Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000110-55.2019.4.03.6004

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: EDNALDO HIGUTI BIGONI

Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON LUIS PEREIRA GONZALEZ - PR34937-A, NATASSIA CAVAZIN TAPXURE PERLY - PR89861-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 


 

  

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Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000110-55.2019.4.03.6004

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: EDNALDO HIGUTI BIGONI

Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON LUIS PEREIRA GONZALEZ - PR34937-A, NATASSIA CAVAZIN TAPXURE PERLY - PR89861-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

OUTROS PARTICIPANTES:

 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

Trata-se de ação de rito comum, ajuizada por Ednaldo Higuti Bigoni, em face da União Federal, objetivando obter provimento jurisdicional que reconheça a nulidade do auto de infração e termo de apreensão de bem nº 0147600-05656/2019, bem como a devolução dos veículos Trator Scania T113 H 4x2 360, cor branca, placas IGH-0501 e Carreta semirreboque Randon SR CA, cor preta, placas MHX-1336.

Alega o autor que está sendo acusado pela prática do crime de descaminho, sob a alegação de ter transportado 20 fardos de roupas oriundas da Bolívia sem o devido desembaraço aduaneiro.

Sustenta que as mercadorias não pertenciam ao autor, ao contrário, fora contratado por Carlos Porcino da Silva para o transporte de Corumbá/MS a Campo Grande/MS, desconhecendo a origem se licita ou ilícita das mercadorias.

Afirma que foi autuado pela prática do crime de descaminho, e em razão da alegação de reincidência e de que o condutor do veículo é também proprietário do bem, apreenderam não somente a mercadoria para aplicação da pena de perdimento, como também ao caminhão apreendido.

O pedido de tutela provisória foi indeferido (Id. 268812095).

Por meio de sentença o r. Juízo a quo julgou improcedente a ação, nos termos do art. 487, inciso I do Código de Processo Civil, condenando o autor ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, ressaltando a suspensão de sua exigibilidade por ser a parte autora beneficiária de gratuidade de justiça (Id. 268812189).

Apela o autor, requerendo a reforma do julgado, alegando que deixou claro e comprovado que é transportador autônomo e que detém o veículo para sustento seu e de sua família. Sustenta que foi contratado por terceiro para fazer o transporte de mercadorias e que a testemunha Jair Moura Santana desmentiu as declarações prestadas em juízo pelo Sr. Carlos Porcino da Silva, proprietário das mercadorias. Aduz a desproporcionalidade entre o valor do veículo e da mercadoria apreendida (Id. 268812191).

Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
4ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5000110-55.2019.4.03.6004

RELATOR: Gab. 14 - DES. FED. MARCELO SARAIVA

APELANTE: EDNALDO HIGUTI BIGONI

Advogados do(a) APELANTE: ANDERSON LUIS PEREIRA GONZALEZ - PR34937-A, NATASSIA CAVAZIN TAPXURE PERLY - PR89861-A

APELADO: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

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V O T O

 

 

De início, registre-se que a Primeira Seção do C. Superior Tribunal de Justiça cancelou o tema 1041, razão pela qual não há impedimento para o regular prosseguimento do processo.

Em casos de importação irregular de mercadorias, a pena de perdimento deve ser aplicada ao veículo transportador sempre que houver prova de que o proprietário do veículo apreendido concorreu de alguma forma para o ilícito fiscal (Inteligência da Súmula nº 138 do TFR) e relação de proporcionalidade entre o valor do veículo e o das mercadorias apreendidas.

No caso dos autos, a autoridade fiscal lavrou o Auto de Infração e Apreensão de Mercadorias nº 0147600-05656/2019 para aplicação da pena de perdimento das mercadorias com base no art. 105, X, do Decreto-Lei n.º 37/1966 (Id. 15544812 – Pág. 1/4), e o Auto de Infração nº 0147600-05657/2019 para aplicação da pena de perdimento dos veículos com base no art. 104, V, do Decreto-Lei n.º 37/1966 (Id. 15544813 – Pág. 1/4), in verbis:

Art.105 - Aplica-se a pena de perda da mercadoria:

(...)

X- estrangeira, exposta à venda, depositada ou em circulação comercial no país, se não for feita prova de sua importação regular;

Art.104 - Aplica-se a pena de perda do veículo nos seguintes casos:

(...)

V - quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção;

Do apurado nos autos, o apelante concorreu para a prática da infração aduaneira, pois transportava diretamente a carga apreendida, utilizando veículo de sua propriedade no ilícito.

Como bem salientou o Juiz a quo, “as evidências afastam os fatos narrados pela parte apelante de um contexto em que usualmente vige a boa-fé. A alegação de que se tratava de mero contrato para transporte de mercadorias, per si, não tem o condão de demonstrar a boa-fé do transportador, devendo esta ser aferida pela conjugação dos elementos trazidos aos autos à luz da legislação aduaneira”.

Impende consignar que o Sr. Carlos Porcino da Silva negou perante o juízo a propriedade das mercadorias apreendidas e não há qualquer documento seguro de que houve ajuste entre o Sr. Carlos e o apelante específico para o transporte de mercadorias como contrato, recibo de pagamento ou mesmo negociação de pagamento.

As alegações da testemunha Jair no sentido de que supõe que houve contratação da parte apelante pelo Sr. Carlos para o transporte, são frágeis e o contexto probatório apontam para uma evidente responsabilidade do recorrente proprietário do veículo.

Ora, a má-fé do apelante restou evidente, caracterizando-se pela reiteração da sua conduta ilícita de introduzir mercadorias no país sem comprovação de sua regular importação ou de sua regular aquisição do mercado nacional, conforme a descrição do Auto de Infração e Apreensão de Veículo n.º 0147600-05657/2019, onde são listados diversos outros Processos Administrativos contendo Autos de Infração com Perdimento de Mercadorias (fls. 32/33 do Processo Administrativo 10108.721080/2018-23, em anexo).

No mais, descabida a questão da proporcionalidade, já que se trata de pessoa reincidente na prática e não foi evidenciada a boa-fé no transporte das mercadorias.

Desse modo, mostra-se adequado o procedimento adotado pelo Fisco Federal, uma vez que restou evidenciada a responsabilidade do proprietário do veículo na prática da infração que culminou com a aplicação da pena de perdimento do bem

Esse é o pacífico entendimento do C. STJ:

“TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. DESCAMINHO. PENA DE PERDIMENTO. COMPROVAÇÃO DE QUE O VEÍCULO UTILIZADO É DE PROPRIEDADE DO CONDUTOR. SÚMULA 7/STJ. PROVIMENTO NEGADO.

1. É legítima a decretação da pena de perda de veículo apreendido em fiscalização aduaneira em razão da introdução irregular de mercadoria estrangeira no território nacional, na hipótese em que for configurada a participação direta do proprietário do veículo na consumação do ilícito fiscal. Precedentes.

2. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem reconheceu que o veículo apreendido pelo transporte de mercadorias irregularmente internalizadas no Brasil era conduzido por seu proprietário de fato, pois, apesar de o veículo encontrar-se registrado no Departamento de Trânsito (DETRAN) em nome de seu irmão, ora recorrente, há provas de que o veículo foi cedido ao condutor e da reiteração na prática infracional. Entendimento diverso, conforme pretendido, implicaria o reexame do contexto fático-probatório dos autos, circunstância que redundaria na formação de novo juízo acerca de fatos e provas.

Incidência no presente caso da Súmula 7 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

3. Agravo interno a que se nega provimento.”

(AgInt no REsp n. 1.775.536/SC, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Turma, julgado em 13/5/2024, DJe de 20/5/2024); (negritei)

“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO APENAS PELA ALÍNEA "C" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DE DISPOSITIVO LEGAL COM INTERPRETAÇÃO DIVERGENTE. SÚMULA 284/STF. PERDIMENTO DE VEÍCULO. DESCAMINHO/CONTRABANDO DE MERCADORIAS ESTRANGEIRAS. APLICAÇÃO DE EXCLUDENTE DE DESPROPORCIONALIDADE INDEVIDA. PRETENSÃO DE REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ.

1. O apelo excepcional foi manejado apenas pela alínea "c" do permissivo constitucional.

2. O Recurso Especial interposto pela alínea "c" do permissivo constitucional deve indicar o dispositivo de lei federal a que foi dada interpretação divergente pelos acórdãos recorrido e paradigma, sob pena de deficiência em sua fundamentação. Incide na espécie também a Súmula 284 do STF.

3. Ainda que superado o óbice acima, a irresignação não merece prosperar.

4. Conforme a jurisprudência do STJ, no momento do exame da pena de perdimento do veículo, deve-se observar não apenas a proporção entre o seu valor e o da mercadoria apreendida, mas também a gravidade do caso, a reiteração da conduta ilícita ou a boa-fé da parte envolvida.

5. No caso dos autos, o Tribunal concluiu pela inaplicabilidade do princípio da proporcionalidade ao caso, bem como pela inexistência de boa-fé por parte da recorrida, consignando que (fls. 596-597, e-STJ): "Com efeito, verifica-se que a parte autora efetivamente concorreu para o ilícito, devendo ser rejeitada a alegação de que teria agido de boa-fé. Ora, a empresa autora tem sede em Pranchita/PR, na fronteira com a Argentina, local em que é comum a prática de contrabando/descaminho - e tem por objeto o comércio de mercadorias da espécie apreendida, bem como a realização de transporte rodoviário de cargas (evento 1, CONTRSOCIAL6). É evidente, pois, que a empresa demandante tem absoluta ciência acerca da imprescindibilidade de documentação ?scal para o transporte de mercadorias e comprovação da regularidade das mesmas. Outrossim, as circunstâncias em que se deu a apreensão demonstram que as mercadorias seriam exportadas clandestinamente à Argentina. A descarga das sacas de fertilizantes foi realizada na barranca do rio Santo Antônio, onde existe uma passagem clandestina para a Argentina, através de uma pinguela sobre o rio. Acresce, ainda, que "No momento da chegada da Polícia Militar já haviam sido descarregadas 11 sacas de uréia e levadas para a Argentina, restando assim 59 sacas" (evento 7, PROCADM2,fl. 33). É evidente, pois, que a autora, por meio de seu preposto (motorista do caminhão), efetuou o transporte de mercadorias sujeitas à pena de perdimento. Impõe-se, ainda, rejeitar a alegação de que a pena de perdimento, no caso, ofenderia o princípio da proporcionalidade. Ainda que se admita a alegação da apelante de que o preço da saca de fertilizante é de aproximadamente R$ 60,00 - o que totalizaria R$ 8.400,00 (o qual, confrontado com o valor do veículo - R$ 98.000,00 - evento 7, PROCADM2, demonstraria a desproporção entre os valores), é inaplicável, aqui, a excludente da desproporcionalidade. Isso porque o proprietário da empresa demandante, Vilmar Rech, já foi autuado pela prática de infração aduaneira (processo n° 10926.720169/2013-24), sendo alta a probabilidade de cometimento de novo ilícito, caso em que descabida a aplicação da excludente, à semelhança do que já decidiu este Tribunal: (...) Portanto, caracterizada a responsabilidade da autora e afastada a possibilidade de aplicação do princípio da proporcionalidade, mostra-se acertada a pena de perdimento do veículo".

6. Rever o decidido no Tribunal a quo quanto à proporcionalidade da pena imposta ao infrator em caso de contrabando/descaminho de bens encontra óbice na Súmula 7/STJ.

7. Recurso Especial não conhecido.”

(REsp n. 1.797.442/PR, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 26/3/2019, DJe de 30/5/2019); (negritei)

Assim, não merece reparo a r. sentença.

Ante o exposto, nego provimento ao apelo.

É como voto.

 



Autos: APELAÇÃO CÍVEL - 5000110-55.2019.4.03.6004
Requerente: EDNALDO HIGUTI BIGONI
Requerido: UNIAO FEDERAL - FAZENDA NACIONAL

 

Ementa: AÇÃO DE RITO COMUM. PERDIMENTO DE VEÍCULO INTRODUTOR DE MERCADORIA ESTRANGEIRA SEM REGULAR DOCUMENTAÇÃO. LEGALIDADE DO ATO. REGULARIDADE BOA-FÉ DO PROPRIETÁRIO NÃO COMPROVADA.

I. Caso em exame

1. Trata-se de ação de rito comum, ajuizada por Ednaldo Higuti Bigoni, em face da União Federal, objetivando obter provimento jurisdicional que reconheça a nulidade do auto de infração e termo de apreensão de bem nº 0147600-05656/2019, bem como a devolução dos veículos Trator Scania T113 H 4x2 360, cor branca, placas IGH-0501 e Carreta semirreboque Randon SR CA, cor preta, placas MHX-1336.

II. Questão em discussão

2. Cinge-se a controvérsia acerca da possibilidade de afastar a pena de perdimento de veículo, quando o proprietário concorreu para a prática da infração aduaneira.

III. Razões de decidir

3. No caso dos autos, a autoridade fiscal lavrou o Auto de Infração e Apreensão de Mercadorias nº 0147600-05656/2019 para aplicação da pena de perdimento das mercadorias com base no art. 105, X, do Decreto-Lei n.º 37/1966 e o Auto de Infração nº 0147600-05657/2019 para aplicação da pena de perdimento dos veículos com base no art. 104, V, do Decreto-Lei n.º 37/1966.

4. Do apurado nos autos, o apelante concorreu para a prática da infração aduaneira, pois transportava diretamente a carga apreendida, utilizando veículo de sua propriedade no ilícito.

5. Como bem salientou o Juiz a quo, “as evidências afastam os fatos narrados pela parte apelante de um contexto em que usualmente vige a boa-fé. A alegação de que se tratava de mero contrato para transporte de mercadorias, per si, não tem o condão de demonstrar a boa-fé do transportador, devendo esta ser aferida pela conjugação dos elementos trazidos aos autos à luz da legislação aduaneira”.

6. Impende consignar que o Sr. Carlos Porcino da Silva negou perante o juízo a propriedade das mercadorias apreendidas e não há qualquer documento seguro de que houve ajuste entre o Sr. Carlos e o apelante específico para o transporte de mercadorias como contrato, recibo de pagamento ou mesmo negociação de pagamento.

7. As alegações da testemunha Jair no sentido de que supõe que houve contratação da parte apelante pelo Sr. Carlos para o transporte, são frágeis e o contexto probatório apontam para uma evidente responsabilidade do recorrente proprietário do veículo.

8. A má-fé do apelante restou evidente, caracterizando-se pela reiteração da sua conduta ilícita de introduzir mercadorias no país sem comprovação de sua regular importação ou de sua regular aquisição do mercado nacional, conforme a descrição do Auto de Infração e Apreensão de Veículo n.º 0147600-05657/2019, onde são listados diversos outros Processos Administrativos contendo Autos de Infração com Perdimento de Mercadorias (fls. 32/33 do Processo Administrativo 10108.721080/2018-23, em anexo).

9. Descabida a questão da proporcionalidade, já que se trata de pessoa reincidente na prática e não foi evidenciada a boa-fé no transporte das mercadorias.

 

IV DISPOSITIVO.

10. Apelo desprovido.

 

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Quarta Turma, à unanimidade, decidiu negar provimento à Apelação, nos termos do voto do Des. Fed. MARCELO SARAIVA (Relator), com quem votaram o Des. Fed. WILSON ZAUHY e o Des. Fed. ANDRÉ NABARRETE. Ausente, justificadamente, por motivo de férias, a Des. Fed. LEILA PAIVA , nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
MARCELO SARAIVA
Desembargador Federal