APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001368-62.2017.4.03.6100
RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO
APELANTE: LADISLAU TENORIO DE FREITAS
Advogado do(a) APELANTE: THALITA ALBINO TABOADA - SP285308-A
APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001368-62.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: LADISLAU TENORIO DE FREITAS Advogado do(a) APELANTE: THALITA ALBINO TABOADA - SP285308-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada por LADISLAU TENORIO DE FREITAS em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CEF, com pedido de tutela antecipada, objetivando a revisão do contrato de mútuo para aquisição de imóvel gravado com cláusula de alienação fiduciária, firmado em 26/11/2013, c/c consignação em pagamento. Na inicial, o autor alegou que, em virtude de dificuldades financeiras, tornou-se inadimplente, tendo, a princípio, formalizado acordo com o banco réu para a suspensão provisória do contrato. Informou, porém, que recebera a correspondência encaminhada pela CEF e relativa à negociação após a data de vencimento do termo final para pagamento, ensejando a retomada da cobrança. Afirmou a possibilidade de purgação da mora até a assinatura do auto de arrematação, independentemente da ocorrência da consolidação da propriedade do imóvel em favor da CAIXA. Asseverou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso. Sustentou a inconstitucionalidade da execução extrajudicial prevista na Lei 9.514/97, por afronta ao artigo 5º, inciso LIV, da Carta Magna. Impugnou o sistema de amortização SAC previsto no contrato, sob a alegação de anatocismo. Requereu a aplicação dos juros de forma simples e linear, bem como a produção da prova pericial. O pleito de tutela antecipada foi indeferido. Deferido o benefício da Justiça Gratuita (ID 35122897). Em contestação, a CEF impugnou a concessão da Justiça Gratuita. Preliminarmente, alegou a inépcia da inicial. No mérito, aduziu que a inadimplência gera o vencimento antecipado da dívida. Defendeu, em síntese, a legalidade do sistema de amortização previsto no contrato (SAC) e da cobrança de seguro obrigatório. Sem apresentação de réplica e sem requerimento de produção de provas. Posteriormente, a CEF alegou a extinção do contrato de alienação fiduciária em garantia em decorrência da consolidação da propriedade, ocasionando a perda de objeto da ação revisional (ID 35122897). A sentença afastou a preliminar de impugnação da Justiça Gratuita, bem como rejeitou as preliminares de inépcia da inicial e de carência superveniente por força da consolidação da propriedade já efetivada, considerando que o reconhecimento da inconstitucionalidade do procedimento extrajudicial também é objeto da lide. No mérito, julgou improcedente os pedidos de revisão contratual e de nulidade de execução extrajudicial. Condenou a CEF a arcar com o pagamento dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, observada a suspensão da exigibilidade da cobrança por se tratar de beneficiário da Justiça Gratuita. Em apelação, a parte autora sustenta a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, argumentando ser imprescindível a realização de prova pericial. Invoca, ainda, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Afirma que houve a cobrança de juros capitalizados, de forma composta, o que resultou em excessiva onerosidade ao mutuário, justificando a necessidade de revisão contratual, com a substituição do método de amortização pela Tabela SAC e a adoção de juros simples e lineares. Pleiteia, por fim, a anulação do procedimento executório realizado com fundamento na Lei nº 9.514/97 e de seus efeitos, além da revisão do contrato de financiamento. Intimada, a CEF apresentou contrarrazões, reiterando a validade do negócio jurídico e a impossibilidade de revisão das cláusulas contratuais livremente pactuadas. É o relatório. AFS
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001368-62.2017.4.03.6100 RELATOR: Gab. 45 - DES. FED. ANTONIO MORIMOTO APELANTE: LADISLAU TENORIO DE FREITAS Advogado do(a) APELANTE: THALITA ALBINO TABOADA - SP285308-A APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O EXMO. DESEMBARGADOR FEDERAL ANTONIO MORIMOTO (RELATOR): Em apelação, a parte autora suscita a nulidade da sentença por cerceamento de defesa, argumentando ser imprescindível a realização de prova pericial. Invoca, ainda, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Afirma que houve a cobrança de juros capitalizados, de forma composta, o que resultou em excessiva onerosidade ao mutuário, justificando a necessidade de revisão contratual, com a substituição do método de amortização pela Tabela SAC e a adoção de juros simples e lineares. Pleiteia, por fim, a anulação do procedimento executório realizado com fundamento na Lei nº 9.514/97 e de seus efeitos, além da revisão do contrato de financiamento. Da prova pericial Inicialmente, rejeito a preliminar de cerceamento ao direito de defesa deduzida pela apelante em virtude da não realização de prova pericial. O art. 355 do CPC/15 permite ao magistrado julgar antecipadamente a causa e dispensar a produção de provas quando a questão for unicamente de direito e os documentos acostados aos autos forem suficientes ao exame do pedido. Por sua vez, o art. 370 do CPC/15 confere ao magistrado a possibilidade de indeferir diligências inúteis ou meramente protelatórias, bem como determinar a realização das provas necessárias à instrução do processo, independente de requerimento, caso se mostrem efetivamente necessárias ao deslinde da questão. No caso dos autos, verifica-se que o método de amortização da dívida e as taxas de juros estão bem especificados e que a questão relativa ao abuso na cobrança dos encargos contratuais é matéria exclusivamente de direito, que não depende de auxílio de perito contábil, mas apenas de interpretação das cláusulas do contrato firmado entre as partes e do ordenamento jurídico. Consequentemente, é desnecessária a realização de prova pericial: APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO BANCÁRIO. PERÍCIA. TAXA DE JUROS. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. LEI 10.931/04. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. O Código de Processo Civil permite ao magistrado julgar antecipadamente a causa quando não houver necessidade de produção de outras provas (art. 355, I), podendo ainda indeferir diligências inúteis ou meramente protelatórias (art. 370, parágrafo único). 2. Não há impedimento para que a taxa de juros seja cobrada em percentual superior a 12% ao ano, tratando-se de operações realizadas por instituição integrante do Sistema Financeiro Nacional. A jurisprudência do E. Supremo Tribunal Federal é pacífica no sentido de que, cuidando-se de operações realizadas por instituição integrante do Sistema Financeiro Nacional, não incide a limitação prevista na lei de Usura (Decreto nº 22.626, 07.04.33). 3. Plenamente possível a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos bancários, cfr. prevê a Medida Provisória nº 1963-17 de 31.03.00, reeditada atualmente sob o nº 2.170-36, desde que pactuada. Na hipótese dos autos, o instrumento contratual celebrado entre as partes foi firmado em data posterior à edição da referida Medida Provisória, motivo pelo qual é possível a sua aplicação. A constitucionalidade da referida Medida Provisória, outrossim, é plenamente aceita pela jurisprudência, consoante se observa dos precedentes do Superior Tribunal de Justiça. Precedentes. 4. Recurso não provido. (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5006150-60.2022.4.03.6000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL LUIZ PAULO COTRIM GUIMARAES, julgado em 29/01/2025, DJEN DATA: 03/02/2025). Da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor De início, cabe destacar que a aplicação do CDC (confirmada pela súmula 297 do C. STJ e confirmada pelo C. STF no julgamento da ADI 2.591/DF) não resulta na automática nulidade de todas as cláusulas questionadas como prejudiciais aos direitos dos interesses do consumidor. Deve ser verificado, caso a caso, se a cláusula contratual questionada impôs desvantagem excessiva, prejudicou o equilíbrio contratual ou resultou em onerosidade excessiva. Assim, a incidência do CDC não necessariamente socorre a pretensão dos autores de decretação de nulidade de cláusulas contratuais celebradas em livre manifestação de vontade pelas partes com base em questionamentos vagos e genéricos sobre onerosidades ou abusividades não comprovadas. Não cabe aplicação indiscriminada da norma consumerista para acolher impugnações desprovidas de razoabilidade. Para a invalidação de cláusula calcada no CDC, é imperiosa a demonstração concreta de abusividade ou onerosidade na avença da forma como foi pactuada. Inclusive a inversão do ônus da prova, de acordo com o art. 6º, inciso VIII do CPC, é possível quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência. Da constitucionalidade da Lei nº 9.514/97 O Tema 982 da sistemática da repercussão geral, fixou tese declarando a constitucionalidade da Lei 9.514/97: “É constitucional o procedimento da Lei nº 9.514/1997 para a execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia, haja vista sua compatibilidade com as garantias processuais previstas na Constituição Federal.” (RE 860631. Relator Min. Luiz Fux). Confira: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 982. DIREITO CONSTITUCIONAL, CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. LEI 9.514/1997. CLÁUSULA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA NOS CONTRATOS DO SISTEMA DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE CONFIRMA A VALIDADE DA EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, INCISOS XXIII, XXV, LIII, LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE AÇÃO. PROCEDIMENTO COMPATÍVEL COM OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E DESPROVIDO, COM FIXAÇÃO DE TESE. 1. A Lei 9.514/1997 dispõe de medidas indutivas ao cumprimento das obrigações contratuais, sob a orientação de redução da complexidade procedimental e sua desjudicialização, cuja aplicação pressupõe o consentimento válido expresso das partes contratantes e a ausência de exclusão total de apreciação da situação pelo Poder Judiciário. 2. A jurisprudência desta Corte, em questão análoga, firmou-se no sentido da recepção do Decreto-Lei 70/1966, inclusive quanto à validade da execução extrajudicial da garantia hipotecária, fixando-se como tese do Tema 249 da Repercussão Geral: “É constitucional, pois foi devidamente recepcionado pela Constituição Federal de 1988, o procedimento de execução extrajudicial previsto no Decreto-lei nº 70/66” (RE 627.106, Rel. Min. Dias Toffoli). 3. A execução extrajudicial nos contratos de mútuo com alienação fiduciária de imóvel, prevista na Lei 9.514/1997, é compatível com as garantias constitucionais, destacando-se inexistir afronta ao princípio da inafastabilidade da jurisdição e do acesso à justiça (art. 5º, inciso XXXV, da CF/88) e do juiz natural (art. 5º, LIII, CF/88), posto que se assegura às partes, a qualquer momento, a possibilidade de controle de legalidade do procedimento executório na via judicial. 4. Inexiste, igualmente, violação aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF/88), tendo em vista que o procedimento extrajudicial que confere executoriedade ao contrato de financiamento imobiliário é devidamente regulamentado pela legislação de regência, não se tratando de procedimento aleatório ou autoconduzido pelo próprio credor. 5. A questão revela tema de complexa regulação econômica legislativa, com efeitos múltiplos na organização socioeconômica, que promove tratamento constitucionalmente adequado à questão, no equilíbrio entre a proteção pelos riscos assumidos pela instituição credora e a preservação dos direitos fundamentais do devedor, adequando-se aos influxos decorrentes do referencial teórico da Análise Econômica do Direito (Law and Economics), além de alinhar-se à tendência do direito moderno de desjudicialização. 6. Recurso extraordinário CONHECIDO e DESPROVIDO. 7. Proposta de Tese de Repercussão Geral: “É constitucional o procedimento da Lei nº 9.514/1997 para a execução extrajudicial da cláusula de alienação fiduciária em garantia, haja vista sua compatibilidade com as garantias processuais previstas na Constituição Federal”. Do sistema de amortização O contrato de mútuo é uma das essências da atuação das instituições financeiras, que emprestam determinado montante de dinheiro e se remuneram pela cobrança da taxa de juros. Atualmente no mercado existem sistemas de amortização que são mais utilizados, dentre eles, o Sistema de Amortização Constante – SAC. A base do sistema SAC é adotar amortização constante e gerar prestações variáveis em regime decrescente ao longo do tempo. Mensalmente, o devedor quita uma prestação de valor fixo e uma quantia relacionada aos juros. A adoção do sistema SAC, por si só, não implica irregularidade contratual. Compete ao devedor comprovar a ocorrência de outros fatores que, aliados ao sistema SAC de amortização, afetem o equilíbrio do contrato. Por certo, incabível a substituição unilateral do sistema de amortização, sob pena de evidente ofensa à autonomia da vontade privada. Da aplicabilidade dos juros No que tange à taxa de juros, dispõe o art. 192 da CF/88 com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 40/2003: “Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram”. A citada emenda revogou o § 3º do art. 192, que previa que as taxas de juros reais não poderiam ser superiores a 12% ao ano, sob pena da cobrança superior a este limite ser enquadrada como crime de usura, punido nos termos que a lei determinar. A Lei Complementar regulamentadora, entretanto, nunca foi editada. Sobre a matéria, o c. STF editou a súmula vinculante nº 07, que dispõe: “A norma do §3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar”. A Lei da usura (Decreto nº 22.626/33) dispõe sobre os juros nos contratos e veda expressamente a incidência de taxas superiores a 12% ao ano e juros compostos, de acordo com os arts. 4º e 5º e não se aplica às instituições financeiras por força da Lei 4.595/64, que dispõe sobre política e as instituições bancárias, monetárias e creditícias, excluindo a aplicação nas operações e serviços bancários do limite de juros previstos da Lei da Usura, e fixando que devem ser observadas as normas editadas pelo Conselho Monetário Nacional – CMN e Banco Central – BACEN. Vejamos as disposições: “Art. 4º Compete ao Conselho Monetário Nacional, segundo diretrizes estabelecidas pelo Presidente da República: (...) IX - Limitar, sempre que necessário, as taxas de juros, descontos comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central da República do Brasil, assegurando taxas favorecidas aos financiamentos que se destinem a promover” Confirmando a inaplicabilidade da Lei de Usura, sobreveio a súmula 596 do C. STF, in verbis: “As disposições do Decreto 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional”. Com isso, conclui-se que não há impedimento legal para cobrança de taxa de juros superior a 12% ao ano, quando se trata de instituição integrante do Sistema Financeiro Nacional– SFN. Neste sentido, foi o julgamento do REsp repetitivo nº 1.061.530/RS de relatoria da Min. Nanci Andrighi, julgado em 22/10/2008, cujo informativo segue abaixo transcrito: “No julgamento de recurso repetitivo (art. 543-C do CPC), confirmou-se a pacificação da jurisprudência da Segunda Seção deste Superior Tribunal nas seguintes questões. Quanto aos juros remuneratórios: 1) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Dec. n. 22.626/1933), como já dispõe a Súm. n. 596-STF; 2) a simples estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano não indica abusividade; 3) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/2002; 4) é admitida a revisão das taxas de juros em situações excepcionais, desde que haja relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) esteja cabalmente demonstrada, diante das peculiaridades do caso concreto. Quanto à configuração da mora: 1) afasta a caracterização da mora a constatação de que foram exigidos encargos abusivos no contrato, durante o período da normalidade contratual; 2) não afasta a caracterização da mora quando verificada a simples propositura de ação revisional, nem mesmo quando o reconhecimento de abusividade incidir sobre os encargos inerentes ao período de inadimplência contratual. Quanto aos juros moratórios: nos contratos bancários não alcançados por legislação específica, os juros moratórios poderão ser convencionados até o limite de 1% ao mês. Quanto à inscrição em cadastro de inadimplentes: 1) a abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: a) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; b) ficar demonstrada que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; c) for depositada a parcela incontroversa ou prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz; 2) a inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção. Quanto às disposições de ofício: é vedado aos juízes de primeiro e segundo graus de jurisdição julgar, com fundamento no art. 51 do CDC, sem pedido expresso, a abusividade de cláusulas nos contratos bancários. A Min. Relatora e o Min. Luís Felipe Salomão ficaram vencidos nesse específico ponto. Anote-se, por último, que as questões a respeito da capitalização dos juros e a comissão de permanência não foram tratadas. REsp 1.061.530-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 22/10/2008”. Sobreveio a súmula 382 do c. STJ, segundo a qual “A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade”. O entendimento é repetido ainda hoje nos julgamentos do C. STJ, vejamos: “79210510 - AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. VIOLAÇÃO. ARTS. 394, 396 E 591 DO CC E 525, § 1º, DO CPC. CERCEAMENTO DE DEFESA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PERTINÊNCIA TEMÁTICA. AUSÊNCIA. CAPITALIZAÇÃO PERMITIDA. NÃO PROVIMENTO. 1. A ausência de pertinência temática entre o dispositivo legal tido por violado e razões levantadas no Recurso Especial ou os fundamentos do acórdão de segundo grau atrai o disposto no verbete n. 284 da Súmula do Supremo Tribunal Federal. 2. "A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RESP nº 1.061.530/RS, Relatora Ministra Nancy Andrighi, submetido ao regime dos recursos repetitivos, firmou posicionamento do sentido de que: (1) as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto nº 22.626/1933) - Súmula nº 596/STF; (2) a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; (3) são inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591, c/c o art. 406 do CC/2002; e, (4) é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, haja vista as peculiaridades do julgamento em concreto. " (AgInt no AREsp n. 1.148.927/MS, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 22/3/2018, DJe de 4/4/2018.) 3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ; AgInt-AREsp 2.091.280; Proc. 2022/0078732-1; RJ; Quarta Turma; Relª Min. Maria Isabel Gallotti; DJE 11/04/2023)” Embora a Súmula nº 121 do Supremo Tribunal Federal tenha estabelecido ser vedada “a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada”, a Corte Constitucional, posteriormente, editou outro entendimento por meio da Súmula nº 596, já mencionada: "as disposições do Dec. n. 22.626/33 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional". Após, a Medida Provisória nº 1.963-17/2000, reeditada por medidas provisórias posteriores até a MP n 2.170-36/2001, passou a autorizar de forma expressa a capitalização de juros, com periodicidade inferior a um ano, desde que pactuada, nos moldes do art. 5º. A norma foi objeto do Tema 33 de repercussão geral do c. STF que resultou na edição da Tese a seguir indicada: “Os requisitos de relevância e urgência previstos no art. 62 da Constituição Federal estão presentes na Medida Provisória 2.170-36/2001, que autoriza a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional”. Abaixo a ementa do citado julgamento: “10274250 - CONSTITUCIONAL. ART. 5º DA MP 2.170/01. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS COM PERIODICIDADE INFERIOR A UM ANO. REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA EDIÇÃO DE MEDIDA PROVISÓRIA. SINDICABILIDADE PELO PODER JUDICIÁRIO. ESCRUTÍNIO ESTRITO. AUSÊNCIA, NO CASO, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA NEGÁ-LOS. RECURSO PROVIDO. 1. A jurisprudência da suprema corte está consolidada no sentido de que, conquanto os pressupostos para a edição de medidas provisórias se exponham ao controle judicial, o escrutínio a ser feito neste particular tem domínio estrito, justificando-se a invalidação da iniciativa presidencial apenas quando atestada a inexistência cabal de relevância e de urgência. 2. Não se pode negar que o tema tratado pelo art. 5º da MP 2.170/01 é relevante, porquanto o tratamento normativo dos juros é matéria extremamente sensível para a estruturação do sistema bancário, e, consequentemente, para assegurar estabilidade à dinâmica da vida econômica do país. 3. Por outro lado, a urgência para a edição do ato também não pode ser rechaçada, ainda mais em se considerando que, para tal, seria indispensável fazer juízo sobre a realidade econômica existente à época, ou seja, há quinze anos passados. 4. Recurso extraordinário provido. (STF; RE 592377; Tribunal Pleno; Rel. Des. Marco Aurélio; Julg. 04/02/2015; DJE 20/03/2015; Pág. 65)”. Corroborando o entendimento, é a redação da súmula 539 do c. STJ, in verbis: “É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior à anual em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional a partir de 31/3/2000 (MP n. 1.963-17/2000, reeditada como MP n. 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada”. E o julgamento do REsp repetitivo nº 973.827/RS de relatoria do Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 08/08/12, abaixo transcrito: “EMENTA. CIVIL E PROCESSUAL. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. AÇÕES REVISIONAL E DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM DEPÓSITO. CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. JUROS COMPOSTOS. DECRETO 22.626/1933 MEDIDA PROVISÓRIA 2.170-36/2001. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. MORA. CARACTERIZAÇÃO. 1.A capitalização de juros vedada pelo Decreto 22.626/1933 (Lei de Usura) em intervalo inferior a um ano e permitida pela Medida Provisória 2.170-36/2001, desde que expressamente pactuada, tem por pressuposto a circunstância de os juros devidos e já vencidos serem, periodicamente, incorporados ao valor principal. Os juros não pagos são incorporados ao capital e sobre eles passam a incidir novos juros. 2. Por outro lado, há os conceitos abstratos, de matemática financeira, de "taxa de juros simples" e "taxa de juros compostos", métodos usados na formação da taxa de juros contratada, prévios ao início do cumprimento do contrato. A mera circunstância de estar pactuada taxa efetiva e taxa nominal de juros não implica capitalização de juros, mas apenas processo de formação da taxa de juros pelo método composto, o que não é proibido pelo Decreto 22.626/1933. 3. Teses para os efeitos do art. 543-C do CPC: - "É permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada." - "A capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada". 4. Segundo o entendimento pacificado na 2ª Seção, a comissão de permanência não pode ser cumulada com quaisquer outros encargos remuneratórios ou moratórios. 5. É lícita a cobrança dos encargos da mora quando caracterizado o estado de inadimplência, que decorre da falta de demonstração da abusividade das cláusulas contratuais questionadas. 6. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido”. Cumpre ressaltar, ainda, que a simples previsão de taxas de juros efetiva e nominal não configura capitalização indevida de juros, mas sim, indica o processo de definição da taxa de juros pelo método composto. Ademais, em relação aos contratos regidos pelo Sistema Financeiro de Habitação, a Lei 11.977, de 07/07/2009, alterou a Lei 4.380/64, que passou a dispor no art. 15-A o seguinte: "É permitida a pactuação de capitalização de juros com periodicidade mensal nas operações realizadas pelas instituições integrantes do Sistema Financeiro da Habitação - SFH." Conclui-se, assim, que, considerando a previsão legal explícita, não é necessária a prova técnica para verificar a possível capitalização mensal dos juros em contratos firmados após a entrada em vigor da Lei 11.977, de 07/07/2009. No caso em tela, o contrato com a CEF foi firmado em data posterior ao advento da Lei 11.977/2009. Acrescente-se que, segundo a Lei 9.514/97, que rege o Sistema Financeiro de Habitação, a capitalização dos juros é condição essencial ao negócio, conforme alude o inciso III do art. 5º: Art. 5º As operações de financiamento imobiliário em geral, no âmbito do SFI, serão livremente pactuadas pelas partes, observadas as seguintes condições essenciais: I - reposição integral do valor emprestado e respectivo reajuste; II - remuneração do capital emprestado às taxas convencionadas no contrato; III - capitalização dos juros; IV - contratação, pelos tomadores de financiamento, de seguros contra os riscos de morte e invalidez permanente. No caso, no tocante ao método de aplicação dos juros, o contrato firmado entre as partes prevê as condições de financiamento, estabelecendo a taxa de juros representada pela TR – Taxa Referencial de Juros, acrescida do CUPOM 16,56 ao ano, proporcional a 1.3800% ao ano, além do sistema de amortização SAC, esclarecendo que a “ a prestação (P) é composta de amortização (A) e juros (J), sendo que o valor mensal da cota de amortização (A) é constante (fixa), havendo flutuação da parcela de juros (J)” – (ID 35122897, Cláusulas Quarta e Quinta, págs. 27/41). Não se vislumbra, portanto, cobrança de juros ou forma de cálculo de amortização em desacordo com as práticas usuais do mercado, tampouco prática abusiva. Ademais, no presente caso, o inadimplemento contratual é incontroverso. Nesse contexto, não prosperam as alegações da parte apelante sobre a não pactuação da capitalização de juros, uma vez que consta expressamente do contrato firmado com a CEF, devidamente assinado que, no caso de impontualidade, sobre a quantia paga incidirão juros remuneratórios, calculados pelo método de juros composto, com capitalização diária, à mesma taxa de juros prevista deste instrumento, desde a data de vencimento, inclusive, até a data de efetivo pagamento. Dispõe, ainda, o contrato que tais juros remuneratórios serão cumulados com juros moratórios à razão de 0,033% por dia de atraso, além de multa moratória de 2% (Cláusula Décima Primeira – parágrafos primeiro e segundo). Não há prova de cobrança perpetrada pela CEF que não esteja prevista expressamente no contrato ou dissociada das práticas normais ou taxas médias do mercado de financiamento imobiliário. In casu, o contrato de alienação fiduciária em garantia celebrado entre as partes é negócio jurídico válido, ato jurídico perfeito (art. 5º, inciso XXXVI da CF/88) que merece tutela jurisdicional, considerando que não foram trazidos fundamentos para afastar a validade e a eficácia. E, como não foram apuradas irregularidades, o contrato deve ser mantido em seus termos originais, em atenção à segurança jurídica, ao princípio da intervenção mínima e à excepcionalidade da revisão contratual, nos termos do art. 421, parágrafo único e art. 421-A, inciso III, ambos do CC/02, além do princípio do pacta sunt servanda. O devedor não era obrigado a contratar. Assim o fez para construir o próprio patrimônio e tinha no mercado oferta de diversas instituições financeiras atuantes. Se optou livremente por contratar junto a CEF, certamente foi o banco que ofereceu melhores condições, inclusive de juros e taxas. O autor estava ciente, desde a contração, de todos os encargos legais que seriam cobrados, inexistente irregularidade que possa resultar na alteração das bases da negociação, em atenção à segurança jurídica. Não havendo prova de cobrança abusiva, fica afastado o pedido de devolução em dobro (repetição). Dos honorários advocatícios Com fundamento no art. 85, §11, do CPC, majoro em 2% do valor atualizado da causa a verba honorária fixada em primeiro grau de jurisdição, mantida a suspensão da exigibilidade da cobrança, com fulcro no § 3º do artigo 98 do CPC, por ser a parte beneficiária da Justiça Gratuita. Conclusão Ante o exposto, nego provimento à apelação, fixados os consectários na forma da fundamentação acima. Consigno que a oposição de embargos declaratórios infundados pode ensejar aplicação de multa nos termos do art. 1.026, § 2°, do CPC. É como voto.
E M E N T A
Direito Civil e do Consumidor. Apelação Cível. Revisão de Cláusulas Contratuais em Contrato de Financiamento imobiliário. Juros Compostos. Sistema de Amortização. Execução extrajudicial. Desprovimento.
I. Caso em exame
1. Apelação cível interposta por mutuário visando à reforma da sentença que julgou improcedente o pedido de revisão contratual de financiamento habitacional, com fundamento na suposta cobrança abusiva de juros compostos, alegada necessidade de substituição do sistema de amortização SAC por juros simples, aplicação do Código de Defesa do Consumidor, nulidade da execução extrajudicial com base na Lei nº 9.514/1997 e necessidade de produção de prova pericial.
II. Questão em discussão
2. Há quatro questões em discussão: (i) saber se houve cerceamento de defesa pela não realização de prova pericial; (ii) saber se o Código de Defesa do Consumidor é aplicável e autoriza a revisão das cláusulas contratuais; (iii) saber se há ilegalidade na capitalização de juros e no sistema de amortização adotado; e (iv) saber se é nulo o procedimento de execução extrajudicial previsto na Lei nº 9.514/1997.
III. Razões de decidir
3. A desnecessidade da prova pericial decorre da suficiência documental e da natureza jurídica da controvérsia, conforme autorizado pelos arts. 355 e 370 do CPC/2015.
4. A aplicação do CDC é admitida, mas não implica nulidade automática de cláusulas contratuais, exigindo-se a demonstração concreta de abusividade ou onerosidade.
5. A jurisprudência consolidada do STF e do STJ admite a capitalização mensal de juros e a adoção do sistema de amortização SAC em contratos celebrados com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, desde que pactuados expressamente.
6. A constitucionalidade do procedimento de execução extrajudicial da Lei nº 9.514/1997 foi reconhecida pelo STF no julgamento do Tema 982 da repercussão geral.
7. Ausência de comprovação de cobrança abusiva ou cláusula ilegal. Validade do contrato de alienação fiduciária firmado entre as partes, com observância ao princípio do pacta sunt servanda e à autonomia da vontade.
8. Manutenção dos honorários advocatícios, com majoração conforme art. 85, § 11, do CPC/2015, respeitada a gratuidade de justiça.
IV. Dispositivo e tese
9. Recurso desprovido.
Tese de julgamento: “1. A ausência de prova pericial não configura cerceamento de defesa quando a matéria é unicamente de direito e a prova documental é suficiente para o julgamento. 2. A aplicação do CDC não enseja, por si só, a nulidade de cláusulas contratuais bancárias sem a demonstração concreta de abusividade. 3. É válida a capitalização de juros em contratos celebrados com instituições financeiras, desde que pactuada. 4. O procedimento de execução extrajudicial previsto na Lei nº 9.514/1997 é constitucional.”
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV e XXXVI; CPC/2015, arts. 355, 370, 85, § 11, e 98, § 3º; CC, arts. 421 e 421-A; Lei nº 9.514/1997; Lei nº 11.977/2009, art. 15-A; MP nº 2.170-36/2001, art. 5º.
Jurisprudência relevante citada: STF, RE 860.631, Rel. Min. Luiz Fux, Plenário, j. 06.02.2020 (Tema 982); STF, Súmula 596; STJ, REsp 1.061.530/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, 2ª Seção, j. 22.10.2008; STJ, Súmulas 382 e 539.