APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007538-43.2014.4.03.6104
RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA
APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO
APELADO: RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, JOSE CARLOS CEPERA, MAURICIO DE PAULO MANDUCA, LUCIO DE SOUZA DUTRA, WILSON VITORINO DE SOUZA, NATANAEL CRUVINEL DE SOUZA, PLURI SERVICOS LTDA, JANICE MARIA CEPERA, VALDEMICE DA SILVA LINO, MUNICIPIO DE PERUIBE
Advogado do(a) APELADO: ADELSON PAULO - SP156124-A
Advogados do(a) APELADO: BRAZ MARTINS NETO - SP32583-A, MARTILEIDE VIEIRA PERROTI - SP203711-A
Advogados do(a) APELADO: CINTHIA YARA ALVES DE OLIVEIRA - SP216852-A, DANIEL MARCOS PASTORIN - SP258675-A
Advogado do(a) APELADO: LEO LUIS DE MORAES MATIAS DAS CHAGAS - SP216922-A
OUTROS PARTICIPANTES:
FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007538-43.2014.4.03.6104 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO APELADO: RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, JOSE CARLOS CEPERA, MAURICIO DE PAULO MANDUCA, LUCIO DE SOUZA DUTRA, WILSON VITORINO DE SOUZA, NATANAEL CRUVINEL DE SOUZA, PLURI SERVICOS LTDA, JANICE MARIA CEPERA, VALDEMICE DA SILVA LINO, MUNICIPIO DE PERUIBE Advogado do(a) APELADO: ADELSON PAULO - SP156124-A OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Sr. Juiz Federal Convocado MARCELO GUERRA: trata-se de ação de improbidade administrativa cujo objeto é: (i) a obtenção de declaração que reconheça a nulidade do Pregão Presencial nº 11/2010 e, consequentemente, do contrato nº 40/2010 firmado entre o MUNICÍPIO DE PERUÍBE e a empresa O.O. LIMA EMPRESA LIMPADORA LTDA. (ii) o reconhecimento da prática de ato de improbidade administrativa que importa em enriquecimento ilícito (artigo 9º, caput, e inciso XII, da Lei nº 8.429/92), condenando, solidariamente, os réus RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, JOSÉ CARLOS CEPERA, MAURÍCIO DE PAULO MANDUCA, LÚCIO DE SOUZA DUTRA, WILSON VITORINO DE SOUZA, NATANAEL CRIVINEL DE SOUZA, O.O.LIMA EMPRESA LIMPADORA LTDA., JANICE MARIA EPERA, VALDEMICE DA SILA LINO, INTERATIVA SERVICE LTDA., BETA CLEAN & SERVICE LTDA, EMPRESA DEMAX SERVIÇOS E COMÉRCIO ao ressarcimento integral do dano e do acréscimo patrimonial por eles percebido, consistente na devolução de todos os valores pagos pelo Município de Peruíbe à empresa O.O. LIMA EMPRESA LIMPADORA LTDA., em decorrência do procedimento licitatório, Pregão Presencial n° 11/2010, com os imanentes consectários. (iii) o pagamento de multa civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial; perdas da função pública, se estiverem em seu exercício; a suspensão dos direitos políticos dos requeridos pessoas físicas, de oito a dez anos; a proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de dez anos (no artigo 12, inciso I, da Lei 8.429/92). (iv) subsidiariamente, o reconhecimento da prática de atos de improbidade administrativa que causem lesão ao erário ou que atentem contra os princípios da administração pública capitulados nos artigos 10 (incisos VIII e XII) e 11 (caput) da LIA, condenando os corréus às penas previstas nos incisos II ou III, do artigo 12 do mesmo diploma legal. Originalmente aforada perante a Justiça Estadual, em face da utilização de verba repassada pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE (em decorrência de convênio celebrado entre as duas entidades de direito público) para o pagamento da empresa O.O. Lima Limpadora Ltda., foram os autos remetidos à Justiça Federal. Regularmente processada, entendeu o MM. Juízo a quo por julgar improcedente a ação (ID 296585625), declarando extinto o processo com resolução de mérito, a teor do artigo 487, inciso I, do CPC. Da r. sentença apelou o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (ID 296585626) e, por adesão, o FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – FNDE (ID 296856628). Ofertadas as contrarrazões, subiram os autos ao E. TRF da 3ª Região, tendo o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ofertado parecer em ID 302228561. Apelação recebida no efeito meramente devolutivo (ID 302274043). Tendo em vista que a r. sentença monocrática foi proferida em 27/05/2024, ou seja, depois da Lei nº 14.230/2021, não se encontra submetida à remessa necessária (STJ, Tema nº 1.284, REsp nº 2.117.355, j. 11/06/2025, Rel. Min. Teodoro Silva Santos). É o relatório.
Advogados do(a) APELADO: BRAZ MARTINS NETO - SP32583-A, MARTILEIDE VIEIRA PERROTI - SP203711-A
Advogados do(a) APELADO: CINTHIA YARA ALVES DE OLIVEIRA - SP216852-A, DANIEL MARCOS PASTORIN - SP258675-A
Advogado do(a) APELADO: LEO LUIS DE MORAES MATIAS DAS CHAGAS - SP216922-A
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0007538-43.2014.4.03.6104 RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA APELANTE: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL, FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCACAO APELADO: RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, JOSE CARLOS CEPERA, MAURICIO DE PAULO MANDUCA, LUCIO DE SOUZA DUTRA, WILSON VITORINO DE SOUZA, NATANAEL CRUVINEL DE SOUZA, PLURI SERVICOS LTDA, JANICE MARIA CEPERA, VALDEMICE DA SILVA LINO, MUNICIPIO DE PERUIBE Advogado do(a) APELADO: ADELSON PAULO - SP156124-A OUTROS PARTICIPANTES: V O T O O Sr. Juiz Federal Convocado MARCELO GUERRA: os atos de improbidade administrativa e respectivas sanções são previstos pela Lei nº 8.429, de 02 de junho de 1992, com a redação dada pela Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021 que inseriu modificações relevantes no texto original, com destaque para a revogação dos preceitos que previam as condutas culposas. Aliás, mesmo antes do advento da Lei nº 14.230, algumas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal deixavam transparecer, ainda que indiretamente, um certo incômodo com a presença da modalidade culposa como elemento apto a configurar ato de improbidade administrativa. Nesse sentido, destaco: (i) no Tema nº 897 de Repercussão Geral (RE nº 852.475, julg. 03/03/2016, Rel. Min. Teori Zavascki), o STF rejeitou a tese da imprescritibilidade do ressarcimento para os atos culposos, mantendo apenas para os dolosos. Essa decisão foi pioneira em distinguir a gravidade e os efeitos jurídicos entre condutas cometidas com dolo, que evidenciam desonestidade e má-fé, daquelas imbuídas pela culpa, equivalente à falta de atenção e devido cuidado com o munus publico, inegavelmente menos graves. (ii) na ADI nº 6.678, em 27/10/2021 o Min. Gilmar Mendes proferiu decisão liminar (ainda não levada a Plenário), para conferir interpretação conforme à Constituição ao inciso II do art. 12 da Lei nº 8.429/1992, estabelecendo que a sanção de suspensão de direitos políticos não se aplica a atos de improbidade culposos que causem danos ao erário, bem como para suspender a vigência da expressão “suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos” do inciso III do referido art. 12. Essa sinalização culminou na edição da Lei nº 14.230, de 25 de outubro de 2021, que, como dito acima, extinguiu os preceitos que previam condutas culposas. Porém, como a norma não abordou expressamente as infrações cometidas antes da sua vigência, passou-se a questionar acerca dos seus efeitos sobre as ações findas e aquelas ainda em curso. Deveria haver retroatividade benigna? Afinal, é cânone do direito sancionador beneficiar o condenado no caso da lei deixar de qualificar uma conduta como sendo ilícita e passível de punição. De início, o STF editou o Tema nº 1.199 (ARE nº 843.989, j. 08/04/2022, Rel. Min. Alexandre de Moraes) que definiu que as alterações promovidas pela Lei nº 14.230 não se aplicam a atos de improbidade administrativa praticados antes de sua vigência quando a decisão estivesse finalizada (coisa julgada) ou em fase de execução de penas. Ficou assentado também, quanto à prescrição intercorrente objeto do art. 23, §5º da LIA, que o prazo de 4 (quatro) anos em relação às ações em curso teve início com a publicação da Lei nº 14.230, ou seja, 26/10/2021. Posteriormente, veio a lume o Tema nº 309 (RE nº 656.558, j. 28/10/2024, Rel. Min. Dias Toffoli) que reconheceu a inconstitucionalidade dos preceitos da Lei nº 8.429 que tipificavam a improbidade administrativa na modalidade culposa. Conforme a ementa do julgado (grifei): “Direito constitucional e administrativo. Improbidade administrativa. Necessidade de dolo. Inexigibilidade de licitação. Contratação pelos municípios de escritório de advocacia para patrocínio e defesa de causas perante os tribunais de contas estaduais. Requisitos. 1. O ato de improbidade administrativa deve ser entendido como ato violador do princípio constitucional da probidade administrativa, ou seja, aquele no qual o agente pratica o ato violando o dever de agir com honestidade. Isso é, o agente ímprobo atua com desonestidade, ao que se conectam a deslealdade e a má-fé. 2. Estando a desonestidade relacionada com o dolo, não é possível desvincular a improbidade administrativa, a qual depende da desonestidade, do referido elemento subjetivo, isso é, do dolo. Nessa toada, o dolo é necessário para a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa (art. 37, §4º, da Constituição Federal), sendo inconstitucional a modalidade culposa prevista nos arts. 5º e 10 da Lei nº 8.429/92, com sua redação originária. 3. No que diz respeito aos arts. 13, inciso V, e 25, inciso II, da Lei nº 8.666/93, deve-se ter em mente, como bem apontou o Ministro Roberto Barroso, que a disciplina constitucional da advocacia pública (arts. 131 e 132 da CF) impõe que, em regra, a assessoria jurídica das entidades federativas, tanto na vertente consultiva como na defesa em juízo, caiba aos advogados públicos. Excepcionalmente, caberá a contratação de advogados privados, desde que plenamente configurada a impossibilidade ou relevante inconveniência de que a atribuição seja exercida pelos membros da advocacia pública. 4. Ainda em relação aos dispositivos mencionados, insta realçar que, mesmo que a contratação direta envolva atuações de maior complexidade e responsabilidade, é necessário que a Administração Pública demonstre que os honorários ajustados se encontram dentro de uma faixa de razoabilidade, segundo os padrões do mercado, observadas as características próprias do serviço singular e o grau de especialização profissional. 5. Foram fixadas as seguintes teses de repercussão geral: “a) O dolo é necessário para a configuração de qualquer ato de improbidade administrativa (art. 37, §4º, da Constituição Federal), de modo que é inconstitucional a modalidade culposa de ato de improbidade administrativa prevista nos arts. 5º e 10 da Lei nº 8.429/92, em sua redação originária. b) São constitucionais os arts. 13, V, e 25, II, da Lei nº 8.666/1993, desde que interpretados no sentido de que a contratação direta de serviços advocatícios pela Administração Pública, por inexigibilidade de licitação, além dos critérios já previstos expressamente (necessidade de procedimento administrativo formal; notória especialização profissional; natureza singular do serviço), deve observar: (i) inadequação da prestação do serviço pelos integrantes do Poder Público; e (ii) cobrança de preço compatível com a responsabilidade profissional exigida pelo caso, observado, também, o valor médio cobrado pelo escritório de advocacia contratado em situações similares anteriores.” 6. RE nº 610.523/SP julgado prejudicado e RE nº 656.558/SP ao qual se dá provimento, restabelecendo-se a decisão em que se julgou improcedente a ação”. Nesse sentido, resta irrelevante a data em que o ato foi praticado (se antes ou depois da Lei nº 14.230), pois sendo na modalidade culposa, extinta deve ser a ação judicial que pleiteia a condenação do agente por suposta improbidade administrativa, em vista da inconstitucionalidade reconhecida pelo STF no Tema nº 309. Como sabido, as condutas que podem gerar condenação por improbidade administrativa estão descritas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei nº 8.429/1992. No que se refere à presença do elemento dolo, o STJ, inclusive em recurso repetitivo, vem decidindo ser necessária a presença do dolo específico para gerar condenação por improbidade, isso é, a vontade livre e consciente de atingir o resultado de dano ilícito, não bastando, portanto, o dolo genérico. Nesse sentido: "(...) O afastamento do elemento subjetivo de tal conduta dá-se em razão da dificuldade de identificar o dolo genérico, situação que foi alterada com a edição da Lei n. 14.230/2021, que conferiu tratamento mais rigoroso, ao estabelecer não mais o dolo genérico, mas o dolo específico como requisito para a caracterização do ato de improbidade administrativa, ex vi do seu art. 1º, §§ 2º e 3º, em que é necessário aferir a especial intenção desonesta do agente de violar o bem jurídico tutelado (...)" (STJ, 1ª Seção, REsp. nº 1.913.638, j. 11/05/2022, Rel. Min. Gurgel de Faria, grifei). "(...) Aplicabilidade das normas benéficas constantes na Lei 14.230/2021 aos processos em que ainda não houve o trânsito em julgado da decisão condenatória. Incidência da ratio decidendi constante no acórdão do ARE 843.989/PR (Tema 1.199), para além da revogação da modalidade culposa. Atual necessidade de dolo específico para a condenação por improbidade administrativa. Caso concreto em que a condenação, na origem, passou ao largo do reconhecimento do dolo e, portanto, com mais razão inexistirá uma "vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito" (art. 1º, §2º, da LIA)" (STJ, 1ª Turma, AgInt no AREsp nº 706.297, j. 07/04/2025, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues, grifei). O dolo específico, no caso da improbidade administrativa, é a vontade livre e consciente de praticar uma conduta imbuída pela má-fé e desonestidade, conduta essa que se encaixe em uma das descrições dos arts. 9º, 10 e 11 da LIA e que tenha uma finalidade específica. No caso do art. 9º, a finalidade é a obtenção de, pelo agente, de qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º da LIA. Em se tratando do art. 10, a finalidade da conduta é gerar perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º da LIA. Por fim, quanto ao art. 11, a finalidade é simplesmente atentar contra os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade. Quanto aos arts. 10 e 11, a motivação remota ou recôndita do agente é irrelevante, ou seja, não interessa se por detrás da conduta ilícita se escondia (ou não) o desejo de obter algum benefício financeiro ou patrimonial para si ou para outrem. Obviamente, é de se presumir que alguma motivação remota sempre exista, pois, salvo casos de desordem mental, ninguém iria praticar um ato tipificado como improbidade administrativa apenas pelo “prazer” de prejudicar a Administração Pública. Todavia, para fins de condenação, em meu sentir, não é necessário identificar nos autos esse elemento remoto. Após a Lei nº 14.230/2021, para que ocorra condenação com base no art. 9º da LIA, além do dolo específico, é necessário haver prova de que o agente público obteve vantagem patrimonial ilícita pelo cometimento de uma das condutas expressas em seus incisos. É possível a condenação de alguém que não seja agente público, caso induza ou concorra dolosamente para a prática do ato de improbidade (art. 3º da LIA). A redação atual do art. 9º é a seguinte (grifei): “Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público; II - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem móvel ou imóvel, ou a contratação de serviços pelas entidades referidas no art. 1° por preço superior ao valor de mercado; III - perceber vantagem econômica, direta ou indireta, para facilitar a alienação, permuta ou locação de bem público ou o fornecimento de serviço por ente estatal por preço inferior ao valor de mercado; IV - utilizar, em obra ou serviço particular, qualquer bem móvel, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta Lei, bem como o trabalho de servidores, de empregados ou de terceiros contratados por essas entidades; V - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para tolerar a exploração ou a prática de jogos de azar, de lenocínio, de narcotráfico, de contrabando, de usura ou de qualquer outra atividade ilícita, ou aceitar promessa de tal vantagem; VI - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indireta, para fazer declaração falsa sobre qualquer dado técnico que envolva obras públicas ou qualquer outro serviço ou sobre quantidade, peso, medida, qualidade ou característica de mercadorias ou bens fornecidos a qualquer das entidades referidas no art. 1º desta Lei; VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, de cargo, de emprego ou de função pública, e em razão deles, bens de qualquer natureza, decorrentes dos atos descritos no caput deste artigo, cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público, assegurada a demonstração pelo agente da licitude da origem dessa evolução; VIII - aceitar emprego, comissão ou exercer atividade de consultoria ou assessoramento para pessoa física ou jurídica que tenha interesse suscetível de ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público, durante a atividade; IX - perceber vantagem econômica para intermediar a liberação ou aplicação de verba pública de qualquer natureza; X - receber vantagem econômica de qualquer natureza, direta ou indiretamente, para omitir ato de ofício, providência ou declaração a que esteja obrigado; XI - incorporar, por qualquer forma, ao seu patrimônio bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei; XII - usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1° desta lei”. Após a Lei nº 14.230/2021, para a condenação por uma das condutas do art. 10 da LIA, além do dolo específico, passou-se a exigir prova efetiva do dano efetivo ao erário. Noutras palavras, não mais prevalece as teses que defendiam a configuração do dano in re ipsa. A nova redação do art. 10 da Lei nº 8.249/1992 não deixa margem à dúvida: “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei, e notadamente: I - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a indevida incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, de rendas, de verbas ou de valores integrantes do acervo patrimonial das entidades referidas no art. 1º desta Lei; II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; III - doar à pessoa física ou jurídica bem como ao ente despersonalizado, ainda que de fins educativos ou assistências, bens, rendas, verbas ou valores do patrimônio de qualquer das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem observância das formalidades legais e regulamentares aplicáveis à espécie; IV - permitir ou facilitar a alienação, permuta ou locação de bem integrante do patrimônio de qualquer das entidades referidas no art. 1º desta lei, ou ainda a prestação de serviço por parte delas, por preço inferior ao de mercado; V - permitir ou facilitar a aquisição, permuta ou locação de bem ou serviço por preço superior ao de mercado; VI - realizar operação financeira sem observância das normas legais e regulamentares ou aceitar garantia insuficiente ou inidônea; VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; VIII - frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente, acarretando perda patrimonial efetiva; IX - ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou regulamento; X - agir ilicitamente na arrecadação de tributo ou de renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público; XI - liberar verba pública sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XII - permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente; XIII - permitir que se utilize, em obra ou serviço particular, veículos, máquinas, equipamentos ou material de qualquer natureza, de propriedade ou à disposição de qualquer das entidades mencionadas no art. 1° desta lei, bem como o trabalho de servidor público, empregados ou terceiros contratados por essas entidades. XIV – celebrar contrato ou outro instrumento que tenha por objeto a prestação de serviços públicos por meio da gestão associada sem observar as formalidades previstas na lei; XV – celebrar contrato de rateio de consórcio público sem suficiente e prévia dotação orçamentária, ou sem observar as formalidades previstas na lei. XVI - facilitar ou concorrer, por qualquer forma, para a incorporação, ao patrimônio particular de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores públicos transferidos pela administração pública a entidades privadas mediante celebração de parcerias, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; XVII - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores públicos transferidos pela administração pública a entidade privada mediante celebração de parcerias, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; XVIII - celebrar parcerias da administração pública com entidades privadas sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; XIX - agir para a configuração de ilícito na celebração, na fiscalização e na análise das prestações de contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas; XX - liberar recursos de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas sem a estrita observância das normas pertinentes ou influir de qualquer forma para a sua aplicação irregular; XXI - (revogado); XXII - conceder, aplicar ou manter benefício financeiro ou tributário contrário ao que dispõem o caput e o § 1º do art. 8º-A da Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. § 1º Nos casos em que a inobservância de formalidades legais ou regulamentares não implicar perda patrimonial efetiva, não ocorrerá imposição de ressarcimento, vedado o enriquecimento sem causa das entidades referidas no art. 1º desta Lei. § 2º A mera perda patrimonial decorrente da atividade econômica não acarretará improbidade administrativa, salvo se comprovado ato doloso praticado com essa finalidade”. Com relação ao art. 11 da LIA, é certo que para a condenação pela prática das condutas nele descritas, mesmo após a Lei nº 14.230, basta existir o dolo específico, não sendo necessário haver prova de dano efetivo ao patrimônio público. Porém, mesmo nessas situações, o §4º do art. 11 exige que haja lesividade relevante ao bem jurídico tutelado, ou seja, cabe ao magistrado analisar a magnitude da lesão ocorrida em cada caso concreto. Além disso, não é mais possível eventual responsabilização do agente por violação genérica aos princípios administrativos indicados no caput do art. 11. A redação legal é a seguinte (grifei): “Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas: I - (revogado); II - (revogado); III - revelar fato ou circunstância de que tem ciência em razão das atribuições e que deva permanecer em segredo, propiciando beneficiamento por informação privilegiada ou colocando em risco a segurança da sociedade e do Estado; IV - negar publicidade aos atos oficiais, exceto em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado ou de outras hipóteses instituídas em lei; V - frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros; VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades; VII - revelar ou permitir que chegue ao conhecimento de terceiro, antes da respectiva divulgação oficial, teor de medida política ou econômica capaz de afetar o preço de mercadoria, bem ou serviço. VIII - descumprir as normas relativas à celebração, fiscalização e aprovação de contas de parcerias firmadas pela administração pública com entidades privadas. IX - (revogado); X - (revogado); XI - nomear cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas; XII - praticar, no âmbito da administração pública e com recursos do erário, ato de publicidade que contrarie o disposto no § 1º do art. 37 da Constituição Federal, de forma a promover inequívoco enaltecimento do agente público e personalização de atos, de programas, de obras, de serviços ou de campanhas dos órgãos públicos. § 1º Nos termos da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, promulgada pelo Decreto nº 5.687, de 31 de janeiro de 2006, somente haverá improbidade administrativa, na aplicação deste artigo, quando for comprovado na conduta funcional do agente público o fim de obter proveito ou benefício indevido para si ou para outra pessoa ou entidade. § 2º Aplica-se o disposto no § 1º deste artigo a quaisquer atos de improbidade administrativa tipificados nesta Lei e em leis especiais e a quaisquer outros tipos especiais de improbidade administrativa instituídos por lei. § 3º O enquadramento de conduta funcional na categoria de que trata este artigo pressupõe a demonstração objetiva da prática de ilegalidade no exercício da função pública, com a indicação das normas constitucionais, legais ou infralegais violadas. § 4º Os atos de improbidade de que trata este artigo exigem lesividade relevante ao bem jurídico tutelado para serem passíveis de sancionamento e independem do reconhecimento da produção de danos ao erário e de enriquecimento ilícito dos agentes públicos. § 5º Não se configurará improbidade a mera nomeação ou indicação política por parte dos detentores de mandatos eletivos, sendo necessária a aferição de dolo com finalidade ilícita por parte do agente” (grifei). É de se ressaltar que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que as novas regras trazidas pela Lei nº 14.230/2021 são aplicáveis às ações em curso quando da sua edição, ou seja, 26/10/2021. Destaco os seguintes julgamentos: “ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. APLICABILIDADE DA LEI 14.230/2021. TEMA 1.199/STF. SUPERVENIÊNCIA DA ALTERAÇÃO DO ENTENDIMENTO DESTA CORTE. FRUSTRAÇÃO DE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. ATUAL L NECESSIDADE DE DANO EFETIVO (ART. 10, VIII, LIA). AUSÊNCIA. ATIPICIDADE. CONTINUIDADE TÍPICO-NORMATIVA. IMPRESCINDIBILIDADE DO DOLO ESPECÍFICO (ART. 11, V, LIA). MATÉRIA FÁTICA. CONFORMAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Aplicabilidade das normas benéficas constantes na Lei 14.230/2021 aos processos em que ainda não houve o trânsito em julgado da decisão condenatória. Alteração do entendimento desta Primeira Turma após a prolação da decisão agravada. 2. A atual redação do art. 10 da Lei de Improbidade Administrativa (LIA), com as alterações advindas da Lei 14.230/2021, passou a exigir a comprovação da perda patrimonial efetiva para a configuração da improbidade administrativa. Reconhecimento no acórdão recorrido da inexistência de dano. Atipicidade da conduta. 3. Alteração do caput do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa pela Lei 14.230/2021, afastando-se a hipótese de responsabilização por violação genérica aos princípios administrativos. Fundamentação do acórdão a potencialmente permitir a tipificação do atual inciso V do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa. Princípio da continuidade típico-normativa. Necessidade de retorno para juízo de conformação. 4. Agravo interno a que se dá parcial provimento” (STJ, 1ª Turma, AgInt no AgInt no AgInt no REsp nº 1.383.628, j. 15/10/2024, Rel. Min. Paulo Sérgio, grifei). “PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LICITAÇÃO PÚBLICA. DISPENSA. DANO PRESUMIDO. CONSTRUÇÃO JURISPRUDENCIAL. LEI N. 14.230/2021. PREVISÃO NORMATIVA EXPRESSA. EXIGÊNCIA DE PERDA PATRIMONIAL EFETIVA. TEMA N. 1.199 DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF. RETROATIVIDADE. ATIPICIDADE DA CONDUTA. PUNIBILIDADE EXTINTA. (...) VII - Alinhado ao entendimento do Supremo Tribunal Federal, esta Corte Superior tem se posicionado não só pela aplicação imediata da Lei n. 14.230/2021 aos processos em curso, sem trânsito em julgado, mas também de que o novel requisito da perda patrimonial efetiva deve ser imediatamente aplicado nos processos em curso, destacando que o entendimento anterior acerca da possibilidade de condenação com base no dano presumido tratava-se de construção jurisprudencial que passou a se incompatibilizar com a nova lei. Veja-se a ementa do julgado desta Corte Superior: (REsp n. 1.929.685/TO, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/8/2024, DJe de 2/9/2024). VIII - O novo requisito da perda patrimonial efetiva para que se caracterize a frustração da licitude de processo licitatório como ato que causa lesão ao erário, nos moldes da Lei n. 14.230/2021, propicia a sua imediata aplicação aos atos praticados na vigência do texto anterior da lei, desde que sem condenação com trânsito em julgado” (STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp nº 1.568.466, j. 12/03/2025, Rel. Min. Francisco Falcão, grifei). “ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CONTRATAÇÃO DIRETA DE ESCRITÓRIO DE ADVOCACIA. FRUSTRAÇÃO À LICITUDE DO PROCESSO LICITATÓ-RIO. DANO PRESUMIDO (IN RE IPSA). CONSTRUÇÃO JURISPRUDENCIAL. SUPERVENIÊNCIA DA LEI N. 14.230/2021. EXIGÊNCIA DE PERDA PATRIMONIAL EFETIVA. TEMA 1.199/STF. RETROATIVIDADE. ABOLITIO. PUNIBILIDADE EXTINTA. RECURSO PREJUDICADO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA PREJUDICADOS. 1. A conduta de frustrar a licitude de processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente, tipificada no art. 10, inciso VIII, da Lei n. 8.429/1992, com a redação alterada pela Lei n. 14.230/2021, além de prever exclusivamente o dolo, passou a exigir a comprovação de perda patrimonial efetiva para caracterização como ato que causa lesão ao erário. 2. A possibilidade de condenação com base em dano presumido (in re ipsa) era fruto de entendimento jurisprudencial, que não mais se coaduna com a nova disposição legal da matéria. 3. Apesar de o Tema 1199 do STF não tratar especificamente da retroatividade de tal dispositivo, impõe-se a sua aplicação no caso para reconhecer a atipicidade superveniente da conduta baseada exclusivamente em dano presumido ao erário. Precedentes das duas Turmas de Direito Público do STJ. 4. Julgada extinta a punibilidade do embargante em razão da superveniente atipicidade da conduta a ele imputada; e, por conseguinte, julgado prejudicados os embargos de divergência” (STJ, 1ª Seção, EREsp 1.288.585, j. 27/11/2024, Rel. Min. Teodoro Silva, grifei). Prosseguindo, a quanto ao reexame necessário, é oportuno consignar que após a Lei nº 14.230/2021, que inseriu ao art. 17 da Lei nº 8.249/1992, o §19, inciso IV, restou extinta essa providência nas ações de improbidade administrativa. Portanto, as sentenças de improcedência ou de extinção do processo sem julgamento do mérito proferidas posteriormente a 25/10/2021 não se submetem ao reexame necessário. Todavia, a sistemática do reexame permanece em relação às sentenças anteriores à aludida data. Nesse sentido: Superior Tribunal de Justiça, Tema nº 1.284, REsp nº 2.117.355, j. 11/06/2025, Rel. Min. Teodoro Silva Santos. O respeito à orientação jurisprudencial, notadamente os precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, é medida que privilegia a segurança jurídica, na modalidade de previsibilidade das decisões judiciais, elemento que auxilia os jurisdicionados a decidirem acerca de sua atuação perante a lei. Aliás, o art. 489, § 1º, VI, do CPC considera não fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. O preceito acima é complementado pelo art. 927 do CPC que, em síntese, determina ser obrigatório aos juízes e Tribunais observarem: as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade (inciso I); os enunciados de súmula vinculante (inciso II); os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos (inciso III); os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitucional (inciso IV); a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados (inciso V). Em resumo, do que acima foi exposto, conclui-se o seguinte: 1) tratando-se de conduta culposa, deve ser extinta a ação judicial que pleiteia a condenação do agente por suposta improbidade administrativa, independentemente da data da prática delituosa, salvo casos em que a condenação já tenha transitado em julgado. 2) as modificações trazidas pela Lei nº 14.230/2021 são aplicáveis às ações em curso quando da sua edição, o que se deu em 25/10/2021. 3) a condenação por improbidade administrativa com base nas hipóteses dos arts. 9º, 10 e 11 da LIA requer a presença de dolo específico (não bastando o dolo genérico), sendo que: 3.1) para o art. 9º é preciso existir prova de obtenção de vantagem patrimonial indevida por parte do agente público ou, se terceiro, de ter contribuído dolosamente para que isso ocorresse; 3.2) para o art. 10 é necessário haver prova de dano efetivo ao erário (numericamente quantificado), não se podendo mais falar do dano in re ipsa. 3.3) para o art. 11, em que pese não se requerer prova do dano efetivo, é indispensável a ocorrência de lesividade relevante ao bem jurídico tutelado. Não havendo essa relevância, a ação improcede. 4) após a alteração do caput do art. 11 da LIA pela Lei nº 14.230/2021, afastou-se a possibilidade de responsabilização por violação genérica aos princípios administrativos. 5) quanto à prescrição intercorrente objeto do art. 23, §5º da LIA, o prazo de 4 (quatro) anos em relação às ações em curso teve início com a publicação da Lei nº 14.230, ou seja, 25/10/2021. 6) submetem-se ao reexame necessário apenas as sentenças de improcedência ou de extinção do processo sem julgamento do mérito proferidas anteriormente a 25/10/2021. Pois bem, a alega o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL em sua apelação de ID 296585626: - a exordial demonstra a existência de um verdadeiro esquema fraudulento envolvendo os demandados que armaram um esquema de fraude à licitação relacionada ao contrato nº 40/2010 (fls. 1003/1012 – vol. 5 do ICP), decorrente do pregão presencial nº 11/2010 (fls. 1001/1002 – vol. 5 do ICP), destinado à contratação de empresa de limpeza para execução de serviços em escolas públicas do Município de Peruíbe/SP. - houve demonstração de verdadeiro conluio entre funcionário público municipal e particulares que se beneficiaram do ato de improbidade perpetrado. - o acórdão proferido pela 15ª Câmara de Direito Criminal do TJSP em desfavor dos corréus NATANAEL CRUVINEL DE SOUZA, LUCIO DE SOUZA DUTRA, WILSON VITORINO DE SOUZA, MAURICIO DE PAULO MANDUCA e JOSÉ CARLOS CEPERA não deixa quaisquer dúvidas quanto à formação de quadrilha para fraudar licitações em Peruíbe, em relação ao Contrato nº 40/2010, decorrente do Pregão Presencial (Aviso de Licitação nº 11/2010). - o Juízo a quo entendeu que "o dolo específico em toda sua extensão e direcionado às modificações ilícitas no edital" não teria restado demonstrado, assim como não teria restado configurado o prejuízo ao patrimônio público, "imprescindível na espécie". - o Supremo Tribunal Federal, ao julgar o ARE 843989-RG (Tema 1.199), consignou expressamente que a retroatividade da Lei 14.230/21 somente se dará, nos processos em curso, em face de atos de improbidade CULPOSOS, cabendo ao Juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente. - entendeu o Supremo Tribunal Federal que a irretroatividade normativa que determina que a lei não pode retroagir para prejudicar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada (inciso XXXVI do artigo 5ª da CF e artigo 6° da LINDB), é fruto da segurança jurídica e do Estado de Direito, de modo que pode ser afastada, a permitir a retroatividade, apenas no caso da lei penal mais benéfica, pois se trata de expressa e excepcional previsão constitucional. Assinalou, ainda, que a Lei 14.230/2021 não preconizou a retroatividade de suas disposições e, por não prever expressamente a retroação, acolheu a regra da necessidade de aplicação da lei vigente à época dos fatos - tempus regit actum. - conquanto a alteração da Lei 8.429/92, dada pela Lei 14.230/21, tenha revogado o artigo 11, tal revogação não é suficiente para suprimir a imputação contra os réus. Trata-se de dispositivo que estava em plena vigência ao tempo dos fatos, aplicável à espécie. - as profundas modificações promovidas pela Lei 14.230/2021 no artigo 11 da LIA, não podem ser aplicadas ao caso presente, conforme já explanado. - a apresentação desta tese recursal se fez necessária tendo em vista que a petição inicial do caso concreto imputou aos réus/apelados também a prática dos atos de improbidade administrativa tipificados no artigo 11 da Lei 8.429/92 (redação anterior à reforma), o que deve ser objeto de consideração por este Tribunal no julgamento deste apelo. - mesmo que não se adote o entendimento de irretroatividade da Lei nº 14.230/2021, fato é que os novos dispositivos do referido diploma legal devem ser interpretados à luz do microssistema da tutela da probidade, em harmonia com a Constituição Federal e sua proteção conferida à tutela da probidade, no princípio republicano e no Estado Democrático, assegurados direitos e garantias fundamentais aos investigados/acusados, como sistema administrativo sancionador, bem como à luz de Convenções Internacionais contra a Corrupção, internalizadas no Direito Brasileiro (OCDE, OEA e ONU). - quanto ao dolo, os atos de improbidade administrativa previstos nos artigos 9º a 11 da Lei 8.429/92 não contêm, em suas descrições, qualquer requisito ligado à necessidade de uma finalidade específica visada pelo agente, tratando-se de infrações que se enquadrariam no que a doutrina penalista considera como dolo genérico. - não é necessário que o ato seja praticado com a intenção específica de gerar enriquecimento ilícito ou causar prejuízo, bastando que a intenção do agente esteja voltada à prática dos atos que se encontram tipificados como de improbidade administrativa que geram enriquecimento ou causam prejuízo (ou contrariam princípios). - o apelante requereu a juntada aos autos do ofício nº 413/2016 do GAECO, que encaminha acórdão proferido no processo de tomada de contas nº 594/012/10, bem como outros documentos relacionados ao contrato nº 40/2010, salientando-se que, da leitura dos documentos, depreende-se que o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo julgou irregulares o pregão presencial nº 11/2010 e o decorrente contrato nº 40/2010. - aplica-se o entendimento fixado pela jurisprudência de que "A fraude à licitação tem como consequência o chamado dano in re ipsa, reconhecido em julgados que bem se amoldam à espécie" (vide STJ. AREsp 419.769/SC, rel. min. Herman Benjamin, 2ª Turma, julgado em 18/10/2016, DJe 25/10/2016). É que o dano ao erário é inerente ao próprio ato ímprobo, ante o fato de o Poder Público ter deixado de contratar a melhor proposta, caso o procedimento licitatório em tela tivesse ocorrido sem irregularidades. - há trechos das interceptações telefônicas e de e-mail (ID 12410798, p. 153 e seg.) que comprovam a participação de RODRIGO, Secretário Municipal de Peruíbe, na fraude à licitação do Contrato nº 40/2010, decorrente do pregão presencial nº 11/2010, realizada pelo Município de Peruíbe. - participação do apelado RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, funcionário público da Prefeitura de Peruíbe/SP, restou clara através da gravação transcrita à fl. 000009 da denúncia – VOL. 1, sendo que não há que se falar em seu desconhecimento sobre a fraude ou não participação. Inclusive, na petição inicial, houve menção expressa de sua conduta que contribuiu diretamente para a celebração do contrato, o que evidencia o nexo causal. - o apelado RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, como Secretário Municipal de Peruíbe, tinha poder de decisão sobre a homologação da licitação e adjudicação de seu objeto e contribuiu ativamente para a perpetração do mal ao erário. Quanto à presença de dolo específico, restou consignado na r. sentença monocrática que (grifei): “Com o advento da nova lei, portanto, não basta a culpa ou o dolo genérico de praticar algumas das condutas previstas nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA. É necessário o dolo específico. Dolo é a conduta de má-fé, desonesta, não se confunde com a mera irregularidade, ou a ilegalidade, ou mesmo com a negligência, a desídia, a inaptidão ou a incompetência. Imprescindível, pois, a efetiva demonstração do elemento subjetivo para a caracterização da improbidade administrativa. (....) De fato, o v. acórdão proferido pela 15ª Câmara de Direito Criminal do E. T.J.S.P. (id 14425448) em desfavor dos ora correús NATANAEL CRUVINEL DE SOUZA, LUCIO DE SOUZA DUTRA, WILSON VITORINO DE SOUZA, MAURICIO DE PAULO MANDUCA e JOSÉ CARLOS CEPERA merece total prestígio e não deixa quaisquer dúvidas quanto a formação de quadrilha para fraudar licitações em diversos municípios do Estado de São Paulo, entre eles, o de Peruíbe, mediante a corrupção de agentes políticos e servidores públicos responsáveis pela deflagração e condução dos procedimentos licitatórios. Com efeito, apesar de volumosas as provas que representam um grandioso trabalho desenvolvido pelos órgãos de inteligência da autoridade policial e do Ministério Público para desbaratar a complexa estrutura e abrangência do grupo por eles formado, não restou inequivocamente demonstrado, em relação ao Contrato nº 40/2010, decorrente do Pregão Presencial (Aviso de Licitação nº 11/2010), o dolo específico em toda sua extensão e direcionado às modificações ilícitas no edital ou mesmo quais teriam sido elas, tampouco o aliciamento de demais participantes. De igual modo, o prejuízo ao patrimônio público, imprescindível na espécie". Aliás, o MM. Juízo a quo colocou em dúvida fundada a participação do corréu RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, único agente público demandado que não foi processado/condenado pela 15ª Câmara de Direito Criminal do E. T.J.S.P. Nesse tópico, destacou a r. sentença (grifei): “Quanto a autoria de rodrigo, há dúvidas, sentença. E mais. Mesmo após concluída a fase instrutória, sequer restou comprovada, seguramente, a participação e o vínculo do corréu RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA, secretário de assuntos jurídicos à época dos fatos, com a atacada contratação. Ademais, a portaria de instauração do ICP nº 43.0375.0000049/10-6 (id 12411692, pg. 50) produzida com base em conversar telefônicas monitoradas indicava, igualmente, a "possibilidade" de a pessoa Rodrigo, mencionada nas escutas, ser o secretário municipal, incluído como corréu na presente ação por mera inferência, sem lastro probatório suficiente e capaz de identifica-lo como coautor dos ilícitos. Senão parte ilegítima, após a ampla produção probatória, não foram evidenciados elementos concretos que demonstrassem a existência de indícios suficientes acerca da autoria de RODRIGO CORREA DA COSTA OLIVEIRA (responsabilidade do agente) e da materialidade da conduta desonesta, abalando assim o nexo de causalidade entre o ato ímprobo a ele imputado e o resultado do pregão presencial objeto dos autos. (...) Tais interceptações, em que pesem revelar indícios de graves irregularidades, as demais provas não identificam, tampouco demonstram, categoricamente, a efetiva participação do então secretário municipal para a perpetração da fraude no processo licitatório, seja procedendo eventuais modificações ilícitas nos editais ou mesmo participando do aliciamento de empresas para o fim de acordos”. Prosseguindo, não há prova de que o erário tenha sido lesado no presente caso, o que, sob a nova sistemática da LIA, é essencial de ser demonstrado. Mais uma vez, conforme consta da r. sentença a quo (grifei): “Ressalto, de outro lado, que a parte autora não traz qualquer notíca/elemento a demonstrar o descumprimento contratual, a ausência de execução do objeto licitado, ou ainda eventual contratação apoiada em preço inadequado. A menção genérica a lesão ao erário, como se viu, não tem o condão de comprovar o prejuízo efetivo aos cofres públicos. (...) Cumpre lembrar que o recebimento da inicial, na hipótese, se deu sob a égide da Lei nº 8.429/92, na redação anterior à dada pela Lei nº 14.230/2021, quando vigorava o entendimento de que a prova definitiva da conduta ímproba (artigos 9º, 10 e 11 da LIA) não era condição necessária para o recebimento da petição inicial da ação de improbidade administrativa. Bastavam indícios verossímeis de sua ocorrência no plano material e de autoria (Lei nº 8.429/92, artigo 17, § 6º), que poderiam ser confirmados ou desqualificados no transcorrer da instrução probatória, a qual tinha, obviamente, a finalidade de apresentação de provas e o exercício do contraditório e da ampla defesa, bem como a verificação da existência dos elementos subjetivos (dolo, má-fé e culpa). Destaco, a propósito, que na fase inicial desta ação vigorava o princípio do in dubio pro societate, a fim de preservar o interesse público. Hoje, jurisprudência e doutrina caminham noutro sentido, sobretudo com as modificações introduzidas na Lei nº 8.429/92. Não obstante a gravidade e o elevado grau de reprovabilidade das condutas retratadas no acervo probatório coligido, a petição inicial encontra-se repousada em afirmações genéricas e abstratas, incapaz de reunir elementos de prova suficientes para macular o contrato objeto dos autos, no qual mostra-se incerta a figura do (único) agente público que teria auxiliado na definição de detalhes sobre o edital ou mesmo que tivesse garantido a inserção ou a retirada de cláusulas que pudessem favorecer a empresa O.O. LIMA EMPRESA LIMPADORA LTDA”. Em meu sentir, a fundamentação desenvolvida pelo MM. Juízo monocrático é adequada e suficiente para chegar às conclusões que expôs na r. sentença, ainda mais porque conjugou os elementos de prova com as novas disposições da Lei nº 14.230 e o entendimento jurisprudencial prevalecente a respeito. Portanto, não havendo prova da pratica de conduta inspirada por dolo específico, nem de ocorrência de dano quantificado ao erário, resta sem relevância jurídica, para fins de constatação de improbidade administrativa nos presentes autos, a existência de um suposto esquema fraudulento criado para fraudar a licitação relacionada ao contrato nº 40/2010. No mesmo ponto, igualmente não é relevante o desenlace da questão criminal, eis que regida por legislação diversa, ou seja, não adota os mesmos pressupostos de configuração do delito, ressaltando que, ao menos em face do art. 10 da LIA, não se concebe ato de improbidade de “mera conduta”, desacompanhado de prova de dano ao erário. Dessa maneira, não estão configuras as hipóteses do art. 9º caput e inciso XII, do art. 10, incisos VIII e XII e art. 11 caput, todos da LIA. Aliás, como visto acima, após a Lei nº 14.230/202 não há mais possibilidade de condenação por improbidade administrativa baseada em conduta contrária exclusivamente aos princípios administrativos elencados no caput do art. 11 da LIA. Posto isso, voto no sentido de negar provimento às apelações interpostas pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e pelo FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO – FNDE.
Advogados do(a) APELADO: BRAZ MARTINS NETO - SP32583-A, MARTILEIDE VIEIRA PERROTI - SP203711-A
Advogados do(a) APELADO: CINTHIA YARA ALVES DE OLIVEIRA - SP216852-A, DANIEL MARCOS PASTORIN - SP258675-A
Advogado do(a) APELADO: LEO LUIS DE MORAES MATIAS DAS CHAGAS - SP216922-A
E M E N T A
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PEDIDO DE CONDENAÇÃO COM BASE NA LEI Nº 8.429/1992 ANTES DAS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS PELA LEI Nº 14.230/2021. NULIDADE DO PREGÃO PRESENCIAL Nº 11/2010 E DO CONTRATO DE LIMPEZA DE ESCOLAS Nº 40/2010 REALIZADO PELA PREFEITURA DE PERUÍBE-SP. VERBAS REPASSADAS PELO FNDE. ACUSAÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA PELOS ARTS. 9º, CAPUT E INCISO XII, 10, INCISOS VIII E XII E 11, TODOS DA LIA. AUSÊNCIA DE PROVA DE DOLO ESPECÍFICO E DE DANO EFETIVO AO ERÁRIO. NEGADO PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DO MPF E DO FNDE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA MONOCRÁTICA.
1. A Lei nº 14.230/2021, de 25/10/2021, ao introduzir alterações na Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA), revogou as condutas que previam a possibilidade de condenação a partir da prática de conduta culposa. Posteriormente, em 28/10/2024, o C. Supremo Tribunal Federal foi além e considerou inconstitucionais os preceitos da LIA que previam sancionamento com base na culpa (Tema nº 309).
2. O C. Supremo Tribunal Federal, em 04/04/2022, no julgamento do Tema nº 1.119, decidiu que as alterações promovidas pela Lei nº 14.230 não se aplicam a atos de improbidade administrativa praticados antes de sua vigência quando a decisão estiver finalizada (coisa julgada) ou em fase de execução de penas. “Mutatis mutandis”, ausentes tais circunstâncias, é aplicável a lei nova mais benigna. No mesmo Tema nº 1.119 ficou assentado que a prescrição intercorrente, objeto da nova redação do art. 23, §5º da LIA, em relação às ações em curso, teve início com a publicação da Lei nº 14.230, ou seja, 26/10/2021.
3. Segundo o C. Superior Tribunal de Justiça, as modificações trazidas pela Lei nº 14.230/2021 são aplicáveis às ações em curso (retroatividade benigna), bem como é necessária, em quaisquer das hipóteses dos arts. 9º, 10 e 11 da LIA, a presença de dolo específico por parte do agente, não sendo suficiente o dolo genérico: 1ª Seção, REsp nº 1.913.638, j. 11/05/2022, Rel. Min. Gurgel de Faria; 1ª Turma, AgInt no AREsp nº 706.297, j. 07/04/2025, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues.
4. A condenação pelo art. 9º da LIA requer prova de obtenção de vantagem patrimonial indevida por parte do agente público ou, se terceiro, de ter ele contribuído dolosamente para que isso ocorresse. A condenação pelo art. 10 da LIA depende de haver prova de dano efetivo ao erário, não se podendo mais falar do dano “in re ipsa”. Por fim, quanto ao art. 11 da LIA, em que pese não ser essencial a prova do dano efetivo, para eventual condenação do agente é indispensável a ocorrência de lesividade relevante ao bem jurídico tutelado. Não havendo essa relevância, a ação improcede. Além disso, posteriormente à alteração do “caput” do art. 11 da LIA pela Lei nº 14.230/2021, afastou-se a possibilidade de responsabilização por violação genérica aos princípios administrativos. Nesse sentido, precedentes do STJ: 1ª Turma, AgInt no AgInt no AgInt no REsp nº 1.383.628, j. 15/10/2024, Rel. Min. Paulo Sérgio Domingues; 2ª Turma, AgInt no AREsp nº 1.568.466, j. 12/03/2025, Rel. Min. Francisco Falcão.
5. Tendo a r. sentença de procedência parcial sido proferida em 27/05/2024, ou seja, posteriormente à Lei nº 14.230/2021, não se encontra submetida à remessa necessária (STJ, Tema nº 1.284, REsp nº 2.117.355, j. 11/06/2025, Rel. Min. Teodoro Silva Santos).
6. No caso, a partir do Pregão Presencial nº 11/2010, a Prefeitura de Peruíbe firmou com O.O. Empresa Limpadora Ltda. o contrato nº 40/2010 destinado à limpeza dos estabelecimentos de ensino municipais. Segundo o MPF, ocorreu fraude à licitação e dano ao erário público, o que justifica a condenação pela prática de improbidade administrativa.
7. Em que pese o acórdão proferido pela 15ª Câmara de Direito Criminal do E. TJSP em desfavor dos corréus não agentes públicos indicar que houve formação de quadrilha para fraudar licitações em diversos municípios do Estado de São Paulo, entre eles, o de Peruíbe, o único agente público processado nesta demanda não foi condenado na aludida ação criminal, não estendo demonstrada a presença de dolo específico em suas ações.
8. Em adição, não há nos autos qualquer elemento apto a demonstrar o descumprimento contratual, a ausência de execução do objeto licitado, ou ainda eventual contratação apoiada em preço inadequado. A menção genérica a lesão ao erário não tem o condão de comprovar o prejuízo efetivo aos cofres públicos. Como sabido, após a Lei nº 14.230/2021, não havendo prova de dano efetivo ao erário, não é possível e condenação do agente com base no art. 10 da LIA.
9. Resultado do julgamento: negado provimento às apelações do MPF e do FNDE, mantendo-se a r. sentença monocrática de improcedência.
Teses de julgamento: (i) após a Lei nº 14.230/2021, não havendo prova de que a conduta do agente foi perpetrada sob dolo específico e/ou ausente evidência de que houve dano efetivo ao erário, não é possível e condenação com base no art. 10 da Lei nº 8.429/1992; (ii) após a Lei nº 14.230/202, não há mais possibilidade de condenação por improbidade administrativa baseada em conduta contrária exclusivamente aos princípios administrativos elencados no "caput" do art. 11 da LIA.
Dispositivos relevantes citados: Constituição Federal; Lei nº 8.429/1992; Lei nº 14.230/2021; Código de Processo Civil.
Jurisprudência relevante citada: STF, ADI nº 6.678; STF, Temas nºs 309, 897 e 1199; STJ, 1ª Seção, REsp nº 1.913.638; STJ, 1ª Turma, AgInt no AREsp nº 706.297; STJ, 1ª Turma, AgInt no AgInt no AgInt no REsp nº 1.383.628; STJ, 2ª Turma, AgInt no AREsp nº 1.568.466; STJ, 1ª Seção, EREsp 1288585; STJ, 1ª Turma, AgInt no REsp. nº 1.543.207; STJ, 1ª Turma, REsp nº 1.502.635.