Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 0012116-57.2016.4.03.0000

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: HOSPITAL E MATERNIDADE VOLUNTARIOS LTDA

Advogado do(a) AGRAVADO: ANDERSON ALVES DE ALBUQUERQUE - SP220726-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 0012116-57.2016.4.03.0000

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: HOSPITAL E MATERNIDADE VOLUNTARIOS LTDA

Advogado do(a) AGRAVADO: ANDERSON ALVES DE ALBUQUERQUE - SP220726-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

A Desembargadora Federal Giselle França:

 

Trata-se de agravo de instrumento contra r. decisão que determinou a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, após pedido de redirecionamento da execução fiscal.

 A União, ora agravante (ID 122858641, págs. 02/ss.), argumenta com a possibilidade de análise do pedido de redirecionamento independentemente da instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica - IDPJ.

 Sem resposta.

 É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
6ª Turma
 

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) Nº 0012116-57.2016.4.03.0000

RELATOR: Gab. 18 - DES. FED. GISELLE FRANÇA

AGRAVANTE: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

AGRAVADO: HOSPITAL E MATERNIDADE VOLUNTARIOS LTDA

Advogado do(a) AGRAVADO: ANDERSON ALVES DE ALBUQUERQUE - SP220726-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

V O T O

 

 

A Desembargadora Federal Giselle França:

 

O Órgão Especial desta C. Corte Regional analisou a compatibilidade do IDPJ para verificação de responsabilidade fiscal em incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR nº. 0017610-97.2016.4.03.0000/SP), tendo firmado o seguinte entendimento vinculante: 

DIREITO CIVIL, PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS (IRDR) (CPC, ART. 976). DEMANDAS PARADIGMAS: CABIMENTO DO INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA (IDPJ) (CPC, ART. 133) EM EXECUÇÃO FISCAL. TESE FIRMADA PELA COMPATIBILIDADE E INDISPENSABILIDADE DO IDPJ PARA COMPROVAÇÃO DE RESPONSABILIDADE EM DECORRÊNCIA DE CONFUSÃO PATRIMONIAL, DISSOLUÇÃO IRREGULAR, FORMAÇÃO DE GRUPO ECONÔMICO, ABUSO DE DIREITO, EXCESSO DE PODERES OU INFRAÇÃO À LEI, AO CONTRATO OU AO ESTATUTO SOCIAL (CTN, ART. 135, INCISOS I, II E III) E PARA INCLUSÃO DAS PESSOAS QUE TENHAM INTERESSE COMUM NA SITUAÇÃO QUE CONSTITUA O FATO GERADOR DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL, DESDE QUE NÃO INCLUÍDOS NA CDA. PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL EM FACE DOS DEMAIS COOBRIGADOS. DESNECESSIDADE DE SUSPENSÃO DOS ATOS EXECUTÓRIOS. LEI DA LIBERDADE ECONÔMICA: LEI 13.874/19.CÓD. CIV. ARTS. 49-A, 50, 264 E 265; CPC-15, ARTS. 7º, 9º , 10, 133 A 137 E 795 E PARÁGRAFO. CTN. ARTS. 124, I E II, 133, INCISOS I E II, 134 E INCISOS, E 135, INCISOS I, II E III. LEI DE EXECUÇÃO FISCAL (6.830/80), ART. 4º, § 2º. LEI 8.212/91, ART. 30, INCISO IX. PORTARIA RFB 2.284/2.010.

1. Preenchidos os requisitos para a admissibilidade do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) diante da repetição de processos contendo controvérsia sobre o cabimento do Incidente de Desconstituição da Personalidade Jurídica (IDPJ) em sede de Execução Fiscal, para a atração de possível responsável tributário.

2. A Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2.019) reintroduziu no ordenamento jurídico a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, que não podem ser confundidas com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores (Cód. Civ. art. 49-A), e também disciplinou as hipóteses de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial (Cód. Civ. art. 50 e seus parágrafos), além de estabelecer paradigma interpretativo de seus postulados "na aplicação e na interpretação do direito civil, empresarial, econômico, urbanístico e do trabalho" (art. 1º, § 1º).

3. A Lei de Execuções Fiscais (Lei nº 6.830/1.980) em seu artigo 4º, § 2º, prevê que "à dívida da Fazenda Pública, de qualquer natureza, aplicam-se as normas relativas à responsabilidade prevista na legislação tributária, civil e comercial", o que remete à aplicação do artigo 50 do Código Civil para a pretensão de redirecionamento da responsabilidade tributária em Execução Fiscal já em curso, dado que as normas civis de assunção de responsabilidade devem ser observadas, e aplicadas, na constituição e exigência da dívida ativa da Fazenda Pública, por expressa determinação legal.

4. Consideradas as garantias processuais e procedimentais tendentes a garantir o contraditório (CPC-15, arts. 7º, 9º e 10), aplicáveis também no seio do Processo de Execução Fiscal, para a determinação, in concreto, das condicionantes postas pelo artigo 50 e seus parágrafos, do Código Civil, não se mostra possível que tal se dê sem que se instaure um incidente em que se confira à parte o amplo direito de defesa, até que se prove, ao fim e ao cabo a presença dos pressupostos da confusão patrimonial e do desvio de finalidade agora legalmente disciplinados, abrangentes das hipóteses de excesso de poderes e infração à lei (vide sobre obrigatoriedade do IDPJ: CPC-15, art. 795, § 4º).

5. Não fossem bastantes as garantias processuais e procedimentais tendentes a garantir o contraditório (CPC-15, arts. 7º, 9º e 10),aplicáveis também no seio do processo de Execução Fiscal, o certo é que não pode, por via judicial, afastar-se o postulado da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas sem resguardar o especial direito de ser ouvida a respeito da pretensão, previamente, a exemplo do que já ocorre no âmbito administrativo.

6. O redirecionamento de execução fiscal a pessoa jurídica que integra o mesmo grupo econômico da sociedade empresária originalmente executada, mas que não foi identificada no ato de lançamento, ou cuja responsabilidade não foi apurada em procedimento administrativo tributário prévio à emissão da CDA, depende mesmo da comprovação do abuso de personalidade, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial, tal como consta do art. 50 do Código Civil, daí porque, nessa hipótese, é obrigatória a instauração do incidente de desconsideração da personalidade da pessoa jurídica devedora (CPC-15, art. 133, c.c. art. 795, § 4º).

7. O artigo 124, ao prever que são "solidariamente obrigadas as pessoas que I - tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal: e II - as pessoas expressamente designadas por lei", não autoriza o redirecionamento da responsabilidade tributária de modo automático, dado que o interesse comum, previsto no inciso I, diz respeito ao interesse jurídico das pessoas na relação tributária, que se dá quando os sujeitos, conjuntamente, fazem parte da situação que permite a ocorrência do fato gerador: por isso, só o interesse econômico decorrente da situação não legitima a atribuição da responsabilidade; o inciso II, ao se referir às pessoas expressamente designadas por lei, remete à norma que atribui a responsabilidade tributária; de toda sorte, não se pode conjugar essa norma com outras espécies de responsabilidade, como, p. ex., a civil ou a trabalhista, para o fim de se concluir pela sujeição passiva de pessoa jurídica tão só por compor um grupo econômico que engloba a devedora original, diante da autonomia das pessoas jurídicas (Cód. Civ., art. 49-A).

8. As hipóteses postas no artigo 133, inciso II e artigo 134 do CTN cuidam, em verdade, de responsabilidade subsidiária e não solidária, devendo se observar a técnica do benefício de ordem na exigência do tributo, situação que não demanda a instauração de IDPJ, bastante para tanto a demonstração de execução frustrada em face do devedor originário (contribuinte), trazendo-se à lide executória a pessoa expressamente indicada em lei (responsável).

9. Para as hipóteses contempladas no artigo 135 e incisos do CTN, em que se têm responsabilidades concorrentes, não excludentes, mas não solidárias, exige-se a demonstração da prática de atos específicos definidos na lei que não podem ser inferidos ou deduzidos sem que se estabeleça prévio e indispensável contraditório, impondo-se a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica, também para a atribuição de responsabilidade inversa (CPC-15, art. 795 e parágrafos).

10. Quanto à suspensão do processo de Execução Fiscal, em razão da instauração do IDPJ, tem-se que a melhor interpretação a ser conferida ao instituto é a de que a Execução Fiscal, em relação aos demais coobrigados já integrados à lide executória não se suspenderá, devendo se instaurar o incidente de modo paralelo, sem prejuízo do regular prosseguimento da pretensão executória, até que advenha a solução sobre a ampliação (ou não) do rol de coobrigados, observando-se a autonomia dos atos executórios em face do devedor originário contra quem se constituiu, validamente, a CDA.

11. Fixa-se, com tais fundamentos, a seguinte tese jurídica: "Não cabe instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica nas hipóteses de redirecionamento da execução fiscal desde que fundada, exclusivamente, em responsabilidade tributária nas hipóteses dos artigos 132, 133, I e II e 134 do CTN, sendo o IDPJ indispensável para a comprovação de responsabilidade em decorrência de confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, ao contrato ou ao estatuto social (CTN, art. 135, incisos I, II e III), e para a inclusão das pessoas que tenham interesse comum na situação que constitua o fato gerador da obrigação principal, desde que não incluídos na CDA, tudo sem prejuízo do regular andamento da Execução Fiscal em face dos demais coobrigados".

12. Pedido parcialmente acolhido.

(TRF-3, Órgão Especial, IRDR 0017610- 97.2016.4.03.0000, j. 10/02/2021, DJe 20/02/2021, Rel. Des. Fed. BAPTISTA PEREIRA, Rel. p/acórdão Des. Fed. WILSON ZAHUY). 

Ocorreu a interposição de recursos excepcionais, dirigidos às Cortes Superiores, no IRDR, os quais foram recebidos com automático efeito suspensivo a teor do artigo 987, § 1º, do Código de Processo Civil.

De toda sorte e nos termos da orientação do Órgão Especial desta C. Corte Regional, cumpre verificar, em cada caso concreto, a viabilidade do redirecionamento da execução fiscal, à luz das provas existentes.

Em outras palavras: o IDPJ não é obrigatório, devendo ser analisada a instrução processual já existente bem como a possibilidade do exercício de defesa em concreto.

Por tais fundamentos, dou provimento ao agravo de instrumento.

É o voto.



E M E N T A

DIREITO TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. PROVIMENTO DO RECURSO.
I. CASO EM EXAME
1.    Agravo de instrumento interposto pela Agência Nacional de Transportes Terrestres – ANTT contra decisão que determinou a instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ) após pedido de redirecionamento de execução fiscal. A agravante sustenta a possibilidade de análise do pedido independentemente do incidente, requerendo o reconhecimento da formação de grupo econômico e o deferimento da penhora de ativos financeiros.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2.    A questão em discussão consiste em definir se a instauração do IDPJ é obrigatória para o redirecionamento da execução fiscal, considerando a formação de grupo econômico e os fundamentos normativos aplicáveis.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3.    O Órgão Especial do TRF-3, no julgamento do IRDR nº 0017610-97.2016.4.03.0000/SP, firmou entendimento vinculante de que o IDPJ é indispensável para a comprovação de responsabilidade decorrente de confusão patrimonial, dissolução irregular, formação de grupo econômico, abuso de direito, excesso de poderes ou infração à lei, contrato ou estatuto social (CTN, art. 135, incisos I, II e III), mas não para hipóteses de responsabilidade tributária previstas nos artigos 132, 133, I e II, e 134 do CTN.
4.    O redirecionamento da execução fiscal pode ocorrer sem a instauração do IDPJ quando houver elementos probatórios suficientes nos autos que permitam a responsabilização direta dos envolvidos, respeitado o contraditório e a ampla defesa.
5.    O efeito suspensivo automático dos recursos excepcionais interpostos contra o acórdão do IRDR não impede a análise da viabilidade do redirecionamento em cada caso concreto.
IV. DISPOSITIVO E TESE
6.    Recurso provido.
Tese de julgamento:
1.    O incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ) não é obrigatório para o redirecionamento da execução fiscal, devendo-se analisar, em cada caso concreto, a existência de provas suficientes e a possibilidade de exercício do contraditório e ampla defesa.
Dispositivos relevantes citados: CPC/2015, arts. 133 a 137 e 795, § 4º; CTN, arts. 124, I e II, 132, 133, I e II, 134 e 135, I, II e III; Lei 6.830/80, art. 4º, § 2º; Lei 13.874/19, art. 1º, § 1º; CC, arts. 49-A e 50.
Jurisprudência relevante citada: TRF-3, Órgão Especial, IRDR nº 0017610-97.2016.4.03.0000/SP, Rel. p/ Acórdão Des. Fed. Wilson Zahuy, j. 10/02/2021, DJe 20/02/2021.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sexta Turma, por unanimidade, deu provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
GISELLE FRANÇA
Desembargadora Federal