Diário Eletrônico

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5024101-92.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: JULIO CESAR DE LIMA SUGUIYAMA, DAIANA ROSAR, S. S., J. S.

Advogado do(a) APELANTE: GETULIO MITUKUNI SUGUIYAMA - SP126768-A

APELADO: VANDERLEI HARTGERS, MARCO ANTONIO MORAES CAUDURO, GEORGIA ROZO OURA CAUDURO, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, CONDOMINIO INDIANA RESIDENCIAL PARK

Advogado do(a) APELADO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A
Advogado do(a) APELADO: JESSICA RAISSA SALLA HARTGERS - SP376698-A
Advogado do(a) APELADO: RENATA TOLEDO VICENTE BORGES - SP143733-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 


 

  

 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5024101-92.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: JULIO CESAR DE LIMA SUGUIYAMA, DAIANA ROSAR, S. S., J. S.

Advogado do(a) APELANTE: GETULIO MITUKUNI SUGUIYAMA - SP126768-A

APELADO: VANDERLEI HARTGERS, MARCO ANTONIO MORAES CAUDURO, GEORGIA ROZO OURA CAUDURO, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, CONDOMINIO INDIANA RESIDENCIAL PARK

Advogado do(a) APELADO: ISRAEL DE SOUZA FERIANE - ES20162-A
Advogado do(a) APELADO: RENATA TOLEDO VICENTE BORGES - SP143733-A

OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 

 

  

 

R E L A T Ó R I O

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): Trata-se de Ação de Usucapião Urbana movida por JULIO CESAR DE LIMA SUGUIYAMA, DAIANA ROSAR, S. S., J. S. em face de CONDOMINIO INDIANA RESIDENCIAL PARK, VANDERLEI HARTGERS, MARCO ANTONIO MORAES CAUDURO, GEORGIA ROZO OURA CAUDURO e da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, pretendendo a aquisição da propriedade do imóvel consubstanciado no apartamento n.º 52 A, localizado no 5º andar do Edifício “A”, integrando o Condomínio Indiana Residencial Park, Situado na Rua Corinto, n.º 431, na Vila Indiana, no 13º Subdistrito – Butantã e respectiva garagem.

 

Em sua inicial, os autores alegam que, em 18.01.2002, firmaram instrumento particular de contrato de venda e compra do referido imóvel, data a partir da qual passou a exercer a posse, sem qualquer impedimento, realizando diversas melhorias.

 

O feito foi ajuizado inicialmente perante a Justiça Estadual em outubro de 2015.

 

Citada a Caixa Econômica Federal  apresentou contestação requerendo o reconhecimento da incompetência da Justiça Estadual e manifestou seu interesse na lide.


Redistribuídos os autos ao juízo federal os atos praticados perante a Justiça Estadual foram ratificados.

 

O MM. Juízo a quo extinguiu o processo, nos termos do inciso VI do artigo 485 do CPC, em relação a Vanderlei Hartgers e ao Condomínio Indiana, por falta de interesse processual. Julgou improcedente o pedido dos autores, com fulcro no artigo 487, inciso I, do CPC.

Quanto ao Condomínio Indiana, condenou a parte autora ao pagamento de honorários fixados em 5% do valor atualizado da causa, ressalvados os benefícios da assistência judiciária gratuita que lhe foram deferidos. Deixou de condenar a parte autora ao pagamento de honorários em favor de Vanderlei Hartgers.

Condenou, ainda, os requerentes ao pagamento de honorários fixados em 5% do valor atualizado da causa em favor de cada um dos demais réus, CEF, Marco Antonio Moraes Cauduro e Georgia Ouzo Oura Cauduro, ressalvados os benefícios da assistência judiciária gratuita que lhe foram deferidos (ID 302733322).

 

Apela a parte autora, aduzindo que houve o preenchimento dos requisitos do art. 183 da CF e art. 1.240 do Código Civil. Assevera que no plano de amortização adotado jamais teve qualquer vinculação com recursos públicos, o imóvel apenas foi utilizado como uma garantia, tendo agido a Apelada-CEF como uma instituição financeira qualquer, visando lucro na operação.

Por fim, afirma que o Juízo a quo cometeu um equívoco ao confundir SFA com SFH e que apenas houve um empréstimo pessoal para antiga proprietária (ID 302733330).

 

Com contrarrazões da CEF, vieram os autos a esta E. Corte (ID 302733332).

 

É o relatório.

 

 


 PODER JUDICIÁRIO
Tribunal Regional Federal da 3ª Região
1ª Turma
 

APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5024101-92.2021.4.03.6100

RELATOR: Gab. 03 - DES. FED. COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: JULIO CESAR DE LIMA SUGUIYAMA, DAIANA ROSAR, S. S., J. S.

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OUTROS PARTICIPANTES:

FISCAL DA LEI: MINISTERIO PUBLICO FEDERAL - PR/SP
 

 

 

 

 

V O T O

 

 

O Exmo. Sr. Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): 

Inicialmente, recebo o recurso de apelação interposto no duplo efeito.

 

Os autores, ora apelantes, pleiteiam na presente ação a declaração do domínio sobre o imóvel usucapiendo, afirmando terem exercido a posse mansa e pacífica sem oposição, desde janeiro de 2002, ocasião em que firmaram instrumento particular de contrato de venda e compra do referido imóvel (o qual não foi trazido aos autos).

 

O artigo 183 da Constituição Federal estabeleceu os requisitos necessários para a configuração da usucapião especial urbana, sendo os principais: a posse mansa e pacífica, o decurso do prazo quinquenal e a não oposição, de modo que a ausência de quaisquer dessas condições afasta por si só a possibilidade de adquirir o domínio do bem, pela prescrição aquisitiva.


 

Como bem consignou o Magistrado de primeiro grau:


 

"(...) Analisando a matrícula mais atualizada do imóvel, emitida em 09.09.2022, documento id n.º 262670782, infere-se que o apartamento n.º 52 A, localizado no 5º andar do Edifício “A”, integrando do Condomínio Indiana Residencial Park, Situado na Rua Corinto, n.º 431, na Vila Indiana, no 13º Subdistrito Butantã, foi originariamente transmitido a Maria Cardoso Salla, solteira, por instrumento particular datado de 30.01.1989, (R.1), sendo dado em hipoteca à CEF, (R.2), como garantia de financiamento firmado no âmbito do SFA.

Por Carta de Arrematação expedida em 04.08.2000 o imóvel foi arrematado pela CEF, (R.3), sendo cancelada a hipoteca.

Por escritura pública lavrada em 14.12.2016, a CEF transmitiu o imóvel por venda a Marco Antonio Moraes Cauduro e sua esposa Georgia Rozo Oura Caudura, (R.6.), operando-se o distrato em 11.10.2017, averbação n.8., retornando o imóvel ao domínio da CEF.

Não cabe nestes autos, nem é objeto desta ação, analisar a regularidade do procedimento que levou à arrematação do imóvel pela CEF, mas sim a quem pertencia a titularidade do domínio, quando o autor firmou o instrumento particular para aquisição do imóvel e adentrou em sua posse, para que possa ser aferida a possibilidade do imóvel ser usucapido e, em caso positivo, a presença dos requisitos necessários para tanto.

Em sua inicial, fl. 3 do primeiro parágrafo do documento id n.º 84274569, o autor afirma expressamente que adquiriu o imóvel por instrumento particular firmado em 18.01.2002, data a partir da qual passou a exercer a posse do imóvel.

Inobstante não ter sido acostado aos autos cópia deste instrumento, tomando a alegação do autor como verdadeira, infere-se que quando firmado o referido instrumento e tomada posse do imóvel, a propriedade já havia sido consolidada pela CEF, uma vez que o imóvel já havia sido por ela arrematado.

Neste contexto, em que a transmissão do imóvel a Maria Cardoso Salla por instrumento particular datado de 30.01.1989, (R.1), e na dação do imóvel em garantia hipotecária à CEF foram regularmente registrados, constando da matrícula do imóvel, resta claro que o autor tinha conhecimento de que a aquisição da propriedade do imóvel se daria apenas com a integral quitação do financiamento, razão pela qual sua posse tinha e tem natureza precária.

A posterior alienação do imóvel a terceiro, não retira da CEF a titularidade do domínio pelo período anterior.

Assim, não se pode considerar que os autores tenham exercido posse animus domini sobre imóvel, porque ciente da existência de dívida da então proprietária com a CEF e da possibilidade de arrematação do imóvel pela CEF para sua quitação.

Como já dito acima, embora a  CEF seja uma empresa pública sujeita ao regime jurídico de direito privado, possui também patrimônio vinculado às políticas públicas que lhe incumbe executar em razão de sua condição de braço financeiro do poder público."

 

Com efeito, a ausência de "animus domini" afasta a pretensão dos requerentes, em se tratando de imóvel hipotecado à CEF submetido ao Sistema Financeiro de Habitação, de contrato de mútuo vinculado ao Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES/CP e Sistema Francês de Amortização, conforme se depreende da documentação acostada aos autos, notadamente cópia da matrícula do imóvel em questão (ID 302733197, p. 14).

Nesse passo, a sentença acertadamente concluiu que: “esse patrimônio especial da CEF, composto por recursos financeiros e imobiliários integrantes do Sistema Financeiro da Habitação, tem natureza pública e, por isso, os imóveis não podem ser objeto de usucapião, em razão da vedação nesse sentido, do artigo 183, § 3º da Constituição Federal.”. 

 

Nesse sentido:

 

APELAÇÃO CÍVEL. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. IMÓVEL FINANCIADO COM RECURSOS DO SFH. EQUIPARAÇÃO A BEM PÚBLICO. ARTIGO 183, §3º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE AQUISIÇÃO POR USUCAPIÃO. RECURSO IMPROVIDO.

1. A demanda foi ajuizada por Irene de Liz Velho, visando à aquisição, por usucapião especial urbana, do imóvel de 94,10 m², correspondente ao apartamento 121, bloco A, do Edifício Moinho Velho, bloco B, acrescido de uma vaga de garagem, Conjunto Residencial Parque das Torres, situado na rua Doutor Heitor Nascimento, 100, São Paulo/SP, sobre o qual alega exercer a posse mansa, pacífica, sem oposição e com animus domini, desde 1998.

2. A r. sentença julgou improcedente o pedido, nos termos do artigo 487, I, do CPC, sob o fundamento de que não foram preenchidos os requisitos necessários para a aquisição da propriedade por usucapião. A autora foi condenada ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% do valor atribuído à causa, devidamente atualizado, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, cuja cobrança ficará suspensa, nos termos do artigo 98, §3º, do CPC.

3. Em suas razões recursais, a autora alega que cumpriu todos os requisitos legais para que seja declarada a prescrição aquisitiva do imóvel em seu favor (posse ininterrupta, mansa, pacífica e com ânimo de dono, por mais de 22 anos). Sustenta, ainda, que a apelada não teria deflagrado qualquer providência administrativa ou judicial para a proteção de sua propriedade, restando caracterizado o abandono. Requer, assim, a reforma da r. sentença, julgando-se procedente o pedido inicial.

4. A usucapião especial urbana, também conhecida como usucapião pró-moradia, tem como escopo a efetividade do direito fundamental à moradia e do princípio da dignidade da pessoa humana, nas condições dispostas no artigo 183 da Constituição Federal. Tal norma, igualmente reproduzida no artigo 1.240 do Código Civil, apresenta como requisitos a essa modalidade de usucapião: a) área urbana de até 250 m²; b) exercício da posse por 5 (cinco) anos, de forma ininterrupta e sem oposição; c) utilização do imóvel para moradia do possuidor ou de sua família; d) não seja o usucapiente proprietário de outro imóvel, rural ou urbano; e) não tenha o usucapiente adquirido qualquer outra área por meio da usucapião. 

5. Ademais, cumpre ressaltar que a restrição prevista no §3º do referido artigo, qual seja, a impossibilidade de aquisição de imóveis públicos por usucapião, não é aplicável aos bens pertencentes a empresas públicas e de sociedade de economia mista, uma vez que estas são regidas pelas normas de direito privado. Todavia, se o bem em questão estiver afetado à prestação de serviço público, este deverá ser tratado como bem público.

6. Nesse sentir, a Caixa Econômica Federal, ao atuar como agente financeiro dos programas oficiais de habitação do Governo Federal, tal como o Sistema Financeiro de Habitação - SFH, explora serviço público "destinado a facilitar e promover a construção e a aquisição da casa própria ou moradia, especialmente pelas classes de menor renda da população" (artigo 8º da Lei nº 4.380/64). Dessa forma, o imóvel financiado pela Caixa Econômica Federal com recursos do Sistema Financeiro de Habitação se equipara a bem público, sendo, portanto, imprescritível. Precedentes.

7. No caso dos autos, a autora, ora apelante, alega residir no imóvel desde 1998, após tê-lo adquirido, por contrato verbal, de Aurora Rodrigues do Prado. Ocorre que, de acordo com os registros de 20/05/1991 na matrícula do imóvel usucapiendo, este havia sido adquirido pela sra. Aurora, através de financiamento firmado com Caixa Econômica Federal, com recursos do Sistema Financeiro de Habitação - SFH, com previsão de pagamento em 240 prestações mensais.

8. Dessa forma, nos termos do §3º do artigo 183 da Constituição Federal, o imóvel não é passível de usucapião, devendo ser mantida a sentença de improcedência, por fundamento diverso.

9. Condenação da apelante ao pagamento de honorários advocatícios recursais, fixados em 1% do valor da atualizado causa, nos termos do artigo 85, §11º, do CPC, cuja execução ficará suspensa em razão da gratuidade da justiça.

10. Apelação a que se nega provimento.

 (TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 0005310-20.2008.4.03.6100, Rel. Desembargador Federal RENATO LOPES BECHO, julgado em 02/02/2023, DJEN DATA: 07/02/2023)

 

Não obstante apenas por amor ao debate, não há possibilidade, a teor do artigo 9º da Lei 5.741/71, e de farta jurisprudência, de aquisição por meio de usucapião de imóveis inseridos no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, porque possui a finalidade de atender à política habitacional do Governo Federal, ao que se depreende dos seguintes arestos:

 

APELAÇÃO CÍVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. NULIDADES AFASTADAS. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANA. IMÓVEL FINANCIADO PELA CEF. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 9º, "CAPUT", DA LEI 5.741/71. APELAÇÃO NÃO PROVIDA.

1. Trata-se de recurso de apelação, interposto pela parte autora, em face da r. sentença que julgou improcedente o pedido de usucapião especial urbana de imóvel sito na Rua Alfredo Lazzerini, nº 04, Jardim Colombo, São Paulo, bem como condenou os autores ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, observada a gratuidade da justiça.

2. Ausência de fundamentação. A sentença recorrida não padece de qualquer vício, houve o exame retido dos autos, com decisão proferida nos termos de jurisprudência consolidada, de modo que o não acolhimento da tese defendida pela parte não importa em ausência de fundamentação. Nulidade afastada.

3. Cerceamento de defesa. Inocorrência.  Nesse sentido, poderá o juiz dispensar a produção probatória, quando os elementos coligidos forem suficientes para fornecer subsídios elucidativos do litígio, casos em que o julgamento da lide poderá ser antecipado e proferido até mesmo sem audiência, se configuradas as hipóteses do artigo 355. A decisão prolatada pelo Juízo a quo, valendo-se dos instrumentos legais supramencionados, bem como do seu livre convencimento motivado, acertadamente entendeu pela suficiência dos elementos probatórios já presentes.  

4. Em relação à alegação da ocorrência da prescrição aquisitiva da propriedade verifica-se que para que haja a declaração de usucapião, não basta a posse do imóvel pelo prazo estabelecido em lei. É necessário que tal posse seja "ad usucapionem", isto é, que preencha determinados requisitos: que seja "animus domini", contínua, ininterrupta, pacífica e pública, cujos requisitos não ocorreram.

5. Para a configuração da usucapião especial urbana é necessária a comprovação simultânea de todos os elementos caracterizadores do instituto constantes no artigo 1.240 do Código Civil, especialmente o animus domini, condição subjetiva e abstrata que se refere à intenção de ter a coisa como sua e que se exterioriza por atos de verdadeiro dono.

6. A parte apelante pretende a declaração de propriedade na forma originária - usucapião especial -, a qual vem prevista no artigo 183 da Constituição da República Federativa do Brasil, nestes termos: "Aquele que possuir como sua área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. § 1º - O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil. § 2º - Esse direito não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez. § 3º - Os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião”. Conforme dispõe o § 3º do dispositivo acima citado, os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.

7. No caso, a Caixa Econômica Federal é uma empresa pública exploradora de atividade econômica, tendo os seus bens, em tese, natureza privada. Contudo, o caso dos autos apresenta peculiaridade que determina o tratamento do bem como se público fosse. É que os imóveis financiados com recursos do SFH têm por escopo promover o direito constitucional à moradia. Nesses casos, a CEF exerce serviço de natureza privada para satisfação do interesse público - a título de intervenção no domínio econômico - com a finalidade de manter o equilíbrio na oferta de bens de caráter social; em outras palavras, imóvel de baixo custo.

8. Em face do preceito insculpido no artigo 9º da Lei nº 5.741/1971, que tipifica a invasão e ocupação de imóvel do sistema Financeiro da Habitação como crime, o Supremo Tribunal Federal já se pronunciou pela impossibilidade de usucapir imóvel do SFH, na linha do seguinte julgado: STF, 2ª Turma, RE 191.603-6/MS, Relator Ministro MARCO AURÉLIO, DJ 28/08/1998.

9. O imóvel objeto desta ação é insuscetível de usucapião, nos termos do artigo 183, § 3º, da Constituição da República Federativa do Brasil.

10. Apelação desprovida.                                    

(TRF 3ª Região, 1ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5013891-84.2018.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL HÉLIO NOGUEIRA, julgado em 02/12/2021, DJEN DATA: 07/12/2021)

 

CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. USUCAPIÃO ESPECIAL URBANO. NÃO COMPROVADA. AUSÊNCIA DE ANIMUS DOMINI. IMÓVEL FINANCIADO COM RECURSOS DO SFH. PRELIMINAR AFASTADA APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. Inicialmente, observo que a realização de prova testemunhal é irrelevante para o caso.

2. No caso, os fatos que embasam o pedido deduzido na inicial são passíveis de prova documental, com exclusividade.

3. A matéria em discussão é eminentemente de direito, a prescindir de prova testemunhal, entendendo o Juízo que o processo está suficiente instruído para julgamento.

4. Discute-se a possibilidade de usucapião de bem com garantia hipotecária, o que evidencia a desnecessidade da aludida prova, não havendo que se falar em cerceamento de defesa.

5. Verifica-se dos autos que a parte autora, de fato, não logrou demonstrar a posse mansa, tranquila e com animus domini capaz de acarretar a aquisição do imóvel por usucapião.

6. Observo, inicialmente, que se trata de empreendimento Parque São Bento, no âmbito do sistema Financeiro de Habitação, com hipoteca sobre o imóvel, conforme R2/34.644 (fls. 43/vº).

7. Posteriormente, houve execução de título judicial, que tramitou junto a 1ª Vara de Sorocaba/SP no final de 1992 e autuada sob o nº 92.0607057-6, ajuizada pela CEF em face da PG S/A, sob o fundamento do inadimplemento do contrato de mútuo celebrado com a instituição financeira, como bem informou a instituição financeira em contestação.

8. Como se não bastasse todos os argumentos expostos, o imóvel pertence ao sistema Financeiro de Habitação.

9. A esse respeito, é entendimento consolidado na jurisprudência que, a teor do artigo 9º da Lei 5.741/71, não é possível a aquisição por meio de usucapião de imóveis inseridos no âmbito do sistema Financeiro da Habitação, porque possui a finalidade de atender à política habitacional do Governo Federal.

10. A E. Primeira Turma desta Corte Regional, pelo voto do Desembargador Federal José Lunardelli, faz referência ao loteamento Parque São Bento, precedente que se amolda ao caso concreto.

11. Apelação improvida (Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1792314 0015549-53.2008.4.03.6110, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO FONTES, TRF3 - QUINTA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/08/2018)

 

DIREITO CIVIL. USUCAPIÃO URBANO ESPECIAL. SFH. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1 - É certo que, apesar de o usucapião urbano especial, previsto no art. 183 da Constituição, no art. 9º da lei 10.257/01 e no at. 1.240 do Código Civil não exigir justo título ou boa-fé, mas somente a inexistência de outros imóveis em nome da pessoa interessada e sua ocupação por cinco anos, para fins de residência familiar, não se pode ignorar que o imóvel ora pretendido foi objeto de financiamento pelo sistema Financeiro de Habitação - SFH, concedido pela Caixa Econômica Federal aos próprios requerentes, tendo como garantia do mútuo a hipoteca.

2 - Como não houve pagamento do empréstimo, o imóvel encontra-se em litígio desde, por conta de execução extrajudicial promovida pela instituição financeira contra os mutuários (em que o imóvel hipotecado foi adjudicado) e de ação anulatória de arrematação/adjudicação (já sentenciada) movida por estes em face da empresa federal credora.

3 - Ressalto que o imóvel em comento constitui objeto de operação financeira no âmbito do sistema Financeiro da Habitação - SFH, merecendo, portanto, proteção contra eventuais ocupações irregulares, consoante prescreve o art. 9º da Lei n.º 5.741/71.

4 - Tais circunstâncias - assim como o fato de a CEF não ter dado mostras ao longo do tempo de se desinteressar pela propriedade - obstam o aperfeiçoamento da prescrição aquisitiva.

5 - Cumpre salientar que não se pode esquecer que o SFH é destinado à condução de política habitacional que beneficia a população de baixa renda e, neste sentido, que preservar as receitas derivadas do adimplemento de mútuos propicia a manutenção de recursos públicos necessários à implantação de empreendimentos habitacionais no país.

6 - Apelação improvida.

(TRF 3ª Região, DÉCIMA PRIMEIRA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1731622 - 0010129-22.2007.4.03.6104, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/08/2018, e-DJF3 Judicial 1 DATA:28/08/2018)

 

O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que, o imóvel vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação, não pode ser objeto de usucapião. Precedentes: AgInt no REsp 1584104/AL, Rel. Min. RAUL ARAÚJO, 4ª Turma, j. 17/08/2017, DJE 08/09/2017; AgInt no REsp 1653998/PE, Rel. Min. MARCO AURÉLIO BELLIZZE, 3ª Turma, j. 03/08/2017, DJE 14/08/2017; AgInt no REsp 1483383/AL, Rel. Min. LUIS FELIPE SALOMÃO, 4ª Turma, j. 20/06/2017, DJE 27/06/2017; AgRg no REsp 1487677/AL, Rel. Min. MOURA RIBEIRO, 3ª Turma, j. 27/04/2017, DJE 22/05/2017; REsp 1448026/PE, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, 3ª Turma, j. 17/11/2016, DJE 21/11/2016; REsp 1221243/PR, Rel. Min. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, 3ª Turma, j. 25/02/2014, DJE 10/03/2014.

 

Por fim, nos termos do § 11º do art. 85 do CPC, a majoração dos honorários é uma imposição na hipótese de se negar provimento ou rejeitar recurso interposto de decisão que já havia fixado honorários advocatícios sucumbenciais, respeitando-se os limites do § 2º do art. 85 do CPC.

 

Assim, à luz do disposto nos §§2º e 11 do art. 85 do CPC, devem ser majorados em 2% os honorários fixados anteriormente, ressalvando-se que, quanto ao beneficiário da justiça gratuita, a cobrança fica condicionada à comprovação de que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos, conforme dispõe o art. 98, §3º do CPC.

 

Diante do exposto, nego provimento ao recurso, majorando em 2% os honorários fixados pelo juízo a quo a título de condenação dos autores.

 

É o voto.



E M E N T A

 

Direito civil. Ação de usucapião especial urbana. Imóvel arrematado pela CEF no âmbito do SFH. Equiparação a bem público. Vedação legal. Recurso desprovido.

I. Caso em exame

  1. Apelação cível interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido de declaração de usucapião especial urbana de imóvel financiado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação. Alegação de posse mansa e pacífica exercida desde 2002.

II. Questão em discussão

  1. Há duas questões em discussão: (i) saber se o imóvel, financiado com recursos do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e arrematado pela CEF, pode ser adquirido por usucapião; e (ii) saber se os autores exerceram posse com animus domini, conforme exigido pelo art. 183 da CF/1988 e art. 1.240 do Código Civil.

III. Razões de decidir

  1. Imóvel objeto de hipoteca à CEF, posteriormente arrematado pela própria instituição, configurando patrimônio vinculado à política habitacional pública. Aplicabilidade do art. 183, §3º, da CF/1988.

  2. Posse exercida pelos autores em imóvel já arrematado, com ciência da dívida e da hipoteca, configurando posse precária e sem animus domini.

  3. Jurisprudência consolidada do TRF-3 e STJ sobre a impossibilidade de usucapião de imóvel vinculado ao SFH, dada sua natureza equiparada a bem público.

IV. Dispositivo e tese

  1. Recurso desprovido. Honorários majorados em 2% sobre o valor da causa, observada a gratuidade da justiça.

Tese de julgamento: “1. Imóvel financiado com recursos do SFH, arrematado pela CEF, possui natureza equiparada a bem público, sendo insuscetível de usucapião. 2. A posse exercida sobre bem arrematado por instituição financeira pública, sem animus domini, é precária e não atende aos requisitos do art. 183 da CF/1988.”

Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 183, §§ 1º e 3º; CC, art. 1.240; Lei nº 5.741/1971, art. 9º; CPC/2015, art. 85, §§ 2º e 11.

Jurisprudência relevante citada: TRF3, ApCiv 0005310-20.2008.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Renato Lopes Becho, j. 02.02.2023; TRF3, ApCiv 5013891-84.2018.4.03.6100, Rel. Des. Fed. Hélio Nogueira, j. 02.12.2021; STJ, AgInt no REsp 1584104/AL, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª Turma, j. 17.08.2017.

 


  ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Primeira Turma, por unanimidade, negou provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal