Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
9ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5002068-60.2022.4.03.6331

RELATOR: 26º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: WILSON MARQUES DA SILVA

Advogado do(a) RECORRIDO: MARCEL ARANTES RIBEIRO - SP205909-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5002068-60.2022.4.03.6331

RELATOR: 26º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: WILSON MARQUES DA SILVA

Advogado do(a) RECORRIDO: MARCEL ARANTES RIBEIRO - SP205909-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de recurso inominado interposto pelo INSS contra sentença que julgou de procedente o pedido, “para condenar o réu a conceder a aposentadoria por incapacidade permanente ao autor, com DIB em 03/08/2021 (DER).”.

Em suas razões recursais, sustenta a autarquia previdenciária, em síntese, que “Analisando-se o laudo pericial administrativo, constata-se que a data de início de incapacidade remonta a 04/05/2019, portanto, se parte autora (re)ingressou no RGPS somente em 01/02/2020, já o fez portadora da incapacidade. Em que pese no laudo judicial a DII tenha sido fixada como sendo em 01/2021, por certo que a incapacidade já existia em momento anterior, pois na perícia administrativa realizada em 28/10/2021 foi consignado que a DID e DII seriam fixadas em 04/05/2019 conforme relatório médico atualizado..

É o relatório. Decido.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5002068-60.2022.4.03.6331

RELATOR: 26º Juiz Federal da 9ª TR SP

RECORRENTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RECORRIDO: WILSON MARQUES DA SILVA

Advogado do(a) RECORRIDO: MARCEL ARANTES RIBEIRO - SP205909-N

OUTROS PARTICIPANTES:

 

V O T O

 

Inicialmente, cabe consignar que não constitui julgamento surpresa o lastreado em fundamentos jurídicos, ainda que diversos dos apresentados pelas partes, desde que embasado em elementos de fato documentados nos autos sob crivo do contraditório.

Isso porque, diante do efeito devolutivo amplo do recurso inominado, no que concerne à cognição vertical (profundidade), o órgão ad quem pode adotar enquadramento jurídico diverso para a controvérsia, não estando limitado pelos fundamentos jurídicos sufragados pela sentença recorrida, nem pelos suscitados pela parte. Lado outro, no plano horizontal, o órgão julgador, em regra, fica adstrito às matérias expressamente impugnadas no apelo, em respeito ao postulado do tantum devolutum quantum appellatum.

Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, “não há falar em decisão surpresa quando o magistrado, diante dos limites da causa de pedir, do pedido e do substrato fático delineado nos autos, realiza a tipificação jurídica da pretensão no ordenamento jurídico posto, aplicando a lei adequada à solução do conflito" (STJ, AgInt no REsp 1.923.907/PR, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, DJe de 23/03/2023).

No mesmo sentido: STJ, REsp 1.717.144/SP, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, DJe de 28/02/2023; EDcl nos EREsp 1.213.143/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 13/02/2023; AgInt no AgInt no AREsp 1.904.192/DF, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 11/11/2022; AgInt no AREsp 2.038.601/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 24/11/2022.

Cito, ainda, os seguintes enunciados aprovados pela Enfam – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados no Seminário “O Poder Judiciário e o Novo Código de Processo Civil”:

“5) Não viola o art. 10 do CPC/2015 a decisão com base em elementos de fato documentados nos autos sob o contraditório.

6) Não constitui julgamento surpresa o lastreado em fundamentos jurídicos, ainda que diversos dos apresentados pelas partes, desde que embasados em provas submetidas ao contraditório.”

Feitos esses esclarecimentos, passo ao exame dos recursos interpostos.

Dispõe o caput do artigo 59 da Lei n.º 8.213/91 que “o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos”.

Por sua vez, reza o artigo 42 do mesmo diploma legal que “a aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição”.

Depreende-se destes dispositivos que a concessão dos benefícios em questão está condicionada ao preenchimento de três requisitos: o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais (artigo 25, I, da Lei nº 8.213/91), a qualidade de segurado quando do surgimento da incapacidade, e a incapacidade laboral, que no caso do auxílio-doença, deverá ser total e temporária, e no caso da aposentadoria por invalidez, deverá ser total e permanente.

Analisando o laudo pericial judicial, observo que o expert do juízo fixou a data de início da doença (DID) e da incapacidade (DII) em 01/2021, com base no relato do autor de que “em janeiro de 2021 iniciou dificuldade na fala e na marcha. Procuro ajuda médica com neurocirurgião. Realizou exames tendo sido diagnosticado acidente vascular cerebral isquémico. Desde então não está trabalhando.”.

Sucede que a perícia administrativa do INS realizada em 28/10/2021 (ID 311921119) já havia constatada a incapacidade laborativa, fixando a DIB e DII em 04/05/2019, com base no relatório do neurocirugião Dr. Carlos Wentz CRM 207077 datado de 04/05/2021, o qual “relata que o AVC ocorreu há 18-24 meses”.

No ponto, observo que a parte autora instruiu o presente feito apenas com atestados médicos recentes, datados de 13/07/2021, 14/07/2021 e 18/09/2021, não anexando à demanda o relatório do neurocirugião Dr. Carlos Wentz CRM 207077 datado de 04/05/2021, que serviu de base para a fixada da DII pelo INSS.

O extrato CNIS da parte autora (ID 311921121) revela que esta, após o encerramento do vínculo empregatício de 09/06/2014 a 25/12/2014, reingressou no RGPS apenas em 01/02/2020, na condição de contribuinte individual.

Com efeito, as filiações extemporâneas e os reingressos tardios afrontam a lógica do sistema previdenciário, privilegiando situações acintosas ao seu equilíbrio financeiro e atuarial, mormente diante da constatação anterior de doenças graves, degenerativas ou progressivas em estágio avançado, como no caso dos autos.

No presente caso, o reingresso da parte autora no RGPS indica claro intuito de se refiliar ao Regime de Previdência Social tão só com o objetivo de perceber benefício previdenciário, o que efetivamente não encontra lastro de licitude, à luz do sistema contributivo/solidário que norteia a Previdência.

Não é possível conceder benefício previdenciário a quem se filia à previdência social quando não mais consegue trabalhar ou mesmo em vias de se tornar inválido. Trata-se de artifício que tem se revelado corriqueiro, mas que não pode contar com a complacência do Poder Judiciário, sob pena de burla às regras previdenciárias e aos princípios da solidariedade e do equilíbrio financeiro e atuarial.

Em caso análogo, assim decidiu o Tribunal Regional Federal da 3ª Região:

“[...] - O laudo atesta que a parte autora apresenta lombalgia crônica, osteófito de coluna e hipertensão arterial. Conclui pela existência de incapacidade parcial e permanente, com restrição para atividades com esforço e carregamento de peso, pela limitação da idade. Em complementação, informou que o início da incapacidade ocorreu, aproximadamente, no ano de 2011. - Verifica-se dos documentos apresentados que a parte autora esteve vinculada ao Regime Geral de Previdência Social por mais de 12 (doze) meses. Recolheu contribuições até 04/1994, deixou de contribuir por longo período e voltou a filiar-se à Previdência Social, recolhendo contribuições de 06/2011 a 11/2011 e de 01/2012 a 05/2012. - Entretanto, o conjunto probatório revela o surgimento da enfermidade incapacitante, desde antes do seu reingresso ao sistema previdenciário. - Neste caso, o perito informa que a incapacidade teve início no ano de 2011. - Ressalte-se que a parte autora reingressou no sistema previdenciário em 06/2011 (após 17 anos sem efetuar qualquer espécie de recolhimento ao RGPS), aos 63 anos de idade, recolheu contribuições suficientes para o cumprimento da carência exigida e, em 06/2013, formulou requerimento administrativo. - Não é crível, pois, que na data do reinício dos recolhimentos contasse com boas condições de saúde para, alguns meses depois, estar total e permanentemente incapacitada para o trabalho, como alega. - Portanto, é possível concluir que a incapacidade já existia antes mesmo da sua refiliação junto à Previdência Social e, ainda, não restou demonstrado que o quadro apresentado progrediu ou agravou-se, após seu reingresso no RGPS, o que afasta a concessão dos benefícios pleiteados, nos termos dos artigos 42, § 2º, e 59, parágrafo único, da Lei nº 8.213/91. [...]” (TRF 3, AC 00015832320144036139, Relatora, DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, OITAVA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/02/2017) - grifei

No mesmo sentido, Turma Nacional de Uniformização cristalizou a compreensão de que “Não há direito a auxílio-doença ou a aposentadoria por invalidez quando a incapacidade para o trabalho é preexistente ao reingresso do segurado no Regime Geral de Previdência Social.” (Súmula 53).

Ante o exposto, DOU PROVIMENTO ao recurso do INSS para reformar a sentença recorrida e julgar improcedente o pedido de aposentadoria por invalidez formulado pela parte autora.

Revogo a antecipação da tutela concedida na instância originária. Encaminhe-se ao INSS com urgência para cumprimento.

Quanto à questão atinente à devolução de valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela, deve ser observada a orientação do Tema Repetitivo 692 do STJ (revisado), bem como a regra inserta no art. 115, § 3º, da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Lei nº 13.846/2019.

Sem condenação em honorários advocatícios, face o disposto no art. 55, da lei nº 9.099/95.

Saliento, por fim, que eventuais embargos de declaração opostos com o intuito de rediscutir as questões de mérito já definidas no julgado serão considerados meramente protelatórios, cabendo a aplicação de multa não excedente a dois por cento sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 1.026, § 2°, do CPC.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. PEDIDO DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AS FILIAÇÕES EXTEMPORÂNEAS E OS REINGRESSOS TARDIOS AFRONTAM A LÓGICA DO SISTEMA PREVIDENCIÁRIO, PRIVILEGIANDO SITUAÇÕES ACINTOSAS AO SEU EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL, MORMENTE DIANTE DA CONSTATAÇÃO ANTERIOR DE DOENÇAS GRAVES, DEGENERATIVAS OU PROGRESSIVAS EM ESTÁGIO AVANÇADO, COMO NO CASO DOS AUTOS. TENTATIVA DE BURLA ÀS REGRAS PREVIDENCIÁRIAS E AOS PRINCÍPIOS DA SOLIDARIEDADE E DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL. INCAPACIDADE PREEXISTENTE AO REINGRESSO NO RGPS. APLICAÇÃO DA SÚMULA 53 DA TNU. PROVIMENTO DO RECURSO DO INSS.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Nona Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Terceira Região - Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, dar provimento ao recurso do INSS, nos termos do voto da Juíza Federal Relatora., nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARISA REGINA AMOROSO QUEDINHO CASSETTARI
Juíza Federal