expor à incidência do IRPJ e da CSLL, em virtude da vedação aos entes federativos de instituir impostos sobre patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros. III - Ao considerar tal crédito como lucro, o entendimento manifestado pelo acórdão paradigma, da 2ª Turma, sufraga, em última análise, a possibilidade de a União retirar, por via oblíqua, o incentivo fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária, outorgou. IV - Tal entendimento leva ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo, em especial porque fundamentado exclusivamente em atos infralegais, consoante declinado pela própria autoridade coatora nas informações prestadas. V - O modelo federativo por nós adotado abraça a concepção segundo a qual a distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de organização estatal e por ela é condicionada. VI - Em sua formulação fiscal, revela-se o princípio federativo um autêntico sobreprincípio regulador da repartição de competências tributárias e, por isso mesmo, elemento informador primário na solução de conflitos nas relações entre a União e os demais entes federados. VII - A Constituição da República atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS - e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei complementar. VIII - A concessão de incentivo por ente federado, observados os requisitos legais, configura instrumento legítimo de política fiscal para materialização da autonomia consagrada pelo modelo federativo. Embora represente renúncia a parcela da arrecadação, pretende-se, dessa forma, facilitar o atendimento a um plexo de interesses estratégicos para a unidade federativa, associados às prioridades e às necessidades locais coletivas. IX - A tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação. X - O juízo de validade quanto ao exercício da competência tributária há de ser implementado em comunhão com os objetivos da Federação, insculpidos no art. 3º da Constituição da República, dentre os quais se destaca a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso III), finalidade da desoneração em tela, ao permitir o barateamento de itens alimentícios de primeira necessidade e dos seus ingredientes, reverenciando o princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento maior da República Federativa brasileira (art. 1º, III, C.R.). XI - Não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com o princípio da subsidiariedade, que reveste e protege a autonomia dos entes federados. XII - O abalo na credibilidade e na crença no programa estatal proposto pelo Estado-membro acarreta desdobramentos deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados, porquanto, se o propósito da norma consiste em descomprimir um segmento empresarial de determinada imposição fiscal, é inegável que o ressurgimento do encargo, ainda que sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias, tornando inócua, ou quase, a finalidade colimada pelos preceito legais, aumentando o preço final dos produtos que especifica, integrantes da cesta básica nacional. XIII - A base de cálculo do tributo haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos estranhos, é dizer, absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência. XIV - Nos termos do art. 4º da Lei n. 11.945/09, a própria União reconheceu a importância da concessão de incentivo fiscal pelos Estados-membros e Municípios, prestigiando essa iniciativa precisamente com a isenção do IRPJ e da CSLL sobre as receitas decorrentes de valores em espécie pagos ou creditados por esses entes a título de ICMS e ISSQN, no âmbito de programas de outorga de crédito voltados ao estímulo à solicitação de documento fiscal na aquisição de mercadorias e serviços. XV - O STF, ao julgar, em regime de repercussão geral, o RE n. 574.706/PR, assentou a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS, sob o entendimento segundo o qual o valor de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os cofres públicos. Axiologia da ratio decidendi que afasta, com ainda mais razão, a pretensão de caracterização, como renda ou lucro, de créditos presumidos outorgados no contexto de incentivo fiscal. XVI - Embargos de Divergência desprovidos.” (STJ, 1ª Seção, EREsp 1517492, relator Ministro Og Fernandes, relatora para o acórdão Ministra Regina Helena Costa, j. 08.11.2017) [g.n.]

 

No voto condutor do posicionamento majoritário, a Ministra Regina Helena Costa pontuou:

 

“[...] Cabe lembrar que a Constituição da República hospeda vários dispositivos dedicados a autorizar certos níveis de ingerência estatal na atividade produtiva com vista a reduzir desigualdades regionais, alavancar o desenvolvimento social e econômico do país, inclusive mediante desoneração ou diminuição da carga tributária. [...]

Tem-se, portanto, que a outorga de crédito presumido de ICMS insere-se em contexto de envergadura constitucional, instituída por legislação local específica do ente federativo tributante. [...]

É esse crédito, em torno do qual gravitam tais aspectos, que se pretende ver incluído nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

Com a devida vênia, ao considerar tal crédito como lucro, o entendimento manifestado pelo acórdão paradigma, da 2ª Turma, sufraga, em última análise, a possibilidade de a União retirar, por via oblíqua, o incentivo fiscal que o Estado-membro, no exercício de sua competência tributária, outorgou.

Com efeito, tal entendimento leva ao esvaziamento ou redução do incentivo fiscal legitimamente outorgado pelo ente federativo [...]

Outrossim, remarque-se que a competência tributária consiste na aptidão para instituir tributos, descrevendo, por meio de lei, as suas hipóteses de incidência. No Brasil, o veículo de atribuição de competências, inclusive tributárias, é a Constituição da República. Tal sistemática torna-se especialmente relevante em um Estado constituído sob a forma federativa, com a peculiaridade do convívio de três ordens jurídicas distintas: a federal, a estadual/distrital e a municipal.

Não por outra razão, cuidou o legislador constituinte originário de alçar a Federação à categoria de cláusula pétrea, tornando-a intangível pelo Poder Constituinte Derivado, conforme o disposto no art. 60, § 4º, I. [...]

Como sabido, o princípio republicano, assim como o princípio da legalidade, constitui decorrência do princípio da segurança jurídica, que se apoia nas ideias de certeza e igualdade. No modelo federativo fiscal, a Constituição dita o que pode cada pessoa política realizar em matéria tributária, demarcando os respectivos âmbitos de atuação, no intuito de evitar conflitos entre a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios.

O modelo federativo por nós adotado abraça a concepção segundo a qual a distribuição das competências tributárias decorre dessa forma de organização estatal e por ela é condicionada.

A rigor, em sua formulação fiscal, revela-se o princípio federativo um autêntico sobreprincípio regulador da repartição de competências tributárias e, por isso mesmo, elemento informador primário na solução de conflitos nas relações entre a União e os demais entes federados.

Como corolário desse fracionamento de competências, o art. 155, XII, g, da Constituição da República, atribuiu aos Estados-membros e ao Distrito Federal a competência para instituir o ICMS – e, por consequência, outorgar isenções, benefícios e incentivos fiscais, atendidos os pressupostos de lei complementar.

Anote-se tratar-se de tributo que, por constituir uma das principais fontes de receita para custeio do aparato estatal, assegura condições para o exercício desembaraçado da autonomia constitucionalmente conferida às unidades da Federação.

A concessão de incentivo por Estado-membro, observados os requisitos legais, configura, portanto, instrumento legítimo de política fiscal para materialização dessa autonomia consagrada pelo modelo federativo. Embora represente renúncia a parcela da arrecadação, pretende-se, dessa forma, facilitar o atendimento a um plexo de interesses estratégicos para a unidade federativa, associados às prioridades e às necessidades locais coletivas.

No caso concreto, verifica-se, de fato, interferência na política fiscal adotada pelo Estado-membro mediante o exercício de competência federal.

Examinada a questão sob valores ético-constitucionais da Federação, limitadores do próprio exercício dessa competência, como também pelo princípio da subsidiariedade, fator de salvaguarda da autonomia dos entes federados perante a atividade tributante federal, constata-se que a concorrência desses elementos, adiante sopesados, é capaz de inibir a pretensão de incidência tributária defendida pela União.

Com efeito, o juízo de validade quanto ao exercício da competência tributária há de ser implementado em comunhão com os objetivos da Federação, insculpidos no art. 3º da Constituição da República, dentre os quais se destaca a redução das desigualdades sociais e regionais (inciso III), finalidade da desoneração em tela, ao permitir o barateamento de itens alimentícios de primeira necessidade e dos seus ingredientes, reverenciando o princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento maior da República Federativa brasileira (art. 1º, III, C.R.).

Desse modo, a tributação pela União de valores correspondentes a incentivo fiscal estimula competição indireta com o Estado-membro, em desapreço à cooperação e à igualdade, pedras de toque da Federação.

Naturalmente, não está em xeque a competência da União para tributar a renda ou o lucro, mas, sim, a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo, e em atrito com a subsidiariedade, "um princípio de bom senso", no dizer do professor André Franco Montoro (Federalismo e o fortalecimento do Poder Local no Brasil e na Alemanha. Coleção Debates da Fundação Konrad Adenauer: Rio de Janeiro, 2002. p. 59), que reveste e protege a autonomia dos Estados-membros. [...]

Dessarte, é razoável que a exegese em torno do exercício de competência tributária federal, no contexto de estímulo fiscal legitimamente concedido por Estado-membro, tenha por vetor principal um juízo de ponderação dos valores federativos envolvidos. [...]

É induvidoso, ademais, o caráter extrafiscal conferido pelo legislador estadual à desoneração, consistindo a medida em instrumento tributário para o atingimento de finalidade não arrecadatória, mas, sim, incentivadora de comportamento, com vista à realização de valores constitucionalmente contemplados, conforme apontado.

Outrossim, o abalo na credibilidade e na crença no programa estatal proposto pelo Estado-membro, a seu turno, acarreta desdobramentos deletérios no campo da segurança jurídica, os quais não podem ser desprezados.

Deveras, se o propósito da norma consiste em descomprimir um segmento empresarial de determinada imposição fiscal, é inegável que o ressurgimento do encargo, ainda que sob outro figurino, resultará no repasse dos custos adicionais às mercadorias, tornando inócua, ou quase, a finalidade colimada pelos preceito legais, aumentando o preço final dos produtos que especifica, integrantes, como assinalado, da cesta básica nacional.

Importante realçar que a relação jurídica de outorga de incentivo fiscal difere da dogmática da relação obrigacional tributária convencional, porquanto, naquela, o contribuinte, ao atender aos requisitos normativos, titulariza o papel de credor do Estado, enquanto o Fisco torna-se devedor do cumprimento das obrigações legais assumidas [...]

A base de cálculo, inquestionavelmente, haverá sempre de guardar pertinência com aquilo que pretende medir, não podendo conter aspectos estranhos, é dizer, absolutamente impertinentes à própria materialidade contida na hipótese de incidência. [...]

Por fim, cumpre registrar, dada a estreita semelhança axiológica com o presente caso, que o Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em regime de repercussão geral, o RE n. 574.706/PR, assentou a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. Entendeu o Plenário da Corte, por maioria, que o valor de ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte, constituindo mero ingresso de caixa, cujo destino final são os cofres públicos [...]

Note-se que, na linha de raciocínio esposada pelo Supremo Tribunal Federal, os créditos presumidos de ICMS, concedidos no contexto de incentivo fiscal, não teriam, com ainda mais razão, o condão de integrar as bases de cálculo de outros tributos, como quer a ora Embargante, em relação ao IRPJ e à CSLL, quer porque não representam lucro, quer porque tal exigência tem fundamento em meras normas infralegais, quer ainda, à vista de fundamento não menos importante, por malferir o princípio federativo. [...]” (g.n.)

 

Ainda que não objeto de julgamento sob a sistemática dos temas representativos de controvérsia de natureza repetitiva, verifica-se que tal entendimento do EREsp n.º 1.517.492 foi ratificado no julgamento, em 26.04.2023, do Tema Repetitivo n.º 1.182 (REsp n.ºs 1.945.110/RS e 1.987.158/SC), cuja delimitação se cingiu, justamente, a “definir se é possível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (extensão do entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL)” (g.n.).

 

No julgamento do referido Tema Repetitivo n.º 1.182, ocorrido em 12.06.2023, portanto na vigência do supracitado artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, a Corte Superior firmou tese no sentido da impossibilidade de extensão do entendimento firmado no EREsp 1.517.492/PR aos demais benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros. Ressaltou-se que a não incidência de IRPJ e CSLL sobre as receitas resultantes da não tributação (total ou parcial) de ICMS nas operações de saída dependeria do cumprimento dos requisitos expressos em Lei. Afastou-se, apenas e tão somente, a necessidade de comprovação prévia de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico, sem prejuízo das ações fiscalizatórias da Receita Federal do Brasil. Seguem as teses firmadas:

 

“1. Impossível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, salvo quando atendidos os requisitos previstos em lei (art. 10, da Lei Complementar n. 160/2017 e art. 30, da Lei n. 12.973/2014), não se lhes aplicando o entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL.

2. Para a exclusão dos benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL não deve ser exigida a demonstração de concessão como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos.

3. Considerando que a Lei Complementar 160/2017 incluiu os §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/2014 sem, entretanto, revogar o disposto no seu § 2º, a dispensa de comprovação prévia, pela empresa, de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico não obsta a Receita Federal de proceder ao lançamento do IRPJ e da CSSL se, em procedimento fiscalizatório, for verificado que os valores oriundos do benefício fiscal foram utilizados para finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico.” [g.n.]

 

Segundo voto condutor da tese firmada no Tema n.º 1.182, do relator Ministro Benedito Gonçalves, assim se diferenciaram os créditos presumidos decorrentes de benefícios fiscais das suas demais espécies:

 

“[...] Considerando que a questão controvertida posta consiste em definir se é possível a extensão do entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR, que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, de modo que também sejam excluídos outros benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros -, revela-se de fundamental importância a investigação das eventuais diferenças existentes entre as espécies de benefícios fiscais, de um lado, e o crédito presumido, do outro.

De partida, é preciso destacar que a Primeira Seção considerou, ao julgar o ERESP 1.517.492/PR, que a concessão do crédito presumido de ICMS representa renúncia a parcela de arrecadação, de modo a tributação pela União desses valores significaria “a irradiação de efeitos indesejados do seu exercício sobre a autonomia da atividade tributante de pessoa política diversa, em desarmonia com valores éticos-constitucionais inerentes à organicidade do princípio federativo” (trecho da ementa do precedente da Seção).

De acordo com a doutrina especializada, em virtude do chamado “efeito de recuperação” que é próprio do regime da não-cumulatividade, benefícios ou incentivos fiscais que desonerem determinadas operações representam tão somente diferimentos de incidência.

O efeito de recuperação é um fenômeno próprio de sistemas que adotam a não cumulatividade do tipo “imposto sobre imposto”, como foi a opção brasileira para o ICMS. Adotado o método “imposto sobre imposto”, uma alíquota inferior, redução de base de cálculo ou uma isenção, por exemplo, aplicadas no curso do ciclo a que está sujeito o produto, não beneficia o consumidor, na ponta final. É que a diferença é recuperada pelo Fisco através da aplicação de incidência mais elevada nas operações posteriores, diante da ausência da possibilidade de apuração de crédito de imposto destacado na nota fiscal. Esse é o chamado efeito de recuperação, representado no diferimento da incidência.

A respeito do tema do efeito da recuperação no contexto da não-cumulatividade do ICMS, o professor Hugo de Brito Machado assevera que: “As isenções, como as imunidades, de determinadas operações, ficam transformadas em simples diferimentos de incidência. Para que isto não ocorresse, necessário seria que ficasse assegurado o crédito do imposto para as operações seguintes.” (MACHADO, Hugo de Brito. Não-incidência, imunidades e isenções no ICMS. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 18, p. 27-39, mar. 1997. p. 39).

Como assertivamente apontado pelo professor, somente a efetiva criação de crédito presumido será capaz de afastar esse efeito de recuperação.

No mesmo sentido, ensina Ivan Ozai que “a isenção do imposto em relação a determinada operação implica a ausência de créditos para pagamento do imposto incidente na operação seguinte, produzindo o fenômeno que conhecemos por efeito de recuperação” (OZAI, Ivan Ozawa. Benefícios fiscais do ICMS. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. p.148).

Aqui reside a peculiar diferença que aparta a espécie de benefício fiscal do crédito presumido das demais espécies de incentivos fiscais de ICMS: a atribuição de crédito presumido ao contribuinte efetivamente representa um dispêndio de valores por parte do Fisco, afastando o chamado efeito da recuperação. Os demais benefícios fiscais de desoneração de ICMS não possuem a mesma característica, pois o Fisco, não obstante possa induzir determinada operação, se recuperará por meio do efeito de recuperação.

Oportuno relembrar, a respeito dessa característica do sistema brasileiro da não cumulatividade (aplicável tanto ao ICMS como ao IPI, no que interessa a este debate), do teor da Súmula Vinculante n. 58 do STF: “Inexiste direito a crédito presumido de IPI relativamente à entrada de insumos isentos, sujeitos à alíquota zero ou não tributáveis, o que não contraria o princípio da não cumulatividade”.

Em outras palavras, a instituição de benefícios fiscais de desoneração de determinada operação não gera, automaticamente, o credito presumido mais à frente. Por isso, em regra, o Fisco irá se recuperar dos valores que deixaram de ser recolhidos, salvo se efetivamente resolva criar um benefício de crédito presumido.

Diante disso, podemos concluir que a questão da não inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, do modo como compreendido pela Primeira Seção no ERESP 1.517.492/PR, não tem a mesma aplicabilidade para todos os demais benefícios fiscais.

O entendimento da Primeira Seção segundo o qual a tributação do crédito presumido terminaria por representar uma incursão do Fisco Federal em valores que o Fisco Estadual resolveu despender, não tem a mesma aplicabilidade para benefícios fiscais de desoneração.

Vale dizer, dadas as características da não-cumulatividade adotada no sistema tributário brasileiro, a atribuição do crédito presumido tem peculiaridades que apartam esse benefício daqueles outros que não representam a atribuição de crédito, mas a desoneração (isenção, redução de base de cálculo, dentre outros). [...]” (g.n.)

 

Importante destacar que, em que pese o contorno constitucional dado pelo c. STJ à questão, o e. Supremo Tribunal Federal, em 18.08.2017, no julgamento do Tema n.º 957 estabeleceu, majoritariamente, que “a controvérsia relativa à inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL não possui repercussão geral, tendo em vista sua natureza infraconstitucional”, ainda que apontado no posicionamento minoritário que, em 27.08.2015, a Corte entendeu pela existência de repercussão geral ao Tema n.º 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818), cuja ratio essendi seria assemelhada. Ressalta-se que há, inclusive, determinação de suspensão nacional quanto ao referido Tema n.º 843.

 

Por outro lado, ainda que o deslinde a ser conferido pelo e. STF ao Tema de Repercussão Geral n.º 843 possa afetar a interpretação dos contornos constitucionais que o c. STJ deu à questão relativa à incidência do IRPJ e da CSLL sobre créditos presumidos decorrentes de incentivos fiscais – aliás, como expressamente aventado na própria decisão de suspensão nacional do Tema n.º 843 –, fato é que, no cenário jurídico atual relativo à tributação do IRPJ e da CSLL, a Corte Suprema conferiu à Corte Superior a última palavra quanto a esta matéria, dada sua competência constitucional para uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional.

 

Em consonância com o decidido pelo c. STJ vem se manifestando esta Corte Regional:

 

“TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. CRÉDITO PRESUMIDO DE ICMS. EREsp 1.517.492. NÃO INCLUSÃO NAS BASES DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL. 1. Revogação do sobrestamento do feito, tendo em vista que a pretensão manifestada nestes autos (exclusão dos créditos presumidos de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL) não se confunde com aquela afetada pelo Superior Tribunal de Justiça ao Tema 1008 dos recursos repetitivos (Possibilidade de inclusão de valores de ICMS nas bases de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, quando apurados pela sistemática do lucro presumido). Por conseguinte, o agravo interno da União restará prejudicado. 2. Delimitação do objeto da lide: o contribuinte apresenta nestes autos pretensão restrita aos créditos presumidos de ICMS, não requerendo provimento jurisdicional atinente aos demais benefícios fiscais de ICMS. Por esta razão, o feito não comporta sobrestamento pelo Tema 1182 dos recursos repetitivos (STJ). 3. Pelo mesmo motivo, o apelo fazendário não será conhecido, pois a insurgência nele apresentada se refere unicamente aos chamados benefícios fiscais negativos (tais como isenções, reduções de base de cálculo e redução de alíquota). As razões apresentadas na apelação da União, portanto, encontram-se dissociadas da discussão travada nos autos e dos fundamentos da sentença, restando inobservado o princípio da dialeticidade recursal, circunstância que obsta o seu conhecimento. 4. O provimento jurisdicional que segue se refere especificamente aos créditos presumidos de ICMS e será exarado em atenção à remessa oficial. 5. Por ocasião do julgamento do EREsp 1.517.492, o Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que os benefícios fiscais concedidos pelos Estados membros (ou pelo Distrito Federal), consistentes em créditos presumidos de ICMS, constituem instrumentos legítimos de política fiscal que materializam sua autonomia. Nesse contexto, a tributação de tais valores pela União caracteriza interferência que viola o pacto federativo, por restringir a eficácia de incentivo fiscal concedido por outro ente federado, de modo a ofender também a segurança jurídica. 6. Restou salientado no referido precedente que a descaracterização desses créditos presumidos como renda ou lucro tornou-se mais evidente a partir da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal no RE 574.706, ante a compreensão de que o valor do ICMS não se incorpora ao patrimônio do contribuinte. 7. Referida Corte Superior tem se manifestado também no sentido de que a inovação legislativa trazida pelos arts. 9º e 10 da Lei Complementar 160/2017 (inclusão dos §§ 4º e 5º ao art. 30 da Lei 12.973/2014) não se mostra hábil a alterar referido entendimento. Sobre o tema: AgInt no AREsp n. 2.020.374/RS, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 29/8/2022, DJe de 31/8/2022. 8. Em síntese, comporta acolhimento a pretensão de exclusão, das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, dos valores atinentes aos créditos presumidos (também conhecidos como créditos outorgados) de ICMS, não se afigurando necessária a observância, nesta situação, das disposições do art. 30 da Lei 12.973/2014. 9. O contribuinte poderá realizar compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. Deve ser observada a prescrição quinquenal. É ressalvado ao contribuinte o direito de proceder a essa compensação em conformidade com as normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios (REsp 1.137.738/SP – Tema 265 dos recursos repetitivos). 10. A análise e exigência da documentação necessária, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96. 11. Os parâmetros da compensação acima especificados foram observados pela sentença. 12. Sobrestamento revogado. Agravo interno prejudicado. Apelação da União não conhecida. Remessa oficial improvida.” (TRF3, 3ª Turma, ApelRemNec 5002071-70.2020.4.03.6109, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, j. 20.05.2023)

 

“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. INCENTIVOS FISCAIS DE ICMS. SENTENÇA REDUZIDA AOS LIMITES DO PEDIDO. CRÉDITO PRESUMIDO ICMS. BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E CSLL. CONDIÇÕES ESTABELECIDAS PELA LEI Nº 12.973/14. IRRELEVÂNCIA. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. RESTITUIÇÃO. INVIABILIDADE. APELAÇÕES DESPROVIDAS. REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDA. I - Depreende-se não ter a impetrante realizado pedido de exclusão de todos os incentivos fiscais de ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (matéria com determinação de sobrestamento nacional – tema nº 1.182/STJ), mas somente dos créditos outorgados de ICMS, também chamados de créditos presumidos. Redução da sentença aos limites do pedido. II - No julgamento dos EREsp. Nº 1.517.492/PR o Superior Tribunal de Justiça entendeu por excluir o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL ao fundamento de violação do Pacto Federativo (art. 150, VI, "a", da CF/88). III -É irrelevante a discussão a respeito do enquadramento do referido incentivo/benefício fiscal como "subvenção para custeio", "subvenção para investimento" ou "recomposição de custos" para fins de determinar essa exclusão, já que o referido benefício/incentivo fiscal foi excluído do próprio conceito de Receita Bruta Operacional previsto no art. 44, da Lei n. 4.506/64. IV – São irrelevantes as alterações produzidas pelos arts. 9º e 10, da Lei Complementar n. 160/2017 (provenientes da promulgação de vetos publicada no DOU de 23.11.2017) sobre o art. 30, da Lei n. 12.973/2014, ao adicionar-lhe os §§ 4º e 5º, que tratam de uniformizar ex lege a classificação do crédito presumido de ICMS como "subvenção para investimento" com a possibilidade de dedução das bases de cálculo dos referidos tributos desde que cumpridas determinadas condições (REsp. n. 1.605.245/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 25.06.2019). V - A data do fato gerador (posterior ou anterior ao advento da LC nº 160/2017) não tem o condão de influenciar no resultado do julgamento, já que o crédito em questão não se trata de receita bruta operacional. Precedentes.  VI – É direito da impetrante a compensação dos valores recolhidos indevidamente, observados os critérios estabelecidos em sentença, ressalvado o direito da autoridade administrativa em proceder à plena fiscalização acerca da existência ou não de créditos a serem compensados, exatidão dos números e documentos comprobatórios, "quantum" a compensar e conformidade do procedimento adotado com a legislação de regência. VII - O ressarcimento do contribuinte em razão de indébito fiscal, na hipótese de condenação judicial em mandado de segurança, somente admite a possibilidade de declaração de compensação ao se considerar o disposto nas Súmulas 269 e 271 do STF. VIII – Apelações desprovidas e remessa oficial parcialmente provida.” (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 5005468-27.2021.4.03.6102, relator Desembargador Federal Mairan Maia,  j. 15.05.2023)

 

Na ideia dos precedentes que se construíram em torno do IRPJ e da CSSL, tem-se que apenas os valores auferidos por força do aproveitamento de créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais afastariam a incidência tributária, posto que implicariam violação ao pacto federativo; ao passo que os valores percebidos por força do aproveitamento dos demais benefícios fiscais de ICMS, dado o efeito de recuperação próprio ao diferimento da respectiva incidência tributária, sofreriam a regular incidência dos tributos de competência da União.

 

E, quanto ao ponto, as disposições previstas na Lei n.º 14.789/2023, com produção de efeitos a partir de 01.01.2024, inclusive quanto à revogação do citado artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, nada alteram o entendimento relativo à violação ao pacto federativo quanto à incidência de IRPJ e CSLL sobre valores auferidos por força do aproveitamento de créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais, da mesma forma que não alteram a compreensão de que resta caracterizada a hipótese de incidência de IRPJ e CSLL sobre valores percebidos por força do aproveitamento dos benefícios fiscais de ICMS distintos dos créditos presumidos, na exata medida em que a não incidência dos tributos de competência da União estava condicionada à expressa previsão na Lei n.º 12.973/2014 e ao cumprimento dos requisitos nela previstos.


No caso concreto, a parte impetrante alega perceber subvenção de investimento decorrente de diversos incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS, restritos a créditos presumidos.

 

Assim, restou demonstrado o direito, no que se refere à subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido, ou também denominado outorgado, de ICMS, haja vista que a tributação em descompasso com o princípio federativo atinge não só o contribuinte, como também, por meios oblíquos, os objetivos do próprio Estado na concessão de créditos presumidos como forma de benefício fiscal.

 

II.2. DO PIS E DA COFINS

 

II.2.1. Da base de cálculo das contribuições ao PIS e à COFINS

 

A Constituição estabelece que a seguridade social será financiada por toda a sociedade mediante recursos, dentre outros, provenientes das contribuições do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei (artigo 195, I).

 

Até a vigência da Emenda Constitucional n.º 20/1998 essa contribuição incidia sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro; posteriormente, passou a incidir sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício (artigo 195, I, a, CF), sobre a receita ou o faturamento (alínea b) e sobre o lucro (alínea c).

 

A contribuição para o Programa de Integração Social – PIS foi instituída pela Lei Complementar n.° 7/70, visando promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas. A Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS foi instituída pela Lei Complementar n.° 70/91, com destinação exclusiva às despesas com atividades-fins das áreas de saúde, previdência e assistência social.

 

Ambas as contribuições possuíam como base de cálculo o faturamento, que sempre foi entendido como a receita bruta das vendas de mercadorias, de mercadorias e serviços e de serviço de qualquer natureza (confira-se: ADC n.° 1-1/DF; artigo 3º da Lei n.º 9.715/98).

 

Posteriormente, a Lei n.° 9.718/98, em que foi convertida a Medida Provisória n.° 1.724/98, dispôs que a base de cálculo do PIS e da COFINS é o faturamento (artigo 2°), correspondente à receita bruta da pessoa jurídica (artigo 3°, caput), entendida como a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica, sendo irrelevantes o tipo de atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada para as receitas (artigo 3°, § 1°). Em razão desta definição de faturamento, prevista por lei ordinária precedente à EC n.º 20/98, foi declarada a inconstitucionalidade do dispositivo pelo Plenário do e. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 390.840-5/MG, em 09.11.05. Enfim, o referido § 1º foi revogado pela Lei n.º 11.941/09.

 

Com a promulgação da EC n.° 20/98, foram editadas as Leis n.°s 10.637/02 (artigo 1°, §§ 1° e 2°) e 10.833/03 (artigo 1°, §§ 1° e 2°) que alteraram a base de cálculo do PIS e da COFINS, respectivamente, ao considerar o valor do faturamento entendido como o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendendo a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela pessoa jurídica.

 

Quanto às pessoas jurídicas sujeitas ao regime cumulativo, reguladas pela Lei nº 9.718/98, foi editada a Lei nº 12.973/2014 que alterou seu artigo 3º, para determinar, como faturamento, a receita bruta de que trata o artigo 12 do Decreto-Lei nº 1.598/77, que, por sua vez, passou a estabelecer:

 

“Art. 12. A receita bruta compreende:

I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria;

II - o preço da prestação de serviços em geral;

III - o resultado auferido nas operações de conta alheia; e

IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III. {...}

§ 4º Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário.

§ 5º Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput, observado o disposto no § 4º.”

 

A despeito de eventuais discrepâncias com conceitos empresariais e contábeis, é fato que até a EC n.° 20/98, para fins tributários, fixou-se uma sinomínia entre “faturamento” e a “receita bruta” oriunda das atividades empresariais.

 

Com a inclusão no texto constitucional da hipótese de incidência “receita” ou “faturamento”, revela-se importante a distinção dos conceitos. Enquanto receita é gênero, que abrange todos os valores recebidos pela pessoa jurídica, que incorporam sua esfera patrimonial, independentemente de sua natureza (operacional ou não operacional); faturamento é espécie, que comporta tão somente as receitas operacionais, isto é, provenientes das atividades empresariais da pessoa jurídica.

 

Se, de fato, sempre houve uma imprecisão técnica na redação legislativa sobre o que é “faturamento”, agora repetida quanto ao que é “receita”, tal jamais foi empecilho para ser considerada a exigibilidade das exações cujos fatos geradores ou bases de cálculo fossem fundadas nesses elementos, desde que respeitados os princípios constitucionais e tributários, mormente o da legalidade.

 

À medida que a EC n.° 20/98 permite a incidência de contribuições sociais para financiamento da seguridade social sobre “receita” ou faturamento”, basta à legislação infraconstitucional definir o fato gerador do tributo e respectiva base de cálculo como “receita” ou “faturamento”, tomados em sua conceituação obtida do direito privado.

 

As empresas tributadas pelo regime da Lei n.° 9.718/98 têm como fato gerador e base de cálculo do PIS e COFINS seu faturamento, entendido na qualidade de espécie de receita, cuja ordem é operacional. Já as empresas tributadas pelo regime das Leis n.°s 10.637/02 e 10.833/03 têm como fato gerador e base de cálculo a totalidade de suas receitas e não apenas aquelas consideradas “faturamento”; independentemente de constar no texto destas normas que o fato gerador “é o faturamento mensal” e a base de cálculo “é o valor do faturamento”, a definição apresentada para faturamento (o total das receitas auferidas pela pessoa jurídica, independentemente de sua denominação ou classificação contábil, compreendida a receita bruta da venda de bens e serviços nas operações em conta própria ou alheia e todas as demais receitas auferidas pela empresa) é incontestavelmente a do gênero “receita”, que é absolutamente compatível com a EC n.° 20/98.

 

II.2.2. Da tributação sobre os valores de ICMS (Tema 69/STF) e ISS

 

Por se considerar que os valores do ICMS e do ISS estão ínsitos, respectivamente, no preço da mercadoria ou dos serviços, por força de disposição legal – já que é vedado o aparte de tal tributo do preço, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle – e da sistemática da tributação por dentro preconizada pelas LC n.ºs 87/96 e 116/03, construiu-se larga jurisprudência no sentido de que é legítima a inclusão do valor do ICMS e do ISS na base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS, inclusive com base nas, hoje cancelas, Súmulas n.ºs 68 (“A parcela relativa ao ICM inclui-se na base de calculo do PIS”, de 15.12.1992) e 94 (“A parcela relativa ao ICMS inclui-se na base de calculo do FINSOCIAL”, de 22.02.1994) do c. Superior Tribunal de Justiça.

 

A discussão que há muito se travou nos órgãos do Poder Judiciário, e de forma unânime sustentada pelos contribuintes, reside no fato de que, ainda que incluso no preço da mercadoria ou serviço, o valor desses tributos (ICMS e ISS) não constitui, efetivamente, qualquer tipo de receita em favor do contribuinte, quanto menos faturamento, na exata medida em que deverá ser vertido aos cofres públicos. Na qualidade de responsável tributária, a empresa não possui disponibilidade jurídica ou econômica sobre os valores percebidos a título de ICMS ou ISS. Assim, não há “receita” do contribuinte, mas mero ônus fiscal.

 

O e. Supremo Tribunal Federal, respectivamente em 25.04.2008 e 10.10.2008, reconheceu repercussão geral aos temas n.º 69 (“Inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.”) e 118 (“Inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS.”), este último ainda pendente de julgamento (RE n.º 592.616/RS).

 

Já em 08.10.2014, o Plenário do e. Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário n.º 240.785/MG, que afastava a incidência da COFINS sobre os valores de ICMS, sem necessidade de se aguardar o julgamento conjunto da ADC n.º 18 e do RE n.º 574.706.

 

Posteriormente, a Ação Declaratória de Constitucionalidade n.º 18/DF (referente ao inciso I, do § 2º, do artigo 3º da Lei n.º 9.718/98) foi julgada prejudicada em razão do julgamento do Recurso Extraordinário n.º 574.706/PR, com reconhecimento de repercussão geral (tema n.º 69), no qual o e. STF firmou tese no sentido de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins” (j. 15.03.2017), observada a modulação (j. 13.05.2021) de seus efeitos a partir de 15.03.2017, ressalvadas as ações judiciais e procedimentos administrativos protocolados até referida data.

 

Segue a ementa dos Acórdãos:

 

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em determinado momento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.” (STF, Pleno, RE 574706, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 15.03.2017)

 

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E CONFINS. DEFINIÇÃO CONSTITUCIONAL DE FATURAMENTO/RECEITA. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE DO JULGADO. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. ALTERAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA COM EFEITOS VINCULANTES E ERGA OMNES. IMPACTOS FINANCEIROS E ADMINISRTATIVOS DA DECISÃO. MODULAÇÃO DEFERIDA DOS EFEITOS DO JULGADO, CUJA PRODUÇÃO HAVERÁ DE SE DAR DESDE 15.3.2017 – DATA DE JULGAMENTO DE MÉRITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 574.706 E FIXADA A TESE COM REPERCUSSÃO GERAL DE QUE “O ICMS NAO COMPÕE A BASE DE CÁLCULO PARA FINS DE INCIDÊNCIA DO PIS E DA COFINS” - , RESSALVADAS AS AÇÕES JUDICIAIS E PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS PROTOCOLADAS ATÉ A DATA DA SESSÃO EM QUE PROFERIDO O JULGAMENTO DE MÉRITO. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS.” (STF, Pleno, RE/ED 574706, relatora Ministra Cármen Lúcia, j. 13.05.2021)

 

Destaca-se do voto da i. Ministra Cármen Lúcia, condutor do leading case, que:

 

“[...] Poder-se-ia aceitar que a análise jurídica e a contábil do ICMS, ambas pautadas na característica da não cumulatividade deste tributo, revelariam que, assim como não é possível incluir o ICMS na base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS, também não seria possível excluí-lo totalmente, pois enquanto parte do ICMS é entregue diretamente ao Estado, parte dele se mantém no patrimônio do contribuinte até a realização da nova operação.

Entretanto, a análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há que levar em consideração o conteúdo normativo do art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, ou seja, examina-se a não cumulatividade a cada operação: 

[...] conquanto nem todo o montante do ICMS seja imediatamente recolhido pelo contribuinte posicionado no meio da cadeia (distribuidor e comerciante), ou seja, parte do valor do ICMS destacado na “fatura” é aproveitado pelo contribuinte para compensar com o montante do ICMS gerado na operação anterior, em algum momento, ainda que não exatamente no mesmo, ele será recolhido e não constitui receita do contribuinte, logo ainda que, contabilmente, seja escriturado, não guarda relação com a definição constitucional de faturamento para fins de apuração da base de cálculo das contribuições.

Portanto, ainda que não no mesmo momento, o valor do ICMS tem como destinatário fiscal a Fazenda Pública, para a qual será transferido. [...]” (g.n.)

 

Ainda, no julgamento dos aclaratórios se reafirmou:

 

“[...] 15. No julgado embargado, prevaleceu o entendimento segundo o  qual, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar  do ICMS, o regime da não cumulatividade impõe se excluir todo ele da definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal.

Quer dizer, todo o valor destacado a título de ICMS deve ser excluído da  base de cálculo da contribuição PIS/COFINS. [...]

16. O valor integral do ICMS destacado na nota fiscal da operação não integra o patrimônio do contribuinte – e não apenas o que foi efetivamente recolhido em cada operação isolada -, pois o mero ingresso contábil não corresponde ao faturamento, devendo por isso ser excluído da base de cálculo da contribuição PIS/COFINS.[...]

22. Antes do julgamento do presente caso, com reconhecimento da repercussão geral, o Superior Tribunal de Justiça tinha firmado entendimento contrário ao que veio a ser concluído por este Supremo Tribunal. [...]

27. Pelo exposto, acolho, em parte, os presentes embargos de declaração, para modular os efeitos do julgado cuja produção haverá de se dar desde 15.3.2017 – data em que julgado este recurso extraordinário n. 574.706 e fixada a tese com repercussão geral “O ICMS não compõe a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS” -, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento de mérito. (g.n.)”

 

Especificamente no que tange ao marco temporal relativo à modulação de efeitos, a Corte Suprema reafirmou sua jurisprudência, no julgamento do Tema de Repercussão Geral n.º 1.279 (RE n.º 1.452.421), fixando a tese de que “em vista da modulação de efeitos no RE 574.706/PR, não se viabiliza o pedido de repetição do indébito ou de compensação do tributo declarado inconstitucional, se o fato gerador do tributo ocorreu antes do marco temporal fixado pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as ações judiciais e os procedimentos administrativos protocolados até 15.3.2017”. Segue a ementa do acórdão:

 

“Recurso extraordinário. Representativo da controvérsia. Direito tributário. Contribuições para o PIS e a COFINS. Base de Cálculo. ICMS. Exclusão. RE 574.706/PR. Tema 69 da repercussão geral. Modulação de efeitos. Fato gerador do Tributo. Marco Temporal: a partir de 15 de março de 2017. Precedentes. Questão constitucional. Relevância. Potencial multiplicador da controvérsia. Repercussão geral com reafirmação de jurisprudência. Decisão recorrida em dissonância com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário a que se dá provimento. 1. O marco temporal da modulação dos efeitos da decisão proferida nos embargos de declaração no RE 574.706/PR, Tema 69, Rel. Min. Cármen Lúcia, na qual se afastou o ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, a partir de 15.3.2017, atinge o fato gerador do tributo, e não a data do lançamento, recolhimento ou pagamento. 2. Recurso extraordinário provido. 3. Fixada a seguinte tese: Em vista da modulação de efeitos no RE 574.706/PR, não se viabiliza o pedido de repetição do indébito ou de compensação do tributo declarado inconstitucional, se o fato gerador do tributo ocorreu antes do marco temporal fixado pelo Supremo Tribunal Federal, ressalvadas as ações judiciais e os procedimentos administrativos protocolados até 15.3.2017.” (STF, Pleno, RE 1452421, relatora Ministra Rosa Weber, j. 22.09.2023)

 

Reconhecido pelo Plenário do e. STF que não há receita, mas ônus fiscal relativo aos valores destacados nas notas fiscais a título de ICMS, tem-se que, em relação às contribuições ao PIS e COFINS incidentes sobre fatos geradores ocorridos a partir de 15.03.2017, não compõem sua base de cálculo os valores percebidos a título de ICMS, devidamente destacados nas notas fiscais.

 

Não obstante a Corte Suprema não tenha firmado tese quanto ao Tema de Repercussão Geral n.º 118, tenho que, por analogia, aplica-se ao ISS o mesmo entendimento que se desenvolveu sobre o ICMS, que, igualmente, representaria um ônus fiscal. Assim, também os valores percebidos a título de ISS, devidamente destacados nas notas fiscais, não compõem sua base de cálculo contribuições ao PIS e COFINS.

 

Contudo, não se aplica aos valores de ISS o mesmo efeito temporal que, em sede de modulação de efeitos, a Corte Suprema definiu para aqueles relativos ao ICMS, posto que a questão extrapola a competência das Cortes de Apelação.

 

A modulação de efeitos, disciplinada nos artigos 27 da Lei n.º 9.868/99 e 927, §3, do CPC, é instituto previsto em favor das Cortes superiores visando à garantia do interesse social e da segurança jurídica, nas hipóteses em que estas Cortes promovem, no âmbito de suas respectivas competências, a declaração a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e a alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos.

 

Nesse sentido, cito os seguintes precedentes:

 

“DIREITO CONSTITUCIONAL, TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ISS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO MANIFESTADO PELO STF NO TEMA 69 DA REPERCUSSÃO GERAL. DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO À COMPENSAÇÃO. PARÂMETROS DA COMPENSAÇÃO. ICMS: MODULAÇÃO DA EFICÁCIA DA TESE VINCULANTE.  AFASTADA QUANTO AO ISS. RESTITUIÇÃO ADMINISTRATIVA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Após longa controvérsia sobre a matéria, o Supremo Tribunal Federal, no RE 574.706 - Tema 69, submetido à sistemática prevista no art. 543-B do CPC/73, art. 1036 do CPC/15, firmou Tese no sentido de que: “O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”. 2. De acordo com o entendimento firmado pela Suprema Corte por ocasião do julgamento dos embargos de declaração opostos no RE 574.706, a declaração de inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS/COFINS terá eficácia prospectiva, ou seja, somente serão indevidos os recolhimentos efetuados a partir da data do julgamento do mérito do RE 574.706 (15.03.2017), salvo nos casos em que o protocolo da medida judicial ou administrativa houver sido anterior à data desse julgamento. 3. Por identidade de razões, o entendimento firmado pelo C. Supremo Tribunal Federal, no RE 574706 - Tema 069. deve ser estendido ao ISS. 4. Incabível a modulação dos efeitos do direito à compensação dos valores recolhidos a título de ISS na base de cálculo do PIS  e da COFINS nos termos estabelecidos pelo julgamento dos embargos de declaração opostos no RE 574.706. A modulação no Tema 69/STF teve como base a data do julgamento do RE  574.706, que versa exclusivamente sobre o ICMS.  A aplicação desse limite temporal exige a identidade material entre o presente caso e a tese de repercussão geral. 5. Ainda que as questões relativas ao ISS versem sobre a mesma tese aplicada ao ICMS, pende a  apreciação do RE 592.616. A data do reconhecimento da repercussão geral  no RE 592.616 remonta à 09/10/2008, não havendo ainda decisão definitiva. Logo, necessário aguardar o pronunciamento do STF acerca de eventual modulação dos efeitos e de qual marco temporal será adotado naquele recurso extraordinário. 6. O e. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que "O mandado de segurança pode ser usado pelo contribuinte para garantir o direito de fazer a compensação tributária com indébitos recolhidos anteriormente à data da impetração, mas ainda não atingidos pela prescrição. 7. O e. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião da análise do REsp 1.114.404/MG, submetido ao regime da Lei nº 11.672/08 (Lei dos Recursos Repetitivos), firmou o entendimento de que, uma vez reconhecido, judicialmente, indébito a favor do contribuinte, pode ele optar pela forma de recebimento: via pagamento mediante precatório ou compensação. 8. Possibilidade de cumprimento do julgado do mandado de segurança, pela repetição via precatório, conforme precedentes desta Egrégia Terceira Turma. 9. Cabível o mandado de segurança impetrado com vistas a declarar o direito à restituição por precatório/compensação tributária, em virtude do reconhecimento da ilegalidade ou inconstitucionalidade da anterior exigência da exação. 10. A restituição do indébito deve observar o regime de precatórios (art. 100 da Constituição Federal). Descabida a restituição em espécie na via administrativa, conforme entendimento firmado no âmbito desta Terceira Turma. 11. O contribuinte poderá realizar a compensação administrativa após o trânsito em julgado da ação (art. 170-A do CTN), com atualização dos valores mediante aplicação da taxa Selic (art. 39, § 4º, da Lei 9.250/1995) e observância do disposto no art. 74 da Lei 9.430/1996 e demais dispositivos vigentes na data da propositura da ação. 12. A análise e exigência da documentação necessária para apuração do valor do ISS e a sua correta exclusão, bem como os critérios para a efetivação da compensação cabem ao Fisco, nos termos da legislação de regência, observando-se a revogação do parágrafo único do art. 26 da Lei 11.457/2007, pelo art. 8º da Lei 13.670 de 30 de maio de 2018, que também incluiu o art. 26-A da Lei 11.457/2007, elucidando a aplicabilidade do disposto no art. 74 da Lei 9.430/96. 13.  Apelação da União e remessa necessária parcialmente providas. 14. Apelação da impetrante provida.” (TRF3, 3ª Turma, ApelRemNec 5023455-82.2021.4.03.6100, relatora Desembargadora Federal Consuelo Yoshida, j. 08.05.2023)

 

“AGRAVOS INTERNOS. DIREITO TRIBUTÁRIO. EXCLUSÃO DO ISS DA BASE DE CÁLCULO DE PIS/COFINS. TEMA 69 DE REPERCUSSÃO GERAL. MODULAÇÃO DE EFEITOS. INAPLICABILIDADE. I.Inicialmente, não há que se falar em suspensão do presente feito em razão do reconhecimento da repercussão geral nos autos do RE nº 592.616 (Tema 118), visto que não houve determinação expressa nesse sentido, conforme exige o art. 1.035, § 5º, do CPC/2015. II. O Plenário do E. Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 69 de repercussão geral (RE nº 574.706-PR, j. 02.10.2017), firmou entendimento no sentido de que"O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins". Assim, amparado firmemente no regime da não cumulatividade, constitucionalmente imposto ao ICMS (art. 155, §2º, I, CF/88), definiu aquele Sodalício pela exclusão dos valores do ICMS da base de cálculo das contribuições ao PIS/COFINS.O tema de fundo, portanto, tornou-se indiscutível. III. No entendimento desta C. 6ª Turma, as razões de decidir da Corte Superior são aplicáveis ao questionamento do ISS, dada a semelhança entre as matérias. IV. Não se afigura possível, todavia, a modulação de efeitos no presente caso, uma vez que a questão relacionada à exclusão do ISS da base de cálculo do PIS e da COFINS foi afetada à sistemática da repercussão geral pelo C. Supremo Tribunal Federal (RE 592.616 – Tema nº 118) e está pendente de apreciação. V. Sendo assim, em que pese tenham sido utilizados os fundamentos do RE 574.706 como razão de decidir, a modulação somente pode ser realizada pelo órgão competente, neste caso, o próprio Supremo Tribunal Federal. Por outras palavras, trata-se de medida excepcional que necessita da maioria de dois terços dos membros do C. STF para ser implementada, o que demanda, portanto, interpretação restritiva. VI. Agravo interno da União Federal desprovido. Agravo interno da impetrante provido.“ (TRF3, 6ª Turma, ApelRemNec 5002555-46.2021.4.03.6143, relator Desembargador Federal Mairan Maia, j. 29.04.2023)

  

III. DA CONDENAÇÃO

 

Destaca-se que a presente demanda foi ajuizada em 02.03.2018, posteriormente ao marco temporal fixado pelo e. STF no Tema de Repercussão Geral n.º 69 (15.03.2017).

 

Do quanto supra fundamentado, destacando-se que não há se falar em “declaração de inexigibilidade” do crédito tributário, impõe-se a declaração de inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a parte contribuinte:

 

(i) a incluir, na base de cálculo do IRPJ e da CSLL os valores auferidos por força do aproveitamento de subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido, ou também denominado outorgado, de ICMS;

 

(ii) a incluir, na base de cálculo das contribuições ao PIS e COFINS, os valores a título de ISS, devidamente destacados nas notas fiscais.

 

Observado o prazo quinquenal de prescrição disposto no artigo 168, I, do CTN e a restrição aos fatos geradores supra definidos, reconheço o direito à compensação dos valores recolhidos indevidamente a tais títulos.

 

Quanto ao ponto, o reconhecimento do direito à compensação não é de cunho de meramente declaratório, mas, sim, condenatório, uma vez que obriga a União a suportar a compensação daquilo cuja conclusão, em regra, implicaria execução nos próprios autos.

 

Na forma dos artigos 39, § 4º, da Lei n.º 9.250/95 e 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, bem como das teses fixadas nos Temas n.º 810/TSF e 905/STJ, os créditos serão atualizados pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – Selic (composta de taxa de juros moratórios e correção monetária), calculada a partir do recolhimento indevido (Súmula STJ n.º 162) até o mês anterior ao da repetição, vedada sua cumulação com quaisquer outros índices. 

 

Após o trânsito em julgado (artigo 170-A do CTN), poderá ser requerida a compensação do indébito administrativamente junto à Secretaria da Receita Federal do Brasil, observando-se o disposto nos artigo 74 da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A da Lei n.º 11.457/2007, vigentes na data da propositura da ação, ressalvando-se o direito de proceder à compensação em conformidade com normas posteriores, desde que atendidos os requisitos próprios, nos termos da tese firmada pelo c. STJ no julgamento do Tema Repetitivo n.º 265 (REsp n.º 1.137.738/SP). 

 

Ressalta-se que compete à Secretaria da Receita Federal do Brasil disciplinar os procedimentos necessários para o requerimento administrativo da compensação (artigo 74, § 14, da Lei n.° 9.430/96 e artigo 26-A, § 2º, da Lei n.º 11.457/2007).

 

Não demonstrado, portanto, qualquer equívoco, abuso ou ilegalidade na decisão recorrida, de rigor sua manutenção.

 

Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno interposto pela UNIÃO.

 

É como voto.

 

 



E M E N T A

AGRAVO INTERNO. TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PIS. COFINS. BASE DE CÁLCULO. EXCLUSÃO DO VALOR DE ISS DESTACADO EM NOTA FISCAL. NÃO CABIMENTO DE MODULAÇÃO DE EFEITOS.  IRPJ. CSLL. ICMS. BASE DE CÁLCULO. LUCRO PRESUMIDO. MATÉRIA PACIFICADA EM SEDE DE RECURSO REPETITIVO DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (TEMA Nº 1.008). IRPJ. CSLL. BASE DE CÁLCULO. EXCLUSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS DE ICMS. CRÉDITO PRESUMIDO. PRINCÍPIO FEDERATIVO. NÃO INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA. RECURSO DESPROVIDO.

1. O agravo interno tem o propósito de submeter ao órgão colegiado o controle da extensão dos poderes do relator e, bem assim, a legalidade da decisão monocrática proferida.

2. Discute-se a inclusão, na base de cálculo da contribuição para o Programa de Integração Social – PIS e da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social – COFINS, de valores recebidos a título de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS, assim como a inclusão, na base de cálculo do Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza da pessoa jurídica – IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL, apurados no regime de lucro presumido, de valores recebidos a título de Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, inclusive decorrentes de incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais concedidos pelos respectivos entes tributantes restritos em créditos presumidos.

3. Segundo entendimento desta Corte, não se verifica impedimento para julgamento do recurso em razão da pendência de julgamento pelo e. STF do Tema de Repercussão Geral n.º 118, haja vista que, em que pese imperativo legal expresso no artigo 1.035, § 5º, do CPC, não houve determinação da Corte Suprema para suspensão da tramitação dos processos que versem sobre a questão (confira-se: STF, Pleno, RE/RG-QO 966177).

4. O e. Supremo Tribunal Federal, respectivamente em 25.04.2008 e 10.10.2008, reconheceu repercussão geral aos temas n.º 69 (“Inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS.”) e 118 (“Inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da COFINS.”), este último ainda pendente de julgamento (RE n.º 592.616/RS).

5. No julgamento do Recurso Extraordinário n.º 574.706/PR, com reconhecimento de repercussão geral (tema n.º 69), o e. STF firmou tese no sentido de que “o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”, observada a modulação de seus efeitos a partir de 15.03.2017, ressalvadas as ações judiciais e procedimentos administrativos protocolados até referida data.

6. Reconhecido pelo Plenário do e. STF que não há receita, mas ônus fiscal relativo aos valores destacados nas notas fiscais a título de ICMS, tem-se que, em relação às contribuições ao PIS e COFINS incidentes sobre fatos geradores ocorridos a partir de 16.03.2017, não compõem sua base de cálculo os valores percebidos a título de ICMS, devidamente destacados nas notas fiscais.

7. Não obstante a Corte Suprema não tenha firmado tese quanto ao Tema de Repercussão Geral n.º 118, por analogia, aplica-se ao ISS o mesmo entendimento que se desenvolveu sobre o ICMS, que, igualmente, representaria um ônus fiscal. Assim, também os valores percebidos a título de ISS, devidamente destacados nas notas fiscais, não compõem sua base de cálculo contribuições ao PIS e COFINS.

8. Não se aplica aos valores de ISS o mesmo efeito temporal que, em sede de modulação de efeitos, a Corte Suprema definiu para aqueles relativos ao ICMS, posto que a questão extrapola a competência das Cortes de Apelação. A modulação de efeitos, disciplinada nos artigos 27 da Lei n.º 9.868/99 e 927, §3, do CPC, é instituto previsto em favor das Cortes superiores visando à garantia do interesse social e da segurança jurídica, nas hipóteses em que estas Cortes promovem, no âmbito de suas respectivas competências, a declaração a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo e a alteração de jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda de julgamento de casos repetitivos.

9. Em conformidade com a autorização constitucional (artigo 153, III, da CF), o Código Tributário Nacional definiu os elementos básicos da obrigação tributária relativa ao Imposto sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza (artigo 43 ss.), cujo fato gerador é aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza. Estabeleceu, ainda, que renda é o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos, bem como que proventos de qualquer natureza correspondem aos acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda. Ainda, nos termos do artigo 2° da Lei n.° 7.689/88, a base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido – CSLL é o valor do resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda, que será apurada nos termos do artigo 28 da Lei n.° 9.430/96, que remonta à base de cálculo do Imposto de Renda – Pessoa Jurídica (IRPJ), de sorte que se aplica à CSLL o mesmo entendimento quanto ao IRPJ.

10. O artigo 44 do CTN dispõe que a base de cálculo do IRPJ é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos tributáveis.

11. A distinção entre o regime tributável se faz relevante no caso concreto.

12. O lucro real corresponde ao lucro líquido do exercício (apurado com a observância das disposições da Lei n.º 6.404/1976) ajustado pelas adições, exclusões ou compensações prescritas ou autorizadas pela legislação tributária (artigos 6º e 67, XI, do Decreto-Lei n.º 1.598/1977). Ainda, na forma do artigo 41 da Lei n.º 8.981/95, os tributos e contribuições são dedutíveis, na determinação do lucro real, segundo o regime de competência.

13. De outro lado, no regime do lucro presumido, utiliza-se uma base de cálculo substitutiva, em que o lucro presumido é determinado pela aplicação de um determinado percentual, estabelecido em lei, sobre a receita bruta definida na forma do artigo 12 do Decreto-Lei n.º 1.598/1977, auferida no respectivo período de apuração, deduzida das devoluções e vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos (artigos 15 da Lei n.º 9.249/95 e 25, I, da Lei n.º 9.430/96).

14. É importante frisar que a tributação com base no lucro presumido consiste em opção do contribuinte (artigo 13 da Lei n.º 9.718/1998), cuja receita bruta total no ano-calendário anterior tenha sido igual ou inferior ao limite legal.

15. Há uma opção legislativa pela “presunção” do lucro de pessoas jurídicas que auferem anualmente determinada receita bruta. Ressalta-se que o lucro é “presumido”, justamente porque, se utilizada a apuração pelo regime do lucro real, poder-se-ia identificar maior ou menor lucro do que aquela base presumida; contudo, o contribuinte optante assume o “risco” de eventual tributação sob uma maior base de cálculo considerando os demais benefícios advindos da opção pela tributação simplificada.

16. Na exata medida em que o contribuinte opta pela tributação sob base presumida, abrindo mão da possibilidade de dedução de tributos, inclusive do ICMS, não há amparo legal ou constitucional para o acolhimento de sua pretensão.

17. Ressalta-se que a questão não apresenta qualquer identidade com aquela objeto do Tema de Repercussão Geral n.º 69 (“o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins”), haja vista que a situação fático-jurídica se afasta daquela tratada pela Corte Suprema na exata medida em que não se está a discutir tributação incidente sobre receita e, sim, sobre lucro na modalidade presumida.

18. Registra-se, ainda, que o e. Supremo Tribunal Federal, em 18.08.2017, no julgamento do Tema n.º 957 estabeleceu, majoritariamente, que “a controvérsia relativa à inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL não possui repercussão geral, tendo em vista sua natureza infraconstitucional”. Em que pese a questão controvertida nesta demanda ser diversa, apresenta a mesma natureza infraconstitucional, posto que, se admita a tese do contribuinte, eventual ofensa à Constituição se daria apenas de forma reflexa.

19. Por seu turno, uniformizando a interpretação da legislação infraconstitucional, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Tema Repetitivo n.º 1.008 (REsp n.ºs 1.767.631/SC e 1.77.2470/RS, fixou tese no sentido de que “o ICMS compõe a base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), quando apurados na sistemática do lucro presumido”.

20. Ressalta-se que, nos termos do artigo 1.040 do CPC/2015, uma vez publicado o acórdão paradigma, "o órgão que proferiu o acórdão recorrido, na origem, reexaminará o processo de competência originária, a remessa necessária ou o recurso anteriormente julgado, se o acórdão recorrido contrariar a orientação do tribunal superior" (inciso II); bem como “os processos suspensos em primeiro e segundo graus de jurisdição retomarão o curso para julgamento e aplicação da tese firmada pelo tribunal superior” (inciso III). Não é demais relembrar, inclusive, que a teor do artigo 1.035, § 11, do CPC, a “súmula da decisão sobre a repercussão geral constará de ata, que será publicada no diário oficial e valerá como acórdão”. Sem ordem das Cortes superiores para tanto, incabível a suspensão da tramitação processual dos feitos cuja questão controversa se refira à tese publicada, ainda que pendente de trânsito em julgado.

21. Considerando que a hipótese de incidência do imposto é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza, tem-se que, para que se verifique no caso concreto a referida disponibilidade, é necessária a efetiva existência de acréscimo patrimonial, ou seja, que o patrimônio resulte acrescido por um direito ou por um elemento material com natureza de renda ou de proventos.

22. A Lei Complementar n.º 160/2017, que dispôs sobre o “convênio que permite aos Estados e ao Distrito Federal deliberar sobre a remissão dos créditos tributários, constituídos ou não, decorrentes das isenções, dos incentivos e dos benefícios fiscais ou financeiro-fiscais instituídos em desacordo com o disposto na referida alínea g, do inciso XII, do § 2º, do artigo 155, da Constituição Federal e a reinstituição das respectivas isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais”, promoveu alteração no então vigente artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, estabelecendo que “os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao imposto previsto no inciso II do caput do art. 155 da Constituição Federal, concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal, são considerados subvenções para investimento”.

23. Por seu turno, o referido artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014 estabelecia que “as subvenções para investimento, inclusive mediante isenção ou redução de impostos, concedidas como estímulo à implantação ou expansão de empreendimentos econômicos e as doações feitas pelo poder público não serão computadas na determinação do lucro real, desde que seja registrada em reserva de lucros”; ainda, em seu § 2º, dispunha que haveria tributação caso lhes fosse dada destinação diversa.

24. Com a vigência da Lei n.º 14.789/2023, a partir de 1º de janeiro de 2024, foi revogado o artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014. A nova Lei não mais prevê a possibilidade de exclusão, para fins de determinação do lucro real, de receita decorrente da não tributação (total ou parcial) pelo ICMS em razão dos benefícios fiscais concedidos. A partir de sua vigência, o regramento legal passa a dispor que “a pessoa jurídica tributada pelo lucro real que receber subvenção da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios para implantar ou expandir empreendimento econômico poderá apurar crédito fiscal de subvenção para investimento”, que será concedido apenas a título de IRPJ (artigo 2º, III, b) e será passível de ressarcimento ou de compensação com tributos administrados pela Receita Federal do Brasil (alínea c). O aproveitamento do crédito fiscal dependerá de prévia habilitação na via administrativa (artigo 3º e seguintes) e corresponderá ao produto das receitas de subvenção e da alíquota de 25% (vinte e cinco por cento) relativa ao IRPJ.

25. Ao se debruçar sobre a matéria, antes da vigência da Lei n.º 14.789/2023, portanto, no contexto das disposições do artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, a 1ª Seção do c. Superior Tribunal de Justiça conferiu soluções jurídicas distintas quanto aos créditos presumidos de ICMS outorgados no contexto de incentivo fiscal e quanto às demais espécies de benefícios fiscais relacionados ao ICMS. Importante frisar que, em quaisquer dos pronunciamentos da Corte Superior, não se afastou a ocorrência de disponibilidade jurídica ou econômica de receita decorrente da não tributação (total ou parcial) pelo ICMS em razão dos benefícios fiscais concedidos, o que se ponderou foi a eventual ocorrência de violação ao pacto federativo na incursão tributária da União.

26. No julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n.º 1.547.492,  uniformizando sua jurisprudência a 1ª Seção do c. STJ entendeu que o acréscimo patrimonial decorrente do aproveitamento de créditos presumidos de ICMS outorgados no contexto de incentivo fiscal não poderia sofrer a incidência de IRPJ ou CSLL, sob pena de violação ao princípio federativo. Ainda que não objeto de julgamento sob a sistemática dos temas representativos de controvérsia de natureza repetitiva, verifica-se que tal entendimento do EREsp n.º 1.517.492 foi ratificado no julgamento, em 26.04.2023, do Tema Repetitivo n.º 1.182 (REsp n.ºs 1.945.110/RS e 1.987.158/SC), cuja delimitação se cingiu, justamente, a “definir se é possível excluir os benefícios fiscais relacionados ao ICMS, - tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros - da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (extensão do entendimento firmado no ERESP 1.517.492/PR que excluiu o crédito presumido de ICMS das bases de cálculo do IRPJ e da CSLL)”.

27. No julgamento do referido Tema Repetitivo n.º 1.182, ocorrido em 12.06.2023, portanto na vigência do supracitado artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, a Corte Superior firmou tese no sentido da impossibilidade de extensão do entendimento firmado no EREsp 1.517.492/PR aos demais benefícios fiscais relacionados ao ICMS, tais como redução de base de cálculo, redução de alíquota, isenção, imunidade, diferimento, entre outros. Ressaltou-se que a não incidência de IRPJ e CSLL sobre as receitas resultantes da não tributação (total ou parcial) de ICMS nas operações de saída dependeria do cumprimento dos requisitos expressos em Lei. Afastou-se, apenas e tão somente, a necessidade de comprovação prévia de que a subvenção fiscal foi concedida como medida de estímulo à implantação ou expansão do empreendimento econômico, sem prejuízo das ações fiscalizatórias da Receita Federal do Brasil.

28. Importante destacar que, em que pese o contorno constitucional dado pelo c. STJ à questão, o e. Supremo Tribunal Federal, em 18.08.2017, no julgamento do Tema n.º 957 estabeleceu, majoritariamente, que “a controvérsia relativa à inclusão de créditos presumidos de ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL não possui repercussão geral, tendo em vista sua natureza infraconstitucional”, ainda que apontado no posicionamento minoritário que, em 27.08.2015, a Corte entendeu pela existência de repercussão geral ao Tema n.º 843 (“possibilidade de exclusão da base de cálculo do PIS e da COFINS dos valores correspondentes a créditos presumidos de ICMS decorrentes de incentivos fiscais concedidos pelos Estados e pelo Distrito Federal” – RE n.º 835.818), cuja ratio essendi seria assemelhada. Ressalta-se que há, inclusive, determinação de suspensão nacional quanto ao referido Tema n.º 843. Por outro lado, ainda que o deslinde a ser conferido pelo e. STF ao Tema de Repercussão Geral n.º 843 possa afetar a interpretação dos contornos constitucionais que o c. STJ deu à questão relativa à incidência do IRPJ e da CSLL sobre créditos presumidos decorrentes de incentivos fiscais – aliás, como expressamente aventado na própria decisão de suspensão nacional do Tema n.º 843 –, fato é que, no cenário jurídico atual relativo à tributação do IRPJ e da CSLL, a Corte Suprema conferiu à Corte Superior a última palavra quanto a esta matéria, dada sua competência constitucional para uniformização da interpretação da legislação infraconstitucional.

29. Na ideia dos precedentes que se construíram em torno do IRPJ e da CSSL, tem-se que apenas os valores auferidos por força do aproveitamento de créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais afastariam a incidência tributária, posto que implicariam violação ao pacto federativo; ao passo que os valores percebidos por força do aproveitamento dos demais benefícios fiscais de ICMS, dado o efeito de recuperação próprio ao diferimento da respectiva incidência tributária, sofreriam a regular incidência dos tributos de competência da União. E, quanto ao ponto, as disposições previstas na Lei n.º 14.789/2023, com produção de efeitos a partir de 01.01.2024, inclusive quanto à revogação do citado artigo 30 da Lei n.º 12.973/2014, nada alteram o entendimento relativo à violação ao pacto federativo quanto à incidência de IRPJ e CSLL sobre valores auferidos por força do aproveitamento de créditos presumidos de ICMS decorrentes de benefícios fiscais, da mesma forma que não alteram a compreensão de que resta caracterizada a hipótese de incidência de IRPJ e CSLL sobre valores percebidos por força do aproveitamento dos benefícios fiscais de ICMS distintos dos créditos presumidos, na exata medida em que a não incidência dos tributos de competência da União estava condicionada à expressa previsão na Lei n.º 12.973/2014 e ao cumprimento dos requisitos nela previstos.

30. No caso concreto, a parte impetrante alega perceber subvenção de investimento decorrente de diversos incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais relativos ao ICMS, restritos a créditos presumidos.

31. Restou demonstrado o direito, no que se refere à subvenção de investimento consubstanciada em crédito presumido, ou também denominado outorgado, de ICMS, haja vista que a tributação em descompasso com o princípio federativo atinge não só o contribuinte, como também, por meios oblíquos, os objetivos do próprio Estado na concessão de créditos presumidos como forma de benefício fiscal.

32. Não demonstrado qualquer equívoco, abuso ou ilegalidade na decisão recorrida, de rigor sua manutenção.

33. Agravo interno desprovido.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo interno, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal