APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071959-57.2024.4.03.9999
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. MARCUS ORIONE
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS JOSE CAVALLARI
Advogados do(a) APELADO: IVAN MARCIO ALARI - SP129458-N, NAYARA CRISTINE BUENO - SP380385-N
OUTROS PARTICIPANTES:
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071959-57.2024.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. MARCUS ORIONE APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MARCOS JOSE CAVALLARI Advogados do(a) APELADO: IVAN MARCIO ALARI - SP129458-N, NAYARA CRISTINE BUENO - SP380385-N OUTROS PARTICIPANTES: R E L A T Ó R I O O Exmo. Desembargador Federal Marcus Orione (Relator): Trata-se de agravo interno interposto pelo INSS em face da decisão monocrática que negou provimento à sua apelação, mantendo, desta forma, a decisão que concedeu o benefício de aposentadoria por idade à parte autora, a partir da data do requerimento administrativo (18/03/2022 - ID 290400259 - pg.01/02). A parte agravante sustenta, preliminarmente, a ocorrência a coisa julgada, tendo em vista a existência de outra ação com pedido de aposentadoria por idade, Proc. n. 1001717-49.2017.8.26.0288, a qual foi julgada improcedente. Ademais, alega o não preenchimento dos requisitos para concessão do benefício. Pugna pela reforma da decisão. Devidamente intimada, a parte adversa apresentou resposta. É o relatório.
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5071959-57.2024.4.03.9999 RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. MARCUS ORIONE APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS APELADO: MARCOS JOSE CAVALLARI Advogados do(a) APELADO: IVAN MARCIO ALARI - SP129458-N, NAYARA CRISTINE BUENO - SP380385-N OUTROS PARTICIPANTES: V O T O A matéria discutida pela parte recorrente já foi amplamente debatida, verificando-se que as razões recursais consistem em mera reafirmação da insatisfação da parte recorrente em relação ao provimento judicial que lhe foi desfavorável. A esse respeito, peço vênia para destacar apenas alguns dos fundamentos já postos na decisão agravada. De início, afasto a alegação de existência de coisa julgada alegada pela autarquia previdenciária, porquanto, conforme ressaltado, nos autos do Processo n. 1001717-49.2017.8.26.0288 não houve pedido de cômputo do período de 01.05.2013 a 31.03.2017, reconhecido na esfera trabalhista, sendo possível a análise. Por sua vez, quanto ao trabalho como empregado, cumpre reiterar que a jurisprudência iterativa é no sentido de que, no caso de trabalhador urbano, deve haver início de prova material suficiente. No caso do urbano – diversamente do rurícola -, as relações trabalhistas, geralmente, deixam “rastros” documentais que não devem ser desprezados. Não se trata da adoção da regra da prova legal – inadmissível -, mas da busca efetiva de elementos para a formação do livre convencimento motivado. Não há, por outro lado, como se infirmar, quer para o tempo trabalhado em condições especiais, quer para o tempo trabalhado em condições comuns, as anotações constantes da CTPS, que não tenham sido refutadas por provas consistentes pelo INSS, ainda que não constem do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS: TRF 3ª Região, 7ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000216-62.2019.4.03.6183, Rel. Juíza Federal Convocada VANESSA VIEIRA DE MELLO, julgado em 27/09/2023, DJEN DATA: 03/10/2023. Há que se ressaltar ainda que mesmo a ausência de eventuais contribuições não deve prejudicar o segurado em caso de reconhecimento de sua atividade laboral para fins previdenciários, entendimento que também se aplica ao empregado doméstico: TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL -5004204-26.2022.4.03.6106, Rel. Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 07/12/2023, DJEN DATA: 13/12/2023; STJ, REsp n. 272.648/SP, relator Ministro Edson Vidigal, Quinta Turma, julgado em 24/10/2000, DJ de 4/12/2000, p. 98; STJ, AgRg no REsp n. 331.748/SP, relator Ministro Felix Fischer, Quinta Turma, julgado em 28/10/2003, DJ de 9/12/2003, p. 310; STJ, REsp n. 473.605/SC, relator Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, julgado em 6/5/2003, DJ de 27/3/2006, p. 351. Desta forma, em que pesem as alegações do INSS em agravo interno, há que se utilizar de todos os lapsos de tempo trabalhados na condição de empregado constantes da carteira profissional (ID. 290400248, pg.01/15), GPS (ID.290400249, pg.01/50; ID.290400250, pg.01/50; ID.290400251, pg.01/27; ID.290400254, pg.01/30; ID.290400255, pg.01/30; ID.290400256, pg.01/26), do CNIS (ID.290400349, pg.58/66) e o reconhecido em processo trabalhista (ID.290400252, pg.01/02) para fins de concessão do benefício pleiteado. Neste ponto, reitera-se que em atenção ao período (01/05/2013 a 31/03/2017), trabalhado para o empregador Concrethor Indústria e Comércio, observa-se que além do acordo firmado na Justiça do Trabalho (ID 290400252) foram apresentadas nestes autos outras provas que dão conta da veracidade do vínculo trabalhista. Nesse sentido, como já destacado, foram acostados relatórios de pagamento (ID.290400257, pg.01/10, ID.290400258, pg.01/07). Outrossim, as testemunhas ouvidas durante a instrução processual corroboraram o referido vínculo de emprego, razão pela qual restou suficientemente comprovado. Neste contexto, para a obtenção do benefício de aposentadoria por idade, na forma dos arts. 48 a 51 da Lei nº. 8213/91, faz-se necessário: a) a contingência – ou seja a idade (que para as mulheres é de 60 anos e para os homens de 65); b) a manutenção da qualidade de segurado e c) o cumprimento da carência. Quanto ao primeiro requisito, a idade do autor vem demonstrada pelos documentos de ID 290400246. Em relação ao preenchimento dos outros dois requisitos, deve-se observar o que se segue. Em relação à carência, dispõe o art. 142 da Lei 8213/91 (redação dada pela lei 9.032, de 28/04/1995) que, para o segurado inscrito na Previdência Social até 24 de julho de 1991, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a tabela constante na lei, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício. Por sua vez, em relação à qualidade de segurado para concessão de aposentadoria por idade, foi destacado que havia uma tendência da mitigação da perda da qualidade de segurado. Muitas das vezes, a pessoa atingia o número de contribuições, mas não a idade – fazendo que o INSS entendesse que, perdida a qualidade de segurado, não seria possível a obtenção do benefício. Esta interpretação foi sendo temperada pelo Superior Tribunal de Justiça, culminando na edição da Lei nº. 10.666/2003. Repisa-se que o fato de o segurado ter parado de trabalhar antes de completar a idade legal não é óbice à percepção da pretendida aposentadoria, vez que não é necessário o preenchimento simultâneo dos requisitos legais. Por sua vez, a Lei n.º 10666/03 dispôs sobre a matéria. Reza o art. 3º desta Lei que “a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial”. Já no que diz respeito à aposentadoria por idade dispôs que a perda da qualidade de segurado “não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício”. Esta legislação sufraga entendimento mais prejudicial do que o dos julgados mencionados – já que considera a data do requerimento administrativo e não do momento em que se implementou o segundo requisito (idade), para fins de verificação do número de contribuições necessárias. Logo, quando muito e “ad argumentandum”, somente poderia se aplicar para situações ocorrentes após a sua edição, sob pena de indevida retroação da norma. Para situações anteriores, acreditamos que deva continuar prevalecendo a orientação jurisprudencial do STJ. No entanto, mesmo para situações posteriores e à luz da noção de direito adquirido, entendemos que não seria de se admitir a verificação do número das contribuições do momento do requerimento, mas, quando muito, do instante do advento da idade – quando, sob a perspectiva tradicional do direito adquirido, todos os requisitos já teriam se completado e o direito incorporado o patrimônio do segurado. Portanto, para fazer uma leitura da norma à luz do conceito constitucional de direito adquirido (interpretação conforme a Constituição), o correto será, mesmo para casos posteriores ao seu advento, que o número de contribuições já vertidos tivessem como consideração a data em que foi implementada a idade legalmente exigida e não a data do requerimento administrativo. Diga-se, em reforço a tudo que estamos expondo, que a questão referente à recuperação da condição de segurado, para as aposentadorias por idade, foi diretamente afetada pela revogação, promovida pela Lei 13.547, de 2017, no art. 24, parágrafo único, da Lei de Benefícios, – em verdadeira harmonia, inclusive, com tudo que vinha se dando no plano jurisprudencial para as hipóteses antes aventadas e promovendo a correção de uma séria distorção que havia no sistema previdenciário brasileiro (em que a perda da qualidade de segurado afetava essencialmente segurados e seguradas que já tinham um longo lapso contribuído para o sistema previdenciário, atingindo diretamente os benefícios percebidos de forma diferida, em especial a aposentadoria por idade). Na hipótese dos autos, verifica-se que o autor comprovou períodos comuns de trabalho e recolhimento de contribuições individuais, não contabilizados pelo INSS, de modo que o autor laborou por 15 anos, 04 meses e 06 dias. Deste modo, considerando que completou a idade em 04/04/2014, quando se exigiam 180 contribuições, resta certo que autor cumpriu o período de carência exigido legalmente, sendo de rigor a manutenção da condenação do INSS no pagamento, à parte autora, do benefício de aposentadoria por idade, a partir da data do requerimento administrativo (18/03/2022 - ID 290400259, pg.01/02). Sendo assim, ante a ausência de alteração substancial no panorama processual capaz de modificar a convicção firmada na decisão hostilizada, tenho que não merece acolhida a pretensão deduzida no presente agravo interno. Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno interposto pelo INSS. É como voto.
Autos: | AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL - 5071959-57.2024.4.03.9999 |
Requerente: | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Requerido: | MARCOS JOSE CAVALLARI |
Ementa: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. APOSENTADORIA POR IDADE. PERÍODO RECONHECIDO NA JUSTIÇA DO TRABALHO. UTILIZAÇÃO DE CTPS E GPS COMO PROVA. DESPROVIMENTO.
I. CASO EM EXAME
Agravo interno interposto pelo INSS contra decisão monocrática que negou provimento à apelação, mantendo a sentença concessiva de aposentadoria por idade em favor da parte autora, a partir da data do requerimento administrativo (18.03.2022).
O INSS alegou preliminarmente a ocorrência de coisa julgada, com base na improcedência de ação anterior (Proc. nº 1001717-49.2017.8.26.0288), e, no mérito, sustentou a ausência de cumprimento dos requisitos legais para concessão do benefício.
A parte agravada apresentou contrarrazões ao agravo.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
Há duas questões em discussão: (i) saber se houve coisa julgada em razão de demanda anterior envolvendo pedido de aposentadoria por idade; e (ii) saber se estão presentes os requisitos legais para a concessão do benefício.
III. RAZÕES DE DECIDIR
A preliminar de coisa julgada não se sustenta, pois o período de 01.05.2013 a 31.03.2017, reconhecido em ação trabalhista, não foi objeto da demanda anterior.
As anotações na CTPS e os comprovantes de recolhimento (GPS), ainda que ausentes no CNIS, constituem prova idônea da atividade laboral, se não impugnadas de forma consistente.
A jurisprudência reconhece o direito à contagem do tempo de serviço mesmo diante da ausência de contribuição, quando se tratar de vínculo empregatício, aplicável inclusive ao empregado doméstico.
O período reconhecido judicialmente (2013 a 2017), somado aos demais documentos e testemunhos, comprova o tempo mínimo de contribuição exigido.
A idade mínima foi completada em 04.04.2014, época que se exigia o cumprimento de 180 contribuições. Autor laborou por 15 anos, 04 meses e 06 dias de atividade comprovada, sendo possível a concessão de aposentadoria por idade.
IV. DISPOSITIVO E TESE
10. Agravo interno desprovido.
Tese de julgamento: “1. A ausência de pedido de reconhecimento de determinado período em ação anterior impede a configuração de coisa julgada sobre esse intervalo. 2. É válido o período reconhecido em processo trabalhista, uma vez que corroborado por provas documentais e testemunhais que comprovem vínculo empregatício”.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXVI; Lei nº 8.213/1991, arts. 48 a 51, 55, 142 e 143; Lei nº 10.666/2003, art. 3º.
Jurisprudência relevante citada: TRF3, ApCiv 5000216-62.2019.4.03.6183, Rel. Juíza Fed. Conv. Vanessa Vieira de Mello, 7ª Turma, j. 27.09.2023, DJEN 03.10.2023; TRF3, ApCiv 5004204-26.2022.4.03.6106, Rel. Des. Fed. Gilberto Rodrigues Jordan, 9ª Turma, j. 07.12.2023, DJEN 13.12.2023; STJ, REsp 272.648/SP, Rel. Min. Edson Vidigal, 5ª Turma, j. 24.10.2000, DJ 04.12.2000, p. 98; STJ, AgRg no REsp 331.748/SP, Rel. Min. Felix Fischer, 5ª Turma, j. 28.10.2003, DJ 09.12.2003, p. 310; STJ, REsp 473.605/SC, Rel. Min. Paulo Gallotti, 6ª Turma, j. 06.05.2003, DJ 27.03.2006, p. 351.