Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Turmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de São Paulo
11ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5049305-15.2024.4.03.6301

RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: DAIANE LIMA SANTOS

Advogado do(a) RECORRENTE: DAVI MULLER RANGEL - RS105776-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: DIOGO NEVES PEREIRA - MG131027-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5049305-15.2024.4.03.6301

RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: DAIANE LIMA SANTOS

Advogado do(a) RECORRENTE: DAVI MULLER RANGEL - RS105776-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: DIOGO NEVES PEREIRA - MG131027-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

 

R E L A T Ó R I O

 

 

Relatório dispensado na forma do artigo 38, "caput", da Lei n. 9.099/95.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
JUIZADO ESPECIAL FEDERAL  DA 3ª REGIÃO
TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO

 

RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº 5049305-15.2024.4.03.6301

RELATOR: 33º Juiz Federal da 11ª TR SP

RECORRENTE: DAIANE LIMA SANTOS

Advogado do(a) RECORRENTE: DAVI MULLER RANGEL - RS105776-A

RECORRIDO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, UNIÃO FEDERAL

Advogado do(a) RECORRIDO: DIOGO NEVES PEREIRA - MG131027-A

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

 

 

V O T O

 

Voto-ementa conforme autorizado pelo artigo 46, primeira parte, da Lei n. 9.099/95.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



E M E N T A

 

VOTO-EMENTA

 

CÍVEL. FIES. REVISÃO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. RECURSO DA PARTE AUTORA. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.

 

1.Pedido: “Ante o exposto, requer se digne Vossa Excelência a: a) Conceder a antecipação dos efeitos da tutela para determinar o impedimento do registro do nome do Requerente e fiadores no cadastro de inadimplentes; e determinar aos réus que efetivem a renegociação do FIES, nos termos da Lei nº 14.719/2023, com redução de 77% do total da dívida; b) Condenar os Réus à revisão do contrato com redução da taxa de juros a zero; c) A restituição de quaisquer valores porventura pagos a maior, devidamente corrigidos e atualizados; d) Condenar aos Réus a constituírem em definitivo a renegociação do FIES, nos termos da Lei nº 14.719/2023 com a redução de 77% do total da dívida; e) A restituição de quaisquer valores porventura pagos a maior, corrigidos e atualizados; f) Os benefícios da Assistência Judiciária Gratuita, vez que se declara pobre no sentido Jurídico do termo, conforme declaração anexa.”

 

2. Conforme consignado na sentença:

 

“Trata-se de ação ajuizada por DAIANE LIMA SANTOS em face da UNIÃO FEDERAL e da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, objetivando: (a) a revisão de contrato de financiamento estudantil, com aplicação de "taxa zero" de  juros, em conformidade com a previsão da Lei nº 10.260/2010, com a redação dada pela Lei nº 13.530/2017, bem como com o perdão de 77% do valor da dívida, na forma da Lei nº 14.719/2023; e (b) a restituição dos valores pagos a maior nas parcelas do financiamento, após aplicação dos juros 0% e abatimento do valor de 77% do valor da dívida.

Para tanto, a parte autora alega ter celebrado, em 2014, contrato de Financiamento Estudantil para custear as despesas do curso de Comunicação Social - Rádio e Televisão. Acrescenta que referido negócio jurídico se encontra em fase de amortização. Sustenta que a cláusula contratual prevendo a incidência de taxa de juros sobre o valor total ajustado não é mais devida, diante do advento da Lei nº 10.260/2010, com redação dada pela Lei nº 13.530/2017, que estabeleceu a taxa zero de juros para os novos contratos de financiamento estudantil. Aponta para a necessidade de retroatividade da lei mais benéfica, a fim de que seja revisto o contrato celebrado e devolvidos os valores cobrados indevidamente. Aponta, outrossim, necessidade de abatimento de 77% do valor da dívida, nos termos da Lei nº 14.719/2023, que não poderia ter oferecido tratamento distinto a adimplentes e inadimplentes.

Devidamente citados, os corréus apresentaram contestação, oportunidade na qual arguiram preliminar de ilegitimidade passiva e defenderam a improcedência do pedido.

É o relatório. Passo a decidir.

A Caixa Econômica Federal é parte legitima em demanda que discute aspectos do contrato de FIES, uma vez que detém a qualidade de agente financeiro do FIES.

A União deve ser excluída da lide, considerando a natureza autárquica do FNDE (art. 1º, Lei nº 5.537/1968), entidade responsável pela execução de políticas educacionais do Ministério da Educação, que possui personalidade jurídica própria e distinta da União.

Passo ao exame do mérito.

 

CONSIDERAÇÕES INICIAIS SOBRE O CONTRATO FIES

 

O FIES foi criado em 1999, em substituição ao antigo Crédito Educativo - PCE/CREDUC, consistindo em um Programa de Concessão de Financiamento Estudantil, efetivado sob o controle do Ministério da Educação, destinado a financiar a graduação no Ensino Superior de estudantes que não tenham condições de arcar com os custos de sua formação e estejam regularmente matriculados em instituições não gratuitas, desde que estas estejam cadastradas no Programa em questão, e ainda tenham alcançado avaliação positiva nos processos conduzidos pelo MEC.

Importante frisar que este programa foi estabelecido sem privilégios, decorrendo a concessão dos valores a serem mutuados de critérios de seleção impessoais e objetivos.

Com efeito, o contrato de financiamento estudantil é parte de uma política pública de acesso à educação, não um simples serviço bancário. A concessão do empréstimo atende a uma política destinada a financiar estudantes de ensino superior, mediante preenchimento de diversos requisitos de caráter socioeconômico. O sistema de FIES, assim como seu antecessor Crédito Educativo (CREDUC), rege-se por legislação própria e não pode ser desfigurado pela mescla de suas normas com as regras do CDC.

Não se tratando de um serviço bancário, afasta-se a aplicabilidade do CDC da discussão sobre os requisitos para obter o financiamento, garantias, metodologia de cálculo das prestações, formas de amortização e encerramento.

Já no que tange aos atos de iniciativa da instituição financeira que atingem o mutuário, assim como atingiriam outros clientes (não mutuários), é devida a aplicação da lei consumerista. Por essa distinção, submetem-se ao CDC práticas concernentes à inclusão dos devedores em cadastros de inadimplentes, abusividade na cobrança ou exposição do devedor a situações vexatórias, pois estas não decorrem da política pública promovida pelo FIES.

 

DA TAXA DE JUROS REAL IGUAL A ZERO

 

Alega a autora ter celebrado em 08/02/2013 um contrato de Financiamento Estudantil (FIES), tendo o corréu Banco do Brasil figurado como agente financeiro, o qual se encontra em fase de amortização. Contudo, afirma que a cláusula contratual que previu a incidência de taxa de juros não é mais devida, diante do advento da Lei nº 10.260/2010, com redação dada pela Lei nº 13.530/2017, que estabeleceu a taxa zero de juros para os novos contratos de financiamento estudantil.

A propósito da mencionada Lei n. 13.530/2017, o seu artigo 5º-C estabeleceu que:

Art. 5o-C.  Os financiamentos concedidos a partir do primeiro semestre de 2018 observarão o seguinte:

(...)

II - taxa de juros real igual a zero, na forma definida pelo Conselho Monetário Nacional;

(...)

§ 8o  Eventuais alterações dos juros estabelecidos na forma do inciso II do caput deste artigo incidirão somente sobre os contratos firmados a partir da data de entrada em vigor da alteração.

 

De início, verifica-se que a lei é bastante clara e específica quanto à sua incidência somente aos contratos de financiamento concedidos a partir do primeiro semestre de 2018, termo que não alcançaria a situação constituída pela parte autora, cujo contrato de financiamento foi ajustado em 2014.

Faz-se mister mencionar que, não haveria, em si, óbice no ordenamento para que a lei em questão fosse expressamente retroativa, eis que inegavelmente mais benéfica (ampliativa de direito), de forma que não configuraria afronta à direito adquirido ou a ato jurídico perfeito.

Contudo, é justamente isso que lhe falta para que fosse procedente a pretensão do autor: a expressa previsão na Lei. Ora, sem comando expresso nesse sentido da retroatividade (que é uma exceção), aplica-se a regra geral (tempus regit actum), ou seja, o princípio da irretroatividade das normas.

A par deste expendido, observa-se que o contrato ora em análise, no que pese ser de adesão, foi elaborado em consonância com as leis que regem o FIES e as políticas de educação, com parâmetros de atualização estabelecidos pelo legislador, razão pela qual é plenamente válido.

Acrescenta-se o fato de ter a parte autora contratado voluntariamente o financiamento estudantil, assumindo o compromisso de quitá-lo nos termos em que ajustado, vale dizer, conforme o número de prestações, valor destas, taxa de juros, forma de amortização e encargos de atraso constantes do instrumento negocial.

De outra parte, o postulante reconhece ter usufruído do crédito estudantil decorrente do contrato celebrado pelo FNDE e operado pelo Banco do Brasil, cujo pacto foi devidamente acertado, sem a constatação de qualquer vício aparente apto a macular o negócio jurídico.

Dessa forma, tornando-se obrigatório para os contraentes o ajuste, não é possível a um deles se eximir de seu cumprimento tão-somente por não entendê-lo mais vantajoso.

Igualmente, não pode, em princípio, o Poder Judiciário interferir nos contratos firmados por particulares, alterando suas cláusulas sem justificativa legal, salvo em caso de se constatar a existência de cláusulas ilegais e/ou abusivas, o que não ocorreu no presente caso.

Nesse sentido, as seguintes ementas:

ADMINISTRATIVO. REVISÃO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. JUROS REMUNERATÓRIOS E MORATÓRIOS. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. POSSIBILIDADE.

-Embora sejam aplicadas as normas previstas no CDC às relações bancárias, não é possível concluir-se automaticamente pela ocorrência de abusividade, devendo haver prova mínima da conduta lesiva alegada pela parte apelante, ônus que lhe cabe quanto ao fato constitutivo do seu direito, por força do disposto no artigo 373, I, CPC/2015, apenas cabendo a inversão prevista no artigo 6º, VIII, do CDC, quando constatada a hipossuficiência do consumidor e a existência de indícios da verossimilhança das suas alegações, não sendo automática a sua decretação, tampouco, para toda e qualquer relação de consumo.

-Não merece prosperar a mitigação do princípio do pacta sunt servanda, uma vez que não cabe ao Poder Judiciário impor, contra a vontade da instituição financeira, a renegociação do débito, objeto do mútuo por situação externa à relação contratual. (...)

(TRF2, Apelação Processo 0006597-64.2010.4.02.5101, RElatora Desembargadora Federal Vera Lúcia Lima, decisão de 16/12/2019).

PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. SFH. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INAPLICABILIDADE DO DECRETO/LEI 70/66. LEI Nº 9.514/97. NOTIFICAÇÃO PESSOAL PARA PURGAR A MORA. OCORRÊNCIA. CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE DO IMÓVEL NA PENDÊNCIA DE AÇÃO REVISIONAL. VALIDADE. CAPITALIZAÇÃO MENSAL DE JUROS. POSSIBILIDADE A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI 11.977/2009. IMPUGNAÇÃO GENÉRICA DA DÍVIDA E DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS. IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO, DE OFÍCIO, DE CLÁUSULAS ABUSIVAS. APELAÇÃO IMPROVIDA. 1. Hipótese de financiamento de imóvel junto à CEF, tendo a alienação fiduciária como garantia. São, portanto, aplicáveis as disposições específicas da Lei 9.514/97, não cabendo à autora invocar o amparo do Decreto-Lei 70/66, que estabelece procedimento executivo extrajudicial distinto. 2. Diante das provas acostadas aos autos, como a cópia da notificação da demandante para purgar a mora, não se vislumbra qualquer irregularidade no procedimento extrajudicial, conduzido em conformidade com a Lei 9.514/1997. 3. No REsp 1.067.237/SP, recurso representativo da controvérsia, o eg. Superior Tribunal de Justiça tratou da suspensão, na pendência de ação revisional, da execução extrajudicial associada a contratos de financiamento de imóvel com garantia hipotecária (Decreto-Lei 70/66). Ademais, no referido precedente, fixou-se como requisito, para a suspensão da execução extrajudicial, que a discussão judicial esteja fundamentada em jurisprudência da própria Corte Cidadã ou do Supremo Tribunal Federal, o que não se verifica no caso sub examine. Com efeito, também sob esse prisma, descabe falar em nulidade da consolidação da propriedade do imóvel em nome da Caixa. 4. É legítima a capitalização mensal de juros nos contratos do Sistema Financeiro da Habitação, desde que firmados a partir da vigência da Lei 11.977/2009, que acrescentou o art. 15-A na Lei 4.380/1964. Entendimento em conformidade com a jurisprudência do eg. STJ: REsp 1124552/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/12/2014, DJe 02/02/2015. 5. A recorrente deixou de apontar quais cláusulas dariam ensejo a onerosidade excessiva ou desequilíbrio contratual, limitando-se a questionar genericamente a dívida. A teor do que prescreve a Súmula 381 do Superior Tribunal de Justiça, o magistrado não pode rever, de ofício, as cláusulas contratuais ao argumento de abusividade, sendo necessário o expresso requerimento da parte interessada, atrelado à indicação explícita, por ela, das disposições do negócio jurídico que seriam abusivas, o que não ocorreu no caso concreto. 6. Em relação ao pedido de renegociação da dívida, a possibilidade de repactuação é faculdade da CEF, não podendo o Judiciário determinar a sua obrigatoriedade. O contrato constitui ato jurídico perfeito, celebrado em plena conformidade com os parâmetros legais, devendo ser preservada a autonomia da vontade, da qual é corolário o Princípio da Força Obrigatória (pacta sunt servanda). 7. Apelação a que se nega provimento.

(TRF5, Quarta Turma, Apelação Cível 559182, Relator Desembargador Federal Edílson Nobre, DJE data de 26/01/2017)

 

Por oportuno, registre-se que a revisão dos contratos comutativos de execução diferida ou continuada é possível, nos termos do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil, nos casos em que há alteração das circunstâncias fáticas vigentes à época da contratação, com o consequente desequilíbrio entre as prestações que se traduzem na comutatividade do pacto.

Entretanto, para que se possa reconhecer a necessidade da revisão contratual, é necessário que essa alteração, que deve compor uma das causas de pedir da ação, tenha sido inesperada e imprevisível à parte que a invocou. É necessário, pois, produzir provas dessa imprevisibilidade, a qual não se mostrou presente neste caso.

Portanto, sob qualquer perspectiva, não há como acatar a pretensão autoral de redução da taxa de juros.

 

DO ABATIMENTO DE 77% DO VALOR CONSOLIDADO DA DÍVIDA

 

Pretende a parte autora o abatimento de 77% do valor consolidado da dívida, sob o argumento de que, por questões de isonomia, aos estudantes adimplentes deve ser assegurado o mesmo tratamento dos inadimplentes, em especial em relação ao abatimento da dívida concedido nos termos da Lei n. 14.375/2022.

A Medida Provisória nº 1.090/2021, convertida na Lei n. 14.375/2022, estabeleceu os requisitos e as condições para a realização das transações resolutivas de litígio relativas à cobrança de créditos do Fundo de Financiamento Estudantil - Fies. Nos termos de referida legislação:

Art. 2º São modalidades de transação aquelas realizadas por adesão, na cobrança de créditos contratados com o Fies até o segundo semestre de 2017 e cujos débitos estejam:

I - vencidos, não pagos há mais de 360 (trezentos e sessenta) dias, e completamente provisionados; ou

II - vencidos, não pagos há mais de 90 (noventa) dias, e parcialmente provisionados.

Parágrafo único. A transação por adesão implicará a aceitação pelo devedor do Fies das condições estabelecidas em ato do Comitê Gestor do Fundo de Financiamento Estudantil (CG-Fies).

[...]

 

Art. 5o-A.  Serão mantidas as condições de amortização fixadas para os contratos de financiamento celebrados no âmbito do Fies até o segundo semestre de 2017.     (Redação dada pela Lei nº 13.530, de 2017)

§ 1º É o agente financeiro autorizado a pactuar condições especiais de amortização ou de alongamento excepcional de prazos para os estudantes inadimplentes com o Fies, por meio de adesão à transação das dívidas do Fies de que trata a legislação referente à matéria, com estímulos à liquidação, ao reparcelamento e ao reescalonamento das dívidas do Fies.   (Redação dada pela Lei nº 14.375, de 2022)

[...]

§ 4º Sem prejuízo do disposto no § 1º deste artigo, o estudante beneficiário que tenha débitos vencidos e não pagos em 30 de dezembro de 2021 poderá liquidá-los por meio da adesão à transação com fundamento nesta Lei, nos seguintes termos:         (Redação dada pela Lei nº 14.375, de 2022)

(...)

V - para os estudantes com débitos vencidos e não pagos havia mais de 90 (noventa) dias em 30 de dezembro de 2021:       (Incluído pela Lei nº 14.375, de 2022)

a) com desconto da totalidade dos encargos e de até 12% (doze por cento) do valor principal, para pagamento à vista; ou       (Incluído pela Lei nº 14.375, de 2022)

b) mediante parcelamento em até 150 (cento e cinquenta) parcelas mensais e sucessivas, com redução de 100% (cem por cento) de juros e multas;      (Incluído pela Lei nº 14.375, de 2022)

VI - para os estudantes com débitos vencidos e não pagos havia mais de 360 (trezentos e sessenta) dias em 30 de dezembro de 2021 que estejam inscritos no CadÚnico ou que tenham sido beneficiários do Auxílio Emergencial 2021, com desconto de até 99% (noventa e nove por cento) do valor consolidado da dívida, inclusive principal, por meio da liquidação integral do saldo devedor; e      (Incluído pela Lei nº 14.375, de 2022)

VII - para os estudantes com débitos vencidos e não pagos havia mais de 360 (trezentos e sessenta) dias em 30 de dezembro de 2021 que não se enquadrem na hipótese prevista no inciso VI deste parágrafo, com desconto de até 77% (setenta e sete por cento) do valor consolidado da dívida, inclusive principal, por meio da liquidação integral do saldo devedor.       (Incluído pela Lei nº 14.375, de 2022)

A parte autora discorda da opção que foi conferida pelo legislador, ao argumento de que, por imperativo de isonomia,  ao seu contrato deve ser assegurado o mesmo desconto autorizado para contratos inadimplentes há 360 dias ou mais.

Contudo, em se tratando de critério objetivo eleito pelo legislador (inadimplência), não pode ser ampliado, sob pena de interferência indevida do Poder Judiciário na finalidade da lei, que foi o de assegurar a sustentabilidade do FIES e a necessidade de retomada econômica dos estudantes que estavam inadimplentes com o programa. Nesse sentido, colaciono o seguinte precedente:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. FIES. RENEGOCIAÇÃO PREVISTA PELO ART. 5º-A, § 4º, V, "B", E VII DA LEI Nº 10.260/2001. APLICAÇÃO AOS CONTRATOS ADIMPLENTES. PRINCÍPIO DA ISONOMIA. DESCABIMENTO. RECURSO DESPROVIDO.  1. O princípio da isonomia estipulado pelo art. 5º, caput, da Constituição Federal (igualdade formal) tem como consequência a igualdade material, consistente na concretização da igualdade formal. Para tanto, aos cidadãos em situações idênticas deverá ser dispensado tratamento igual, e desigual aos cidadãos em situações diferentes, de modo a compensar a desigualdade fática apresentada e nivelar os sujeitos de Direito em um mesmo patamar.  2. O art. 5º, I e II, da Lei nº 14.375/2022 é claro ao definir que a concessão de descontos aos contratos do FIES tem como objeto os créditos classificados como inadimplentes, irrecuperáveis ou de difícil recuperação, observado o impacto líquido positivo na receita, nos termos do art. 6º, III, da mesma Lei. Almeja-se, portanto, minimizar os prejuízos suportados pelo erário com base nos contratos que se encontrem nessa situação, o que não ocorre com os financiamentos do FIES adimplidos em dia.  3. É especificamente essa a circunstância verificada no caso, em que são distintas as características dos contratos adimplidos e inadimplidos. Mostrando-se diversas suas situações jurídicas, a justiça social justifica a aplicação de percentuais diferenciados de desconto, sem que isso viole o princípio da isonomia.  4. Apelação cível desprovida. (TRF4, AC 5019864-64.2022.4.04.7001, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relator JOÃO PEDRO GEBRAN NETO, juntado aos autos em 24/01/2024)

Assim, a pretensão formulada pela parte autora igualmente não merece acatamento.

 

DISPOSITIVO

 

Diante do exposto:

(a) com fundamento no artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, julgo extinto o processo sem resolução do mérito em relação à União, ante a sua patente ilegitimidade passiva;

(b) com fundamento no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito e JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado.

Sem custas e honorários advocatícios, a teor do art. 1º da Lei nº. 10.259/01 c.c. o art. 55, caput da Lei nº. 9.099/95.

Concedo o benefício de assistência judiciária gratuita à parte autora, ante o requerimento expresso formulado na inicial, nos termos do artigo 5º, inciso LXXIV, da CRFB/88 e dos artigos 98 e  seguintes do CPC/2015. Nesse passo, rejeito a impugnação apresentada pela União, tendo em vista que não restou comprovado que a parte autora aufere renda suficiente para custear o processo sem prejuízo da própria manutenção.

Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.”

3. Recurso da parte autora: requer seja reformada a referida sentença proferida pelo Douto Juízo a quo, para fim de Condenar aos Réus a constituírem em definitivo a renegociação do FIES, nos termos da Resolução nº 49 de 10 de fevereiro de 2022 e da Lei nº 14.719/2023 com o perdão da dívida prevista de 77% e conceder a redução dos juros a zero com a restituição dos valores pagos a maior.

 

4. A despeito das alegações recursais, reputo que a sentença analisou corretamente todas as questões trazidas no recurso inominado, de forma fundamentada, não tendo a recorrente apresentado, em sede recursal, elementos que justifiquem sua modificação.

 

5. Não obstante a relevância das razões apresentadas pela recorrente, o fato é que todas as questões suscitadas foram corretamente apreciadas pelo Juízo de Origem, razão pela qual a r. sentença deve ser mantida por seus próprios e jurídicos fundamentos, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099/95. RECURSO DA PARTE AUTORA A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

 

6. Recorrente condenada ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa. Na hipótese de a parte autora ser beneficiária de assistência judiciária gratuita, o pagamento dos valores mencionados ficará suspenso nos termos do artigo 98, § 3º do CPC.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Décima Primeira Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
LUCIANA MELCHIORI BEZERRA
Juíza Federal