Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007845-20.2020.4.03.6000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

APELADO: DARIENA LAUZAO HERNANDEZ

Advogado do(a) APELADO: HUMBERTO PABLO DE SOUZA - GO39035-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007845-20.2020.4.03.6000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: DARIENA LAUZAO HERNANDEZ

Advogado do(a) APELADO: HUMBERTO PABLO DE SOUZA - GO39035-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

 

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO em ação de procedimento comum ajuizada por DARIENA LAUZAO HERNANDEZ, pleiteando “a condenação do Requerido a reconhecerem o direito do Autor na REINCORPORAÇÃO no Programa Mais Médicos Brasil, nos termos do art. 23-A da Lei nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, acrescido pelo Art. 34 da Lei nº 13.958, de 18 de dezembro de 2019 bem como seja garantida sua participação no certame do EDITAL DE CHAMAMENTO PÚBLICO Nº 9, DE 26 DE MARÇO DE 2020”.

 

 A r. sentença (ID 275916708) julgou procedente o pedido “para determinar que a ré permita à autora concorrer às vagas que eventualmente sejam disponibilizadas em decorrência do Edital SAPS/MS Nº 9, de 26 de março de 2020, ficando sua nomeação e exercício condicionados à efetiva existência de vagas e de comprovação do preenchimento ao item 2 do edital”. Honorários advocatícios fixados em 8% do valor atualizado atribuído à causa. Não houve condenação em custas.

 

Em suas razões recursais (ID 275916710), a apelante alega que “em 14 de novembro de 2018 a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS) informou ao Ministério da Saúde, por intermédio da Carta BRA/PWR/63/253/18, que o Governo de Cuba manifestou, unilateralmente, desinteresse em manter a cooperação com esse organismo internacional, por meio do qual médicos cubanos participavam do Projeto Mais Médicos para o Brasil”.

 

Aduz que “sensível à situação dos médicos cubanos que permaneceram no Brasil após o rompimento do Termo de Cooperação, decorrente da conversão da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, em 19 de dezembro de 2019 foi publicada a Lei nº 13.958, de 18 de dezembro de 2019 que “Institui o Programa Médicos pelo Brasil, no âmbito da atenção primária à saúde no Sistema Único de Saúde (SUS), e autoriza o Poder Executivo federal a instituir serviço social autônomo denominado Agência para o Desenvolvimento da Atenção Primária à Saúde (Adaps)”, que no art. 34, acresceu o art. 23-A a Lei nº 12.871/2013, que assim dispõe (vênia para nova transcrição): Art. 23-A Será reincorporado ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, na forma do inciso II do caput do art. 13 desta Lei, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos, o médico intercambista que atender cumulativamente aos seguintes requisitos: I - estar no exercício de suas atividades, no dia 13 de novembro de 2018, no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil, em razão do 80º Termo de Cooperação Técnica para implementação do Projeto Ampliação do Acesso da População Brasileira à Atenção Básica em Saúde, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde; II - ter sido desligado do Projeto Mais Médicos para o Brasil em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde para a oferta de médicos para esse Projeto; e  III - ter permanecido no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio. Deste modo, a República de Cuba determinou a repatriação de todos os profissionais que se encontrassem no território brasileiro como participantes do Projeto, tornando inexequível a continuidade da execução do 80º Termo de Cooperação Técnica firmado entre a União/Ministério da Saúde e a OPAS/OMS”.

 

Sustenta que “existe uma determinação legal para que os médicos cubanos sejam reincorporados ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, pelo prazo de 2 (dois) anos, devendo ser esclarecido que o referido mandamento não possui a mesma natureza jurídica dos chamamentos públicos, contido no artigo 13, da Lei 12.870/2013, no qual há uma prévia seleção entre os perfis lá descritos. A reincorporação dos médicos cubanos tem natureza jurídica sui generis e se consubstancia em uma manifestação de vontade dos profissionais contemplados pela lei, desde que atendam aos requisitos exigidos na norma. Observa-se, no entanto, que não basta que o médico cubano tenha participado do PMMB e tenha permanecido no Brasil, é imperioso esclarecer que o artigo 23-A da Lei 12.871/2013 trouxe requisitos em seus incisos, podendo se afirmar que a reincorporação não é automática. Para o cumprimento da obrigação legal de reincorporação dos médicos cubanos ao PMMB, observando os requisitos postos no texto legal, serão necessárias as seguintes medidas: a) Verificação junto à Organização Mundial de Saúde dos profissionais que não embarcaram novamente para Cuba; b) Análise dos documentos de naturalização, residência e refúgio, sendo necessário acionar o Departamento da Polícia Federal na referida tarefa; c) Expedição via portaria de Registro Médico de Saúde (RMS), haja vista que, por não deterem inscrição nos Conselhos Regionais Médicos, não podem exercer a medicina no território brasileiro, sem a autorização extraordinária, que se corporifica por meio do RMS. Veja a necessidade de que o profissional médico esteja em lista da OPAS é requisito essencial para cumprir o mandamento legal. Com efeito, é necessário que o médico estivesse no exercício de suas atividades em 13 de novembro de 2018 no âmbito do Projeto Mais Médicos, bem como ter sido desligado do Projeto Mais Médicos para o Brasil em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Organização PanAmericana da Saúde/Organização Mundial da Saúde e ter permanecido no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio. Diferentemente do que ocorrera em relação aos demais participantes, o contrato da União em relação aos médicos cubanos era celebrado diretamente com a OPAS que, consequentemente, firmava contratos com os médicos. É por essa razão que apenas a OPAS poderá dizer quem é o médico que estava vinculado ao programa durante a vigência do projeto. O Ministério da Saúde, ao abrir o chamamento de médicos intercambistas, consultou, portanto, aquela organização internacional, já que detentora do liame jurídico com o profissional. Observe-se, é uma constatação irrevogável que não existe restrição volitiva à incorporação de médicos cubanos ao PMMB, mas sim, condicionantes definidas pela legislação de regência que, se concordando ou não, pautam os atos administrativos que tem nela seu supedâneo. Sendo assim, inexiste qualquer restrição ou obstáculo criado no Edital 9/2020, mas fiel observância ao art. 23-A da Lei 12.871/2013, que estabelece 03 (três) condicionantes para que a reincorporação de médicos intercambistas encontre lugar no seio da política pública”.

 

Devidamente processado o feito, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.

 

Houve apresentação de contrarrazões (ID 275916713).

 

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 


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3ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5007845-20.2020.4.03.6000

RELATOR: Gab. 08 - DES. FED. CARLOS DELGADO

APELANTE: UNIÃO FEDERAL

 

APELADO: DARIENA LAUZAO HERNANDEZ

Advogado do(a) APELADO: HUMBERTO PABLO DE SOUZA - GO39035-A

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V O T O

 

 

O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):

 

Como resultado da conversão da Medida Provisória nº 621/2013, a Lei nº 12.871/2013 instituiu o Programa Mais Médicos, tendo como um de seus principais objetivos diminuir a carência de médicos nas regiões prioritárias para o SUS, a fim de reduzir as desigualdades regionais na área da saúde (artigo 1º, I). Nesse contexto, estabeleceram-se, inclusive, acordos de cooperação entre Brasil e Cuba por meio da Organização Pan-Americana da Saúde – OPAS, permitindo o ingresso de profissionais de saúde cubanos para atuar em território brasileiro.

 

No âmbito do referido Programa, foi instituído o Projeto Mais Médicos para o Brasil, com as suas características definidas pelo artigo 13 da mencionada lei, nos seguintes termos:

 

 

Art. 13. É instituído, no âmbito do Programa Mais Médicos, o Projeto Mais Médicos para o Brasil, que será oferecido:

 

I - aos médicos formados em instituições de educação superior brasileiras ou com diploma revalidado no País; e

 

II - aos médicos formados em instituições de educação superior estrangeiras, por meio de intercâmbio médico internacional.

 

§ 1º A seleção e a ocupação das vagas ofertadas no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil observarão a seguinte ordem de prioridade:

 

I - médicos formados em instituições de educação superior brasileiras ou com diploma revalidado no País, inclusive os aposentados;

 

II - médicos brasileiros formados em instituições estrangeiras com habilitação para exercício da Medicina no exterior; e

 

III - médicos estrangeiros com habilitação para exercício da Medicina no exterior.

 

§ 2º Para fins do Projeto Mais Médicos para o Brasil, considera-se:

 

I - médico participante: médico intercambista ou médico formado em instituição de educação superior brasileira ou com diploma revalidado; e

 

II - médico intercambista: médico formado em instituição de educação superior estrangeira com habilitação para exercício da Medicina no exterior.

 

§ 3º A coordenação do Projeto Mais Médicos para o Brasil ficará a cargo dos Ministérios da Educação e da Saúde, que disciplinarão, por meio de ato conjunto dos Ministros de Estado da Educação e da Saúde, a forma de participação das instituições públicas de educação superior e as regras de funcionamento do Projeto, incluindo a carga horária, as hipóteses de afastamento e os recessos.

 

 

Após um período de descontinuação parcial, a política pública foi retomada por meio da Lei n. 13.958, de 18 de dezembro de 2019, que trouxe a seguinte disposição:

 

Art. 34. A Lei nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 23-A:

 

        “Art. 23-A Será reincorporado ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, na forma do inciso II do caput do art. 13 desta Lei, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos, o médico intercambista que atender cumulativamente aos seguintes requisitos:

 

        I - estar no exercício de suas atividades, no dia 13 de novembro de 2018, no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil, em razão do 80º Termo de Cooperação Técnica para implementação do Projeto Ampliação do Acesso da População Brasileira à Atenção Básica em Saúde, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde;

 

        II - ter sido desligado do Projeto Mais Médicos para o Brasil em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde para a oferta de médicos para esse Projeto; e

 

        III - ter permanecido no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio.”

 

 

 

Para a efetivação da política pública de saúde, o Ministério da Saúde, por intermédio da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, tem realizado o chamamento público para adesão de médicos ao programa de provimento do Ministério da Saúde – Projeto Mais Médicos para o Brasil, por meio da publicação de editais.

 

Não há novidade em se dizer que o edital é a lei interna da Administração ou mesmo a lei do concurso. Isso porque a vinculação ao edital, princípio de observância obrigatória pela Administração Pública, tem por objetivo assegurar a todos os interessados a impessoalidade, a legalidade e a moralidade no processamento dos atos administrativos, sendo vedado ao Judiciário intervir em tais situações, elegendo exceções às regras que integram o Edital. Dito de outra forma, não cabe ao Poder Judiciário substituir os critérios de seleção previstos em edital elaborado pela Administração Pública, quando estes estão em consonância com a lei, sob pena de violar a repartição de Poderes.

 

Assim, as exigências legais foram repetidas pelo Edital n. 9, de 26 de março de 2020, nos seguintes termos:

 

 “2. DOS REQUISITOS PARA REINCORPORAÇÃO AO PROJETO MAIS MÉDICOS PARA O BRASIL

2.1. Em atendimento ao disposto no art. 23-A da Lei nº 12.871/2013, serão reincorporados ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, na forma do inciso II do caput do art. 13 da Lei nº 12.871/ 2013, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos, o médico intercambista que atender cumulativamente aos seguintes requisitos:

I - estar no exercício de suas atividades, no dia 13 de novembro de 2018, no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil, em razão do 80º Termo de Cooperação Técnica para implementação do Projeto Ampliação do Acesso da População Brasileira à Atenção Básica em Saúde, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde;

II - ter sido desligado do Projeto Mais Médicos para o Brasil em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Organização PanAmericana da Saúde/Organização Mundial da Saúde para a oferta de médicos para esse Projeto; e

III - ter permanecido no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio.”

 

Já o Anexo II do mencionado Edital trouxe a seguinte disposição:

 

 “1.1. Este Edital tem por objeto realizar o chamamento público de médicos intercambistas, oriundos da cooperação internacional, indicados no Anexo II deste Edital, lista disponibilizada, no endereço eletrônico http://maismedicos.gov.br, que atendam aos requisitos do art. 23-A da Lei nº 12.871/2013, acrescido pelo art. 34 da Lei nº 13.958/2019, para manifestarem interesse na reincorporação ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos.”

 

O conteúdo do Edital é decisão que essencialmente integra o mérito administrativo, logo, resulta da discricionariedade da Administração a partir de um juízo de oportunidade e conveniência.

 

Conquanto não exista irregularidade na delegação legal ao ato editalício para a fixação das regras para a participação no programa, não há dúvida de que este não pode trazer exigência que extrapole os limites da legislação. Logo, a previsão de que o nome do candidato conste obrigatoriamente em lista específica deve ser desconsiderada, desde que atendidos aos requisitos previstos em lei. Nesse sentido, colaciono:

 

“PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA ANTECIPADA. PROJETO MAIS MÉDICOS PARA O BRASIL. REINCORPORAÇÃO DE PROFISSIONAIS CUBANOS. CERTAME PÚBLICO. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO.

1. A questão posta nos autos diz respeito à reincorporação de profissionais ao Projeto Mais Médicos para o Brasil.

2. A tutela provisória de urgência, em sua modalidade antecipada, objetiva adiantar a satisfação da medida pleiteada, garantindo a efetividade do direito material discutido. Para tanto, nos termos do art. 300 do atual Código de Processo Civil, exige-se, cumulativamente, a demonstração da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora).

3. O Projeto Mais Médicos para o Brasil, instituído pela Lei 12.871/13, estabeleceu uma cooperação entre Brasil e Cuba, com intermédio da Organização Pan-americana da Saúde – OPAS, cuja finalidade era atrair médicos cubanos para atuar no setor de Atenção Básica do Sistema Único de Saúde, em locais onde havia grave insuficiência de médicos brasileiros.

4. Houve descontinuação da política pública em nov/2018 e posterior retomada por meio da Lei 13.958/19. Em 2020, como parte das ações do Poder Público para enfrentamento da pandemia de COVID-19, foram publicados diversos editais de convocação para que alguns médicos intercambistas, expressamente indicados pelo instrumento convocatório conforme listas realizadas pela Organização Pan-americana da Saúde – OPAS, manifestassem seu interesse em concorrer às vagas disponibilizadas para o Projeto Mais Médicos para o Brasil.

5. Não se vislumbra razões idôneas para impedir que os impetrantes concorram às mencionadas vagas. A elaboração de uma lista fechada com indicação específica dos médicos aptos a participarem do certame, sem abertura de prazo para impugnação ou qualquer tipo de questionamento, e sem demonstração dos critérios adotados para seleção, caracteriza ato administrativo violador de direito líquido e certo dos impetrantes.

6. A mera participação na convocação não significa a atribuição da vaga, cabendo à própria Secretaria de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde verificar a implementação dos pressupostos a serem atendidos.

7. Não merece prosperar a alegação da agravante no sentido do não cumprimento do requisito previsto no art. 34, III, da Lei 13.958/19 pelos impetrantes. Isto porque a exigência de permanência em território nacional até a data da publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019 (posteriormente convertida em Lei 13.958/19) não pode ser lida de maneira excessivamente literal e desarrazoada.

8. Não há sentido no entendimento de que a estadia em solo brasileiro deva ter se operado de forma completamente ininterrupta, até porque não há obrigação expressa de que a permanência devesse ser necessariamente contínua.

9. Conclui-se que, não obstante algumas ausências pontuais, todos os impetrantes estavam em território brasileiro por ocasião da publicação da Medida Provisória nº 890/2019.

10. Tendo em vista que o Brasil ainda atravessa o estágio de aceleração descontrolada do número de casos de COVID-19, e considerando a necessidade de preservar a capacidade de absorção de nosso sistema de saúde, não há que se dispensar imotivadamente profissionais que pretendam exercer a medicina nos lugares mais vulneráveis do País.

11. Agravo de instrumento desprovido e embargos de declaração prejudicados.”                           

 

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5011900-69.2020.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal ANTONIO CARLOS CEDENHO, julgado em 07/08/2020, Intimação via sistema DATA: 12/08/2020) (Destaquei).

 

 

 

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. PROGRAMA MAIS MÉDICOS. LEI Nº 12.871/2013. TERMO DE COOPERAÇÃO ENTRE OPAS/OMS E MINISTÉRIO DA SAÚDE. PROFISSIONAIS CUBANOS. MÉDICOS INTERCAMBISTAS. REINCORPORAÇÃO. EXIGÊNCIA DE PERMANÊNCIA EM TERRITÓRIO NACIONAL. RECURSO DESPROVIDO.

- O Programa Mais Médicos foi instituído pela Lei nº 12.871/2013, oriunda da conversão da Medida Provisória nº 621/2013, com a finalidade de formar recursos humanos na área médica para o Sistema Único de Saúde- SUS.

- Em atendimento ao art. 23 da Lei nº 12.871/2013, foi firmado o Termo de Cooperação nº 80 entre a Organização Pan-Americana da Saúde/ Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) e o Ministério da Saúde. Em 14/11/2018, o Ministério da Saúde Pública de Cuba declarou a intenção de não mais integrar o projeto de cooperação do Programa Mais Médicos, iniciando operação de repatriação dos profissionais.

- Foi, então, publicada a Medida Provisória nº 890, de 01/08/2019, convertida na Lei nº 13.958/2019, que instituiu o Programa Médicos pelo Brasil. Tal lei, em seu art. 34, acresceu à Lei nº 12.871/13 o art. 23-A, que passou a prever a possibilidade de reincorporação do médico intercambista, bem como os respectivos critérios para tanto.

- Em cumprimento a tal dispositivo e em convergência com o Plano de Contingência Nacional- COVID 19, foi publicado o Edital nº 9/2020-SAPS/MS no intuito de realizar chamamento público de médicos intercambistas, oriundos de cooperação internacional, para reincorporação ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, desde que atendidos os requisitos legalmente previstos e que o profissional conste do Anexo II do Edital.

- No caso concreto, sustenta o autor que, a despeito de cumprir os requisitos exigidos por lei, seu nome não constou do Anexo II do Edital. Compulsando-se os autos de origem, verifica-se que a parte autora estava no exercício de suas atividades, em 13/11/2018, no âmbito do Programa Mais Médicos para o Brasil, encerrando suas atividades no Projeto em 30/11/2018. Assim, restaram cumpridos os requisitos constantes dos incisos I e II do art. 23-A da Lei nº 12.871/13.

- Quanto à condição imposta pelo inciso III do referido dispositivo legal, de fato, consta a informação de que a parte autora, até então lotada em Bandeirantes/MS, embarcou de volta para Cuba em 08/12/2018. Todavia, verifica-se dos autos subjacentes ao presente instrumento a existência de documentos que demonstram tanto a existência de vínculo do autor com o Brasil, quanto que, após sua repatriação, retornou e permaneceu no país.

- Vem entendendo a jurisprudência desta E. Corte que a exigência de permanência do profissional em território nacional, até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, não pode ser considerada de forma estritamente literal, inclusive em razão dos trâmites de repatriação promovidos pela República de Cuba. Assim, conclui-se que a imposição de permanência ininterrupta no Brasil não se mostra razoável ou proporcional. Precedentes.

- Agravo de instrumento desprovido.”                                   

 

(TRF 3ª Região, 3ª Turma, AI - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 5013806-60.2021.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal RUBENS ALEXANDRE ELIAS CALIXTO, julgado em 03/05/2024, DJEN DATA: 08/05/2024) (Destaquei).

 

 

Ademais, conforme constou na sentença recorrida, “a autora comprovou a condição de residente no País, conforme Carteira de Registro Nacional Migratório n. G374005-1 (ID 43300830), o que é indicativo de que permaneceu em território nacional até a publicação da MP n. 890/2019, na condição de residente temporário. Comprovou, ainda, a graduação em medicina, bem como sua participação no Projeto Mais Médicos para o Brasil, até o mês em que houve o encerrado do acordo de cooperação, em novembro de 2018 (ID’s 43301133/43301134 e 43301141)” (ID 275916708).

 

Portanto, de rigor a manutenção da sentença recorrida.

 

Em atenção ao disposto no artigo 85, § 11, do CPC, ficam os honorários advocatícios majorados em 1% (um por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo. 

 

Ante o exposto, nego provimento à apelação, observada a majoração recursal dos honorários advocatícios, na forma da fundamentação.

 

É como voto.



E M E N T A

APELAÇÃO. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. PROGRAMA MAIS MÉDICOS. REINCORPORAÇÃO. POSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA AOS REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. APELAÇÃO DESPROVIDA.

1. Como resultado da conversão da Medida Provisória nº 621/2013, a Lei nº 12.871/2013 instituiu o Programa Mais Médicos, tendo como um de seus principais objetivos diminuir a carência de médicos nas regiões prioritárias para o SUS, a fim de reduzir as desigualdades regionais na área da saúde (artigo 1º, I). No âmbito do referido Programa, foi instituído o Projeto Mais Médicos para o Brasil, com as suas características definidas pelo artigo 13 da legislação citada.

2. Após um período de descontinuação parcial, a política pública foi retomada por meio da Lei n. 13.958, de 18 de dezembro de 2019, que trouxe a seguinte disposição: “Art. 34. A Lei nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, passa a vigorar acrescida do seguinte art. 23-A:  “Art. 23-A Será reincorporado ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, na forma do inciso II do caput do art. 13 desta Lei, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos, o médico intercambista que atender cumulativamente aos seguintes requisitos: I - estar no exercício de suas atividades, no dia 13 de novembro de 2018, no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil, em razão do 80º Termo de Cooperação Técnica para implementação do Projeto Ampliação do Acesso da População Brasileira à Atenção Básica em Saúde, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde;  II - ter sido desligado do Projeto Mais Médicos para o Brasil em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde para a oferta de médicos para esse Projeto; e   III - ter permanecido no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio.”

3. Para a efetivação da política pública de saúde, o Ministério da Saúde, por intermédio da Secretaria de Atenção Primária à Saúde, tem realizado o chamamento público para adesão de médicos ao programa de provimento do Ministério da Saúde – Projeto Mais Médicos para o Brasil, por meio da publicação de editais.

4. Não há novidade em se dizer que o edital é a lei interna da Administração ou mesmo a lei do concurso. Isso porque a vinculação ao edital, princípio de observância obrigatória pela Administração Pública, tem por objetivo assegurar a todos os interessados a impessoalidade, a legalidade e a moralidade no processamento dos atos administrativos, sendo vedado ao Judiciário intervir em tais situações, elegendo exceções às regras que integram o Edital. Dito de outra forma, não cabe ao Poder Judiciário substituir os critérios de seleção previstos em edital elaborado pela Administração Pública, quando estes estão em consonância com a lei, sob pena de violar a repartição de Poderes.

5. Assim, as exigências legais foram repetidas pelo Edital n. 9, de 26 de março de 2020, nos seguintes termos:  “2. DOS REQUISITOS PARA REINCORPORAÇÃO AO PROJETO MAIS MÉDICOS PARA O BRASIL 2.1. Em atendimento ao disposto no art. 23-A da Lei nº 12.871/2013, serão reincorporados ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, na forma do inciso II do caput do art. 13 da Lei nº 12.871/ 2013, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos, o médico intercambista que atender cumulativamente aos seguintes requisitos: I - estar no exercício de suas atividades, no dia 13 de novembro de 2018, no âmbito do Projeto Mais Médicos para o Brasil, em razão do 80º Termo de Cooperação Técnica para implementação do Projeto Ampliação do Acesso da População Brasileira à Atenção Básica em Saúde, firmado entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde; II - ter sido desligado do Projeto Mais Médicos para o Brasil em virtude da ruptura do acordo de cooperação entre o Ministério da Saúde Pública de Cuba e a Organização PanAmericana da Saúde/Organização Mundial da Saúde para a oferta de médicos para esse Projeto; e III - ter permanecido no território nacional até a data de publicação da Medida Provisória nº 890, de 1º de agosto de 2019, na condição de naturalizado, residente ou com pedido de refúgio.” Já o Anexo II do mencionado Edital trouxe a seguinte disposição:  “1.1. Este Edital tem por objeto realizar o chamamento público de médicos intercambistas, oriundos da cooperação internacional, indicados no Anexo II deste Edital, lista disponibilizada, no endereço eletrônico http://maismedicos.gov.br, que atendam aos requisitos do art. 23-A da Lei nº 12.871/2013, acrescido pelo art. 34 da Lei nº 13.958/2019, para manifestarem interesse na reincorporação ao Projeto Mais Médicos para o Brasil, pelo prazo improrrogável de 2 (dois) anos”.

6. O conteúdo do Edital é decisão que essencialmente integra o mérito administrativo, logo, resulta da discricionariedade da Administração a partir de um juízo de oportunidade e conveniência.

7. Conquanto não exista irregularidade na delegação legal ao ato editalício para a fixação das regras para a participação no programa, não há dúvida de que este não pode trazer exigência que extrapole os limites da legislação. Logo, a previsão de que o nome do candidato conste obrigatoriamente em lista específica deve ser desconsiderada, desde que atendidos aos requisitos previstos em lei. Precedentes desta Corte.

8. Ademais, conforme constou na sentença recorrida, “a autora comprovou a condição de residente no País, conforme Carteira de Registro Nacional Migratório n. G374005-1 (ID 43300830), o que é indicativo de que permaneceu em território nacional até a publicação da MP n. 890/2019, na condição de residente temporário. Comprovou, ainda, a graduação em medicina, bem como sua participação no Projeto Mais Médicos para o Brasil, até o mês em que houve o encerrado do acordo de cooperação, em novembro de 2018 (ID’s 43301133/43301134 e 43301141)”.

9. De rigor a manutenção da sentença recorrida.

10. Em atenção ao disposto no artigo 85, § 11, do CPC, ficam os honorários advocatícios majorados em 1% (um por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo. 

11. Apelação desprovida.


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal