RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000188-18.2021.4.03.6311
RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP
RECORRENTE: MARCO ANTONIO BUNNO DA SILVA
Advogado do(a) RECORRENTE: ANDERSON REAL SOARES - SP230306-N
RECORRIDO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL
OUTROS PARTICIPANTES:
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000188-18.2021.4.03.6311 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: MARCO ANTONIO BUNNO DA SILVA Advogado do(a) RECORRENTE: ANDERSON REAL SOARES - SP230306-N RECORRIDO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 0000188-18.2021.4.03.6311 RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP RECORRENTE: MARCO ANTONIO BUNNO DA SILVA Advogado do(a) RECORRENTE: ANDERSON REAL SOARES - SP230306-N RECORRIDO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL OUTROS PARTICIPANTES: V O T O Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.
E M E N T A
VOTO-EMENTA
TRIBUTÁRIO. PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO. IMPOSTO DE RENDA. AHRA – ADICIONAL HORA DE REPOUSO E ALIMENTAÇÃO. TEMA 306 TNU. JUÍZO DE ADEQUAÇÃO EXERCIDO.
1. Trata-se de pedido de uniformização de jurisprudência interposto em face de acórdão proferido por esta Turma Recursal.
2. Em acórdão proferido nestes autos, foi negado provimento ao recurso da parte autora, nos seguintes termos:
“VOTO-EMENTA
TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. HRA – HORA REPOUSO ALIMENTAÇÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.
1. Pedido de exclusão da HRA (Hora Repouso Alimentação) e AHRA/DOBRA DE TURNO da base de cálculo do Imposto de Renda, ante seu caráter indenizatório, e, por conseguinte, a restituição de todos os valores pagos a tal título nos últimos 05 anos.
2. Conforme consignado na sentença:
“Cuida a presente demanda de ação ajuizada pela parte autora em face da União Federal (PFN), na qual postula a declaração de inexigibilidade e, em conseqüência, a restituição dos valores que lhe foram descontados a título de imposto de renda pessoa física incidente sobre "hora repouso alimentação – HRA”, no montante e períodos indicados na inicial, tudo em face dos fatos e fundamentos narrados na exordial.
Citada, a União apresentou sua contestação tempestivamente, na qual requereu a improcedência da ação. Réplica apresentada nos autos.
Tratando-se a discussão em apreço de matéria eminentemente de direito, vieram os autos virtuais à conclusão para sentença e julgamento antecipado do pedido, a teor do que dispõe o artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.
No mais, relatório dispensado nos termos do art. 38 da Lei 9099/95 e 1º da Lei 10259/01.
Fundamento e decido.
Observo que o feito foi processado com observância do contraditório e da ampla defesa, inexistindo situação que possa levar prejuízo ao princípio do devido processo legal.
As partes são legítimas e bem representadas, estando presentes as condições da ação, bem como os pressupostos de constituição e desenvolvimento válido e regular da relação processual.
Observo que os documentos essenciais ao julgamento da lide estão juntados aos autos.
No mais, ainda que entenda ser aplicável por analogia o entendimento esboçado pelo STJ no RESP 1111003 (Tema 115), segundo o qual os comprovantes de recolhimento do tributo poderão ser juntados quando da liquidação do julgado, fica advertida a parte autora que, em caso de procedência do pedido vertido na inicial, caberá a ela diligenciar perante o empregador (responsável tributário) de forma a obter a documentação necessária à comprovação do indébito tributário a fim de viabilizar eventual execução de valores a serem restituídos.
Assim, em caso de procedência, a definição dos valores exatos objeto de devolução será feita por liquidação de sentença, na qual obrigatoriamente deverá ocorrer a demonstração do quantum recolhido indevidamente.
Outrossim, persiste o interesse de agir da parte autora ante a resistência da ré manifestada em sede de contestação.
Não havendo outras preliminares a serem apreciadas, analiso a matéria relativa à defesa indireta do mérito.
Por oportuno, analiso eventual ocorrência de prescrição, nos termos do art. 168, I, do CTN, c.c. art. 118, I, da LC n. 118/2005.
Vale dizer que, em análise do tema da aplicação imediata ou não da LC n. 118/2005, o Supremo Tribunal Federal rechaçou a interpretação que vinha sendo dada à questão pelo C. Superior Tribunal de Justiça, firmando a incidência da referida lei complementar às ações ajuizadas após o decurso da vacatio legis de 120 dias, ou seja, a partir de 9 de junho de 2005 . Abaixo, transcrevo a ementa do referido julgado, realizado na forma do art. 543-B do CPC:
(...)
Assim, adoto tal entendimento, mormente considerando-se a função de uniformização da interpretação constitucional exercida pelo Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, no caso deste feito, ajuizado após a vacatio legis da Lei Complementar mencionada, deve ser aplicada a prescrição qüinqüenal. Assim, acolho a prescrição apenas quanto aos pagamentos indevidos ocorridos anteriormente ao quinquênio que antecedeu a propositura da presente demanda, lembrando-se que o pagamento indevido, no caso, não ocorre com a retenção na fonte (que é provisória), mas sim com o posterior ajuste mediante a declaração anual e o posterior recolhimento do imposto (ou restituição a menor que o devido).
Prossigo com o exame do mérito.
No caso dos autos, pleiteia-se a não incidência do imposto sobre os valores percebidos a título de hora repouso alimentação percebido pela parte autora, sob o argumento de se tratar de verba indenizatória.
Em apertada síntese, a parte autora alega que é empregada da empresa Petrobrás, trabalhando em turnos ininterruptos de oito horas, sem intervalo para refeição e descanso. Sustenta que tal jornada de trabalho é regulamentada pela Lei n. 5.811/72, sendo a supressão do intervalo intrajornada uma exceção legalmente permitida em relação à disciplina normativa prevista no art. 71 da CLT.
Com o intuito de reparar a perda do intervalo, assegura que o art. 3º, II, da Lei 5.811/72, bem como o art. 71, §4º, da CLT, preveem o pagamento de numerário a título de indenização. Destarte, face à natureza jurídica da verba, defende que não incide imposto de renda sobre ela, pugnando pela declaração da inexistência da relação jurídicotributária, bem como pela restituição do indébito indevidamente pago nos cinco anos que precederam o ajuizamento da demanda.
O pedido não comporta acolhimento.
Segundo o art. 43, I, do CTN, o imposto de renda “tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica [...] de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos”.
Nesse sentido, pode-se entender a renda como acréscimo patrimonial, ou seja, a mais valia auferida pela pessoa, que poderá advir de diversas origens, tais como do capital, do trabalho, da álea, de obrigações de natureza civil.
Ainda sobre o tema, o Decreto n. 3000/99 estabelece:
Art. 43. São tributáveis os rendimentos provenientes do trabalho assalariado, as remunerações por trabalho prestado no exercício de empregos, cargos e funções, e quaisquer proventos ou vantagens percebidos, tais como (Lei n º 4.506, de 1964, art. 16, Lei n º 7.713, de 1988, art. 3 º, § 4 º, Lei n º 8.383, de 1991, art. 74, e Lei n º 9.317, de 1996, art. 25, e Medida Provisória n º 1.769-55, de 11 de março de 1999, arts. 1 º e 2 º):
I - salários, ordenados, vencimentos, soldos, soldadas, vantagens, subsídios, honorários, diárias de comparecimento, bolsas de estudo e de pesquisa, remuneração de estagiários;
[...]
XVI - outras despesas ou encargos pagos pelos empregadores em favor do empregado;
[...]
Feitas essas considerações, não há como se negar a natureza remuneratória e, portanto, de acréscimo patrimonial, representada pelo adicional de HRA (Hora de alimentação e repouso). Com efeito, malgrado o pagamento deste seja feito com referência a um período em que o trabalhador fique à disposição da empresa durante o seu horário de alimentação, em estrita relação com a prestação de serviços dele decorrente, tanto que a Consolidação das Leis do Trabalho, em seu art. 4º, assim estabelece:
"Art. 4º - Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição especial expressamente consignada."
Portanto, é de natureza remuneratória, e não indenizatória, o adicional previsto no art. 71, § 4º, da CLT, quando da não concessão pelo empregador de intervalo mínimo intrajornada para repouso e alimentação, tendo reflexo, por conseguinte, não somente no imposto de renda, mas também na contribuição previdenciária patronal.
A Súmula 437 do TST igualmente consigna a natureza remuneratória do adicional:
(...)
A "Hora Repouso Alimentação - HRA", diversamente das férias indenizadas, é paga como única e direta retribuição pela hora em que o empregado fica à disposição do empregador.
Ao contrário do alegado pela parte autora, o pagamento da HRA assemelha-se a hora extra, eis que a remuneração é paga pelo tempo efetivamente trabalhado ou à disposição do empregador, sujeitas não somente ao imposto de renda mas também à contribuição previdenciária.
Logo, a remuneração pela disponibilidade do trabalhador durante o seu horário de alimentação repouso é devida em razão da prestação de trabalho, sendo, portanto, verba de natureza remuneratória a sofrer a incidência de imposto de renda.
Por sua vez, não há que se falar que o pagamento do adicional consistiria em verba indenizatória. A ideia de indenização pressupõe reparação, retorno ao status quo ante de um patrimônio (material ou moral) que foi violado. Nesse contexto, se a indenização se limita a recompor um dano, tal hipótese implica mera configuração de elemento permutativo de patrimônio, haja vista que apenas se assegura ao lesado o retorno ao estado de riqueza anterior à ocorrência do dano, ou seja, em tal hipótese há o ingresso de uma disponibilidade financeira na exata quantia necessária para que haja a reposição patrimonial, ou seja, para tornar o patrimônio indene.
Ora, não é o que ocorre no caso do adicional de HAR que, como visto, decorre da prestação de trabalho e não caracteriza reparação por qualquer violação a direito do trabalhador; ao contrário, seu pagamento representa o exercício de um direito do empregador, nos casos em que a CLT especifica.
Nesse sentido já se encontra pacificada a jurisprudência:
(...)
Portanto, conforme jurisprudência uniforme, incide o imposto de renda sobre os valores pagos pelo empregador pela disponibilidade do empregado no local de trabalho ou nas suas proximidades durante o intervalo destinado a repouso e alimentação, conforme o art. 2º, § 2º, da Lei 5.811/1972, conhecida por "Hora Repouso Alimentação - HRA".
Em vista do esposado, penso que outra não deve ser a decisão senão o reconhecimento da improcedência do pedido formulado na presente ação.
Ante o exposto e tudo o mais que dos autos consta, julgo extinto o processo com resolução de mérito, a teor do art. 487, I, do CPC, julgo improcedente o pedido formulado na inicial.
Sem custas e honorários advocatícios nesta instância judicial, a teor do art. 1º da Lei nº 10.259/01 c.c. o art. 55, caput da Lei nº
9.099/95. (...)”
3. Recurso da parte autora: afirma que os valores recebidos a titulo de HRA, em verdade, trata-se de verba indenizatória, e portanto, deveria ser excluída a incidência de imposto de renda. A HRA reveste natureza jurídica autenticamente indenizatória, pois seu escopo é recompor direito legítimo do empregado suprimido em virtude das vicissitudes da atividade laboral, assumindo perfil de genuína compensação, de verdadeira contrapartida a que o empregador está obrigado, por lei, a disponibilizar ao obreiro, em virtude da não fruição do direito ao intervalo para refeição e repouso que lhe é garantido, imprescindível ao restabelecimento do seu vigor físico e mental.
4. A "Hora Repouso Alimentação – HRA” é paga como única e direta retribuição pela hora em que o empregado fica à disposição do empregador, possuindo caráter salarial. A respeito da natureza remuneratória desta verba, assim decidiu o C. STJ:
TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. INCIDÊNCIA SOBRE GRATIFICAÇÃO NATALINA E ADICIONAL POR TEMPO DE SERVIÇO. HORA REPOUSO ALIMENTAÇÃO.
1. A Gratificação por Tempo de Serviço e a Gratificação Natalina, por ostentarem caráter permanente, integram o conceito de remuneração, sujeitando-se, consequentemente, à contribuição previdenciária.
2. A incidência da contribuição previdenciária sobre a rubrica "hora repouso alimentação" já foi objeto de discussão na Segunda Turma que, em 1°.3.2011, no julgamento do REsp 1.157.849/RS, Relator Ministro Herman Benjamim, após voto-vista do Min. Mauro Campbell (acórdão pendente de publicação), decidiu-se que incide a contribuição previdenciária sobre o intervalo intrajornada, uma vez que encerra natureza salarial. Recurso especial improvido. (REsp 1208512/DF, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 24/05/2011, DJe 01/06/2011)
5. Destarte, a despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou corretamente todas as questões trazidas no recurso inominado, de forma fundamentada, não tendo o recorrente apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação.
6. Não obstante a relevância das razões apresentadas pelo recorrente, o fato é que todas as questões suscitadas foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Origem, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
7. Recorrente condenado ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa. Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do artigo 98, § 3º do CPC.
(...)”
3. Em decisão monocrática prolatada pela TRU, foi determinada a devolução dos autos à Turma Recursal de origem para aplicação do Tema 306 da TNU ("Com o advento da Lei nº 13.467, de 13/07/2017, que deu nova redação ao § 4º do art. 71 da CLT e estabeleceu expressamente a natureza indenizatória do pagamento operado pela supressão do intervalo intrajornada, habitualmente conhecido como Adicional Hora de Repouso e Alimentação (AHRA), em conformidade com a proteção constitucional à saúde do trabalhador (arts. 7º, XXII, 194, caput, 197 e 200, II, bem como art. 5º, § 2º c.c. arts. 4o e 5o da Convenção 155 da OIT, incorporada ao direito interno pelo Decreto n. 1.254/94, hoje consolidada no Decreto n. 10.088/2019 e o art. 7º, do Pacto Internacional Relativo aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 1966, incorporado ao direito interno pelo Decreto n. 591/92), não incide imposto de renda sobre a verba paga a tal título." )
4. Outrossim, ante o entendimento firmado pela TNU, no referido TEMA 306, altero o entendimento anteriormente adotado.
5. Ante o exposto, exerço o juízo de adequação da decisão anteriormente prolatada por esta Turma Recursal e, em consequência, dou provimento ao recurso da parte autora para excluir a HRA (Hora Repouso Alimentação) da base de cálculo do Imposto de Renda, com a restituição dos valores pagos a este título, nos 05 anos anteriores ao ajuizamento desta demanda, com correção monetária e juros de mora pela taxa SELIC, respeitados os demais termos da Resolução 784/22. Sem honorários, nos termos do art. 55 da Lei 9.099/95, porquanto não há recorrente vencido.